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As posições sociais diferenciadas dos jovens agricultores no campesinato A posição dos agentes constitui-se pela diferença a eles conferida no espaço social e

Capítulo IV Os Jovens Agricultores e sua condição camponesa: inserção sócio profissional e as múltiplas formas de permanecer no campo

4.1 As posições sociais diferenciadas dos jovens agricultores no campesinato A posição dos agentes constitui-se pela diferença a eles conferida no espaço social e

por eles incorporada, bem como manifestada na estrutura de relações objetivas onde se inserem. Por assim dizer, a posição social traduz os esquemas ou disposições para perceber, sentir e agir ligadas à condição de classe, numa palavra, traduz o habitus diferenciador dos agentes e orientador de suas práticas; ao passo que, em sendo o habitus produto da socialização, este se torna capaz de informar os processos ligados à trajetória do grupo delineadores das tomadas de posição dos agentes.

Uma das características pertinentes à condição econômica e social dos jovens agricultores, logo, dos traços diferenciadores associados a sua posição correspondente no espaço, seria traduzida por uma espécie de conceito-valor manifestado no destaque a eles atribuído (tanto pelos agentes do campesinato, quanto pela sociedade envolvente) e pelos jovens interiorizado. Esta posição de destaque que teriam os jovens egressos da CFR também é revelada nas avaliações e/ou formas como os mesmos são representados e representam a si mesmos através de expressões como: “ter consideração”, “ser olhado com outros olhos”, ou ainda, “ter reconhecimento”.

Este conceito-valor foi apresentado primeiramente de forma espontânea em entrevista com uma liderança local, ex-coordenador da CFR em Medicilândia. Em entrevistas com outros agentes, quando questionados se havia e/ou há este destaque dos jovens egressos, os mesmos confirmaram, apontando algumas oscilações deste destaque ao longo da trajetória da CFR, conforme se verá adiante. Entre os jovens agricultores e seus pais, quando perguntados ‘o que havia mudado em suas vidas após a formação que tiveram na CFR’, a idéia de destaque foi sendo confirmada/demonstrada, espontaneamente, pelas demais expressões referidas neste texto: “passou a ser olhado com outros olhos...”, “teve mais reconhecimento....”, etc. Convém ressaltar que ao longo das entrevistas realizadas, a idéia de destaque é recorrentemente acionada sempre quando os agentes falam também das lideranças locais e regionais do MPST/MDTX, STR, FVPP, PT, as quais teriam se formado como tal porque “foram se destacando nas discussões, nos debates, nas lutas....”. O destaque teria assim um conteúdo de prestígio, reconhecimento no interior do grupo e de competência política, profissional, que atribuem aos sujeitos investidos do destaque uma posição pública respeitável.

Este destaque está presente em duas dimensões que se poderia dizer definidoras da posição (ou das posições) dos ex-CFRs: a primeira é a dimensão social ou das interações na

sociabilidade em que a prática política destes jovens inclui-se; a segunda é a dimensão técnica de seus saberes e práticas produtivas na agricultura. As falas a seguir são exemplares deste possível posicionamento:

[...] Ser gente é o cara com conhecimento que pode se destacar dentro de uma

política, no comércio [...], então os jovens da CFR tinha um destaque; no comércio

quando via um jovem da CFR dizia: “ – oi meu jovem, como vai você?”; um jovem de

uma outra escola não tinha esse tratamento [...] existe isso ainda com certeza, eu dei

o exemplo no comércio, mas é de uma forma geral: se encontrar um oficial de justiça, por exemplo, que você olha que é um cidadão à parte, ele te trata bem, ele te visita, ele trata como família, como cidadão de bem; dentro do sindicato é a mesma coisa [...](Liderança local/CFR. Ex-coordenador da CFR).

Tem sim [destaque], eu acho que tem porque sempre fica né: “ – Estudou na Casa Familiar Rural!”. Tem sempre uma credibilidade, eu acho; no caso, vamos supor, se

ele chega numa assembléia de sindicato, num seminário, quando se apresenta, fala que é, que foi, é ex-aluno da Casa Rural, sempre, se eles quisesse, eles tinha mais oportunidade, talvez até mais que um outro aluno né, sempre tem mais uma facilidade de entrar [...]. Também eu acho assim que esse grupo que estudou na Casa, hoje eles tão mais, assim, sabe administrar melhor o lote, quem ficou no lote;

quem não ficou, que nem o [referência ao Ex-aluno 3, 1ª turma, 33 anos] mora até hoje aqui [na zona urbana de Medicilândia], mas eles, a gente nota, que tem uma diferença

né, dos outros, os outros que estuda assim, nem estuda [...] eles não conseguem administrar né, o lote, de acordo mais na técnica, melhor [...]. Então eu acho que

valeu a pena, quem passou pela Casa Familiar Rural tem uma maneira

diferenciada de administrar o lote, que já é uma vantagem. (Pai 2/CFR – 4ª Turma.

Liderança local. Ativista do Partido dos Trabalhadores. 2ª Geração de Colonos

Pioneiros).

Com certeza tem [o destaque]. Eu acredito que mudou e muito. Por exemplo, eu

participava apenas da minha comunidade lá, de coisa que era normal pra mim e para qualquer um que morava lá e participava de algumas reuniões, mas era muito

pouco. E depois disso a gente viu que a gente passou a ter mais, assim a ser olhado

com outros olhos, por a gente ter passado esse período lá na Casa Familiar Rural.

Tanto é que depois disso eu fui chamado para dar aula lá pra adulto também. Depois disso surgiu esse curso, aí entrei nesse curso justamente por causa disso, pra tá mais

envolvido nos movimentos sociais. [...] eu acredito que não só a minha turma, mas as

outras [...] até na própria comunidade também, depois que eu tava estudando na

Casa Familiar Rural, eu fui coordenador de grupo de jovens lá. Fui representante da nossa comunidade. (Ex-aluno 3 /CFR – 1ª Turma, 33 anos. Pai: Colono Pioneiro).

As disposições ou interiorizações de saberes, valores, gostos, habilidades e representações adquiridas pelos jovens agricultores parecem operar no espaço um processo de distinção social que se revelaria – a exemplo das falas acima – através de um conhecimento distinto e um reconhecimento dos traços distintivos que os definem. Produto do habitus, a distinção social sintetiza e expressa as diferenças da condição de classe; assim, a distinção, tal como revelada na idéia de destaque nas formas como os egressos da CFR são percebidos e percebem a si mesmos, apresenta-se

[...] como configurações sistemáticas de propriedades que exprimem as

diferenças objetivamente inscritas nas condições de existência sob a forma

dos esquemas de percepção e de apreciação necessários para identificar, interpretar e avaliar seus traços pertinentes, funcionam como estilos de

vida. (BOURDIEU, 2007, p. 164. Grifos meus).

A distinção social dos jovens egressos da CFR, ou o destaque dos mesmos, se faria pela posição que os mesmos vêm ocupando ou em que vêm sendo colocados nos diferentes campos (político; familiar; escolar; acadêmico; religioso), e parecem condensar-se hoje, sobretudo, em três espécies de capital, configuradores dos traços pertinentes dos jovens CFRs que lhes aprovisionaria os critérios de diferenciação:

1) Um capital cultural manifestado por estes jovens ao modo de uma distinção

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