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Recusa de obediência

No documento APOSTILA DE DIREITO PENAL MILITAR (páginas 68-72)

CAPÍTULO XIII- AÇÃO PENAL

DOS CRIMES CONTRA AUTORIDADE OU DISCIPLINA MILITAR 1 DO MOTIM E DA REVOLTA

3. DO DESRESPEITO A SUPERIOR E A SÍMBOLO NACIONAL OU A FARDA 1 Desrespeito a superior

4.1. Recusa de obediência

• Tipo legal Art. 163. Recusar obedecer a ordem do superior sobre assunto ou matéria de serviço, ou relativamente a dever imposto em lei, regulamento ou instrução: Pena – detenção, de um a dois anos, se o fato não constitui crime mais grave. • Objetividade jurídica: inserida ainda no mesmo título, o objeto jurídico continua sendo a autoridade militar (traduzida no descumprimento da ordem do superior), bem como a disciplina militar (perturbada por esse descumprimento).

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o inferior hierárquico ou funcional (este por compreensão do art. 24 do CPM), o que restringe o cometimento do delito ao militar, federal ou dos Estados. Aqui, também, a exemplo do art. 157 do CPM, não se utilizou no tipo penal a expressão “militar”, mas sim “superior”, significando que o delito pode ser perpetrado por militares da ativa ou inativos, desde que contra um superior.

• Elementos objetivos: inicialmente, cabe uma observação acerca do termo “insubordinação”, o qual ecoa nas casernas como sinônimo de recusa de obediência e, na definição mais simplista, representa “o motim de um só”, enquanto, ao revés, diz-se que o motim é a “insubordinação coletiva”. Atualmente, o nosso o Código Penal Militar entendeu a insubordinação como gênero do qual a recusa de obediência (art. 163), a oposição à ordem de sentinela (art. 164), a reunião ilícita (art. 165) e a publicação ou crítica indevida (art. 166) são espécies. Portanto, a priori, não há o crime de insubordinação, mas os crimes de insubordinação. Partindo agora para a análise do tipo penal, o núcleo da conduta é recusar, negar acatamento, obediência à ordem superior, o que pode materializar-se por uma conduta omissiva (simplesmente permanecer inerte sem acatar o que lhe foi determinado) ou

comissiva (agir de forma contrária ao determinado, fazer quando o superior manda não fazer). • Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de recusar obediência ao superior, afrontando a autoridade e disciplina militares. A excludente de dolo prevista no inciso I do art. 47 também é aplicável ao tipo em estudo, ou seja, se o subordinado ignorar a qualidade de superior do emitente da ordem não haverá dolo de recusa de obediência. Exemplificativamente, pode-se citar o Primeiro-Tenente PM, Comandante de Pelotão que, ignorando que seu par, outro Primeiro-Tenente, está na função de Comandante de Companhia (de sua Companhia), recusa-se a cumprir a ordem por este emitida. Também é possível que a excludente de dolo do inciso II do art. 47 seja aplicada neste tipo estudado. Assim, o militar que descumpre ordem emitida por superior, verbalizada com impropérios, não estará cometendo o delito, por falta do elemento subjetivo (ex.: “vá fazer a ronda, seu lixo!”).

• Consumação: o delito se consuma quando o autor recusa obediência à ordem, seja por ação, seja por omissão, contudo sempre acompanhado de afronta à autoridade que determinou ou que está fazendo cumprir a ordem, bem como afronta à disciplina. • Tentativa: não é possível, em razão de o crime ser unissubsistente. • Crime propriamente militar.

• Ação penal: é pública incondicionada. 4.2. Reunião ilícita

• Tipo legal

Art. 165. Promover a reunião de militares, ou nela tomar parte, para discussão de ato de superior ou assunto atinente à disciplina militar:

Pena – detenção, de seis meses a um ano a quem promove a reunião; de dois a seis meses a quem dela participa, se o fato não constitui crime mais grave.

• Objetividade jurídica: o bem jurídico tutelado é a disciplina militar; acresça-se a autoridade militar se a discussão versar sobre ordem de superior.

• Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar, federal ou dos Estados, bem como, apenas nas modalidades de promoção da reunião ou de tomar parte para discussão de assunto atinente à disciplina, o civil, porém, nesse caso, somente se no âmbito federal. Entendemos, apesar de ilustres posicionamentos contrários, que o civil pode promover e ainda tomar parte da reunião que discute assuntos próprios da disciplina da caserna, embora, por uma análise superficial, possamos ser levados a crer que o assunto é totalmente estranho aos interesses dos particulares (civis). Ocorre que, não raramente, deve-se advertir, percebemos civis embrenhados nas questões militares.

