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Portugal: o princípio da socialidade e o regime dos direitos econômicos,

Em 25 de abril de 1974 sagrou-se vitoriosa em Portugal chamada “Revolução dos Cravos”. Por meio dela, chegava ao fim uma das mais longas ditaduras da história européia recente. Instituída em 28 de maio de 1928 sob a liderança de Oliveira Salazar, que permaneceu no poder até 1968 quando foi afastado por incapacidade, o regime se mantinha desde então sob o comando de Marcelo Caetano. No entanto, profundamente desgastado pela longa permanência no poder, com uma economia estagnada, ainda pautada nos imperativos do monopólio do comércio com as suas colônias de ultra-mar (mantidas ao custo de uma guerra desgastante com o movimentos de libertação nacional locais), isolada politicamente no âmbito europeu e, contando com forte oposição da sociedade civil portuguesa, o regime caiu ao perder o apoio das forças armadas. Articulada por jovens oficiais do exército (capitães em sua maioria), sob a liderança do General Antônio de Spínola, o levante que contou com forte apoio popular conseguiu derrubar o regime sem que este fosse capaz de opor uma resistência significativa. No dia seguinte, 26 de abril, formou-se uma Junta de Salvação Nacional, constituída por militares, formando um primeiro governo de transição. O movimento militar (auto- intitulado por MFA) apresentou um programa que era resumido pelos chamados três D: democratizar, descolonizar, desenvolver. Dentre as medidas imediatas adotadas pela revolução encontram-se a extinção da polícia política (PIDE/DGS) e da censura. Concedeu-se liberdade aos sindicatos e legalizaram-se os partidos políticos – inclusive o comunista.

Foram libertados os presos políticos das prisões de Caxias e de Peniche, e os lideres políticos no exílio foram autorizados a regressar. Na semana seguinte, o 1º. De maio foi celebrado (legalmente) nas ruas pela primeira vez em muitos anos. Na capital Lisboa, reuniram-se cerca de um milhão de pessoas.

Nos dois anos que se seguram ao levante de 25 de abril, Portugal viveu um período de grande agitação política, normalmente designado pela expressão PREC (processo revolucionário em curso), caracterizado pela luta entre forças de esquerda e de direita. Foram nacionalizadas inúmeras empresas, e muitas personalidades associadas ao antigo regime foram forçadas ao exílio. Em 25 de abril de 1975, um ano após o levante, foram realizadas as primeiras eleições livres, para a composição de uma Assembléia Constituinte. O processo eleitoral deu maioria aos membros do Partido

Socialista (38%), secundado pelos conservadores do Partido Popular Democrático (26%), mas com uma votação expressiva do Partido Comunista (12%). Juntos, socialistas e comunistas obtiveram aproximadamente 50% das cadeiras na Assembléia Constituinte. Tal hegemonia expressou-se no texto da Constituição, de forte pendor socializante. No entanto, a concepção de Estado que resultou ao final é claramente identificada com os postulados do Estado Democrático Social de Direito, com um sistema de governo de tipo parlamentarista e adesão aos postulados de uma economia de mercado. A Constituição foi promulgada em abril de 1976, e tornou-se a principal referência de um novo constitucionalismo, no qual, os parâmetros do Estado Democrático Social de Direito instituídos pela Constituição de Bonn (1949) foram retomados e aprofundados, passando o seu texto, a servir como referência fundamental para processos constituintes que lhe seguiram, com destaque para a Constituição espanhola (1978) e para a brasileira (1988).

Assim como já havia ocorrido com a Lei Fundamental alemã, a Constituição portuguesa de 1976 abriu espaço para um amplo movimento de normatização dos direitos fundamentais em geral, e em especial, dos direitos fundamentais econômicos e sociais. Para analisá-la, seguiremos os passos daquele que, a exemplo do que se deu com Konrad Hesse em relação à Constituição alemã, se tornou um dos mais autorizados interpretes da Constituição de Portugal: J.J. Gomes Canotilho. Para os objetivos de nossa investigação, interessarão de forma especial os elementos que envolvem o chamado “princípio da socialidade”, bem como, as questões referentes ao regime dos direitos econômicos, sociais e culturais. Ademais, ao investigar este campo normativo no âmbito da experiência constitucional portuguesa, estaremos levantando uma série de problemas que se colocam diretamente no plano de nossa própria história constitucional – dada à proximidade entre o texto português de 1976 e o brasileiro de 1988.

