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Nova definição de entidade familiar trazida pela Lei nº 11.340/06 - Lei de violência doméstica e familiar contra mulher

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA CAMILA GABRIELA PIRES

NOVA DEFINIÇÃO DE ENTIDADE FAMILIAR TRAZIDA PELA LEI Nº 11.340/06 – LEI DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

Tubarão 2011

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CAMILA GABRIELA PIRES

NOVA DEFINIÇÃO DE ENTIDADE FAMILIAR TRAZIDA PELA LEI Nº 11.340/06 – LEI DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Linha de Pesquisa: Justiça e Sociedade

Orientador: Prof. Maurício Daniel Monçons Zanotelli, Msc.

Tubarão 2011

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CAMILA GABRIELA PIRES

NOVA DEFINIÇÃO DE ENTIDADE FAMILIAR TRAZIDA PELA LEI Nº 11.340/06 – LEI DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

Esta monografia foi julgada adequada à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovada em sua forma final pelo Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Tubarão, 16 de junho de 2011.

______________________________________________ Prof. e orientador Maurício Daniel Monçons Zanotelli, Msc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

_______________________________________________ Prof. Lester Marcantonio Camargo, Msc.

Universidade do Sul de Santa Catarina

________________________________________________ Prof. Erivelton Alexandre Mendonça Fileti, Esp.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, primeiramente, por sempre iluminar meu caminho.

Aos meus pais, Belmont e Eloir, por todo o amor, apoio e paciência, e por terem proporcionado meus estudos, ainda que isso lhes custasse a privação de suas próprias vontades.

As minhas irmãs, Ana Cristina e Mara Lúcia, que sempre me incentivaram e estiveram dispostas a me auxiliar.

Ao meu orientador, Professor Maurício Daniel Monçons Zanotelli, pela dedicação e confiança em mim depositada, e por nunca ter dispensado sabedoria e paciência em me ensinar.

Aos Professores, verdadeiros Mestres, que sempre conduziram as aulas com grande empenho e paciência.

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“A todos que têm sensibilidade para ver que o afeto é uma realidade digna de tutela e coragem para se buscar uma Justiça mais justa.” (Maria Berenice Dias)

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RESUMO

No presente estudo o tema abordado é “nova definição de entidade familiar trazida pela Lei nº 11.340/06 – Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher”, cujo objetivo geral é elucidar a nova definição de entidade familiar trazida em decorrência da promulgação da Lei nº 11.340/06, direcionando, ainda, ao reconhecimento da homoafetividade como núcleo familiar. Para alcançar tal objetivo foi utilizado o método de abordagem dedutivo, partindo de um conceito de entidade familiar de maneira geral e ampla, para, em seguida, analisá-lo de forma particular. Quanto ao nível de profundidade ou objetivo do estudo, a presente pesquisa se classifica como exploratória, já que, ao estudar o conceito hodierno de família, busca uma familiarização com o objeto de estudo. No tocante ao procedimento utilizado na coleta de dados, a presente pesquisa classifica-se como bibliográfica, uma vez que se fundamenta nas teorias publicadas em diversas fontes, tais como livros, artigos, meios eletrônicos, os quais formam o embasamento teórico e orientam todo o desenvolvimento do trabalho. Do estudo constatou-se que, não obstante tenha se furtado a regular as relações entre pessoas do mesmo sexo, a Constituição não as proibiu. Assim, conclui-se que a Lei nº 11.340, promulgada em 07 de agosto de 2006 – Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher – ampliou o conceito de entidade familiar, bem como se vislumbra possível referido conceito permear o ordenamento jurídico pátrio e este, por sua vez, reconhecer a união homoafetiva como entidade familiar.

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ABSTRACT

In this study the subject is "new definition of family unit brought about by Law n. 11.340/06 - Law of Domestic and Family Violence against women", whose general objective is to elucidate the new definition of a family unit brought in because of the enactment of Law n. 11.340/06, directing, although the recognition of homosexuality as family units. To achieve this was used the method of deductive approach, based on a concept of a family unit in general and broad, to, then, analyze it in particular. The level of depth or purpose of the study, this research is classified as exploratory and behold, when studying the modern concept of family, seeks to familiarize them with the object of study. Regarding the procedure used in data collection, this research is classified as literature, since it is based on the theories published in various sources such as books, papers, electronic media, which form the theoretical foundation and guide all the development work. The study found that, despite having been remiss in regulating relations between persons of the same sex, the Constitution does not prohibited them. Thus, we conclude that the Law n. 11.340, promulgated on August 7, 2006 - Law and Domestic Violence against Women - expanded the family entity, as well as a glimpse possible that concept to permeate the legal mother and this in turn, recognize the homosexuality union as a family entity.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA ... 9

