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Potencial consciência da ilicitude a) Conceito

No documento APOSTILA DE DIREITO PENAL MILITAR (páginas 40-43)

3. Ilicitude (antijuridicidade) 1 Conceito

4.3 Potencial consciência da ilicitude a) Conceito

A consciência da ilicitude é a capacidade que o agente de uma conduta proibida tem, na situação concreta, de apreender a ilicitude de seu comportamento. Trata-se de uma consciência profana do injusto, constituída do conhecimento da antisocialidade, da imoralidade ou lesividade de sua conduta, a partir das normas de cultura, dos princípios morais e éticos, dos conhecimentos adquiridos na vida em sociedade No Direito Penal Militar, a consciência da ilicitude não precisar ser real, sendo bastante a possibilidade que o agente apresentava, no caso concreto, de alcançar este conhecimento (potencial consciência).

b) Erro de direito

A consciência da ilicitude é adotada no Código Castrense de forma diversa do Código Penal Comum, já que sua disciplina envolve o chamado Erro de Direito, previsto no artigo 35 do CPM, que determina que a “pena pode ser atenuada ou substituída por outra menos grave quando o agente, salvo em tratando de crime que atente contra o dever militar, supõe lícito o fato, por ignorância ou erro de interpretação da lei, se escusável”.

Erro é a falsa representação da realidade ou o falso ou equivocado conhecimento de um objeto. Já a ignorância é a falta de representação da realidade ou o desconhecimento total do objeto. Percebe-se que, ao definir o erro de direito, o Código Penal Militar dá igual tratamento à ignorância da lei (falta de conhecimento – aspecto negativo) e ao erro de interpretação da lei (falsa representação da realidade – aspecto positivo).

No erro de direito, o autor tem domínio da situação fática, pois sabe o que está fazendo, mas não tem consciência de que aquele comportamento é reprovável do ponto de vista penal. O sujeito, ao praticar o fato, supõe-no lícito porque ignora a norma ou porque, apesar de conhece-la, interpreta-a de forma equivocada.

O erro de direito do CPM é semelhante ao erro de proibição do Código Penal (art. 21, CP), pois também recai sobre a consciência da ilicitude, já que o sujeito “supõe lícito o fato”. Por exemplo, o agente invade um compartimento não aberto ao público onde alguém exerce profissão, pensando que não se trata de domicílio (por equívoco na interpretação do termo casa) – art. 226, § 4º, III, CPM.

Diferentemente do Código Penal Comum, o Código Penal Militar não isenta de pena o agente que supõe lícito o fato por ignorância ou por erro de direito escusáveis. Nesse caso, a

pena pode ser atenuada de 1/5 a 1/3, à luz do artigo 73, CPM, ou substituída por outra menos grave, como, por exemplo, de reclusão por detenção. Todavia, não se pode alegar erro de direito em se tratando de crime que atente contra o dever militar, porque nesse caso o agente tem a obrigação de conhecer a norma castrense e interpreta-la corretamente. Os crimes contra o dever militar estão elencados entre os artigos 187 e 204 do CPM.

c) Erro de fato

De outro lado o artigo 36 do Código Penal Militar dispõe acerca do erro de fato, afirmando que é “isento de pena quem, ao praticar o crime, supõe, por erro plenamente escusável, a inexistência de circunstância de fato que o constitui ou existência de situação de fato que tornaria a ação legitima”.

O erro de fato do estatuto penal castrense não se confunde com o erro de tipo do Código Penal comum, que é mais amplo, pois recai não só sobre os elementos fático- descritivos do tipo, como também sobre os elementos jurídico-normativos. O erro de tipo do caput do artigo 20 do Código Penal incide sobre as elementares ou qualquer outro dado que se agregue a determinada figura típica, por isso sempre exclui o dolo, seja evitável ou não, por que nele a vontade é baseada na premissa inidônea à luz do tipo penal.

Já o erro de fato do Direito Penal Militar, o sujeito equivoca-se quanto a algum elemento do plano fático, pois, ao praticar o crime, supõe a inexistência de circunstância de fato que o constitui. Por exemplo, o agente subtrai a mochila de um colega de farda, supondo- a própria por ser idêntica à sua mochila (situação fática).

Interessante notar que o estatuto repressivo castrense insere no mesmo dispositivo o erro sobre descriminante putativa (supõe a existência de situação de fato que tornaria a ação legítima), conferindo-lhe o mesmo regramento do erro de fato sobre o elemento constitutivo do tipo. Por exemplo, um soldado de serviço de sentinela, acreditando tratar-se de uma invasão ao quartel, mata um civil que, fugindo de um assalto, correra em direção à área militar em busca de abrigo.

Na hipótese de erro de fato invencível ou plenamente escusável, o agente não tinha como evitá-lo, nas circunstâncias em que se encontrava, mesmo tomando todas as cautelas necessária. Assim qualquer pessoa naquela mesma situação teria incorrido naquele erro. A solução adotada pelo Código Castrense nesse caso é distinta daquela apresentada no Código Comum: o agente é isento de pena.

De outra sorte, se o erro de fato é vencível ou inescusável, quando verificado que o agente, se tivesse atuado com diligência exigida, teria evitado o erro. Embora não seja isento de pena, há um tratamento mais brando, pois, o fato poderá ser-lhe atribuído a titulo de culpa se houver previsão legal de modalidade culposa.

