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Relato e exposição de dados coletados na pesquisa Relatório final da pesquisa

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CAPÍTULO 2: A PESQUISA DA POLÍTICA PÚBLICA MUNICIPAL DA EJA I EM

2.1 Relato e exposição de dados coletados na pesquisa Relatório final da pesquisa

A pesquisa intitulada Relatório final da pesquisa etnográfica: “Perfil do aluno do

Seja — Perfil do Seja” revelou observações, avaliações e análises sobre o processo educativo

realizado em Diadema pelo Serviço de Educação dos Jovens e Adultos, atualmente denominada Eja I, de acordo com os conteúdos dos discursos, colhidos em entrevistas e categorizados pela equipe de pesquisadores.

Durante todo o tempo de funcionamento dos cursos da Eja, os índices de retenção e evasão dos alunos de alfabetização e pós-alfabetização variaram de 30% a 48% em alfabetização inicial e de 35% a 25% nos cursos de pós-alfabetização,17 o que demonstra um rendimento baixíssimo. Em decorrência disso, em meados de 1993, a chefia do Seja, exercida pela professora Silvia Telles, juntamente com alguns professores do próprio Serviço, propôs-

16 Para que o leitor que não tenha nenhuma familiaridade com esses conceitos possa se localizar, vale a pena especificar bem o significado dessas palavras. Estabeleçamos, como Levi-Strauss, que a etnografia, a etnologia e a antropologia constituem os três momentos de uma mesma abordagem. A etnografia è a coleta direta e o mais minuciosa possível dos fenômenos que observamos, por uma impregnação duradoura e continua e um processo que se realiza por aproximações sucessivas. Esses fenômenos podem ser recolhidos por meio de notas, mas também por gravação sonora, fotográfica ou cinematográfica. A etnologia consiste em um primeiro nível de abstração: analisar os materiais colhidos e fazer aparecer a lógica especifica da sociedade que se estuda. A antropologia, finalmente, consiste em um segundo nível de inteligibilidade: construir modelos que permitam comparar as sociedades entre si. Como escreve Levi-Strauss, “seu objetivo é alcançar, além da imagem consciente e sempre diferente que os homens formam de seu devir, um inventário das possibilidades inconscientes, que não existem em número ilimitado” (LAPLANTINE, 1994, p. 25).

17 Dados fornecidos pela secretaria administrativa da EJA. Secretaria de Educação Municipal de Diadema, 2009/2010.

se a delinear um trabalho de pesquisa qualitativa e etnográfica que permitisse elucidar as causas da evasão escolar e o baixo aproveitamento dos alunos atendidos.

Assim, formou-se uma equipe de pesquisadores, composta por quatro professores interessados na questão — José Geraldo Moreira, Sebastião de Oliveira Coelho, Reginaldo Mendes Paixão e eu, Verônica Maria dos Santos —, os quais foram selecionados com apresentação de projeto para pesquisa, comprometendo-se a dedicar, semanalmente, 24 horas ao trabalho docente em sala de aula e 16 horas, a princípio, ao trabalho de campo e à formação em pesquisa qualitativa.

Para assessorar e coordenar o trabalho, foi convidada a professora Maria Nilde Mascellani18, docente da Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, com larga experiência na área educacional e de pesquisa qualitativa em educação.

Os resultados da pesquisa, formalizada em dezembro de 1994, foram entregues em janeiro de 1995 à então secretária de Educação do município de Diadema, a professora Lisete Arelaro. Os dados foram socializados, com a nossa coordenação, entre os professores do Seja. O objetivo era promover uma socialização e um estudo do material recolhido advindo

18 Maria Nilde Mascelani foi uma das principais educadoras do Brasil e teve uma visão bastante libertária de educação. Ligada à ala progressista da Igreja Católica.