1.2 JUSTIFICATIVA... 12 1.3 OBJETIVOS ... 13 1.3.1 Objetivo geral ... 13 1.3.2 Objetivos específicos ... 13 1.4 CONCEITOS OPERACIONAIS ... 13 1.5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 16 1.5.1 Método ... 16 1.5.2 Tipo de pesquisa ... 16

1.6 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS .17 2 BREVE DIGRESSÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE FAMÍLIA NO BRASIL...19

2.1 A FAMÍLIA NO DIREITO ROMANO ... 20

2.2 A FAMÍLIA NO DIREITO CANÔNICO ... 21

2.3 A FAMÍLIA NAS PRIMEIRAS CONSTITUIÇÕES DO BRASIL ... 23

2.4 O CÓDIGO CIVIL DE 1916 ... 25

2.5 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ... 27

2.6 O CÓDIGO CIVIL DE 2002 ... 29

2.7 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO DAS FAMÍLIAS ... 30

2.7.1 Princípio da dignidade da pessoa humana ... 31

2.7.2 Princípio da solidariedade familiar ... 32

2.7.3 Princípio da igualdade entre o homem e a mulher ... 33

2.7.4 Princípio da liberdade às relações de família ... 34

2.7.5 Princípio do pluralismo das entidades familiares ... 35

2.7.6 Princípio do planejamento familiar ... 36

2.7.7 Princípio da afetividade ... 37

3 NOVOS CONCEITOS DE FAMÍLIA NA SOCIEDADE BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA ... 39

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3.2 UNIÕES HOMOAFETIVAS ... 44

3.3 DECISÕES JUDICIAIS PÁTRIAS EM MATÉRIA RELATIVA ÀS UNIÕES HOMOAFETIVAS ... 48

3.4 PROJETOS DE LEI EM TRAMITAÇÃO NO BRASIL DESTINADOS A REGULAMENTAR AS UNIÕES HOMOAFETIVAS ... 56

3.5 RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ... 58

4 NOVA DEFINIÇÃO DE ENTIDADE FAMILIAR TRAZIDA PELA LEI Nº 11.340/2006 ... 60

4.1 BREVES NOÇÕES SOBRE A LEI Nº 11.340/06 ... 60

4.2 CONCEITO DE ENTIDADE FAMILIAR NA LEI Nº 11.340/06 ... 61

4.3 CONCEITO HODIERNO DE FAMÍLIA ... 62

5 CONCLUSÃO ... 70

REFERÊNCIAS ... 73

ANEXO ... 80

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho monográfico tem por objetivo elucidar a nova definição de entidade familiar trazida em decorrência da promulgação da Lei nº 11.340/06 – Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher, direcionando, ainda, ao reconhecimento da homoafetividade como núcleo familiar.

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

Análise da nova definição de entidade familiar trazida pela Lei nº 11.340/06 – Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher, bem como da possibilidade de tal conceito permear o ordenamento jurídico pátrio e este, por sua vez, reconhecer a união homoafetiva como entidade familiar.

A Lei nº 11.340/06, segundo Souza (2008, p. 13), representa uma mudança cultural e jurídica, implantada no ordenamento jurídico brasileiro, que reflete uma preocupação universal e busca alcançar a erradicação da contumaz violência praticada contra mulheres, principalmente no âmbito das relações domésticas e familiares.

A Lei nº 11.340/06, em seu artigo 2º, dispõe que:

Art. 2o Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. (BRASIL, 2006a).

A violência doméstica e familiar contra a mulher encontra-se descrita no artigo 5º da mesma lei, in verbis:

Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

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Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. (BRASIL, 2006a).

Violência doméstica é toda aquela que acontece no seio de uma família. O parágrafo único do artigo 5º supracitado reitera que independem de orientação sexual todas as situações que configuram violência doméstica e familiar.

Embora tal dispositivo seja pouco esclarecedor, doutrinadores têm afirmado que a Lei nº 11.340/06 reconhece as relações homoafetivas como abrangidas no conceito lato de família, merecendo, portanto, proteção legal (PORTO, 2007, p. 35; DIAS, 2007, p. 35). Como, a partir desta lei, está assegurada a proteção a fatos que ocorrem no ambiente doméstico, as uniões de pessoas do mesmo sexo são consideradas entidades familiares (DIAS, 2007, p. 35).

