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2 REVISÃO DE LITERATURA

2.2 PLANEJAMENTO

2.2.1 Tipos de planejamento

2.2.1.2 Planejamento Estratégico

2.2.1.2.3 Planejamento Estratégico Participativo

Na linha de pensamento de Misoczky e Guedes (2012), o Planejamento Estratégico Participativo (PEP) baseia-se na participação democrática, na autonomia do indivíduo, na democratização do conhecimento e na práxis técnico-política, e busca começar um processo de inversão do padrão histórico da capacitação dos servidores e agentes políticos, transformando-os solidariamente em partícipes da discussão dos temas da gestão pública, num cenário de democratização das relações sociais e de poder.

Nesta mesma linha de pensamento, Araújo Filho (2002) afirma que o Planejamento Estratégico Participativo é um instrumento, uma ferramenta de elaboração coletiva de identidades democráticas no setor público. Representa uma tentativa, fundamentada e legitimada num projeto de governo democrático-participativo e quiçá deva ser o núcleo inicial de uma Escola de Governo que transforme, consideravelmente, o olhar do gestor público referente ao seu papel e seu compromisso social. Permite capacitar quadros técnico-políticos para desempenhar as atividades de elaboração, gestão e monitoramento de programas de complexa governabilidade.

Para esta corrente de pensamento, o PEP foi desenvolvido sobre as bases teóricas de Carlos Matus, Ministro do planejamento do Governo Allende, no Chile, período no qual desenvolveu os fundamentos teóricos do Planejamento Estratégico Situacional (ARAÚJO FILHO, 2002).

No entendimento de Araújo Filho (2002), a participação não é somente desejada por proporcionar a integração e harmonia na organização, mas, porque oportuniza apreender a realidade situacional com muito maior capacidade e bom senso, assegurando a realização desejável aos projetos planejados.

Souto-Maior desenvolveu uma metodologia que possui elementos do planejamento estratégico e do planejamento participativo a qual, primeiramente, denominou de Planeação Estratégica Participativa, também conhecida por PEP, a qual é uma abordagem metodológica de planejamento organizacional. Sendo que, mais tarde a nomeou de PEC (Planeação Estratégica e Comunicativa), cuja proposição central é a obrigatoriedade de se construir estratégias por meio de diálogo intersubjetivo, busca contribuir para a efetividade e proporcionar às sustentabilidades organizacionais e regionais (SOUTO-MAIOR, 2013).

Seu propósito ao utilizar essa nova nomenclatura (planeação) para a metodologia PEP, é destacar que se refere a uma abordagem de planejamento e gestão orientada para a capacitação, formação, participação, reconstrução e ação. Outro fator fundamental é que esta metodologia é um processo que possibilita a interação comunicativa, e não guiar de modo sistemático pessoas em direção a objetivos predeterminados (SOUTO-MAIOR; ALTERESCU, 2004). A PEP, metodologia criada pelo pesquisador Souto-Maior Filho vem sendo implantada especialmente em organizações de natureza pública (FERNANDES; SAMPAIO, 2006).

A PEC é um grupo de atividades e processos cognitivos, comunicativos, interativos e iterativos que buscam a elaboração das estratégias, a gestão da implementação das estratégias, a avaliação dos processos e resultados. Com o auxílio da PEC busca-se desenvolver tanto estratégias comunicativas, embora haja a possibilidade também de criar estratégias competitivas, quando suas premissas são relaxadas (SOUTO-MAIOR, 2013).

A metodologia PEC foi criada, inicialmente, como uma tentativa de unir a Administração Estratégica do setor privado empresarial ao Planejamento Participativo do setor público, sem uma intenção inicial em relacioná-la com a Teoria do Agir Comunicativo, de Jürgen Habermas. No entanto, quando Souto-Maior se aprofundou nesta teoria, constatou que ela poderia reforçar sua base epistemológica e axiológica e, em consequência, aperfeiçoar a mesma (SOUTO-MAIOR, 2013).

A abordagem da Planeação Estratégica e Comunicativa possui etapas, as quais podem ser visualizadas na figura 2 a seguir:

Figura 2 - Etapas da Planeação Estratégica e Comunicativa

Fonte: SOUTO-MAIOR, 2013, p. 152.

A etapa 1 - são as preparações, que consiste em sensibilizar e desenvolver comprometimento dos dirigentes; compor o processo a ser desenvolvido; capacitar participantes; realizar acordos sobre a abrangência e horizontes do plano; estabelecer apoio financeiro e logístico; e determinar a coleta de dados e outras informações para suprir o processo (SOUTO-MAIOR, 2012).

A etapa 2 - história, mandato e perfil. É aprender a história da organização, o corpus jurídico e as obrigações que traduzem seus mandatos. A etapa 3 - é a análise dos exigentes (stakeholders). Consiste em detectar os principais exigentes da organização, suas expectativas e reinvindicações, objetivando respondê-los com as ações a serem elaboradas no planejamento, viabilizando efetividade (SOUTO-MAIOR, 2012).

Já a etapa 4 - é elaborar as redações das declarações da Missão, Visão e Valores da organização. E a etapa 5 - é a análise do ambiente externo. Compreende a análise do ambiente externo, identificando oportunidades e ameaças à organização. A etapa 6 - é a análise do ambiente interno e consiste em fazer uma análise interna da organização, identificando recursos, estratégias atuais e desempenho da organização (SOUTO-MAIOR, 2012).