É assim que o Código Penal Militar define a hipótese de erro de fato culposo, em seu artigo 36, §1º: “se o erro deriva de culpa a este titulo responde o agente, se o fato for punível como crime culposo”. A doutrina fala em culpa imprópria ou culpa por assimilação nessa situação em que o agente, em virtude de erro evitável pelas circunstâncias, realiza voluntariamente a conduta típica, mas responde como se tivesse praticado um delito culposo. d) Erro determinado por terceiro

De acordo com o § 2º do artigo 36, CPM, “se o erro é provocado por terceiro, responderá este pelo crime, a titulo de dolo ou culpa, conforme o caso”. Se o terceiro determina o erro dolosamente, deve-se verificar se o agente incidiu em erro escusável ou inescusável. Na primeira hipótese, haverá autoria mediata, pois, o terceiro utiliza o instrumento inculpável (isento de pena) para realização material do delito. Por exemplo, um oficial medico ordena que ao enfermeiro que injete determinado “remédio” no paciente, o que é feito prontamente. O paciente vem a falecer, eis que, de fato, se tratava de poderoso veneno.

No caso de erro inescusável, ter-se-á um caso de autoria colateral heteróloga, pois aquele que terminou o erro dolosamente responderá pelo erro dolosamente responderá por crime doloso, enquanto que o sujeito que praticou o fato induzido a erro culposo, responderá a título de culpa, se houver previsão legal. Como exemplo, um soldado desafia um colega míope a mostrar sua boa pontaria disparando sua arma em direção a um “tronco”, que na verdade era outro militar, o qual vem a falecer em virtude do ferimento.

O soldado que determinou o erro responde por homicídio doloso, enquanto que o que disparou a arma responde por homicídio culposo. Se o terceiro determina o erro culposamente, responde a título de culpa, sem prejuízo de se verificar se o agente incorreu em erro escusável (isento de pena) ou inescusável (culpa imprópria).

d)Erros Acidentais

O erro acidental não isenta de pena, pois não faz o agente julgar licita a ação criminosa. O sujeito atua com consciência da antijuridicidade de seu comportamento, mas apenas se equivoca quanto a um elemento não essencial do fato ou erra no seu movimento de execução. Há três modalidades de erro acidental previstas no artigo 37 do Código Penal Militar:

• Erro sobre a pessoa (erro in personam) • Erro na execução (aberratio ictus)

• Erro quanto ao bem jurídico (aberratio criminis)

No erro obre a pessoa (erro in personam) o agente, por erro de percepção, atinge uma pessoa em vez de outra e, portanto, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela que pretendia atingir. Há substituição das pessoas que se viram envolvidas no fato.

A execução é correta, mas a pessoa tem uma falha de percepção na identificação da vítima, o que nada modifica a classificação do crime cometido.

Não se consideram as qualidades da vítima real, mas sim da vítima virtual, que realmente pretendia ofender. Por exemplo, um soldado pretendia praticar violência contra superior hierárquico (superior), mas confunde-se e golpeia no escuro outro soldado. A doutrina dá maior elasticidade ao conceito acima e reconhece a hipótese de erro sobre o objeto (erro in objecto), quando o agente, tendo vontade e consciência de praticar uma conduta típica e ilícita, erra na identificação do objeto. Por exemplo, pretendendo subtrair uma arma de fogo, o sujeito furta uma réplica (simulacro). Responde como se tivesse praticado o crime contra aquela coisa que realmente pretendia atingir.

O erro na execução (aberratio ictus), previsto na segunda parte do caput do artigo 37, CPM, ocorre quando o agente, por erro no uso dos meios de execução, ou outro acidente, atinge pessoa diversa da pretendida. A expressão aberratio ictus pode ser traduzida por “desvio de golpe”. Assim, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela pessoa que realmente pretendia atingir. Por exemplo, um soldado querendo matar um colega, dispara sua arma, vindo a acertar outro militar que passava pelo mesmo local naquele momento.

O erro quanto ao bem jurídico (resultado diverso do pretendido ou aberratio criminis) (art. 37 § 1º) ocorre quando, por erro ou outro acidente na execução, é atingido bem jurídico diverso do visado pelo agente, que responderá por culpa se houver previsão legal.

A única hipótese juridicamente plausível é considerar erro de coisa para pessoa. Por exemplo, o sujeito arremessa uma pedra a fim de danificar uma vidraça do alojamento de praças, mas erra o alvo e acaba atingindo um militar que transitava pela alameda do quartel.

Não responde pela tentativa de dano, mas pela lesão culposa. Pensar o inverso significaria premiar o infrator, pois em vez de responder pela tentativa de crime contra a pessoa, seria punido pelo crime culposo contra a coisa. Para ilustrar o absurdo: com a intenção

de matar um colega de farda, o sujeito dispara sua arma, mas erra o alvo, vindo a danificar equipamento militar. Não obstante haver previsão de dano culposo no Código castrense, inviável afastar-se a tentativa de homicídio para que o agente responda pelo crime contra o patrimônio a título de culpa. Tanto no erro na execução quanto no erro quanto ao bem jurídico, se houver duplicidade do resultado aplica se a regra do concurso formal próprio (art. 79, CPM).

No documento APOSTILA DE DIREITO PENAL MILITAR (páginas 40-43)