Verifica-se que esta norma infraconstitucional, ao tempo em que trouxe formas de proteção à violência doméstica e familiar contra a mulher, pareceu ampliar o conceito de família existente, ao definir, em seu artigo 5º, o âmbito da família e as relações que configuram violência doméstica e familiar. De acordo com a referida lei, o âmbito familiar abarca todo e qualquer agrupamento de pessoas no qual permeie o elemento afeto, ou seja, todo grupo em que seus membros se considerem como familiares, bem como aqueles formados pela vontade expressa dos indivíduos.

Registre-se, contudo, que não obstante tal conceito se adeque ao moderno conceito de família, a Constituição Federal prevê, em seu artigo 2261, apenas a família oriunda do casamento, da união estável e da entidade monoparental, não havendo previsão legal para qualquer outra forma de constituição familiar.

Neste sentido, segundo Venosa (2006, p. 1-2), o direito das famílias estuda:

[...] em síntese, as relações das pessoas unidas pelo matrimônio, bem como daqueles que convivem em uniões sem casamento; dos filhos e das relações destes com os pais, da sua proteção por meio da tutela e da proteção dos incapazes por meio da

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Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio

§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. (BRASIL, 1988).

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curatela. [...] O casamento ainda é o centro gravitador do direito de família, embora as uniões sem casamento tenham recebido parcela importante dos julgados nos tribunais, nas últimas décadas, o que se refletiu decididamente na legislação. Ainda, ensina o mesmo doutrinador que o “Código Civil de 2002 procura fornecer uma nova compreensão da família, adaptada ao novo século, embora tenha ainda com passos tímidos nesse sentido.” (VENOSA, 2006, p. 11).

Mas lembra o autor que “importa considerar a família em conceito amplo, como parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas unidas por vínculo jurídico de natureza familiar” (VENOSA, 2006, p. 2).

Em todos os casos, há características comuns, sem as quais não configuram entidades familiares, quais sejam: a afetividade, como fundamento e finalidade da entidade, com desconsideração da variável econômica; a estabilidade, excluindo-se os relacionamentos casuais, episódicos ou descomprometidos, sem comunhão de vida; e a ostensibilidade, o que pressupõe uma unidade familiar que assim se apresente publicamente (LÔBO, 2002).

No tocante às uniões homoafetivas, estas podem apresentar referidas características da mesma forma que as uniões heterossexuais. O casal pode conjugar o mesmo afeto, ter interesses e planos comuns da mesma forma que um casal heterossexual. Como demonstrado, se a Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher realmente ampliou a definição de entidade familiar, como defendem alguns doutrinadores, alcançou as uniões de pessoas do mesmo sexo, uma vez que também estão presentes nestas o elemento afeto. Ademais, constata-se que as uniões homoafetivas são constituídas por vontade expressa, o que as inclui na previsão legal do artigo 5º, II, da Lei nº 11.340/06, retro transcrito.

O tema homossexualidade é um tema gerador de grande polêmica, uma vez que desperta acalorados debates e diferentes opiniões na sociedade. Muito embora sua existência remonte à Grécia antiga e ao Império Romano, os entendimentos acerca do assunto não parecem estar perto de se construir um posicionamento unânime.

A união afetiva das pessoas do mesmo sexo é um fato que se impõe e não pode ser negado, entretanto, ainda não mereceu a atenção do legislador pátrio (DIAS, 2009, p. 96).

Percebe-se, ao longo da história, que o conceito de grupo familiar vem sendo alterado, tendo em vista a adequação do ser humano à realidade da sociedade. Todavia, ainda não há normas suficientes que prevejam todas as situações, sendo de fundamental importância leis que tutelem as diversas espécies de entidade familiar existentes.

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Poderia o conceito de entidade familiar trazido pela Lei nº 11.340/06 permear o ordenamento jurídico pátrio e este, por sua vez, reconhecer a união homoafetiva como entidade familiar?

1.2 JUSTIFICATIVA

Hodiernamente, há diversas relações familiares que não são previstas juridicamente de forma expressa. Entretanto, as transformações que ocorrem na sociedade desencadeiam um processo de transformação dos conceitos jurídicos. A estrutura jurídica de uma sociedade não é estática, uma vez que o Direito é uma realidade histórico-cultural, constituído pelo fato, valor e norma, elementos dinâmicos, que se amoldam ao contexto social ao qual estão inseridos.