• Elementos objetivos: antes de passarmos ao estudo dos elementos objetivos do tipo, pedimos vênia para firmar nossa posição pela constitucionalidade do tipo estudado, de sorte que foi ele recepcionado pela nova ordem constitucional, desde que com a interpretação adequada. Ao enumerar os direitos e deveres individuais e coletivos, no Capítulo I, especificamente no inciso XVI do art. 5º, a Lei Maior garantiu a todos o direito de reunião pacífica, nos seguintes termos: “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”. Sacramenta-se, portanto, o direito de reunião como um direito individual e ao mesmo tempo uma garantia coletiva, “uma vez que consiste tanto na possibilidade de determinados agrupamentos de pessoas reuniremse para livre manifestação de seus pensamentos, quanto na livre opção do indivíduo participar ou não dessa reunião” Como bem sabemos, no entanto, nenhum direito grafado no Texto Maior possui caráter absoluto. Nesse sentido, devemos entender que os “direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no art. 5o da Constituição Federal, não podem

ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito. O tipo penal, contudo, da forma como está grafado, permite a interpretação de que toda e qualquer reunião, para discutir ato de superior ou para discutir assunto atinente à disciplina, constituir-se-ia em reunião direcionada a um fim ilícito, o que, absurdamente, abrangeria também a discussão elogiosa do ato de superior ou de assunto afeto à disciplina. Um grupo de militares que se reunissem para elogiar a ordem emitida por um superior, ou para elogiar a nova postura disciplinar de uma Corporação, estaria, em tese, em prática do delito. Aqui, no entanto, pensamos que deve haver a interpretação conforme o sistema do Código Penal Militar e da própria Constituição Federal, no sentido de restringir o elemento típico discussão ao entendimento de que somente haverá o delito se a discussão significar afronta à disciplina ou à autoridade, o que só se alcança pela discussão que desprestigie, critique negativamente os assuntos referidos no tipo.

Pode-se chegar a essa compreensão, primeiramente, pela já consignada objetividade jurídica, significando que o escopo protetor do tipo são a disciplina e a autoridade. Ora, se a reunião se propõe a elogiar, não há afetação dos bens jurídicos protegidos, significando que não há falar no cometimento do crime estudado.

• Os núcleos do tipo são “promover” e “tomar parte”. Promover significa organizar, acionar, convocar ou mobilizar outras pessoas, tornando a reunião real para, no caso do tipo, discutir os assuntos grafados (ato de superior ou assunto atinente à disciplina). Essa compreensão afasta o delito se houver o convite recusado pelo convidado, porquanto a reunião não foi promovida. Tomar parte significa participar, estar presente de forma engajada. A reunião se configurará, em face da ausência de disposição em sentido contrário, com a participação de, no mínimo, dois militares. Ato de superior deve ser compreendido como qualquer atitude, no bojo das relações afetas ao serviço, que contenha decisão, deliberação, opinião etc., podendo ser esse ato praticado gestualmente, por escrito, por palavras ou outras formas. Além do ato de superior, a reunião também pode versar sobre assunto atinente à disciplina. Essa expressão é muito ampla, mas é certo que o cerne da questão continua sendo o choque, o desrespeito, a

afronta dos mesmos bens através daquela discussão.

• Elemento subjetivo: só admite o dolo, a intenção, a vontade livre e consciente de promover a reunião ou dela tomar parte com um fim específico: discutir ato de superior ou assunto afeto à disciplina. Há, portanto, uma finalidade específica, configurando-se um elemento subjetivo específico do tipo penal (antigo dolo específico). Caso o militar seja chamado à reunião e, sem conhecer os seus motivos, lá compareça, não poderá ser incriminado até o momento em que se anuncie o que se pretende com a reunião, isso se deliberar pela permanência e por tomar parte na discussão. Até este momento, falta-lhe o dolo de afrontar os bens jurídicos tutelados e, portanto, não há falar em crime.

• Consumação: o delito se consuma quando a reunião acontece, pois, até então, não há falar em “promover”, já que não existiu, nem em “tomar parte”, pelo mesmo motivo. Não se exige, no entanto, como já ressaltamos, que ocorra a efetiva discussão dos assuntos grafados no tipo. • Tentativa: não cabe em nenhuma das previsões, por se configurar delito unissubsistente. • Crime impropriamente militar.

