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179Por sua vez, Badinter considera que “(…) a homofobia é um aspecto

de uma ideologia religiosa conservadora, que estabelece comportamentos estritamente definidos para os homens e mulheres” (1993, 120). Observa que

a nossa ignorância, uma vez que não sabemos definir este comportamento, e o facto de se ter ideologicamente definido o modelo de masculinidade como o heterossexual, são duas razões que explicam as atitudes discrimi- natórias para com os homossexuais.

Ao longo da História, este comportamento sexual tem sido uma cons- tante, variando no espaço e no tempo a forma como foi encarado. Foucault (2006) mostrou-nos que na Grécia Antiga o incorrecto era ser passivo em relação aos prazeres e não a escolha de um ou outro sexo, Paul Veyne (1998) considera que seria errado pensar na Antiguidade como o paraíso da não repressão, e Maurice Sartre salienta que:

“Atendendo a documentação disponível, é seguro que os gregos não emitiam

um juízo sobre a homossexualidade propriamente dita. Aos seus olhos, ela é nem superior nem inferior ao amor pelas mulheres, é uma manifestação, legitima, do desejo amoroso. O que pode tornar condenável é a violência infligida ao parceiro, a prostituição, a desmesura (o obcecado sexual – seja qual for o objecto do seu desejo – está sujeito à troça” (1998, 72).

Depois do antigo período Greco-latino caracterizado por outras con- cepções e práticas da sexualidade, a Antiguidade tardia marca o advento de uma reviravolta e o Cristianismo faria mais tarde a ligação entre a carne e o pecado.

Jacques Le Goff (1998) defende que a fornicação passou a ser conde- nada, principalmente, através do Novo Testamento. O antigo testamento havia concentrado a repressão da sexualidade nos rituais interditos como a homossexualidade, a nudez, o incesto, a sodomia e o coito durante as regras da mulher. Na Alta Idade Média, a experiência do monaquismo faria a distinção da fornicação em união sexual ilícita, masturbação e erecções e ejaculações voluntárias.

O comportamento homossexual em Cabo Verde, tradicionalmente, não era norma e as Ciências Sociais em Cabo Verde fazem pouca referência a este fenómeno. De forma geral, tudo indica que uma sociedade, de tradi-

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ções patriarcais e marcadas pela religiosidade católica, não tenha dado espaço a este variante comportamental sexual. De acordo com António Carreira (1983), a acção da Igreja Católica no arquipélago não deixou de normalizar as interacções sexuais entre os moradores, sendo a sodomia uma das práticas mais contestadas a par de outros comportamentos con- siderados desviantes como a prática sexual com negros.

O quadro n.º 24 mostra-nos que 58% do total da nossa amostra pensa que a homossexualidade feminina é uma forma diferente de viver a sexualidade, 5,2% associam-na ao pecado, 15,6% pensa que contraria as leis da natureza e 19,8% associa a homossexualidade feminina à uma vergonha:

quadro n.º 24: Representações sobre a homossexualidade feminina em função do sexo dos inquiridos/as

o que pensas da homossexualidade feminina? total

Uma forma diferente de viver a sexualidade Um pecado sem perdão É contra as leis da natureza uma vergonha nR sexo dos/as inquiridos/as Masc. n 220 26 66 112 6 430 % 24,4% 2,9% 7,3% 12,4% 0,7% 47,8% fem. n 308 21 74 66 1 470 % 34,2% 2,3% 8,2% 7,3% 0,1% 52,2% total n 528 47 140 178 7 900 % 58,7% 5,2% 15,6% 19,8% 0,8% 100,0%

Da mesma forma, podemos ler no quadro n.º 25 que 54,3% dos in- quiridos também considera a homossexualidade masculina uma forma diferente de se viver a sexualidade, 6,6% defende que é um pecado sem perdão, para 16,7% é uma violação às leis da natureza e 22,1% retratam- -na como uma vergonha:

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quadro n.º 25: Representações sobre a homossexualidade masculina em função do sexo dos inquiridos/as

o que pensas da homossexualidade masculina? total

Uma forma diferente de viver a sexualidade Um pecado sem perdão É contra as leis da natureza uma vergonha nR sexo dos/as inquiridos/as Masc. n 191 37 71 127 4 430 % 21,2% 4,1% 7,9% 14,1% 0,4% 47,8% fem. n 298 22 76 72 2 470 % 33,1% 2,4% 8,4% 8,0% 0,2% 52,2% total n 489 59 147 199 6 900 % 54,3% 6,6% 16,3% 22,1% 0,7% 100,0%

Analisando os dois quadros, deparamos com números muitos próxi- mos, o que nos indica uma leitura similar das duas questões. Em ambos os casos, mais de metade da amostra vêem-na numa perspectiva mais contemporânea. Uma realidade social orientada pela preservação dos direitos individuais (Badinter, s/d) pode ser um ponto de partida para se compreender a menor prevalência do factor religioso e a maior prevalência da tolerância.

Apesar dos novos modelos que emergem com a modernidade, e que são generalizados à escala do globo pelo meios mais diversos, incluído as próprias políticas governamentais, os números mostram-nos que a visão tradicional e conservadora, marcada pela religião ainda tem a sua força, podendo persistir uma certa reprovação a esta forma de se conduzir sexualmente.

Partindo deste pressuposto, quisemos saber através da nossa amostra qual dessas práticas encontra maior tolerância na cidade da Praia.

O quadro n.º 26 indica que para 61,7% dos inquiridos, na cidade Praia tanto a homossexualidade feminina como a masculina são tolerados na mesma medida, enquanto que para 18,7% a masculina encontra maior tolerância e 17,1% considerou a feminina como a mais tolerada:

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quadro n.º 26: Representações sobre o grau de tolerância relativamente à homossexualidade feminina e masculina em função do sexo dos inquiridos/as

o que é mais tolerado na Cidade da Praia? total

Homossexualidade masculina Homossexualidade feminina Ambos, na mesma medida nR sexo dos/as inquiridos/as Masc. n 66 71 275 18 430 % 7,3% 7,9% 30,6% 2,0% 47,8% fem. n 102 83 280 5 470 % 11,3% 9,2% 31,1% 0,6% 52,2% total n 168 154 555 23 900 % 18,7% 17,1% 61,7% 2,6% 100,0%

Por sua vez, o quadro n.º 27 mostra-nos como os inquiridos represen- tam o grau de tolerância relativamente à homossexualidade, segundo a variável religião. Assim 70,2% afirmam não condenar nem a homosse- xualidade feminina, nem a masculina. Deste total 61,2% são católicos. A homossexualidade masculina é censurada por 23,7% da amostra, e destes 18,6% são católicos. A homossexualidade feminina é condenada por 3,4% do total da amostra, e destes 3,0% são católicos:

quadro n.º 27: Representações sobre o grau de intolerância

relativamente à homossexualidade feminina e masculina em função da religião dos inquiridos

o que você condena? total

Homossexualidade masculina Homossexualidade feminina Não condeno nR Religião dos/ as inquiridos/ as Católica n 167 27 551 21 766 % 18,6% 3,0% 61,2% 2,3% 85,1% Protestante n 6 7 2 15 % 0,7% 0,8% 0,2% 1,7% Não tem n 20 3 49 72 % 2,2% 0,3% 5,4% 8,0% nR n 20 1 25 1 47 % 2,2% 0,1% 2,8% 0,1% 5,2% total n 213 31 632 24 900 % 23,7% 3,4% 70,2% 2,7% 100,0%

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