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Pesquisas sobre escrita no aporte do ISD: estado da arte

Parte II – Pressupostos Teóricos

Capítulo 1 Pesquisas sobre escrita no aporte do ISD: estado da arte

Para apresentar esse estado da arte, realizei uma busca sobre pesquisas que têm como foco a produção de texto. O levantamento desse estado da arte deu-se prioritariamente por meio do Currículo Lattes da plataforma CNPq via palavras-chave “escrita textual interacionismo sociodiscursivo” e “reescrita textual interacionismo sociodiscursivo”. O buscador Scholar Google também foi utilizado para a busca a artigos que versam sobre o assunto. Além desses, busquei no SciELO Brasil periódicos que trazem em seus títulos palavras como “escrita” ou “reescrita” ou “produção de texto” ou “espiral”. Desta pesquisa, estão aqui apresentadas brevemente as pesquisas que guardam alguma relação (de discordância ou de semelhança) com este trabalho.

Ferreira e Araújo (2004) apresentaram, dos trabalhos encontrados por mim, o que mais se aproxima com o que aqui desenvolvo, no artigo intitulado “O (não) funcionamento da reescrita em textos produzidos por licenciandos em Letras”. Este artigo foi resultado de uma pesquisa cujo objetivo era o de “identificar e analisar os fatores que contribuem (ou não) para a reescrita textual no ensino superior” (FERREIRA; ARAUJO, 2004, p. 201). O ponto de partida da pesquisa foi a observação empírica de que a reescrita não funcionava tão bem como etapa tida como de melhoramento do texto. Concluíram que há uma tendência de a correção que antecede a reescrita favorecer certa passividade do produtor daquele texto e uma segunda tendência, porém menos recorrente, de reversão dessa passividade no contexto pesquisado.

Nesta tese, pretendo discutir questões relacionadas a essa passividade e ao meu contexto de pesquisa que é o aluno adolescente do Ensino Médio, quando examinarei a fase da adolescência no contexto escolar.

Leite (2009), em dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal da Paraíba, intitulada “A reescritura do aluno sob a orientação do professor”, buscou investigar se a reescrita contribuía ou não para o desenvolvimento de uma competência discursiva do aluno na produção escrita. Realizando uma pesquisa de campo, analisou qualitativamente, com subsídios no ISD, textos em sua primeira versão e após a reescrita guiada pela correção do professor. Como resultados, percebeu que a correção e a reescrita conduzem mais a uma promoção de higienização do texto do que a um desenvolvimento da competência discursiva dos alunos.

Gonçalves (2007), em sua tese de doutorado defendida junto ao Programa da Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara – denominada “Gêneros textuais e reescrita: uma proposta de intervenção interativa”, investigou a forma como sequências didáticas – juntamente a listas que servem para regulação e controle do comportamento no momento da reescrita (interativa) de alguns gêneros – constituíam-se como ferramentas eficazes na produção desses gêneros. Como resultado, percebeu que as reescritas, em maior ou menor grau, tornaram-se mais proficientes.

Gasparotto e Menegassi (2013), em artigo intitulado “A mediação do professor na revisão e reescrita de textos de aluno do Ensino Médio”, publicado na revista Calidoscópio, apresentaram análise realizada, com base nos pressupostos teóricos de Bakhtin e de seu Círculo, quanto aos modos de participação de um professor, por meio da correção escrita, na revisão e na reescrita de textos de um de seus alunos. Perceberam que havia pouco conhecimento teórico docente referente ao trabalho com a reescrita e que esta se configurava como prática pouco exercitada (ou exercitada de forma artificial) nas escolas, o que não fazia com que os pesquisadores deixassem de apontar a importância fundamental da reescrita para quem a entende como propiciadora da reflexão sobre o ato da escrita por parte do aluno.

Souza e Menegassi (2010), em artigo intitulado “A reescrita como instrumento de desenvolvimento da escrita: uma experiência com professores”, desenvolveram seu trabalho em torno de três objetivos, dos quais consideraram dois atingidos: o de disseminar a ideia de que a reescrita seria procedimento inerente ao da produção textual e o de fomentar a consolidação de espaços de discussão teórico-metodológica entre os professores de língua materna dentro de suas instituições de ensino. Não consideraram integralmente atingido o objetivo de conseguir que os professores, após essa compreensão da reescrita como inerente ao ato da produção textual, se comportassem de maneira a explicitar essa compreensão, uma vez que eles não se comportaram de tal forma, o que os autores da pesquisa atribuem ao fato de esses professores serem excessivamente tradicionalistas e não conseguirem romper com a tradição do “normativismo gramatical”, conforme afirmaram.

A maior parte desses trabalhos focam a reescrita como essencial no processo de ensino-aprendizagem relativo à produção textual, embora muitos apontem insucesso na prática devido a uma força da tradição normativista da maior parte dos professores em atuação. Embora o foco da reescrita seja respeitável e aceito academicamente, percebi haver outras possibilidades exitosas de trabalho para com a produção textual, como a que defendo aqui.

Araujo (2004), em dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal da Bahia, apresentou um duplo enfoque no seu trabalho, que versava sobre o rascunho e a avaliação de pares. Em seu estudo, discutiu sobre atividades de revisão de texto partilhada e reescrita como prática de reformulação de rascunho (entendendo aí um uso produtivo do rascunho na escola) e percebeu a produtividade dessas práticas nas crianças com as quais desenvolveu a pesquisa.

O trabalho de Araujo tem pontos de contato com esta tese: o trabalho com revisão de rascunho e a avaliação de pares. Na tese que aqui se apresenta, a possibilidade da reescrita na etapa de planejamento do texto (rascunho) era partilhada e “avaliada” pelos pares por meio da plataforma virtual de aprendizagem que era utilizada em certos momentos do processo de produção textual.

