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2.7 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO DAS FAMÍLIAS

2.7.7 Princípio da afetividade

Embora a palavra afeto não esteja presente no texto constitucional, Lôbo (2008, p. 48) defende que se encontram na Constituição fundamentos essenciais do princípio da afetividade, quais sejam, a igualdade de todos os filhos, independentemente de sua origem (artigo 227, §6º); a adoção a partir de escolha afetiva obteve integralmente igualdade de direitos (artigo 227, §§5º e 6º); a proteção constitucional da família formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos (artigo 226, §4º); e a prioridade absoluta da convivência familiar (em detrimento da origem biológica) assegurada à criança e ao adolescente (artigo 227).

Neste compasso, apesar de nosso ordenamento não consagrar expressamente o princípio da afetividade, para Dias (2010, p. 70), ele está implicitamente contemplado, já que:

Ao serem reconhecidas como entidade familiar merecedora da tutela jurídica as uniões estáveis, que se constituem sem o selo do casamento, tal significa que a afetividade, que une e enlaça duas pessoas, adquiriu reconhecimento e inserção no sistema jurídico.

Ainda, segundo a mesma autora, na medida em que se acentuam as relações de sentimentos e se valorizam as funções afetivas da família, esta vai se transformando. Surgem então:

[...] novos modelos de família mais igualitárias nas relações de sexo e idade, mais flexíveis em suas temporalidades e em seus componentes, menos sujeitas à regra e mais ao desejo. [...] O novo olhar sobre a sexualidade valorizou os vínculos conjugais, sustentando-se no amor e no afeto (DIAS, 2010, p. 71-72).

Lôbo (2008, p. 49) segue o mesmo raciocínio ao dizer que “A família atual é tecida na complexidade das relações afetivas, que o ser humano constrói entre a liberdade e o desejo”.

Identifica-se, assim, um novo perfil do casamento e das famílias, mais voltados à realização dos interesses afetivos e existenciais de seus integrantes e nos quais há comunhão de afeto, elemento incompatível com o modelo único e “matrimonializado” da família. Na esteira dessa evolução, buscando explicar as relações familiares contemporâneas, instalou-se uma nova ordem jurídica para a família, atribuindo valor jurídico ao afeto. “Talvez nada mais seja necessário dizer para evidenciar que o princípio norteador do direito das famílias é o princípio da afetividade” (DIAS, 2010, p. 71-72).

Apresentados tais princípios, norteadores do direito das famílias, passa-se a abordar os novos conceitos de família na sociedade brasileira contemporânea.

3 NOVOS CONCEITOS DE FAMÍLIA NA SOCIEDADE BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA

Como visto, até a Constituição de 1988 não eram reconhecidas as entidades familiares não provenientes do casamento. A nova carta constitucional reconheceu a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, bem como a família monoparental (família constituída apenas pelo pai ou pela mãe e seus descendentes), conforme se infere do seu artigo 226:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o

homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão

em casamento.

§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por

qualquer dos pais e seus descendentes.

[...]

(BRASIL, 1988, grifo nosso)

Acerca da evolução do direito das famílias e sua nova abordagem após a Constituição de 1988, ensina Dias (2010, p. 168):

Com a evolução dos costumes, as uniões extramatrimoniais acabaram merecendo a aceitação da sociedade, levando a Constituição a dar nova dimensão à concepção de família e introduzir um termo generalizante: entidade familiar. Alargou o conceito de família, passando a proteger relacionamentos outros além dos constituídos pelo casamento. Emprestou juridicidade aos enlaces extramatrimoniais até então marginalizados pela lei. Assim, o concubinato foi colocado sob regime de absoluta legalidade. As uniões de fato entre um homem e uma mulher foram reconhecidas como entidade familiar, com o nome de união estável. Também foi estendida proteção estatal aos vínculos monoparentais, formados por um dos pais com seus filhos.

Na esteira das inovações introduzidas, Lôbo (2008, p. 58) lembra que, além das entidades familiares expressamente previstas na Constituição (artigo 226), para determinados fins legais, o direito também atribui a alguns grupos sociais a qualidade de entidades familiares, a exemplo da Lei 8.009/90 que, ao dispor sobre a impenhorabilidade do bem de família, deixa amplo o conceito de entidade familiar, conforme se verifica na redação do seu artigo 1º:

Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei. (BRASIL, 1990, grifo nosso)

Verifica-se também essa característica na Lei 8.425/91, que dispõe sobre locação de imóveis urbanos, relativamente à proteção da família, que inclui todos os residentes que vivam na dependência econômica do locatário. Peculiaridade ainda prevista nos artigos 183 e 191 da Constituição Federal, que garante a usucapião especial em benefício do grupo familiar que possua o imóvel urbano e rural como moradia. E a Lei 11.340/06 que no seu artigo 5º define o âmbito da família como “a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa” (LÔBO, 2008, p. 58).

Sobre a interpretação conferida ao artigo 226 da Constituição, Lôbo (2008, p. 58- 59) afirma que a maioria dos civilistas o toma como numerus clausus, ou seja, defende que a Constituição não admite outros tipos de entidades familiares além das previstas no aludido artigo. Todavia, o autor acredita na superação do numerus clausus das entidades familiares, tendo em vista a dimensão das normas e princípios contidos no artigo 226 da Constituição Federal. Referida divergência voltará a ser abordada de forma mais detalhada no próximo capítulo.

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