Ao término da representação da ES-EVF, iniciou-se a identificação da variável-chave a ser maximizada e dos pontos de alavancagem, como descrito na seção metodológica. Os pontos de alavancagem representam um conjunto de ações pequenas e focadas com o objetivo de maximizar a variável-chave. Partindo do pressuposto de que a ARA-EVF expõe “o que mudar”, foram identificadas, na ES-EVF, Figura 39, que variáveis representariam as causas básicas (Quadro 22), formando, então, os pontos de alavancagem.
A variável-chavefoi identificada considerando os efeitos indesejados principais da ARA-EVF, a saber: “redução da participação econômica do futebol no PIB advinda de receitas diretas do futebol” (12) e “redução dos benefícios do futebol para a sociedade” (19). Salienta- se que esses dois efeitos indesejados são consequências da maior parte das causas básicas apresentadas na ARA-EVF. A união desses dois efeitos indesejados pode ser traduzida na variável da ES-EVF “participação econômica gerada pelo clube na sociedade”. Tal variável concentra as entradas de recursos advindos do clube e de terceiros (sociedade) e, respectivamente, os efeitos indesejados 12 e 19. Portanto, por meio dela, é possível compreender economicamente a modalidade futebol, de forma direta e indireta.
Além disso, ao definir essa variável como chave para ser maximizada, levou-se em consideração a questão de pesquisa, que busca compreender sistemicamente o esporte enquanto um ecossistema produtivo a fim de amplificar a agregação de valor econômico para a sociedade. Entende-se que o esporte, enquanto uma cadeia de atividade, ultrapassa o jogo e acompanha as mudanças econômicas inerentes aos demais setores produtivos. Por conseguinte, ao qualificar e, futuramente, quantificar, reconhece-se o potencial de agregação de valor do esporte, e ações de fomento podem ser direcionadas ao futebol. Por fim, a definição da variável-chave considerou, também, que nos balanços financeiros apresentados pelos clubes é expresso o Demonstrativo de Valor Adicionado (DVA), que representa a riqueza gerada e dissemina como ela foi distribuída entre os diversos setores envolvidos.
A partir dessa variável-chave e do objeto de estudo, o futebol brasileiro, foram identificados 05 (pontos de alavancagem). O primeiro ponto refere-se à variável “investimento
nas categorias de base”.Apresenta os investimentos nas categorias de base dos clubes como
fonte de desenvolvimento social para a comunidade e para o clube, como captação de recursos financeiros advindos da comercialização dos direitos federativos do jogador. Além disso, essa variável se justifica pelos resultados das entrevistas, que citam como elemento alavancador o
investimento nas categorias de base: “é a nossa salvação, principalmente pela diferença de
valores de atletas no mercado versus o potencial financeiro dos clubes” (ENTREVISTADO
T2). O investimento no desenvolvimento do principal ativo intangível dos clubes, os jogadores,
possibilita criar um ambiente que permita aos clubes se beneficiarem de investimentos realizados na formação de jovens talentos. (BLUMENSCHEIN, 2013). Ao promover um desenvolvimento das categorias de base, o clube pode limitar a causa básica “falta de profissionalização na gestão do clube” (01), pois os resultados não são imediatos, mas sim decorrentes de decisões de longo prazo, as quais necessitam, ainda que minimamente, de profissionalismo.
O segundo ponto de alavancagem deriva da necessidade de “exploração de novos
mercados”. Essa variável enfatiza a captação de recursos financeiros por meio de royalties por
parte dos clubes. Daniel (2015) apontou que, em 2015, o valor das 30 marcas mais valiosas dentre os clubes de futebol do Brasil era de R$ 8,32 bilhões de reais.Esse valor dividia-seentre os elementos torcida (45%), mercado (24%) e receitas adicionais (31%). Ademais, a causa básica 78 (setenta e oito) aponta que “as distribuições de recursos dos direitos de transmissão baseiam-se na participação relativa de torcedores”, portanto, ao desenvolver novas formas de exploração e inserção do clube, é possível amplificar sua base de torcedores e participantes e, por consequência, os recursos financeiros.
A variável “número de atletas externos adquiridos” remete à compra de atletas profissionais formados por outras entidades para comporem o elenco do clube. Os atletas profissionais foram inseridos como ponto de alavancagem porquetêm como objetivo a manutenção da qualidade da equipe principal nos jogos. Contudo, a causa básica demonstra que “as decisões em relação ao futebol são tomadas emocionalmente” (32). Desse modo, é interessante verificar se os contratos de jogadores milionários (BLUMENSCHEIN; NEDAL, 2010) realmente provocam o agravamento dos problemas estruturais dos clubes, os quais apresentam margens estreitas e crescimento de dívidas (KENNEDY; KENNEDY, 2016) e/ou se auxiliam a manter a qualidade do clube.
O quarto ponto de alavancagem se refere à redução da “dívida do clube”. Busca-se, então, demonstrar que “a falta de planejamento, equacionamento entre receitas e despesas
visando manter as contas em dia” (ENTREVISTADO I2) é um problema que pode limitar o
desenvolvimento dos clubes. Assim, essa variável remete à questão do equilíbrio entre as receitas e despesas do clube, o atendimento ao pressuposto de responsabilidades civis, expressas nas medidas impostas pela Lei 13.155, de 2015 (BRASIL, 2015), e a contínua arrecadação tributária. Essa variável reflete as causas básicas “não há uma responsabilização econômica
para os tomadores de decisão” (59) e “não há mecanismos para limitar a divida total dos clubes” (55).
