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O pioneirismo na educação de Diadema: a criação do Seja/EJA I no contexto local

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CAPITULO 1: A ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL

1.4 O pioneirismo na educação de Diadema: a criação do Seja/EJA I no contexto local

Relevante destacar que, entre 1983 e 1986, foi realizada em Diadema importante ação para alfabetização de jovens e adultos, Coordenada pela equipe da Fundação Wilson Pinheiro, ligada à Direção Nacional do Partido dos Trabalhadores, contou na época com a

assessoria do professor Moacir Gadotti e da professora Vera Barreto, os dois membros do que viria a ser o Instituto Paulo Freire, criado em 1991. As turmas foram instaladas em antigas favelas pela cidade, nas quais, concomitantemente, se promovia sua urbanização, para tornarem-se núcleos habitacionais. Anos depois, essa ação foi registrada em publicação da Ação Educativa, com assessoria, pesquisa e informação coordenada por Sergio Haddad.13

No governo municipal de Diadema, eleito em 1982 pelo Partido dos Trabalhadores (PT), inaugura-se em 1987 a materialização da ideia do direito à escolarização de jovens e adultos que não tiveram acesso ao sistema escolar ou que deste tenham sido excluídos. Com esta ação, antecipa-se o que seria aprovado em 1988 pelo artigo 208 da Constituição Federal, em que se vê inscrito o dever do Estado para com a educação: “ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiverem acesso na idade própria”.

Na trilha de Diadema, ainda na mesma década, Santo André e São Bernardo do Campo, respectivamente em 1989 e 1991, também instituíram serviços voltados exclusivamente para jovens e adultos.

Estas iniciativas devem ser analisadas num momento histórico expressivo das lutas pela democratização que se propagaram pelo País, ao longo da década de 1980, que tiveram ressonância na atuação de alguns sindicatos e do PT, considerados importantes atores sociais centrais e com fortes laços entre si baseados em suas concepções políticas.

Um dos fatos importantes e altamente expressivos são as manifestações por eleições diretas no Brasil, o movimento Diretas Já! toma as principais praças dos maiores estados do país. Na educação é recorrente frisar que não é a toa que os analfabetos voltam a

13Atualmente, Haddad é assessor da ONG Ação Educativa, diretor presidente da Fundação Fundo Brasil de Direitos Humanos, membro do Conselho Internacional de Educação de Adultos e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES). Tem experiência na área de educação, com ênfase em Tópicos Específicos de Educação, atuando principalmente nos seguintes temas: educação, educação de jovens e adultos, educação de adultos, educação popular e terceiro setor.

ter direito ao voto14, afinal representavam um alto contingente de votantes; mais importante que isso é o fato de que essas pessoas, cidadãos e cidadãs participam ativamente da vida brasileira, com sua força de trabalho, suas habilidades, com suas percepções e sensibilidades para a construção da realidade brasileira, isto é inegável.

Em Diadema, para atender à demanda por educação em diferentes faixas etárias e às diferentes necessidades daí decorrentes, foram criados, em 1987, no Departamento de Educação, Cultura e Esportes, na Divisão de Educação Especial, dois serviços: o Serviço de Educação de Jovens e Adultos (Seja), para atender a população não alfabetizada ou com baixa escolaridade; e a Escola Olga Benário Prestes, para atender crianças e jovens portadores de deficiência auditiva.

A Prefeitura de Diadema passava, assim, a assumir a educação de jovens e adultos analfabetos. Na verdade, isso já acontecia no município desde os anos 1970, através do antigo Mobral e da Fundação Educar, na década de 1980.15 Mas só em 1986 se começa a dar importância à educação municipal, com a ampliação dos serviços existentes, fazendo-se um diagnóstico do município, quando dados do IBGE projetavam, para 1987, uma população analfabeta em torno de 15% do total da população.

O Seja anunciava em seu documento inaugural, como um dos seus princípios: “[...] formar o professor crítico, participativo e mediador para que, numa relação dialética, este possa formar o aluno – cidadão, sujeito de sua própria história [...]” (DIADEMA, 1986).

A inovação do Seja, inaugurado no início de 1987, instituiu-se com a elaboração de currículos especiais para alfabetização de jovens e adultos. À época, estava em pauta a teoria sócio construtivista, que começou a ser divulgada no Brasil nos anos 1980, trazendo

1414http://www.tse.jus.br/noticias-tse/2013.

15 Vale lembrar que, neste mesmo período, iniciativas para alfabetização de jovens e adultos desenvolvem-se em diferentes estados, nos quais prefeituras com orientação democrática e popular instituem serviços para isso. Pode-se citar Porto Alegre/RGS, Campinas/SP, Santo André/SP, Santos e São Bernardo do Campo também em São Paulo, entre outras.

pesquisas realizadas por Emilia Ferreiro. As obras desta autora — assim como as de Luria, Leontiev e Vygotsky — subsidiavam discussões e práticas pedagógicas. Em especial, estudavam-se também conceitos como a zona de desenvolvimento proximal, apresentado na obra A formação social da mente (VYGOTSKY, 1989).