As uniões afetivas entre pessoas do mesmo sexo merecem regulamentação, vez que:

[...] existem e continuarão a existir, independentemente do reconhecimento positivo do Estado. E, se o direito se mantém indiferente, de tal atitude emergirá indesejada situação de insegurança. Mais do que isso, a indiferença do Estado é apenas aparente e revela, na verdade, um juízo de desvalor. Na medida em que o relacionamento íntimo entre duas pessoas do mesmo sexo pode ter efeitos jurídicos relevantes, é mais razoável que se faça uma abordagem jurídica e técnica da questão, e não uma análise moral, porque esta última, além de ser excessivamente subjetiva, concluirá pela negativa de qualquer efeito útil (DIAS, 2009, p. 133).

A Constituição Federal veda discriminações de qualquer ordem e concede especial proteção à família, entretanto, reconhece apenas a união entre um homem e uma mulher. No entanto, verifica-se que tal omissão não significa dizer que a união homoafetiva não possa ser tutelada pelo Estado, já que, conforme motivos supracitados, a Constituição, embora não tenha previsto de forma expressa todas as situações existentes, inovou ao possibilitar a inclusão de outras formas de constituição familiar, por meio do conceito pluralista de família contido em seu artigo 226, que não veda a inclusão de outras formas de família.

Neste ínterim, justifica-se a presente pesquisa e torna-se importante verificar o que mudará no ordenamento jurídico pátrio a partir do avanço no conceito de entidade familiar trazido pela Lei nº 11.340/06.

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1.3 OBJETIVOS

1.3.1 Objetivo geral

Analisar a nova definição de entidade familiar trazida pela Lei nº 11.340/06 – Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, bem como a possibilidade ou não deste conceito permear o ordenamento jurídico pátrio para englobar a união homoafetiva como entidade familiar.

1.3.2 Objetivos específicos

Os objetivos específicos da monografia são:

a) apresentar de forma breve a evolução histórica do conceito de família no Brasil;

b) identificar o atual conceito de entidade familiar existente no ordenamento jurídico pátrio;

c) discorrer acerca dos novos conceitos de família na sociedade contemporânea, analisando-se decisões judiciais referentes às uniões homoafetivas, bem como projetos de leis;

d) apresentar breves noções acerca da Lei nº 11.340/2006;

e) identificar o novo conceito de entidade familiar trazido pela Lei nº 11.340/2006;

f) discutir a possibilidade do conceito de família trazido pela Lei nº 11.340/2006 permear o ordenamento jurídico brasileiro, bem como a possibilidade de reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar.

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A fim de elucidar algumas terminologias utilizadas ao longo do presente trabalho, bem como para evitar ambiguidades, elencam-se alguns termos com suas respectivas definições operacionais que assumem no curso do estudo.

Violência doméstica. Apresenta-se com o mesmo significado de “violência familiar”. Para se chegar ao conceito de violência doméstica é necessária a conjugação dos artigos 5º e 7º2 da Lei nº 11.340/2006, interpretando-os conjuntamente. Assim, compreende-se que violência doméstica é qualquer das ações elencadas no artigo 7º da referida lei, quais sejam, violência física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral, praticada contra a mulher em razão de vínculo de natureza familiar ou afetiva (DIAS, 2007, p. 40).

Ainda, conforme ensinamento de Souza (2008, p. 35) tal termo refere-se:

[...] aos atos de maltrato desenvolvidos no âmbito domiciliar, residencial ou em relação a um lugar onde habite um grupo familiar, enfatizando prioritariamente, portanto, o aspecto espacial no qual se desenvolve a violência, ou seja, é um conceito que não se ocupa do sujeito submetido à violência, entrando no seu âmbito não só a mulher mas também qualquer outra pessoa integrante do núcleo familiar (principalmente mulheres, crianças, idosos, deficientes físicos ou deficientes mentais) que venha a sofrer agressões físicas ou psíquicas praticadas por outro membro do mesmo grupo.

Entidade familiar. A Constituição Federal reconheceu a família como base da sociedade e enumerou as formas de composições familiares, chamadas entidades familiares. Referida enumeração se encontra no artigo 226 da Carta Magna: união estável (226, § 3º), família monoparental (226, § 4º) e no caput, a família decorrente do casamento.

Dessa forma, as entidades familiares são aquelas que preenchem os requisitos de afetividade, estabilidade e publicidade, ou seja, que tenham como fundamento e finalidade a

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Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a

comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação,

chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (BRASIL, 2006a).