Contradições e ambigüidades do “normativismo revolucionário”

De início, nos chama à atenção a maneira pela qual o texto constitucional português expôs a encruzilhada política e as ambigüidades

jurídico-normativo, típicas do desenvolvimento daquilo que, mais tarde, ficaria conhecido pela expressão “normativismo revolucionário”.

Nossa reflexão toma como ponto de partida o chamado “princípio da socialidade”. Entende a doutrina que tal princípio foi explicitamente adotado pelo texto português em face da dicção do seu art. 2º., quando considera como objetivo do Estado de Direito Democrático a “realização da democracia econômica, social e cultural”. Por isso, tem-se que a realização dessa democracia econômica, social e cultural é um desdobramento político e lógico- material do “princípio democrático”. Tal assertiva se reforça ainda mais na medida em que sabemos que a maioria dos Estados europeus o admitem em sua respectiva ordem jurídica (estando expressamente previsto no âmbito do direito comunitário), como o núcleo elementar do Estado Constitucional Democrático.

A extensão da idéia de democracia se deu no texto originário da Constituição de 1976, sacramentada na chamada “opção socialista”, prevista no a pouco referido artigo 2º. A expressão “opção socialista” denota basicamente uma “palavra-de-ordem” introduzida no texto pela maioria composta por socialistas e comunistas, sob a pressão dos setores mais mobilizados da sociedade civil que acompanharam ativamente os trabalhos da Constituinte, mas não denotaria qualquer identificação com alguma posição doutrinária em particular.

De fato, o que se buscou com a introdução dessa expressão no texto constitucional, parece ter sido simplesmente a ultrapassagem do velho marco liberal-individualista. Os opositores da “opção socialista” preconizavam a formação de um Estado alheio à questão social, por entender ser esta, da alçada exclusiva dos particulares, devendo ser organizada com base em processos de auto-regulação pela via contratual, devendo o Estado apenas garantir, coativamente, se necessário, o seu adimplemento. Não admitiam como politicamente correta e tecnicamente adequada à introdução de direitos de natureza social no corpo da Constituição. Dessa forma, percebe-se que os opositores da “opção socialista”, de fato se opunham qualquer manifestação até mesmo dos parâmetros já fixados desde a primeira metade do século XX pelo Estado Social, os quais até mesmo a ditadura salazarista havia

incorporado – mesmo que no interior de uma dinâmica marcada pelo paternalismo e cooptação típicos de regimes autoritários desse gênero.

Em suma, a expressão socialista acabou “passando” até mesmo como demarcação da correlação de forças existente dentro da Assembléia Constituinte. Todavia, o seu conteúdo, deve ser avaliado pelos parâmetros normativos mais amplos contidos no próprio texto constitucional, o que reduz o seu alcance a um plano muito próximo do que já se havia institucionalizado no âmbito da experiência alemã recente em torno do princípio da socialidade.

“A formulação de uma opção socialista foi severamente contestada. Umas vezes discutia-se se um princípio com a natureza do princípio socialista (ou até nas vestes mais modestas de cláusulas de socialidade) devia estar consagrado na Constituição. A questão, na sua globalidade, podia reduzir-se a esta pergunta: será politicamente desejável e tecnicamente correta a inserção de princípios de conteúdo social na lei fundamental de um país? Quem partir da noção de uma lei fundamental no sentido literal de simples limite do poder, quem proclamar a Constituição como garantia do status quo, sobretudo

do status quo da distribuição de bens patrimoniais, quem

proclamar o isolamento do estado de direito da sua ambiência social, quem continuar a insistir na idéia de Constituição de um Estado total, neutro e formal, como garantia de uma unidade pressuposta, enfim, quem considerar a questão social apenas como uma realidade natural, não pode ter outra resposta que não seja a de relegar os princípios sociais de uma Constituição (desde o princípio socialista a qualquer cláusula da socialidade, por mais vaga e indiferenciada que seja) para o lugar modestíssimo de um problema administrativo.”58

