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PRIMEIRA AJUDA DO CÉU

No documento É Preciso Algo Mais (Elisa Masselli) - PDF (páginas 144-152)

“É PRECISO ALGO MAIS” _ ELISA MASSELLI

“Artur, como das outras vezes, sabia que precisaria da droga. Disse:

— Está bem, vamos tentar. Quando vai ser? Jiló, antes de responder, disse:

— Só tem um problema... — Que problema?

— Não pode ser durante o dia, seria muito perigoso. O melhor é à noite, de preferência perto de alguma faculdade. Lá só tem carro bom. É tudo filhinho de papai.

— Não conseguirei sair à noite.

— Pode deixar, eu ligo para sua casa na hora do jantar. Digo que estou precisando da sua ajuda, seus pais não desconfiarão de nada.

— Será que não desconfiarão mesmo?

— Claro que não. Eles não imaginam o que você faz, confiam plenamente.

— É por isso que em alguns momentos fico triste. Não consigo imaginar o que fariam caso descobrissem.

— Agora não é hora de pensar nisso. Precisamos planejar como faremos. Jiló vamos conversar sobre a marca do carro e qual será a nossa parte em dinheiro.

— É assim que se fala. Esperem, vou lá dentro pegar tudo. Está tudo escrito em um papel.

Jiló entrou. Artur, como já vivia a muitos dias se drogando, estava meio entorpecido, não conseguia pensar com

clareza, só sentia necessidade do pó. Jiló em seguida saiu com um papel na mão. Entregou-o para Rodrigo e os três planejaram como seria.

Artur ia concordando com tudo. Naquela mesma noite, após o jantar, o telefone tocou.

Odete atendeu. Artur estava sentado junto ao pai assistindo televisão. Após atender ao telefone, Odete disse:

— Artur, é para você! — Quem é?

— Rodrigo, disse que está precisando da sua ajuda para a prova de amanhã.

— Que chato!

— Ora, meu filho, não custa nada ajudar. Nem todos têm a mesma facilidade que você para aprender.

Fingindo descontentamento, pegou o telefone. — Alô.

— Oi, Artur, está tudo bem por aí?

— Está tudo bem, mas o que você quer? — Posso falar?

— Claro!

— Precisa ser hoje, minha mãe ligou dizendo que vai precisar trabalhar até mais tarde. Diz aí que precisa vir para cá me ensinar.

— Não posso sair à noite.

— Me deixe falar com sua mãe.

— Está bem. Mamãe, ele quer falar com a senhora. Odete pegou o telefone.

— Alô! Pode falar.

— Dona Odete, amanhã vai ter uma prova muito difícil, e eu estou tendo um pouco de dificuldade. Será que Artur não pode

vir até minha casa para me ajudar? A senhora sabe que ele é o melhor aluno da classe!

Ela, que até então não sabia que o filho já não era mais o melhor aluno, respondeu:

— Não sei se ele pode ou quer ir. — Por favor, peça a ele...

Odete sorriu. Rodrigo sabia ser agradável. — Está bem, vou tentar.

Olhou para Artur, que fingia não estar interessado. — Artur, acredito que não custa nada, ele é seu amigo... — Está bem, mamãe, eu vou.

Álvaro disse: — Eu o levo.

— Não precisa, é aqui perto.

— Vá, meu filho. Quando terminar, se for tarde, vou buscá- lo.

— Não vai precisar papai, acho que não vai demorar. Não posso ficar muito tempo, preciso dormir. Também tenho a mesma prova amanhã.

Artur saiu. Na rua, começou a correr. Precisava realmente voltar logo para não despertar suspeitas. Quando chegou, Rodrigo já o estava esperando:

— Vamos logo. Você demorou!

— Não demorei, vim o mais rápido possível. Vamos!

— Espere, antes vamos entrar. Minha mãe ainda não chegou, dá tempo de dar uma cheirada antes de sair.

Entraram. O pó estava esparramado sobre a mesa. Cheiraram e saíram. Andavam pela rua sem saber muito bem o que estavam fazendo. Corriam, paravam e riam muito. Chegaram ao local planejado. Em frente havia uma faculdade. Vários rapazes

e moças estacionavam seus carros e entravam. Eles ficaram observando. Logo o movimento de pessoas parou. As aulas começaram e todos os alunos estavam lá dentro.