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entidade, não sejam relacionamentos casuais e que a unidade familiar assim se apresente publicamente.

União estável. A família instituída pela união estável é a decorrente da convivência pública, contínua e duradoura entre um homem e uma mulher, formada com o objetivo de constituição de família, nos termos do artigo 17233 do Código Civil.

Conforme lição de Wald (2005, p. 318), com o advento da Constituição Federal, outorgou-se status de entidade familiar à união estável. Inicialmente, o instituto foi regulado pela Lei nº 8.971/94 e, posteriormente, pela Lei nº 9.278/96, sendo estas revogadas pelo Código Civil de 2002, que disciplinou integralmente a matéria (artigos 1723 a 1727). O autor ensina, ainda, que a união estável, conceituada pelo artigo 1723 do Código Civil, relaciona os seguintes pressupostos:

a) diversidade de sexo; b) convivência pública, contínua e duradoura; c) a existência de relação estabelecida com objetivo de constituição de família; d) ausência de impedimento para contrair matrimônio (art. 1.521 do CC), não se aplicando o inciso VI no caso de a pessoa se achar separada de fato.

Família monoparental. Conforme artigo 226, §4º, da Constituição Federal, é aquela família constituída apenas pelo pai ou pela mãe e seus filhos biológicos e/ou adotivos.

Afeto. Do latim, affectus, significa afeição por alguém; inclinação, simpatia, amizade, amor (FERREIRA A.; SILVEIRA; FERREIRA, M., 1999, p. 33).

Afeição e afeto têm origem nas palavras affectio ou affectus, compostas da preposição ad, que significa “para”, e de uma forma nominal do verbo facere, que significa “fazer”. Segundo Barros (2001 apud DIAS, 2009, p. 129) “feito para traduz o fato de ser ou estar um feito para o outro, mutuamente”.

Uniões homoafetivas. Embora não sejam regulamentadas pela legislação brasileira, ocorrem com cada vez mais frequência atualmente e se caracterizam como sendo a união de duas pessoas do mesmo sexo, que apresenta todas as características de um relacionamento, ou seja, um convívio público, duradouro e com objetivo de constituir família, conceito este que muito se assemelha com o da união estável.

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Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.

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1.5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Pesquisa é um processo de investigação que tem por objetivo estabelecer uma série de compreensões a fim de construir respostas para as indagações e questões levantadas.

Para que a pesquisa seja definida como científica, é necessário que seu objeto seja estudado de forma sistemática, seguindo um planejamento que deve ser previamente estabelecido pelo pesquisador.

No momento do delineamento da pesquisa, o investigador estabelece os meios técnicos da investigação, prevendo-se os instrumentos e os procedimentos necessários utilizados para a coleta de dados.

1.5.1 Método

Para cada pesquisa a ser realizada, será necessário um método específico para se obter os dados. Os métodos de abordagem, segundo Leonel e Motta (2007, p. 66), “estão vinculados ao plano geral do trabalho, ao raciocínio que se estabelece como fio condutor na investigação do problema de pesquisa”.

O desenvolvimento do trabalho dar-se-á de acordo com o método dedutivo, ou seja, parte de argumentos gerais para argumentos específicos. A presente pesquisa estudará o conceito de entidade familiar de maneira geral e ampla, para, em seguida, analisá-lo de forma particular. Parte-se de argumentos que se consideram verdadeiros e inquestionáveis para se obter conclusões formais, podendo-se chegar a um resultado necessário que é a conclusão.

1.5.2 Tipo de pesquisa

A classificação dos tipos de pesquisa é feita mediante o estabelecimento de alguns critérios. Quanto ao nível de profundidade ou objetivo do estudo, a presente pesquisa se

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classifica como exploratória, já que, ao estudar o conceito hodierno de família, busca uma familiarização com o objeto de estudo.

A pesquisa exploratória tem por objetivo a demonstração geral sobre um determinado fato, no caso o tema da pesquisa, de maneira aproximativa, sendo, em geral, utilizada quando tal tema ainda é incipiente, pouco desenvolvido na comunidade acadêmica, tornando complicada a formulação de hipóteses precisas e operacionalizáveis (GIL, 1999, p. 43).

Nesta acepção, no caso em tela, analisa-se a possibilidade de ampliação do conceito de família no ordenamento jurídico brasileiro, por força da Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, bem como a possibilidade de reconhecimento das uniões homoafetivas.