[...] Conclui que os processos de construtividade presentes nas situações de produção do conhecimento e de realização do ensino/aprendizagem só se legitimam como mediadores da educação quando marcados também pela historicidade típica da prática real que constitui a substância do próprio existir concreto dos homens (VYGOTSKY, 1989, p. 101).

Ao assumir estas perspectivas, o pensamento de Vygotsky traz maiores contribuições ao esclarecimento do sentido da educação em seu vínculo aos processos socioculturais envolventes. E, enfatizando o papel que a cultura em geral e a linguagem, em particular, desempenham no processo de construção da subjetividade, graças à internalização, Vygotsky articula mais significativamente as dimensões psíquicas e epistêmicas com as dimensões pedagógicas e culturais.

De modo substancial, e não menos importante, toda a teoria de Paulo Freire que tratava especialmente do método para alfabetização de jovens e adultos, também fundamentava, o tempo todo, o exercício pedagógico. Juntamente a estes teóricos, colocava-se em discussão a interdisciplinaridade na educação, fundamentando, assim, a política de formação de professores de jovens e adultos na cidade.

Em Diadema, de 1987 até 2007, existiu uma política de formação permanente para professores em serviço.

Para isso, no que diz respeito à formação do professor-alfabetizador de adultos, foi reservada uma carga horária de nove horas semanais destinadas a sua formação político- pedagógica, pois não se exigia como requisito a habilitação em magistério para compor o corpo docente, apenas o ensino médio completo, em qualquer outra modalidade

profissionalizante. Essa não exigência perdurou por pouco tempo, já que havia uma discussão ampla em nível nacional para a elaboração de nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) que passaria a exigir, para todos os professores, formação regular e universitária.

Diadema investiu durante as três últimas décadas em políticas sociais, aplicando investimentos com viés claramente inclusivo. No âmbito educacional, tem constituído ativamente um processo para rever currículos e a estrutura da educação básica na rede municipal de educação.

Em 1997, com a Lei Complementar nº 71, instituiu-se o Estatuto do Magistério Municipal, que regulamentou a organização do professorado atuante na rede educacional municipal. Uma inovação prevista no Estatuto foi a eleição para diretores (as) e vice- diretor(as) das escolas — prática, aliás, que se mantém até hoje.

Importante dizer que esse Estatuto foi elaborado por meio de discussões coletivas com os gestores da Secretaria de Educação e os professores de todos os segmentos educacionais. Entre acordos, negociações, conflitos e interesses comuns, o texto foi enviado para apreciação e votação dos vereadores na Câmara Municipal, ao final da gestão de José de Fillipi Junior, terceiro prefeito eleito sequencialmente pelo PT, que seria reconduzido ao cargo em 2001, ainda pelo mesmo partido.

Dando continuidade às ações na área educacional, também foram implantadas ações do governo federal, que visam aprimorar o ensino em todos os níveis. Uma dessas ações é a implantação da Universidade Federal instalada na cidade, em 2001.

Tendo em vista todos esses programas, propostas e projetos, é imprescindível realizar um estudo com abordagem qualitativa, considerando a dinâmica social e a diversidade cultural, dentro das relações humanas, nesta cidade.

Para pesquisadores, professores e técnicos que se propõem a decodificar e trabalhar os sentidos da educação, para aqueles que rejeitam os estigmas que desqualificam

esses milhares de cidadãos e cidadãs (GOFFMAN, 1988, p. 146-147), é necessário um trabalhoso exame das realidades dos alunos e das alunas, para então instituir premissas e critérios capazes de redefinir a qualidade de ensino, alargar as proposituras de políticas públicas para alfabetização de jovens e adultos, dando-lhes a possibilidade de acesso à certificação no percurso desses estudantes, compondo políticas para elevação de escolaridade em diferentes níveis.

Esta pesquisa foca principalmente a identidade da rede escolar da Eja municipal, dos professores, dos alunos, enfim, dos atores sociais que a construíram, bem como suas relações com o que é considerado extraescolar e o que é intraescolar, certamente perpassada pela dinâmica social e pela diversidade cultural. Numa analise comparativa diacrônica, capturar e analisar essa identidade e as muitas percepções e vivências construídas ao longo de 27 anos não só reconstitui a história, mas ao mesmo tempo pode contribuir para ações no futuro.

CAPÍTULO 2: A PESQUISA DA POLÍTICA PÚBLICA MUNICIPAL DA EJA I EM

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