No entanto, a presença do princípio da socialidade no âmbito do texto constitucional, sobretudo, se com a intenção expressa de se constituir os fundamentos normativos de um Estado Democrático Social de Direito, justifica- se sobre vários aspectos. Em primeiro lugar, devemos ter em mente que, anos após aqueles calorosos debates na Assembléia Constituinte, parece indiscutível a existência de uma dimensão social e econômica ao lado (ou como elemento constituinte) de uma dimensão política no âmbito daquilo que costumamos denominar por “princípio democrático”. Isto porque, não se pode compreender a democracia política como um valor dotado de relevância constitucional ao lado de uma democracia social cuja existência e

desenvolvimento dependeria de uma intervenção residual do Estado administrativo. Em segundo lugar, a idéia de um Estado de Direito neutro, meramente formal, abre de tal forma o campo de intervenção às forças políticas que se corre o risco de deixá-las entregues à própria sorte de todo o jogo de clientelas, de ações corporativistas, de completo alheamento político- social, desconectadas dos grandes temas que interessam ao desenvolvimento e a justiça social.

Diante desse perigo iminente, justifica-se a necessidade prevista pelo constituinte de circunscrever minimamente um conjunto de tarefas, cujo conteúdo e forma específica, caberiam ao princípio democrático, garantidor da disputa político-eleitoral, preencher. E por último, temos que a reserva da cláusula da socialidade pelo “Estado administrativo” implicaria em retirar à própria democracia política (do Legislativo e da Lei) importantes comandos constitucionais. O resultado prático de tal operação, parece só interessar àqueles que se pautam pela mera estabilização das relações de poder e mando existentes. O que se acaso viesse a ocorrer, esvaziaria substancialmente o potencial de legitimidade do novo texto constitucional – sobretudo, em face das circunstâncias históricas objetivamente vividas pelo povo português.

De qualquer forma, os excessos verborrágicos determinados pelo momento histórico no corpo do texto constitucional português acabaram sendo suprimidos e/ou re-elaborados ao longo das sucessivas revisões a que foi submetido desde a sua promulgação. Neste sentido procederam três revisões constitucionais (1ª., 2ª., 4ª., realizadas respectivamente em 1982, 1989, 1997), por meio das quais, dentre outras coisas, eliminou-se a “opção abstrata e ideológica” da “decisão socialista”, e aquilo que Canotilho denominou por “suas refrações escatológicas” (libertação da exploração do homem pelo homem) e “econômicas” (apropriação coletiva dos principais meios de produção e irreversibilidade das nacionalizações). Em substituição a estas locuções, o texto revisado optou por outras, designativas de “novas premissas normativas de justiça econômica e social”, por meio das quais se buscou uma abertura maior para o chamado “social concreto”, por uma nova normatização 58 CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Livraria

do universo social, cujo desenvolvimento e implementação foram endereçados não apenas ao Estado, mas também aos próprios cidadãos.

As revisões foram aproveitadas também para reforçar no texto constitucional a defesa do meio ambiente, em um âmbito que buscou ir além de uma tutela puramente patrimonial, mas que tentou preservar os meios necessários para uma sadia condição de vida também para a presente e as futuras gerações (natureza jurídica de direito fundamental intergeracional).

O princípio da socialidade e a democracia econômica, social, e cultural

A articulação entre os preceitos instituidores da democracia política (art. 9º., da CRP) e da democracia social, econômica e cultural (art. 2º., da CRP) é que deixa claro a maneira como a concretização da segunda decorre lógico- materialmente da primeira. Isto porque, no plano do Estado Democrático Social de Direito, o princípio da socialidade, implica em um objetivo que só pode ser realizado (conforme já observou Konrad Hesse no contexto da Lei Fundamental alemã) mediante o respeito às exigências simultaneamente postas pelo princípio democrático (respeito ao preceito majoritário) e ao do Estado de direito (tutela das minorias contra as maiorias circunstanciais). Tal articulação deve ainda harmonizar-se com os valores e princípios da soberania popular, dos direitos e liberdades fundamentais, e do pluralismo político e ideológico expresso por uma organização do jogo político por parâmetros democráticos.