Cunha e Toledo (2014) apresentaram as análises qualitativas das influências do bilhete orientador do professor no processo de revisão e reescrita textual pelo aluno. Como corpus, tiveram escritas e reescritas de um aluno de 5º ano e o bilhete do professor como instrumento de correção textual. Concluíram que o bilhete do professor provê discussão sobre adequações ao gênero, revisões quanto ao uso de coesivos e propicia estímulo aos comportamentos escritores do aluno, levando-o a escritas mais satisfatórias.

Alunos do quinto ano, como os da pesquisa de Cunha e Toledo (2014), apresentam um perfil diferente dos que tenho nesta tese. Trata-se, naquela, de crianças cuja competência escrita da capacidade linguística está se firmando e cuja ansiedade da busca pela novidade não é tão marcada como na adolescência (faixa de público-alvo da pesquisa que se desenvolve nesta tese).

Silva (2014), no mesmo número da revista em que Cunha e Toledo publicaram seu artigo, apresentou os resultados de um estudo realizado no grupo de formação integrante do PIBID da faculdade de Letras da Universidade Federal de Lavras. Trouxe a análise de propostas de produção de texto aplicadas por professores do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental, considerando o trabalho do planejamento, da escrita, do exame frente ao escrito e da reescrita. Com relação à reescrita, a pesquisa concluiu haver indícios de que os professores (40%) estavam orientando os alunos nessa etapa, porém sem que fosse um trabalho muito sistematizado, segundo os pesquisadores, porque priorizavam sobretudo orientações relacionadas à correção ortográfica. Como conclusão da pesquisa como um todo, perceberam que havia lacunas no processo do ensino-aprendizagem da escrita e que o ato da escrita tinha priorizado aspectos formais, fazendo-se inexpressivo e artificial, levando o aluno a não compreender os motivos da escrita e a não estabelecer sentidos ao escrever textos.

Independentemente de a correção visar à reescrita ou visar a uma nova produção textual (como no caso da Escrita em Espiral que aqui se propõe), as orientações na correção devem se fazer com relação aos aspectos micro e macroestruturais. Nesta tese, também pude vislumbrar se, na Escrita em Espiral, o processo do ensino-aprendizagem da escrita poderia se estabelecer de forma expressiva e não artificial, levando o aluno, diferentemente, a compreender os motivos da escrita e a estabelecer sentidos ao produzir seus textos.

Nascimento (2004), em dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Pernambuco, analisou dezesseis textos, frutos do processo de reescrita de duas dissertações argumentativas, duas cartas ao leitor e duas narrativas fantásticas, produzidos por alunos de primeiro ano do Ensino Médio. Analisou a reescrita a partir do rascunho do texto e concluiu que, ao reescrever, do rascunho para a versão “definitiva”, o aluno não se limitava a passar a limpo o rascunho, mas sim se tornava seu primeiro leitor e expandia os recursos expressivos da língua, aprimorando sua habilidade escrita. Já os escritores iniciantes precisavam submeter esses rascunhos a um olhar externo (do docente) por terem dificuldades em corrigire seus textos.

O trabalho de Nascimento (2004) apresenta pontos em comum com esta tese: textos de alunos adolescentes do Ensino Médio e aprimoramento de texto a partir do rascunho, seja a partir do olhar do próprio aluno, seja a partir de um olhar externo. Na Escrita em Espiral, conforme se apresentará, a etapa do planejamento (rascunho) também passa por aprimoramento, seja a partir do olhar do próprio aluno, seja a partir do olhar dos pares (colegas ou professor) interagindo por meio do Ambiente Virtual de Aprendizagem.

Martins (2013), em dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras da PUC de Minas Gerais intitulada “Entre o prescrito e o realizado: repercussões no ensino da escrita em aulas de língua materna”, investigou a avaliação e sua relação com o ensino da escrita (relação “de impasse”, segundo o autor). Martins considerou que os professores afirmavam a necessidade da prática da escrita, enquanto em sala de aula o que promoviam não eram aulas de produção de texto, mas, segundo o pesquisador, aulas de metalinguagem. Aponta, também, as condições de trabalho dos docentes e seus salários, considerando-os insatisfatórios.

Em comum ao trabalho de Martins (2013), nesta tese também reflito brevemente sobre as condições de trabalho do professor, sugerindo como contribuições uma reflexão acerca de uma “reforma política” educacional que consiga situar o professor e sua carga de trabalho, considerando inclusive que ao levar para o centro de sua aula a produção de texto o professor atribui a si uma significativa carga excedente de trabalho extraclasse. Hipotetizo, dentro desta

perspectiva, que talvez o foco da maioria dos professores esteja no trabalho com a metalinguagem (como constatado por Martins) porque este trabalho talvez possa vir a lhes exigir uma carga horária extraclasse significativamente menor do que a exigida quando o centro do trabalho é a produção textual.

É também dentro de uma perspectiva ligeiramente diferente da de Martins que atribuo o foco recorrente (como percebido por Martins) das aulas de Linguagem à metalinguagem, não tendo tanta certeza de que seja porque os professores estejam convictos de que, desenvolvendo metalinguagem, seus alunos desenvolverão competência escritora, mas pelo fato de que trabalhar metalinguagem vai exigir desses professores, que têm condições tão infelizes de trabalho, uma carga horária extraclasse menor do que a que lhes seria exigida com o trabalho de produção textual, mesmo que, em suas representações, este trabalho apareça como o mais importante de ser realizado.