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Parte II – Pressupostos Teóricos

Capítulo 8 A produção textual no aporte do isd

9.4 Tipos de sequência

Dentro dos tipos de discurso, estão algumas formas de planificação convencional propostas por Bronckart (2012): as sequências. Elas se baseiam em operações de caráter dialógico porque são selecionadas, no interdiscurso da língua, de acordo com uma decisão do enunciador a partir da representação que possui do destinatário e do objetivo que possui com relação a este. Bronckart busca em Jean-Michel Adam – definição que este inicia na década de 1980 e aprofunda em 1990, 1992 e 1999 – para ampliar a discussão sobre as sequências.

Caracterizando-as, segundo Adam, há dois traços essenciais. Um deles é que elas correspondem a “um conjunto hierarquicamente organizado de macroproposições. Cada uma das macroproposições dá conta de uma das características da sequência e pode ser atualizada por uma ou várias proposições na superfície do texto (o texto produzido)”. (BONINI, 2005, p. 217). Outro traço é que os traços típicos que marcam as sequências prototípicas aparecem nos textos, geralmente, de modo parcial, visto que as exigências pragmáticas (como o gênero) atualizam as sequências no texto. Assim, muitas vezes um texto pode apresentar mais de uma sequência em sua superfície, embora uma se apresente como dominante à qual se adequará(ão) a(s) outra(s).

Recorrendo às pesquisas e à concepção de Adam e fazendo ressalvas a ela, Bronckart elenca seis tipos de sequência que podem se combinar e se articular organizando linearmente um texto: a sequência narrativa, a descritiva, a dialogal, a explicativa, a argumentativa e a injuntiva (esta última não considerada por Adam, mas considerada por Bronckart como uma sequência específica e distinta das demais).

As sequências são definidas em diferentes níveis: (i) semântico-pragmático: por meio de sequências, o produtor, de acordo com o que representa sobre o destinatário e sobre o efeito que deseja produzir nele, reconstrói o mundo discursivo; (ii) morfossintático: cada sequência é marcada por unidades linguísticas típicas; (iii) psicológico: advém de uma “experiência do intertexto” (BRONCKART, 2012, p. 233); (iv) teórico: neste nível, constituem-se enquanto prototípicas; (v) no nível de sua relação com os tipos de discursos:

cada tipo de discurso possui uma tendência à predominância de certas sequências e (v) no nível de relação com os textos: não há entre textos e sequências relação de obrigatoriedade, podendo haver texto sem organização em forma de sequência prototípica. (Cf. Machado, 2005)

Algumas representações direcionam a escolha por se organizar um conteúdo em uma ou outra sequência específica. É o que mostra o Quadro 2 a seguir.

Quadro 2: Sequências, representações dos efeitos pretendidos e fases correspondentes.

Sequências Representações dos efeitos pretendidos Fases Descritiva Fazer o destinatário ver em detalhe elementos

de um objeto de discurso, conforme a orientação dada a seu olhar pelo produtor.

Ancoragem Aspectualidade Relacionamento Reformulação

Explicativa Fazer o destinatário compreender um objeto de discurso, visto pelo produtor como

incontestável, mas também como de difícil compreensão para o destinatário.

Constatação inicial Problematização Resolução

Conclusão/Avaliação

Argumentativa Convencer o destinatário da validade de

posicionamento do produtor diante de um objeto ou discurso visto como contestável (pelo

produtor e/ou pelo destinatário).

Estabelecimento de: premissas

suporte argumentativo contra-argumentação conclusão

Narrativa Manter a atenção do destinatário por meio da construção de suspense, criado pelo

estabelecimento de uma tensão e subsequente resolução. Apresentação de: situação inicial complicação ações desencadeadas resolução situação final

Injuntiva Fazer o destinatário agir de um certo modo ou em uma determinada direção

Enumeração de ações temporalmente subsequentes

Dialogal Fazer o destinatário manter-se na interação proposta

Abertura

Operações Transacionais Fechamento

Fonte: MACHADO, A. R. (2004)

É importante ressaltar que as sequências não são critérios para definição ou classificação de gêneros.

Como consequência lógica da posição do ISD sobre sequências, pode-se afirmar que não há possibilidade de definir ou classificar todos os gêneros existentes pelo critério de sequência, dada a constatação de que existem

textos vários em que elas não ocorrem, o que nos leva à hipótese de que

também há gêneros de textos que não as apresentam. Muito menos podemos afirmar que um gênero se diferencia de todos os demais por apresentar um tipo de sequência e não outro. (MACHADO, 2005, p. 248)

O possível de se realizar, é identificar gêneros cujas famílias trazem uma sequência enquanto dominante, mas, ainda assim, não se abarcariam todos os gêneros existentes.

Como o foco das perguntas de pesquisa que norteiam este trabalho têm como centro de investigação o aluno, não discorro teoricamente, a seguir, sobre a sequência injuntiva que recairia na prescrição da professora.

a) Sequência narrativa

As sequências narrativas são as que aparecem nos relatos interativos e nas narrações (cf. Bronckart, 2012, p. 252).

Na sequência narrativa, há organização de acontecimentos em uma ordem linear obrigatória – que implicam personagens – sustentado por um “processo de intriga” (BRONCKART, 2012, p. 219).