“O princípio da democracia econômica, social e cultural tem a mesma dignidade constitucional do princípio do Estado de Direito e do princípio da democracia política, estando, tal como eles, garantido contra lei de revisão substancialmente perversoras. Todavia, ele apresenta duas dimensões especificas relativamente a estes dos princípios: (1) uma dimensão teleológica, pois a democracia econômica, social e cultural é um objetivo a realizar no contexto de um processo público aberto – Estado social como processo -, e, por isso, ela apresenta-se como um fim do Estado (art. 9º./d); (2) uma dimensão impositivo- constitucional, pois muitas das suas concretizações assentam no

cumprimento de fins e tarefas por parte de órgãos de entidades públicas.”59

Os elementos estruturantes da democracia econômica, social, e cultural

Temos então que, por meio de inúmeras modificações promovidas no texto constitucional através de procedimentos de revisão, promoveu-se, uma depuração daquelas expressões e conceitos excessivamente datados pelo fervor revolucionário. Ao mesmo tempo, assentou-se um novo plano normativo mais adequado às características de uma sociedade amadurecida, menos propensa a radicalizações, porém, mais interessada na realização prática daqueles fins e objetivos constitucionalmente traçados. E nesse sentido, torna- se de fundamental importância uma melhor explicitação daquilo que poderíamos denominar por “elementos estruturantes do princípio da democracia econômica e social”, que a seguir passaremos a comentar.

1 - O primeiro elemento estruturante da democracia econômica e social diz respeito à sua imposição constitucional e o âmbito da discricionariedade legislativa. Trata-se de uma imposição obrigatória, dirigida aos órgãos de

direção política, como os poderes legislativo e executivo, vinculando-os diretamente aos dispositivos constitucionais de forma a exigir que tais poderes desenvolvam uma atividade econômica e social capaz de conformar as estruturas socioeconômicas de modo a garantir a sua evolução no sentido estabelecido pelo “programa constitucional”. Em seu núcleo essencial, o princípio da democracia econômica e social estabelece uma mandato constitucional juridicamente vinculativo com o objetivo de limitar a discricionariedade legislativa, exigindo deste poder uma intervenção com o objetivo de realizar o seu conteúdo sem, no entanto, estabelecer a forma ou os mecanismos por meio dos quais os poderes estatais atingirão aquele objetivo. O constituinte fixou previamente uma exigência, mas deixou aos sujeitos políticos atuantes perante a sociedade e o parlamento uma margem de discricionariedade, por meio da qual, cada um deve apresentar uma proposta

que acredita ser a mais apta para a realização daquele. As escolhas dos meios hábeis à concretização da democracia econômica e social deverão ser objeto de disputa ou acordo entre os atores políticos – daí porque se dizer que a realização da democracia econômica e social decorre política e lógico- materialmente do princípio democrático.

2 - O segundo elemento diz respeito à caracterização do direito como instrumento de conformação social. Trata-se de uma autorização constitucional

para que o legislador, bem como, outros órgãos estatais encarregados da concretização dos objetivos e fins político-constitucionais, para adotarem as medidas que entenderem necessárias para que se possa garantir uma evolução para o conjunto da ordem jurídica de forma a respeitar os postulados da justiça constitucional em sua busca pela realização da justiça social. O princípio da democracia econômica e social (princípio da socialidade), como elemento fundamental do Estado Democrático Social de Direito, impõe tarefas que devem ser cumpridas pelos órgãos estatais, no sentido de se conformar, transformar e modernizar as estruturas econômicas e sociais. O elemento teleológico que deve inspirar tal iniciativa será indiscutivelmente a promoção da “igualdade real”, “material” ou “substancial” entre os portugueses, conforme expressamente estabelecido pelos arts. 9º., / d e 81º. / a e b, da CRP. Trata-se

aqui de imperativo constitucional que qualifica o princípio da igualdade, no sentido de se exigir a ultrapassagem de sua concepção meramente formal, isonômica, como a de sua configuração sob uma ordem jurídica liberal- individualista.