No tocante ao procedimento utilizado na coleta de dados, a presente pesquisa classifica-se como bibliográfica, uma vez que se fundamenta nas teorias publicadas em diversas fontes, tais como livros, artigos, meios eletrônicos, os quais formam o embasamento teórico e orientam todo o desenvolvimento do trabalho.

Conforme Manzo (1971, p. 32 apud LAKATOS; MARCONI, 1991, p. 183), a pesquisa bibliográfica:

[...] oferece meios para definir, resolver, não somente problemas já conhecidos, como também explorar novas áreas onde os problemas não se cristalizaram suficientemente. [...] Dessa forma, a pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras.

Ainda, segundo Leonel e Motta (2007, p. 114) “A realização da pesquisa bibliográfica é fundamental para que se conheça e analise as principais contribuições teóricas sobre um determinado tema ou assunto”.

Neste sentido, é esse o objetivo da presente pesquisa ao analisar, por meio do estudo dos princípios constitucionais, da opinião de diversos doutrinadores e do que vem entendendo os tribunais brasileiros, a possibilidade do conceito de família trazido pela Lei nº 11.340/06 – Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher – permear o ordenamento jurídico pátrio e este, por sua vez, reconhecer a união homoafetiva como entidade familiar.

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O desenvolvimento da monografia foi estruturado em três capítulos.

No primeiro capítulo, foi apresentada breve digressão histórica do conceito de família no Brasil. Revelados aspectos essenciais de seu arcabouço histórico-conceitual, passou-se à abordagem cronológica da entidade familiar sob a ótica do sistema jurídico pátrio. Na sequência, foram abordados alguns princípios considerados norteadores do direito das famílias e consagrados pela Magna Carta.

No capítulo seguinte, foram apresentados os novos conceitos de família na sociedade brasileira contemporânea, advindos com a Constituição Federal de 1988, que reconheceu as uniões extramatrimoniais, até então marginalizadas pela lei, em especial a união estável, instituto cujas características mais se assemelham à união homoafetiva. Em seguida, abordou-se a união homoafetiva, bem como foram colacionadas algumas decisões judiciais pátrias relativas ao reconhecimento destas e seus efeitos. Abordaram-se, ainda, os projetos de lei em tramitação no Brasil destinados a regulamentar as uniões homoafetivas, bem como o reconhecimento da união homoafetiva pelo Supremo Tribunal Federal.

No último capítulo, foram apresentadas breves noções sobre a Lei nº 11.340/06, a definição de entidade familiar presente nesta, bem como o conceito hodierno de família, no tocante à ampliação da definição de entidade familiar e ao reconhecimento da homoafetividade como núcleo familiar.

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2 BREVE DIGRESSÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE FAMÍLIA NO BRASIL

Na história da humanidade, encontram-se agrupamentos humanos em todas as culturas. Do início ao fim da vida é indiscutível a necessidade do indivíduo em relacionar-se com o outro. Ao longo da existência, o ser humano acumula inúmeros relacionamentos, a partir dos quais se envolve mais ou menos até identificar-se afetivamente com alguém em especial e constituir um início de vida em conjunto.

Em família, dá-se dos primeiros aos últimos passos da existência humana. Entende-se que é no seio familiar onde ocorrem as primeiras lições para a vida, as quais servirão para a formação do caráter e da personalidade do indivíduo.

Corroboram este pensamento as palavras de Oliveira (2002, p. 20) para quem: Sem sombras de dúvidas que a família na sociedade destaca-se para o homem como o seu mais importante elo de ligação no relacionamento social, pois é no seio dela que ele surge, recebe a proteção indispensável para a continuidade da vida e se prepara para os embates que o futuro lhe reserva em termos de subsistência, evolução pessoal e material que a humanidade busca sem cessar, como fator de seu desenvolvimento e progresso contínuo.

Em termos de organismo social a família é o mais antigo. Por se relacionar e interagir com a sociedade, a família passa por um processo ininterrupto de transformações durante sua evolução.

Como instituição social, a família é uma entidade anterior ao Estado, à religião e ao direito que hoje a regulamenta, resistiu a todas as transformações econômicas, sociais, científicas e culturais que sofreu a humanidade, através da história da civilização, sobrevivendo praticamente incólume desde a sua estrutura mais simples até obter os contornos que hoje apresenta (OLIVEIRA, 2002, p. 22).

