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CAPÍTULO 1 – POLÍTICAS PÚBLICAS DE DESENVOLVIMENTO RURAL E

1.6 Políticas públicas de desenvolvimento territorial rural no Brasil: o programa

Buscando aperfeiçoar as políticas públicas de desenvolvimento territorial rural, o governo federal constituiu, a partir dos TRs, os Territórios da Cidadania (TCs), instituídos em 25 de fevereiro de 200815, na segunda gestão do presidente Lula. O PPA 2008-2011 apresentou como proposta o crescimento econômico, a inclusão social e a redução das desigualdades regionais. Para tanto, indicou com destaque obras e ações de infraestrutura econômica e social, para ampliar a potencialidades locais e superar os limites ao crescimento e desenvolvimento econômico. O referido plano foi construído com a participação da sociedade em conferências, fóruns e conselhos, além das fronteiras ministeriais e por meio de parcerias com o setor privado, governos estaduais e municipais (BRASIL, 2007).

Dessa forma, conforme Brasil (2007, p.13), o PPA 2008-2011 considera a dimensão territorial do planejamento com o objetivo de promover:

i) A superação das desigualdades sociais e regionais; ii) O fortalecimento da coesão social e unidade territorial;

iii) Os potenciais de desenvolvimento sustentável das diferentes regiões; iv) A valorização da inovação e da diversidade cultural e étnica da população; v) O uso sustentável dos recursos naturais;

vi) O apoio à inserção e integração competitiva autônoma no mundo globalizado.

Segundo Brasil (2007), a redução das desigualdades regionais a partir das potencialidades locais do território nacional faz parte do planejamento estratégico e busca do avanço das regiões menos desenvolvidas e menos dinâmicas do Brasil, por meio de políticas públicas integradas e ajustadas às realidades regionais e locais. A proposta é buscar eficiência, competitividade, equidade, sustentabilidade e coesão, através do aproveitamento e valorização dos diversos recursos dos territórios.

Em relação aos TRs, o PPA 2008-2011 propõe que as ações continuem implementadas pelo MDA, com o apoio dos atores e instituições locais articulados em torno da construção e gestão social dos PTDRS. A proposta é que a partir dos TRs fossem instituídos os TCs. A

15 Brasil. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Decreto de 25 de fevereiro de

estratégia utilizada é a inclusão produtiva, como resultado de ações governamentais coordenadas, da universalização dos programas de cidadania e da maior participação da sociedade civil (ORTEGA, 2013; SILVA, 2012; CORRÊA, 2010; ORTEGA, 2008, BRASIL, 2008, BRASIL, 2007).

De acordo com Brasil (2008), o programa TCs tornou-se mais restrito, como uma nova institucionalidade capaz de identificar e atuar, prioritariamente, a partir da sinergia existente em um grupo de municípios com maior nível de carências e grande concentração da pobreza rural, atendendo aos seguintes critérios:

 Estar incorporado ao programa TRs;  Menor IDH territorial;

 Maior concentração de beneficiários do programa Bolsa Família (BF);

 Maior concentração de agricultores familiares e assentados da reforma agrária;  Maior concentração de populações tradicionais, quilombolas e indígenas;

 Baixo dinamismo econômico, segundo a tipologia das desigualdades regionais, da Política Nacional de Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional;  Respeitar a convergência de programas de apoio ao desenvolvimento de distintos níveis

de governo;

 Maior organização social;

 Menor Índice de Desenvolvimento de Educação Básica (IDEB).

Os TCs são configurados por agrupamentos de municípios com densidade populacional média de 80 hab/km2 e população média municipal de, no máximo, 50 mil habitantes. Cada TC deve possuir identidade historicamente construída e identificada a partir de critérios sociais, culturais, geográficos e econômicos. Porém, segundo Brasil (2008), para que o programa TCs alcance seus objetivos e promova o desenvolvimento territorial rural torna-se necessário:

i) Integração de políticas públicas com base no planejamento territorial;

ii) Ampliação dos mecanismos de participação social na gestão das políticas públicas de interesse do desenvolvimento dos territórios;

iii) Ampliação da oferta dos programas básicos de cidadania;

iv) Inclusão e integração produtiva das populações pobres e dos segmentos sociais mais vulneráveis, tais como trabalhadores rurais, quilombolas, indígenas e etc.;

v) Valorização da diversidade social, cultural, econômica, política, institucional e ambiental das regiões e das populações.