Rodrigo mostrou um carro para Artur.

— È aquele ali. Vamos rápido. Tenho aqui as ferramentas, vamos!

Aproximaram-se do carro. Artur se impressionou com a rapidez com que Rodrigo abrira a porta. Ficou do lado de fora enquanto Rodrigo entrou e puxou alguns fios que havia embaixo do painel. Cortou, estava fazendo a ligação quando ouviu uma voz:

— O que está fazendo aí?

Levantou a cabeça. Ficou horrorizado com a cena que viu. Um homem, tendo um revólver sobre a cabeça de Artur, que tremia muito, repetiu:

— O que está fazendo aí?

Rodrigo, também tremendo, ficou sem saber o que dizer. O homem, com voz firme, disse:

— Saia! Não tente nada. Sou um delegado de polícia.

O homem tirou duas algemas que tinha na cintura e colocou nos dois. Naquele momento, Artur se lembrou do rapaz que havia visto em frente à escola e que tanto o impressionara. Teve a resposta à pergunta que se fizera naquele dia. Sabia o porquê de o rapaz estar naquela situação.

Com os dois algemados e com o revólver em suas costas, o delegado levou-os até um telefone que havia ali. Ligou para um número e logo depois uma viatura com dois policiais chegou. Empurrando os dois para dentro da viatura, disse a um policial:

— Leve estes dois para a delegacia. Vim trazer minha filha para a aula e de longe vi estes dois em atitude suspeita. Aproximei-me e vi que tinha razão. Eles estavam tentando furtar

este carro. Faça o relatório. O delegado saberá o que fazer. Se for necessário, irei até a delegacia. Aqui está o número do meu telefone.

— Sim, doutor, farei isso.

Os policiais colocaram os dois na parte de trás da viatura. Eles estavam apavorados. Devido à droga, não percebiam muito bem a situação, mas sabiam que nada estava bem.

Assim que chegaram à delegacia, foram levados até uma sala. Um senhor com os cabelos grisalhos, com um sorriso e a voz calma, perguntou:

— O que estavam fazendo?

Artur permaneceu calado. Rodrigo, com voz trêmula, respondeu:

— Não estávamos fazendo nada! Foi tudo um engano! Aquele delegado se enganou, a gente só estava passando por aquela rua!

Com um sorriso o homem prosseguiu:

— Foi mesmo? Aqui neste papel diz que um de vocês estava dentro do carro tentando fazer uma ligação direta.

— È mentira...

— Pode ser, mas por que um delegado mentiria? O que ele ganharia com isso?

— Não sei, ele não deve ter gostado da gente... — Vocês estão drogados?

Um olhou para o outro. Artur não dizia nada, não conseguia esquecer daquele dia em frente à escola, quando o rapaz fora preso. Naquele momento, no rosto de Rodrigo via a mesma expressão de medo e desespero que vira no rosto dele. Rodrigo respondeu:

O delegado deu outro sorriso. Parecia que estava triste por aquela situação:

— Vocês já perceberam que não sou mais jovem, tenho uma longa vida aqui nesta delegacia. Por aqui passaram vários outros jovens como vocês. Sei que estão drogados, sei também que estavam roubando aquele carro para pagar a droga.

Quantos anos vocês têm?

Disseram a idade. Os dois choravam. O delegado continuou:

— Preciso saber o nome de vocês e o endereço. Artur quase gritou:

— Por quê?

— Preciso avisar e pedir para que seus pais venham buscá- los. Artur, desesperado, disse:

— Por favor, senhor! Não faça isso! Meus pais não sabem de nada. Se souberem, morrerão!

— Eles não sabem? — Não!

— Então, em vez de ficar chorando, deve agradecer por isto que está acontecendo. Da maneira como estão vestidos e falam, parecem pertencer a boas famílias. São bem-educados, por isso tenho certeza que seus pais também são esclarecidos e entenderão. Só poderão ajudá-los quando tomarem conhecimento.