A despeito da perpetuação da ideia nuclear do que seja a entidade familiar, Lôbo (2008, p. 56) adverte que “Várias áreas do conhecimento, que têm a família ou as relações familiares como objeto de estudo e investigação, identificam uma linha tendencial de expansão do que se considera entidade ou unidade familiar”.

A par de tais considerações, precede a temática específica, uma breve digressão histórica do conceito de família no Brasil, bem como dos princípios constitucionais norteadores do direito das famílias.

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2.1 A FAMÍLIA NO DIREITO ROMANO

A família brasileira sofreu influência principalmente da família romana e canônica.

Em Roma, a família era organizada sob o princípio da autoridade. Segundo Ribeiro (2002), o pater famílias, que era o ascendente comum mais idoso, exercia sua autoridade sobre todos os seus descendentes não emancipados, bem como sobre a mulher, que era totalmente subordinada à autoridade marital. A família era uma unidade econômica, religiosa, política ou jurisdicional. O Estado Romano pouco interferia no grupo familiar, que era de responsabilidade do pater.

Alguns estudiosos alegam que, num primeiro momento da história Romana, a família teria vivido sob a autoridade feminina, com fundamento no parentesco gerado pela uterinidade e em razão de a mulher ser considerada o centro criador da família. A liderança da família romana teria sido retirada das mulheres e dada aos homens, criando-se um novo sistema familiar. Todavia, não existem registros históricos românicos que comprovem tal informação (RIBEIRO, 2002).

Ainda, segundo a mesma autora, em Roma, o homem era considerado o chefe político, religioso e juiz. “A própria expressão família, que deriva do latim famulus, se referia ao conjunto de escravos domésticos e bens postos à disposição do pater”.

Ao casar, a mulher podia continuar sob a autoridade paterna e ligada à família de seu pai, no chamado casamento sem manus, ou entrar na família marital, no chamado casamento com manus. Nesse caso, a mulher e seu patrimônio passavam a pertencer e ser administrados pelo marido (RIBEIRO, 2002).

No Império, registra Wald (2005, p. 11) que o Estado limita a autoridade do pater, podendo este aplicar apenas penas moderadas e permitindo que os descendentes recorressem ao magistrado no caso de abuso do pater. A mãe passa a ser autorizada a ficar com a guarda dos filhos e a ter direitos sucessórios na herança do filho, tornando-se herdeira legal na ausência de descendentes e de irmãos consanguíneos do falecido.

O casamento com manus foi sendo substituído pelo casamento sem manus, ocorrendo uma emancipação gradual e progressiva da mulher romana. Na época imperial, a mulher começa a participar da vida social e política, não ficando mais adstrita às funções

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familiares. O feminismo se revela principalmente na vida esportiva, na qual as mulheres participam de caças e outros esportes (WALD, 2005, p. 11-12).

Corrompida pela riqueza, essa fase corresponde à dissolução da família romana, multiplicando-se os adultérios e os divórcios. Para os romanos, desde a celebração do casamento até enquanto este perdurasse, era necessária a affectio. O consentimento das partes deveria ser continuado e não apenas inicial. Assim, a ausência da afeição era causa necessária para a dissolução do casamento pelo divórcio (GONÇALVES, 2009, p. 15).

Neste contexto, a perspectiva histórica engendrada deve prosseguir, a fim de revelar a evolução do conceito de entidade familiar.

2.2 A FAMÍLIA NO DIREITO CANÔNICO

A partir da Idade Média, a Igreja começou a interferir de forma decisiva nos institutos familiares e as relações de família se regiam exclusivamente pelo direito canônico, haja vista que, do século X ao século XV, o casamento religioso era o único conhecido (RIBEIRO, 2002).

Segundo Luz (2002, p. 23), foi sobre família, mais especificamente acerca do matrimônio, que a Igreja mais legislou. E o direito canônico:

[...] nada mais é que o conjunto de cânones, expressão esta utilizada pela Igreja para denominar as suas normas jurídicas, para efeito de diferenciá-las das leis do Estado. Desse modo, constituíam os cânones em normas supletivas, usadas para complementar as leis do Estado sempre que estas fossem omissas.

Para a doutrina canônica, observa Wald (2005, p. 13), o matrimônio não era apenas um contrato, mas também um sacramento, reconhecendo-se a indissolubilidade do vínculo e discutindo-se a possibilidade de divórcio apenas em relação aos infiéis, caso em que o casamento não se revestia de caráter sagrado.