Por fim, buscou-se analisar como a alternância política pode impactar no desenvolvimento do Ecossistema de Valor do Futebol (EVF). Essa variável concentra as causas básicas “o futebol não é visto como um negócio” (02), “há decisões de interesse pessoal” (30) e “há decisões com interesse exclusivamente político” (31). Congrega, ainda, as variáveis da ES-EVF “necessidade de visão técnica de gestão do clube” e “número de decisões exclusivamente políticas”. Entende-se que a alternância de gestão pode apresentar resultados insatisfatórios em todas as relações do ecossistema, pois não há uma continuidade nas atividades desenvolvidas.
Assim, os pontos de alavancagem identificados representam as variáveis em que se deve atuar para que se possa ter um retorno efetivo e impulsionar o EVF. Sterman (2002) descreve que os pontos de alavancagem auxiliam a criar políticas operacionais, orientando uma mudança efetiva. Ao identificar a variável-chave e os pontos de alavancagem na ES-EVF por meio das causas básicas da ARA-EVF, foi possível minimizar a subjetividade ao fundamentar a escolha desses elementoscom uso de uma ferramenta lógica. As relações expressas na ES-EVF possibilitaram o entendimento da complexidade inerente a essa modalidade esportiva. Demonstraram, também, que o futebol conta com convicções sociais e políticas e que seu principal cliente traz uma carga emocional de paixão e de competitividade. (SORIANO, 2010). Desse modo, as peculiaridades inerentes a essa modalidade esportiva devem ser observadas ao propor soluções para os efeitos indesejados.
Contudo, os pontos de alavancagem identificados são qualitativos. Assim, propõe-se explorá-los por meio de um Modelo de Dinâmica de Sistemas do Ecossistema de Valor do Futebol (MDS-EVF). O MDS-EVF, por sua vez, explora dinamicamente as relações do EVF, considerando o impacto das decisões no tempo e espaço. Por conseguinte, são propostos cenários alternativos, ou seja, alterações nos escores dos pontos de alavancagem, visando a identificar o comportamento resultante das alterações realizadas. Além disso, refuta-se ou aceita-se a variável como um ponto de alavancagem. O próximo capítulo apresenta a avaliação dos pontos de alavancagem por meio do MDS-EVF.
6 AVALIAÇÃO DOS PONTOS DE ALAVANCAGEM DO ECOSSISTEMA DE VALOR DO FUTEBOL
Este capítulo expõe a avaliação dos pontos de alavancagem do Ecossistema de Valor do Futebol (EVF).AFigura 40 descreve a condução das atividades. Destarte, a partir dos elementos/atores/serviços, foi possível caracterizar o EVF e desenvolver a respectiva análise sistêmica. A análise sistêmica foi composta pela ARA-EVF e pela ES-EVF, as quais possibilitaram compreender qualitativamente as relações existentes na modalidade esportiva em questão, bem como identificar os pontos de alavancagem e a variável-chave do EVF.
Figura 40: Condução das atividades para desenvolvimento do MDS-EVF
Fonte: Elaborado pela autora (2018).
4- Construção dos módulos M DS-EVF (terceiros)
3- Construção dos módulos MDS-EVF (clube)
3.5 Despesas
3.4 Receitas 2- Construção M ódulo
DRE e DVA 2.1 DRE 2.2 DVA 3.1 Investimentos Categorias de Base 3.4.1 Royalties 3.2 Número de atletas externos adquiridos 3.6 Dívida do clube 3.4.2 Transmissão 3.6.1 Despesas Financeiras 3.5.2 Despesas Federação imagens, serviços... 3.5.1 Despesas de Viagem 3.3 Resultado efetivo 4.2 Jogos (Arena) 4.1 Hotel 5. Agregação de valor gerada pelo
clube na sociedade 3.4.3 Publicitárias 3.4.6 Patrimoniais 3.4.7 Produtos licenciados (Grêmio Mania) 3.4.5 Venda/Empréstimo de Atletas 3.5.3 Empréstimo/ Participação de atletas e comissões 3.5.4 Amortização direitos de atletas profissionais 3.5.5 Remuneração, benefícios/encargos 1- Modelo conceitual Análise sistêmica: - Árvoreda RealidadeAtual - Estrutura Sistêmica Variável Chave PontosdeAlavancagem Ecossistema de Valor do Futebol
Entretanto, objetiva-se também avaliar o impacto dos pontos de alavancagem por meio de um Modelo de Dinâmica de Sistemas do Ecossistema de Valor do Futebol (MDS-EVF). Assim, como descrito na seção metodológica, o MDS-EVF foi desenvolvido na perspectiva de um clube de futebol, considerando os Demonstrativos de Resultado de Exercício (DRE).
Nesse sentido, a primeira atividade deste capítulo é a descrição do modelo conceitual do MDS-EVF. Posteriormente, o modelo conceitual é transposto para o software de dinâmica de sistemas para a construçãodos módulos individuais representativos ao clube e aos terceiros. O bloco que apresenta a construção do MDS-EVF e discute os resultados do clube foi desenvolvido em dois modelos. O primeiro tem o objetivo de verificar se as lógicas utilizadas para o cálculo do DRE e DVA estão corretas. O segundo modelo, por sua vez, esboça a modelagem exploratória futura, assim foram inseridos os outros módulos do modelo possibilitando analisar o impacto dos pontos de alavancagem. Por fim, os resultados do modelo apresentam a agregação de valor gerada pelo clube à sociedade, expressada pelo ganho de terceiros com o clube e pelo DVA do clube. A próxima seção expõe os modelos conceituais desenvolvidos.