A partir de 1962, Maria Nilde foi mentora da proposta dos ginásios vocacionais, implantada em seis unidades da rede pública paulista. Seu objetivo era propiciar uma formação que contemplasse aspectos variados do conhecimento, com vistas a tornar o educando sujeito de sua história, em consonância com o personalismo do filósofo francês Emmanuel Mounier (1905-1950). Numa época de grande experimentação, os vocacionais introduziram novidades hoje comuns, como o estudo do meio e a pedagogia de projetos, além de disciplinas complementares voltadas ao mundo do trabalho (artes industriais, economia doméstica etc.). Havia ainda educação física e disciplinas extracurriculares, como teatro, cinema, música, artes plásticas, dentre outras. O aluno participava ativamente de sua avaliação, tornando-o um ser integrado com sua escola, com os outros alunos, professores e funcionários. Como resultado, o aluno aprendia a ser um sujeito de sua história, com uma atitude crítica perante o mundo. A educadora permaneceu na coordenação do Serviço de Ensino Vocacional, onde sofreu inúmeras pressões, até ser presa pela ditadura. Depois de liberta, Maria Nilde criou um centro educacional na Faculdade de Psicologia da PUC-SP, onde foi professora, a partir de 1970. Sua obra baseou-se em duas crenças: a educação precisa partir de necessidades sentidas e vividas pelo educando no contexto social onde está inserido; e é somente no esforço de realizar algo concreto que a pessoa pode abrir-se para perceber com mais clareza os ambientes físicos e sociais que a circundam, para assim encontrar sua maneira apropriada de atuar. Com essas convicções empenhou-se sempre em ampliar a formação de professores e outros profissionais da educação, não só nos ginásios vocacionais como nas suas diversas atividades educacionais em São Paulo e em outros Estados. Disponível no site www.http://ead.stj.jus.br/. Acesso em dezembro de 2014.

dos discursos dos alunos, de acordo com a metodologia da pesquisa, principalmente das entrevistas com os alunos evadidos, para propor alternativas que solucionassem os altos índices de evasão. Além disso, a formação em serviço dos próprios professores pesquisadores, mais próximos do cotidiano escolar, contribuiu para a análise mais acurada dos relatos dos alunos, subsidiando uma reflexão mais abrangente e ao mesmo tempo pontual sobre as práticas em sala de aula, como sugerem André e Lüdke (1986, p. 49): “[...] ultrapassando os dados, tentando estabelecer conexões e relações que possibilitem a proposição de novas explicações e interpretações” — conjugando, assim, ação e reflexão.

Diante da atual conjuntura político-econômico-cultural, ainda é grave constatar que o contingente de analfabetos em nosso País é muito alto. Há anos, os programas governamentais sucedem-se sem que o cerne do problema seja tocado. Trata-se, com efeito, de um dos maiores problemas da educação19, não só porque envolve milhões de brasileiros.

Contudo, não se pode pensar a educação isolada da cultura, no caso da educação de adultos mais do que em outros níveis. Daí a importância de analisar a questão dentro do contexto político-econômico-cultural.

O problema ainda se coloca concretamente, em Diadema, município onde moro e trabalho.

De acordo com a orientação do Departamento de Educação, Cultura e Esporte (Dece),20 o Seja (atual Eja) empenhava-se em cumprir na sua ação educativa as seguintes diretrizes político-pedagógicas: democratização da escola pública; garantia de acesso e

19 Textos consultados: O estado da arte da pesquisa sobre o fracasso escolar (1991-2002): um estudo

introdutório. Educação e Pesquisa. Coordenado pela Profª Maria Helena Souza. Patto do Instituto de Psicologia

da Universidade de São Paulo; o outro texto consultado foi ELABORAÇÃO DE POLÍTICAS E ESTRATÉGIAS PARA A PREVENÇÃO DO FRACASSO ESCOLAR – Documento Regional. BRASIL: Fracasso escolar no Brasil: Políticas, programas e estratégias de prevenção ao fracasso escolar. Secretaria de Educação Infantil e Fundamental. MEC. Luiz Fernandes Dourado Brasília, maio 2005.

20 Em 1994, o governo municipal instituiu a Secretaria de Educação, Cultura, Esporte e Lazer (Secel), incluindo o lazer como política a ser desenvolvida na cidade. Dessa secretaria, a partir de 2004, consolidou-se a Secretaria de Educação, a Secel foi desmembrada em duas outras, a de Cultura e de Esporte, que engloba as políticas para o lazer.

permanência; ensino com qualidade. Atualmente essas diretrizes continuam norteando todas as ações da Secretaria de Educação do município.

Para consolidar uma escola pública de qualidade, é preciso uma visão do todo do processo educacional.

Neste sentido, esta pesquisa vem contribuir com o conhecimento e reconhecimento da realidade, em inúmeros aspectos, para que se possa interferir nesta realidade com o intuito de transformá-la. Além disso, naquela ocasião aquela pesquisa foi proposta para buscar prováveis causas da evasão escolar no Seja e avaliá-las o quanto possível, com vistas a reformulações sugeridas pelos resultados.