E a etapa 7 - é a matriz e questões estratégicas, quando a partir da Matriz SWOT5 são elaboradas e escolhido um número adequado de questões estratégicas. A etapa 8 - é estabelecer as estratégias organizacionais e elaborar a redação do Plano de Ação. E a última, a 9 - é a gestão, coordenação e avaliação; quando é feito o acompanhamento da realização das ações planejadas; monitorado e retificado atrasos e adiantamentos na realização; averiguado e dado solução às dificuldades na execução de tarefas; dificuldades com recursos, com pessoal e questões relacionadas ao contexto (SOUTO-MAIOR, 2012).

Na PEC, trabalhar com os stakeholders da organização é primordial, pois é esse fator que proporcionará a efetividade pretendida. Para isso é preciso identificar quem são, buscando constatar suas expectativas, reinvindicações, influências, possibilidades de auxiliar a organização. Com base nestes dados, as estratégias a serem elaboradas poderão contemplá- los. No momento que a organização consiga satisfazer seus stakeholders, ela estará estimulando sua efetividade, porque atingirá resultados no meio social de sua atuação. No entanto, é complexo trabalhar com stakeholders, os quais podem ser muitos e com múltiplas expectativas (MAGALHÃES, 2016).

Nas organizações não mercantis as estratégias nem sempre podem ser naturalmente rotuladas, apesar de alguns temas aparecerem com frequência, como: estabilidade financeira, contenção de custos, obtenção de apoio político/financeiro, sensibilização do público-alvo, cooperação e coordenação do arranjo institucional (SOUTO-MAIOR, 2013).

A abordagem PEC permite que as estratégias possam ser consequência de um processo majoritariamente deliberado e sistemático, bem como surgirem de um processo interativo brevemente estruturado, contudo, de acordo com as premissas do agir comunicativo (SOUTO- MAIOR, 2013).

A teoria criada por Habermas é chamada Teoria do Agir Comunicativo (TAC), e baseia-se no conceito de ação e na interação que os sujeitos constituem intra e entre grupos e prioriza as ações de natureza comunicativa, as quais se referem à intervenção proveniente do diálogo entre vários sujeitos (MEIRELES et al., 2017).

A ação comunicativa é resultado da interação que ocorre entre sujeitos que se abrem ao uso da linguagem e ação, possibilitando o surgimento de novos entendimentos e conhecimentos, contestando a perspectiva de uma comunicação unilateral, na qual predomine

5 Matriz SWOT é o acrônimo em inglês de Strengths, Weaknesses, Opportunities e Threats, também denominada

Matriz FOFA, acrônimo de Forças, Fraquezas, Oportunidades e Ameaças. Constiui-se em uma maneira de cruzamento de informações do ambiente que permitem análises interna e externa da organização. Forças e fraquezas estão ligadas aos fatores internos ou organizacionais, próprios da organização; oportunidades e ameaças relacionam-se aos fatores externos ou ambientais (PEREIRA, 2011).

o poder de um sobre o outro (HABERMAS, 2012).

No Planejamento Estratégico Participativo ou agora denominado PEC é dado ênfase à participação. A própria estratégia é instituída como uma ação comunicativa, no entanto, apenas quando for resultado de uma interação argumentativa entre interlocutores com as seguintes características: a) as regras da interação surgiram do próprio processo interativo e cada um as aceita, não porque acredita que sejam vantajosas para si, ou mesmo para os outros, mas, porque acredita que a regra ou norma é a correta; b) os participantes conseguiram expor suas ideias e intenções livremente, pois não foi assentida a coerção; c) as posições dos participantes foram suscetíveis de contestação, por meio de argumentos (SOUTO-MAIOR, 2013).

Além disso, é preciso ainda as características: d) a interação foi impreterivelmente focada para o entendimento sobre meios e fins; e) as ações comunicativas foram coordenadas, por meio da linguagem, que apresentou expectativas mútuas de comportamento e foram validadas e legitimadas, mediante acordo, o qual teve que ser fundado; ele foi tido como fundado, porque a interação argumentativa foi orientada conforme alguns pressupostos pragmáticos (derivados das características da interação comunicativa) (SOUTO-MAIOR, 2013).

Esses pressupostos são: todos os interessados tiveram direito de participar; tiveram oportunidades iguais de mostrar e de contestar argumentos; os argumentos foram submetidos a livre análise de todos e nenhum dos participantes experimentou qualquer coação. Assim, sob essa nova visão, ter competência comunicativa é conseguir habilidades cognitivas, linguísticas e interativas, objetivando entendimento relativo a determinado objetivo ou ação (SOUTO- MAIOR, 2013).

Em situações propícias de diálogo, como aquelas construídas pelo uso da própria abordagem PEC é, normalmente, viável ultrapassar as particularidades de pontos de vista individuais e passar para o entendimento intersubjetivo, isto é, de compreensão da perspectiva dos outros e da aceitação do acordo como o caminho mais racional e moral (SOUTO- MAIOR, 2013).

Enfim, quanto mais participativo e comunicativo for o método de elaboração, implementação e avaliação de estratégias, usando uma metodologia como a PEC, mais altos serão: o grau de harmonia entre os objetivos, normas e valores das organizações e aqueles dos seus stakeholders e da região como um todo; o nível de coerência entre os bens e os serviços gerados pelas organizações e aqueles necessitados e desejados pelos seus stakeholders; o grau de satisfação dos seus stakeholders internos e externos; o nível de confiança, reconhecimento,

credibilidade e legitimidade conferidos pelos stakeholders; o grau de apoio político- institucional e financeiro por parte dos stakeholders externos, em especial, das agências governamentais (Estado) e das empresas privadas (Mercado) (SOUTO-MAIOR, 2013).

Para Souto-Maior e Alterescu (2004) nesta abordagem os participantes se habilitam como sujeitos por meio de um processo pedagógico, transformando-se em conhecedores de sua própria realidade e interessados no seu presente e futuro. Com isso, a PEP transforma-se em um exercício orientado para a cidadania.