Rodrigo tentou:

— Por favor, doutor, deixe a gente ir embora. Prometemos que nunca mais faremos isso! Deixaremos a droga, não é, Artur?

Artur não conseguia falar, estava nervoso, assustado e com muito medo. O delegado continuou:

— Não posso fazer isso. Conheço o drogado, ele promete, mente, pede perdão, diz que não vai mais usar, mas assim que se

vê livre, volta a se drogar. Não consegue se livrar sozinho, precisa de ajuda. Para o bem de vocês, preciso avisar seus pais. Eles virão e eu conversarei com eles. Encontraremos uma maneira de ajudá- los. Já estiveram presos antes? Já traficam?

Com a cabeça, disseram que não.

— Se isso for verdade, é muito bom, é sinal que estão ainda no começo e que têm chance de se libertar. Agora preciso dos nomes e endereços.

Entendendo que não havia outra maneira, os dois disseram seus nomes e os endereços.

Enquanto isso, na casa de Artur, Odete, preocupada disse: — Álvaro, já está tarde, são quase onze horas e Artur não voltou.

— Tem razão, ligue para a casa do amigo dele, diga que vou buscá-lo. Não quero que fique andando pelas ruas à uma hora dessas, é muito perigoso.

— Não sei o número do telefone. Ele não deixou... — Deve estar nessa agenda perto do telefone.

Odete pegou a agenda, procurou, mas não encontrou. Álvaro disse:

— Artur deve ter uma agenda só dele.

— É mesmo, vou até o seu quarto ver se encontro.

Ela subiu a escada em direção ao quarto de Artur. Entrou, sorriu ao ver a bagunça. Pensou:

"Vou ter que falar sério com ele, precisa arrumar este quarto."

Olhou em direção ao computador, aproximou-se. Procurou por sobre a mesa, mas não viu a agenda. Abriu a gaveta, também ali não estava. Viu alguns pacotinhos de pó branco. Pegou um deles em sua mão, olhou, mas não conhecia, não sabia

o que era, pois nunca havia visto cocaína. Colocou de volta na gaveta, saiu.

Voltou para junto de Álvaro, dizendo: — Não achei nenhuma agenda.

— Sabe onde ele mora?

— Não, sei que é aqui perto, mas não sei onde.

— Bem, só nos resta esperar, logo mais ele vai telefonar ou chegar.

— Tem razão.

Estavam ali conversando e esperando por Artur. O telefone tocou. Álvaro, enquanto atendia, disse:

— Não disse que ele ia telefonar? Odete sorriu aliviada. Ele atendeu: — Alô.

Do outro lado da linha, uma voz de homem disse: — Preciso falar com o doutor Álvaro Gomes de Matos. — Sou eu.

— O senhor precisa vir até a delegacia. — Delegacia!?! Por quê?

Odete deu um pulo do sofá onde estava sentada. Olhou desesperada para o marido, que ouvia o homem dizendo:

— Seu filho está aqui.

— Meu filho!?! Por quê? Foi assaltado novamente?

— Não posso dizer nada por telefone, o delegado o está esperando aqui.

— Mas ele está bem? Está ferido?

— Não, ele não está ferido. Venha o mais rápido possível. — Irei agora mesmo. Qual é o endereço?

Enquanto ele anotava em um papel o endereço, Odete segurava em seu braço, desesperada, querendo saber o que estava

acontecendo. Após terminar de anotar, muito nervoso, ele se voltou para ela, dizendo:

— Preciso ir para a delegacia, Artur está lá! — Entendi isso, mas por quê?

— Não sei, a pessoa que ligou não quis dizer por telefone, mas disse que ele está bem, não está ferido! Vou agora!

— Vou com você!

— Não pode! Leandro está dormindo, não pode ficar sozinho.

— Vou ficar desesperada!

— Sei disso, mas não há outra maneira.

— Assim que chegar e tomar conhecimento do que aconteceu, ligue para me contar.

— Está bem, farei isso.

Ele deu-lhe um beijo e saiu. Ela ficou rezando, foi até o quarto de Leandro, que dormia profundamente. Voltou para a sala e ficou junto ao telefone”.

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