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Diagrama 1: Representação da Dialética em espaço tripolar

2 DISPOSITIVO TEÓRICO: PEDRA ANGULAR DO CAMINHO DE CONSTRUÇÃO DA

2.1 Estudos de linguagem: a perspectiva da Análise do discurso de base enunciativa

2.1.1 O primado do interdiscurso

Para esta pesquisa seguiremos o conceito desenvolvido por Dominique Maingueneau (2008a) de interdiscurso. Mesmo sabendo que este não é um conceito totalmente novo, a visão de Maingueneau delimita o interdiscurso a partir dos critérios de fechamentos semânticos específicos de determinadas formações discursivas - que para este autor será posicionamentos - em campo e espaço discursivo. Esse critério de apreensão do discurso através de campos e espaços discursivos determinados é de extrema importância em nossa pesquisa, uma vez que nosso córpus de estudo abrange variados campos discursivos e fechamentos semânticos em determinados espaços de circulação discursiva.

Assim, através do primado do interdiscurso, assumimos neste trabalho, que há espaço de trocas entre os discursos analisados e, que o “Outro” está introduzido no “Mesmo”, ainda que aquele não esteja claramente exposto em citações e perceptível na superfície linguística. O “Outro”, segundo Maingueneau (2008a, p.37) seria um interdito, ou seja, o dizível faltoso da interação discursiva e é dessa maneira que iremos abranger este estudo para entendermos a constituição discursiva do conceito trabalho em tempos de economia da informação e de época pró-patente dentro do site BoC a partir de redes de trocas em espaços discursivos determinados. Dessa forma, afirma Maingueneau (2008a, p. 35- 37) no que tange a relação interdiscursiva “Mesmo/Outro”:

Reconhecer este tipo de primado do interdiscurso é incitar a construir um sistema no qual a definição da rede semântica que circunscreve a especificidade de um discurso coincide com a definição das relações desse discurso com seu Outro. No nível das condições de possibilidades semânticas, haveria, pois, apenas um espaço de trocas e jamais de identidade fechada. [...] O Outro não deve ser pensado como uma espécie de “invólucro” do discurso, ele mesmo considerado como invólucro de citações tomadas em seu fechamento. No espaço discursivo, o Outro não é nem um fragmento localizável, uma citação, nem uma entidade externa[...]ele se encontra na raiz de um Mesmo sempre já descentrado em relação a si próprio[...]ele é aquele que faz sistematicamente falta a um discurso e lhe permite encerrar-se em um todo. É aquela parte de sentido que foi necessário o discurso sacrificar para constituir a própria identidade. [...] Disso decorre o caráter essencialmente dialógico de todo enunciado do discurso, a impossibilidade de dissociar a interação dos discursos do funcionamento intradiscursivo. [...] o Outro no espaço discursivo não é em nada redutível a uma figura de interlocutor, [...] talvez seja mais justo ver no Outro um eu do qual o enunciador discursivo deveria constantemente separar-se. Ele seria, de alguma forma, o interdito de um discurso.

Maingueneau (2008a) tem como um de seus principais pontos teóricos a tese do Primado do Interdiscurso sobre o discurso. Discurso sendo compreendido pelo autor como “integralmente linguísticos e integralmente históricos” (MAINGUENEAU, 2008a, p.16) e, como “um sistema de regras que define a especificidade de uma enunciação” (MAINGUENEAU, 2008a, p.19) e sendo a enunciação “o produto de um acontecimento único, que supõe um enunciado, um destinatário, um momento e um lugar particulares” (MAINGUENEAU, 2001). Dessa forma, Maingueneau se situa em um lugar capaz de descrever o discurso a partir de sua enunciabilidade, que é o fato de um discurso ter sido “objeto de atos de enunciação por um conjunto de indivíduos, que condiciona toda a sua estrutura” (MAINGUENEAU, 2008a, p.18) e, por isso, passível de ser historicamente circunscrita.