• Ação penal: é pública incondicionada. 4.3. Publicação ou crítica indevida

• Tipo legal Art. 166. Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar publicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Governo:

Pena – detenção, de dois meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave. • Objetividade jurídica: assim como no delito anterior, o bem jurídico protegido é a disciplina militar perturbada pela afronta da publicação ou da crítica; entretanto, se o alvo da conduta for ato de superior, teremos também o ferimento à autoridade de quem o praticou. • Sujeitos do delito: o sujeito ativo é o militar (federal ou estadual), que deve ser compreendido, nos termos do art. 22 do CPM, como o militar em situação de atividade. O militar inativo e o civil podem perpetrar este delito se em concurso com um militar da ativa, quando a circunstância pessoal militar, que é elementar do tipo, comunica-se aos consortes (art. 53, § 1º, segunda parte, do CPM). O militar inativo, ademais, poderá perpetrar este delito se estiver sendo empregado na Administração Militar, conforme expõe o art. 12 do Código Castrense. O sujeito passivo, titular dos bens jurídicos aviltados, é a própria Instituição Militar, que se vê lesada em sua disciplina. Ademais, na forma de crítica de ato de superior, o praticante do ato é atingido pela conduta nuclear, sendo, portanto, sujeito passivo mediato. Elementos objetivos: as condutas nucleares são publicar e criticar. Publicar é tornar público, levar a conhecimento, o que pode ser de viva voz, por escrito, diretamente ou por qualquer outro meio de comunicação, como televisão, jornal, e-mail etc. Irrelevante para o crime sob exame se o público que poderia ser alcançado pelo ato de publicação é composto de civis (público externo) ou de militares (público interno). A publicação, ademais, para ser delituosa, pressupõe a ausência de licença, de autorização de autoridade competente, reconhecendo-se, aqui, um elemento normativo do tipo, em que o aplicador do Direito Penal Militar deverá investigar muito bem tal elemento e, somente o confirmando, concluir pela perfeita subsunção. O objeto da publicação é o ato ou documento oficial. A segunda possibilidade é a de criticar publicamente. Faz-se necessário, neste ponto, a mesma advertência feita quando do estudo do tipo anterior. Com efeito, tal qual a discussão, vista anteriormente, a crítica pode comportar conteúdo positivo ou negativo. Por óbvio, a crítica positiva não ameaçará os bens tutelados e, por consequência, não se bastará ao preenchimento do tipo penal estudado. A crítica, para ser delituosa, recairá sobre três objetos, a saber: a) o ato de superior, b) o assunto atinente à disciplina e c) a resolução do governo. • Elemento subjetivo: só admite o dolo, a vontade livre e consciente de praticar as condutas descritas. Caso o agente publique o ato ou documento, por autorização de pessoa que pense ser competente para tanto, sem que de fato o seja, haverá hipótese de erro de fato que afastará o dolo e, se plenamente escusável, isentará o agente de pena (art. 36 do CPM), sem prejuízo de responsabilização da pessoa que, indevidamente, autorizou e provocou o erro (art. 36, § 2º, do CPM).

• Consumação: o delito se consuma quando ocorre a publicação do ato ou documento em questão, sendo indiferente para o tipo estudado que alguém tenha acesso à publicação; basta que, potencialmente, possa ela chegar ao conhecimento de alguém, configurando-se, pois, em crime de perigo abstrato, o que também leva à conclusão de que não se exige para a configuração do delito que a veiculação da informação lese efetivamente a disciplina ou a autoridade militares; é suficiente a simples conduta, sendo presumido o risco de lesão. Na modalidade de se fazer crítica, o crime se consuma com a externalização do pensamento crítico, desde que publicamente, exigindo-se, porém, nessa modalidade, que pessoas apreendam as críticas publicadas (crime de perigo concreto). O advérbio “publicamente” é sinônimo da expressão “em público”, equiparando a compreensão deste artigo àquela consignada nos comentários à consumação da forma majorada do delito de despojamento desprezível. Diferente seria se a norma consignasse a expressão “em local público”, quando a referência ao local, e não à assistência pelo modo como se pratica o ato, levaria à conclusão de que o risco seria presumido, bastando a prática da conduta no local indicado. • Tentativa: é admissível nos casos em que se tomam todas as providências para efetivar a publicação e esta acaba por não acontecer por fatores alheios à vontade do autor. No caso

específico da crítica, é inadmissível por se tratar de modalidade unissubsistente. • Crime propriamente militar.

• Ação penal: é pública incondicionada.

No documento APOSTILA DE DIREITO PENAL MILITAR (páginas 68-72)