3 - O terceiro elemento estruturante da democracia econômica e social é talvez, um dos mais importantes, sobretudo, em momentos nos quais o Estado Democrático Social de Direito se vê sob o ataque das ideologias neoliberais. Trata-se do princípio do não retrocesso social ou da proibição do retrocesso social. Por meio dele busca-se estabelecer que os direitos econômicos e

sociais, dentre os quais, poderíamos exemplificar os direitos trabalhistas, o direito à assistência social, o direito à educação, etc., uma vez obtido um determinado patamar de realização, tornar-se-iam objeto de uma garantia institucional, conferindo a todos aqueles por eles beneficiados um “direito subjetivo”. Canotilho deixa claro que, o princípio da proibição de retrocesso, “nada pode fazer contra recessões e crises econômicas”, por ele denominadas

como “reversibilidade fática”, mas ressalva que o princípio limita a reversibilidade de direitos adquiridos – o que teria implicações diretas em campos como os da seguridade social e do seguro contra o desemprego involuntário.

A contrariedade a tais pressupostos implicaria na violação dos preceitos referentes à proteção da confiança e da segurança dos cidadãos no âmbito econômico, social e cultural. Em seu limite, tal vulneração atingiria o núcleo essencial de uma existência mínima inerente ao respeito à dignidade da pessoa humana, verdadeira causa de existir do Estado Democrático Social de Direito, seu lastro de legitimidade. Inspirando-se novamente na Lei Fundamental alemã e na jurisprudência do seu Tribunal Constitucional, associa-se aqui o direito subjetivo a prestações materiais por parte do Estado ao núcleo constitucional do próprio “direito de propriedade”.

Tal formulação se torna ainda mais plausível, quando se sabe que, para a maioria dos trabalhadores, os benefícios previdenciários, por exemplo, podem ser o único e mais importante bem adquirido ao longo de toda a sua vida. Um bem pelo qual ele pagou durante décadas, e em relação ao qual, ajuste contábil algum do Estado pode justificar a sua supressão ou mesmo redução. Daí porque, a doutrina, tanto alemã quanto a portuguesa, utiliza-se da expressão “direitos prestacionais de propriedade subjetivamente adquiridos”. Neste sentido, o princípio da proibição do retrocesso impõe um limite jurídico ao legislador, ao mesmo tempo em que, lhe impõe também uma obrigação para a prossecução de uma política congruente com manutenção e ampliação dos direitos concretamente consolidados e com as expectativas subjetivamente alicerçadas.

Nesse sentido, seguindo a trilha aberta por Canotilho, afirma-se que a violação do núcleo essencial de um direito econômico, social ou cultural efetivado justifica e exige a aplicação da sanção de inconstitucionalidade “relativamente às normas manifestamente aniquiladoras da chamada justiça social”. É neste sentido que ele afirma que seria inconstitucional uma lei que extinguisse o direito ao seguro desemprego ou que pretendesse alargar desproporcionalmente o tempo de serviço necessário para a sua aquisição. Neste sentido, a liberdade de conformação do legislador no âmbito das leis sociais nunca poderia afirmar-se sem reservas, pois no âmbito do Estado

Democrático

Social de Direito, esta liberdade de conformação estaria sempre sujeito às limitações que impõe a proibição de discriminações sociais e de políticas anti- sociais.

Isto não quer dizer que a Constituição impede a modificação destes textos de lei – que introduzem direitos econômicos e sociais. Até porque, como é de amplo conhecimento, norma e texto não se confundem, já que a norma é produzida a partir da interpretação de um determinado texto que lhe serve de suporte. Dessa forma, a convivência social exige pela sua complexidade um permanente processo de adaptação, que no âmbito normativo, pode se dar com ou sem a modificação de um texto legal – como, por exemplo, nos processos de mutação constitucional.

Com isso quer se afirmar que, o que ocorre não é imutabilidade do texto legal, mas da norma que garantiu à sociedade aquele novo patamar de civilidade. E essa conquista que não pode, à força de um argumento meramente instrumental, de ajuste de um modelo econômico qualquer, jogar