Há articulação, em sua forma mais simples, de três fases, quais sejam: a situação inicial (início), a transformação (meio) e a situação final (fim).

De forma mais complexa, Bronckart (2012) recorre a Labov e Waletzky (1967) para trazer o padrão desta sequência implicando cinco fases principais para a sequência narrativa prototípica: (i) situação inicial (estado equilibrado); (ii) fase de complicação (momento da inserção de uma problema, de criação de tensão); (iii) fase de (re)ações (em que se reúnem os acontecimentos advindos da perturbação); (iv) fase de resolução (quando há uma diminuição da tensão); (v) fase da situação final (com um novo estado de equilíbrio).

Há, ainda, duas outras fases que podem se acrescentar, que são (i) a fase de avaliação e (ii) a fase de moral.

Essas fases podem acontecer em um número limitado ou de modo mais complexo em um texto, a depender do gênero em que se organizam.

Pode também acontecer de não haver fase de tensão na sequência narrativa – é “o grau zero da planificação dos segmentos da ordem do narrar” (BRONCKART, 2012, p. 238).

Seu caráter dialógico está em organizar acontecimentos de forma a manter a atenção do destinatário para uma dimensão interpretativa, destinatário este que será capaz de “empreender uma tentativa de compreensão das questões da atividade humana” (BRONCKART, 2016, p. 234).

As sequências descritivas aparecem nos tipos discursivos da ordem do narrar e da ordem do expor (cf. Bronckart, 2016, p. 252). Organizam-se em uma ordem hierárquica, comportando três fases em sua forma prototípica: (i) ancoragem (assinala-se, geralmente, o tema da descrição por uma forma nominal); (ii) aspectualização (atribuem-se propriedades ao tema, então decomposto em partes); (iii) relacionamento (elementos descritos são relacionados comparativa ou metaforicamente a outros). O grau zero da descrição também pode acontecer, quando, após a fase I, simplesmente se enumeram suas partes.

O caráter dialógico da sequência descritiva está na decisão do agente-produtor, de acordo com seu objetivo e sua representação do destinatário, de produzir o efeito do “fazer ver em detalhe os elementos do objeto do discurso” (BRONCKART, 2016, p.235) e de conduzir o olhar do destinatário.

c) Sequência dialogal

As sequências dialogais aparecem exclusivamente nos discursos interativos dialogados. (cf. Bronckart, 2016), estruturando-se em turnos de fala. Estruturam-se, prototipicamente, em três fases, quais sejam: (i) abertura (caráter fático, interactantes entram em contato); (ii) transacional (agentes-produtores co-constroem o conteúdo temático) e (iii) encerramento (caráter fático; interactantes finalizam a interação).

d) Sequência explicativa

Para dar suporte à teorização da sequência explicativa, Bronckart (2012) recorre à escola de Grize (bem como ao teorizar sobre a sequência argumentativa).

As sequências explicativas aparecem nos discursos teóricos e nos discursos interativos monologados. (cf. Bronckart, 2016, p. 252). Originam-se a partir de algo que parece não ser questionável (fenômeno incontestável), mas que se aparenta inicialmente como ou incompleto ou reclamando maiores explicações relativas a alguma contradição, ainda que aparente, que possa vir a se apresentar em torno dele. Após esse período de desenvolvimento, a constatação inicial é apresentada de forma “geralmente enriquecida” (BRONCKART, 2016, p. 229).

Prototipicamente, compõe-se de quatro fases, quais sejam: (i) constatação inicial (introdução do fenômeno); (ii) problematização (no que ele aparenta questionável); (iii) resolução (traz informações suplementares que respondem às questões postas); (iv) conclusão-avaliação (reformula, completa, amplia o que se constatou inicialmente).

Seu caráter dialógico está em apresentar o tema que está sendo tratado de forma adaptada às características – “conhecimentos, atitudes, sentimentos, etc.” (BRONCKART, 2016, p. 234) – que o remetente imagina serem do destinatário. Nesse caso, explica-se por imaginar que o que está sendo tratado é difícil de ser compreendido pelo destinatário.

e) Sequência argumentativa

As sequências argumentativas, assim como as explicativas, aparecem nos discursos teóricos e nos discursos interativos monologados. (cf. Bronckart, 2012, p. 252).

Bronckart (2012) filia-se à escola de Grize ao teorizar sobre os processos de raciocínio argumentativos (e também os explicativos) em relação ao modo como se desenvolvem nos textos. Baseando-se nessa abordagem, sustenta que o raciocínio argumentativo parte da implicação de uma tese a respeito de um tema. A partir dessa tese, propõe-se novos dados, os quais passam por uma inferência orientando para uma conclusão ou nova tese. É assim que, prototipicamente, essa sequência apresenta quatro sucessivas fases: (i) de premissas (de onde se parte); (ii) de apresentação de argumentos (direcionam para uma provável conclusão); (iii) de apresentação de contra-argumentos (restringe-se a orientação argumentativa) e (iv) de conclusão ou nova tese (reúne efeitos de II e III).

Seu caráter dialógico explica-se pelo fato de o agente-produtor imaginar que o que está sendo tratado é contestável (a seu próprio ver ou ao do destinatário).