Dentro dessa perspectiva, o interdiscurso precede o discurso. Assim, o objeto de análise para os pesquisadores são as relações existentes entre os diversos discursos, ou seja, as relações interdiscursivas e, não, discursos em si, isolados. Maingueneau (2008a, p.33) elabora uma tríade para tornar “menos grosseiro este termo muito vago” e opta por trabalhar e delimitar as condições de enunciabilidade no nível de um “universo discursivo, campo discursivo e espaço discursivo”, noções que abrangeriam de forma mais exata a noção de interdiscurso e, consequentemente, o processo de interdiscursividade. Mediante isso, segundo Maingueneau (2008a, p.20), “o interdiscurso tem procedência sobre o discurso”. Isso significa propor que a unidade de análise pertinente não é o discurso, mas um espaço de trocas entre vários discursos convenientemente escolhidos. A noção de

interdiscurso é segmentada pelo autor em três conceitos que embasam a nossa construção discursiva de pesquisa:

1. Universo Discursivo: conjunto de formações discursivas de todos os tipos que interagem numa conjuntura dada. É um conjunto finito e não pode ser apreendido em sua globalidade. O Universo discursivo serve como balizador ao analista do discurso para definir domínios que serão estudados (MAINGUENEAU, 2008a, p.33).

2. Campo Discursivo: conjuntos de formações discursivas que se encontram em concorrência, delimitam-se reciprocamente em uma região determinada do universo discursivo. (MAINGUENEAU, 2008a, p.34). No que diz respeito à noção de formação discursiva, Maingueneau opta por denominá-la, atualmente, de posicionamentos, que podem estar em confronto, aliança ou em uma neutralidade aparente dentro de seus universos discursivos. Este tipo de concorrência entre as formações discursivas, ou posicionamentos, se dá entre discursos que possuem a mesma função social, mas divergentes quanto ao modo pelo qual ela deve ser preenchida. “É no interior de um campo discursivo que se constitui um discurso, e levantamos a hipótese de que essa constituição pode deixar-se descrever em termos de operações regulares sobre formações discursivas já existentes”. (MAINGUENEAU, 2008a, p.34). Isso não significa que todos os discursos de um mesmo campo se constituam de uma mesma forma. O recorte em campos é uma abstração necessária e não definidor de zonas insulares.

3. Espaço Discursivo: subconjuntos de formações discursivas que o analista, diante de seu propósito, julga relevante pôr em relação. (MAINGUENEAU, 2008a, p.35). Esse espaço discursivo é estabelecido pelo analista através do conhecimento do campo discursivo e de hipóteses referidas e fundamentadas sobre conhecimento dos textos e um saber histórico, que serão confirmadas ou infirmadas na análise.

Ao se reconhecer o Primado do Interdiscurso através de uma operacionalização dos conceitos acima descritos, haveria um espaço de trocas entre os discursos e jamais identidades fechadas no nível de condições das possibilidades semânticas. Dentro dessa interação entre os discursos, repousa toda a função dialógica de linguagem, uma vez que tal interação permite a presença do Mesmo no Outro, um interdito, dizível faltoso em constante “conflito regulado”:

No espaço discursivo, o Outro não é nem um fragmento localizável, uma citação, nem uma entidade externa; não é necessário que ele seja localizável por alguma ruptura visível da compacidade do discurso. Ele se encontra na raiz de um Mesmo sempre já descentrado em relação a si próprio, que não é em momento algum passível de ser considerado sob a figura de uma plenitude autônoma. Ele é aquele que faz sistematicamente falta a um discurso e lhe permite encerrar-se em um todo. É aquela parte de sentido que foi necessário o discurso sacrificar para constituir a própria identidade. Disso decorre o caráter essencialmente dialógico de

todo enunciado do discurso, a impossibilidade de dissociar a interação

dos discursos do funcionamento intradiscursivo. (MAINGUENEAU, 2008a, p.37)

Desse modo, por considerar como objeto de análise as relações interdiscursivas e, não, discursos em si, isolados, Maingueneau (2008a) propõe a apreensão desses objetos mediante uma semântica global do discurso para dar conta dos múltiplos planos discursivos. Dessa maneira, na seção seguinte trataremos da hipótese desenvolvida por Maingueneau (2008a) de uma semântica global que sustente os vários planos discursivos e, que em nossa pesquisa, será operacionalizada com intuito de dar sustentação a nossa construção e constituição discursiva.