Em 2008, o programa TCs mobilizou e articulou vários ministérios e órgãos do governo federal16. Em 2009 o funcionamento dos TCs e a institucionalidade do programa é formada pelo Comitê Gestor Nacional, Comitê de Articulação Estadual e Colegiados Territoriais (BRASIL, 2013d; ORTEGA, 2013; SILVA, 2012; CORRÊA, 2010; ORTEGA, 2008).

Em 2008, sessenta TRs foram convertidos em TCs, dos quais 41 (68,33%) foram classificados como territórios deprimidos, porque dezenove estavam presentes em regiões estagnadas e 22 em regiões de baixa renda. Em relação aos demais TCs, dezesseis estavam presentes em regiões dinâmicas e três em regiões de alta renda (ORTEGA, 2008). Nesse ano, sessenta TCs estavam presentes em 958 municípios brasileiros (17% do total), os quais receberam investimentos no montante de R$11,3 bilhões (CORRÊA, 2010).

Em 2009 foram instituídos mais 60 TCs, formando os atuais 120 TCs. São 33,27% (1.851) de municípios envolvidos, 46,19% da população rural, 46,79% dos agricultores familiares, 66,68% de famílias assentadas, 66,33% de quilombolas, 51,8% de áreas indígenas, 36,65% dos beneficiados do BF, 62,48% de municípios de baixa renda. Do mesmo modo, o percentual de municípios dinâmicos atendidos (62,18%) é maior do que o percentual de municípios estagnados (26,99%) (ORTEGA, 2013). Nesse ano, os TCs receberam investimentos no montante de R$23,5 bilhões (Brasil, 2013a; Corrêa, 2010). Contudo, mesmo reconhecendo os avanços das políticas públicas voltadas à redução da pobreza e desigualdade social no meio rural, Ortega (2013, p.137) afirma:

A pesar del relativo mejoramiento de la situación de pobreza rural en Brasil, todavia hay mucho que hacer, requiriendo políticas públicas conconocimiento más preciso de “quienes sonlos pobres del campo” para orientar mejor sus acciones. Enese sentido hay que reconocer que las políticas orientadas a lamejoría de las condiciones de vida de los hogares rurales no siempre están obteniendo los resultados esperados. Como consecuencia, las políticas dirigidas al combate contra la pobreza rural necesitan teneren cuenta las características específicas y las condiciones sociales y económicas que enfrentan las personas y lãs familias de este tipo de población. Nesse sentido, Corrêa (2010) questiona o fato dos TRs serem delimitados a partir das microrregiões geograficamente estabelecidas, que envolvem municípios de perfis diferentes, e não a partir do critério de semelhança quanto à situação de carência de municípios fisicamente próximos. Também questiona o fato de apenas 70% dos TCs serem classificados como

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i) Desenvolvimento Agrário/Incra; ii) Desenvolvimento Social; iii) Saúde; iv) Educação; v) Integração Nacional; vi) Trabalho e Emprego; vii) Meio Ambiente; viii) Cidades; xix) Minas e Energia; x) Secretaria de Políticas para as Mulheres; xi) Secretaria Promoção da Igualdade Racial; xii) Secretaria de Aquicultura e Pesca; xiii) Secretaria da Justiça/Funai; xiv) Agricultura, Pecuária e Abastecimento; xv) Cultura; xvi) Secretaria Geral; xvii) Planejamento; xviii) Secretaria de Relações Institucionais; xix) Casa Civil (ORTEGA, 2008).

territórios rurais deprimidos, quando o principal critério do programa é atender as regiões estagnadas.