O estudo do problema da evasão, pela sua seriedade, deveria desencadear providências pedagógicas e administrativas.

É evidente que uma avaliação profunda deveria ser feita para explicar esse fenômeno, pois esta situação causava e ainda causa grande preocupação na equipe de coordenação e na de professores. Isso fazia com que estes até utilizassem alguns mecanismos para minimizar o problema, com a manipulação de dados, entre outros. A partir de uma compreensão deste fenômeno, através de uma investigação minuciosa, criteriosa e científica, pode-se desencadear um processo de construção da qualidade de ensino, superando os altos níveis de evasão e garantindo efetivamente a permanência dos nossos alunos nos cursos da Eja.

Através de análises macro estruturais e micro estruturais, compreende-se que as razões que impelem nossos alunos a se evadir, por um lado, são de cunho social, econômico, político e cultural. Por outro, da qualidade pedagógica e didática dos cursos e das metodologias utilizadas, esta é uma das conclusões mais contundentes que o exame dos discursos desses alunos evadidos e frequentes nos revelou de modo muito significativo.

Quanto às razões macro estruturais, sabe-se que a possibilidade de nestas interferir esta no âmbito da sociedade civil, ao lado de igrejas, partidos políticos e organizações populares em geral, ou seja, no desempenho cotidiano de nossa cidadania. Não menos importante exigir do Estado que cumpra seu papel para a garantia dos direitos de todos os cidadãos e cidadãs.

As outras razões, porém, são de responsabilidade dos profissionais que instalam o processo educativo nos cursos de alfabetização — o objeto de nossa reflexão —, visando a interferências otimizadoras no que se refere à proposta educacional oferecida aos nossos alunos.

Para tanto, é necessário detectar dados de natureza qualitativa para compreensão dessa problemática, isto é, ir além das aparências, assumindo essas tarefas com a desejável competência profissional.

Entrevistamos e observamos alunos(as) evadidos(as) e frequentes, no seu meio de convivência, registrando seus anseios, suas duvidas e expectativas em relação a si mesmos(as), à escola e ao mundo, o que amplia em muito nossa visão de educação.

Que se tenha notícia, foi a primeira vez que em Diadema se fez um trabalho de pesquisa dessa natureza e envergadura na área da educação de adultos, exclusivamente sobre um serviço. Sabíamos que era uma atitude ousada por parte da direção da Secretaria de Educação e que, no âmbito de uma instituição pública, enfrentaria problemas, como preconceitos, resistências e, particularmente, aqueles gerados pela burocracia, identificados com frequência quando utilizados procedimentos científicos voltados para a prática da educação e da administração.

Encarar esse desafio pressupôs uma práxis, ou seja, quebrar o antagonismo, até então preconceituoso entre academia e o serviço público, pois se supunha que havia uma distância hierárquica entre a teoria elaborada dentro da academia e a prática promovida pelo

serviço público. Nesta direção a coordenação da Secretaria de Educação demonstrou este compromisso de modo sóbrio e corajoso para superar essa situação.

Cabe-nos ressaltar que adultos analfabetos expressam uma cultura que temos a tarefa de captar com vistas a uma prática pedagógica e para tanto, são necessárias criatividade e coragem político-administrativa.

Assim, a opção metodológica foi cuidadosamente escolhida para contemplar da maneira mais completa possível essa intenção de captar esse universo cultural, por isso é qualitativa-etnográfica.

Na realização desta pesquisa, o objetivo principal foi, em primeiro lugar, detectar as causas que levam jovens e adultos(as) trabalhadores(as), aluno(a) da Eja I, a abandonar o estudo e, secundariamente, permitir o estabelecimento do perfil do Seja como instituição. Tais objetivos introduzem a seguinte questão: qual a metodologia de pesquisa mais adequada para a captação da realidade sociocultural de um universo de pessoas jovens e adultas analfabetas?

Algumas situações nos levaram a refletir sobre a metodologia de pesquisa mais indicada.

Uma foi a real dificuldade de responder questionários escritos e de responder oralmente às perguntas contidas em formulários com perguntas fechadas. A partir desta realidade, optou-se por uma metodologia que possibilitasse respostas abertas dos entrevistados, evitando-lhes situações constrangedoras. Nesta perspectiva, procurou-se garantir a apreensão do universo cultural dos informantes, além de levantar dados quantitativos referentes a alunos e professores da Eja.

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