De acordo com Corrêa (2010), na Região Nordeste foram instituídos 29 TCs, os quais envolveram 53,2% da população rural. Nessa região, quando se considera o Índice de Desenvolvimento Rural (IDR) e o IDH-M, há grande diversidade entre os TCs e dentro dos territórios há diferenças significativas entre os municípios. Ou seja, dentro de um mesmo TC existem municípios com valores muito superiores ou inferiores ao IDR e ao IDH-M do estado ou do próprio território. Ao comparar as condições dos municípios que fazem parte dos TCs com aqueles que não fazem parte, não houve diferença pelo IDR e pelo IDH-M. A pesquisadora também destaca que o programa TCs deixou de incluir muitos municípios economicamente deprimidos.

Destacando o caso do Estado da Bahia, apenas 40,8% da sua população rural participa do programa TCs, cerca de 4.297.902 pessoas. Esse estado apresenta IDR de 0,292, a segunda pior média; e registra IDH-M de 0,626. Na Bahia, os municípios que participam dos TCs apresentaram IDR de 0,278, e os que não fazem parte apresentaram IDR de 0,300, uma diferença pouco significativa. Assim, a partir dos resultados apresentados para a região Nordeste e especificamente para o Estado da Bahia, Corrêa (2010, p. 163) conclui:

[...] a grande diversidade [entre os territórios e entre os municípios de um mesmo território] é um fator que pode gerar problema na “concertação” que se irá efetuar no interior dos Conselhos Intermunicipais de Desenvolvimento e na definição das localidades que receberão recursos. Ainda que as propostas sejam efetuadas coletivamente, seu direcionamento será a espaços específicos, podendo beneficiar ou relegar determinados municípios. Diferenças muito expressivas podem gerar capacidades distintas de fazer valer os anseios de cada um dos participantes. Ademais, condições díspares podem gerar capacidades maiores ou menores de lidar com os recursos [...].

Portanto, diferente da política neoliberal, que apostava no desenvolvimento endógeno, constituído por meio de arranjos organizados pela capacidade da própria sociedade, a vantagem da política criada em prol do desenvolvimento territorial é mais ampla, tornando-se capaz de reduzir a pobreza e a desigualdade. De acordo como Ortega (2008, p. 168):

Em contraste com o ideário liberalizante, que vê, nas estratégias de desenvolvimento local, uma alternativa “autônoma” de desenvolvimento dos espaços locais, inclusive com a “liberação” dos Estados Nacionais de muitas das responsabilidades que lhes são atribuídas, a incorporação das estratégias de desenvolvimento territorial nas políticas públicas federais vem denotando um traço distintivo daquele ideário. A presença do Estado, não somente implementando um grande conjunto de políticas sociais, mas, ainda, investindo na infraestrutura básica, na capacitação dos atores sociais locais, na assistência técnica oficial, dentre outras ações, tem representado um avanço no resgate de uma parcela importante dos espaços rurais deprimidos brasileiros.

Considerando os dois mandatos do presidente FHC e do presidente Lula existem semelhanças e diferenças entre as políticas de desenvolvimento territorial adotadas. De forma semelhante, as políticas reconheceram a importância da organização social local (o empoderamento), promoveram a descentralização política administrativa e se submeteram ao ideário econômico ortodoxo de maior desobrigação do governo. Diferentemente de FHC, no governo Lula houve combinação de estratégias bottom-up e top-down; as políticas procuraram superar a dicotomia rural-urbana e tornaram-se intermunicipais (ORTEGA, 2008).

Com a instituição dos TCs procurou-se abandonar a fragmentação das políticas e ampliar a intervenção pública para incitar e fortalecer as iniciativas locais (ORTEGA, 2008). Por tudo isso, entende-se que as políticas de desenvolvimento territorial rural instituídas por FHC e, principalmente, pelo presidente Lula foram inspiradas nas políticas de desenvolvimento rural de enfoque territorial da UE, especialmente na iniciativa Leader.

CAPÍTULO 2 – EVOLUÇÃO E CARACTERÍSTICAS DAS POLÍTICAS PÚBLICAS