Uma vez que o casamento era indissolúvel, o direito canônico buscou estabelecer um sistema de impedimentos para a sua realização, justificando a sua nulidade ou a sua anulabilidade. A Igreja exigia para a validade do casamento apenas o consenso dos nubentes e as relações sexuais voluntárias. Já o direito civil leigo, por motivos de ordem política, considerava como requisitos essenciais para a realização do casamento e sua validade o consentimento paterno (WALD, 2005, p. 13-14).

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Entre os impedimentos para a realização do casamento no direito canônico, conforme Wald (2005, p. 14), estavam a incapacidade (idade, diferença de religião, impotência, casamento anterior), o vício do consentimento (dolo para obter o consentimento matrimonial, coação ou erro quanto à pessoa do outro cônjuge) e a relação anterior (parentesco, afinidade).

A separação do direito canônico não importava na dissolução do vínculo e era um ato judiciário da autoridade religiosa, distinguindo-se do divórcio romano ou judaico, para os quais o divórcio constituía um ato privado contra o qual a parte prejudicada podia recorrer à autoridade judiciária. Somente após o século XIV é que se admitiu a separação no caso de acordo entre os cônjuges (WALD, 2005, p. 14-15).

Também a separação de corpos dependia de autorização do bispo ou sínodo (reunião de padres), sendo admitida apenas em alguns casos, como o adultério, heresia (atitudes contrárias à religião), tentativas de homicídio ou sevícias (maus-tratos) de um cônjuge em relação ao outro (WALD, 2005, p. 15).

No fim da Idade Média, segundo o mesmo autor, os tribunais civis e religiosos entraram em conflito quanto a aspectos patrimoniais do direito de família e em relação aos seus efeitos pessoais. Como reação, de 1542 a 1563, os católicos se reuniram em Trento e publicaram as normas do Concílio, reafirmando solenemente o caráter sacramental do casamento, reconhecendo a competência exclusiva da Igreja Católica e das autoridades eclesiásticas para a sua celebração e validação.

As conclusões do Concílio de Trento tiveram máxima importância na evolução do direito de família dos países católicos, especialmente nos que o receberam. Mesmo de maneira indireta, referido concílio exerceu importante influência, em alguns países, como a França, por exemplo, em que tais deliberações jamais foram explicitamente aceitas pelo legislador (WALD, 2005, p. 15-16).

Segundo o mesmo autor, na época do Renascimento, fortalecendo-se a autoridade do rei, o Estado reivindicou a competência para julgar as questões referentes ao direito de família. Por outro lado, com o aumento dos cidadãos não católicos e com as influências dos países protestantes e de seus imigrantes, levou o Estado a admitir, ao lado do casamento religioso, o casamento civil.

Sem prejuízo do reconhecimento do casamento religioso, a concepção leiga do casamento passou a preponderar. Todavia, os conceitos básicos elaborados pela doutrina

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canônica foram conservados pelo direito leigo de família, ainda hoje encontrados no direito brasileiro (WALD, 2005, p. 17).

Revelados aspectos essenciais de seu arcabouço histórico-conceitual, passa-se à abordagem cronológica da entidade familiar sob a ótica do sistema jurídico pátrio.

2.3 A FAMÍLIA NAS PRIMEIRAS CONSTITUIÇÕES DO BRASIL

Nossa primeira Constituição, elaborada no período imperial, em 1824, não trouxe normas relativas à família brasileira, sua forma de constituição e ignorou o instituto do casamento, tanto o religioso como o civil, tratando apenas da família imperial e permitindo que as demais fossem instituídas livremente. (OLIVEIRA, 2002, p. 32)

Já a Constituição promulgada em 1891, embora também não tenha inserido um capítulo específico para o direito de família, estabeleceu que somente seria reconhecido o casamento civil, conforme seu artigo 72, §4º que afirmava que “A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita”. (OLIVEIRA, 2002, p. 35)

O aludido dispositivo demonstra que o Estado estava se posicionando firmemente contra as normas canônicas e, conforme ensina Oliveira (2002, p. 35):

[...] retirando da Igreja Católica o direito ao controle do ato jurídico válido do casamento e continuando a dar clara conotação de ilegalidade à cerimônia religiosa do casamento celebrada perante o credo religioso, até então considerado como religião oficial pelo direito constitucional imperial. Por ser pomposa a cerimônia do casamento, ela constituía um dos mais fortes instrumentos de influência do credo católico sobre a vida privada dos brasileiros.

Tal posicionamento já havia sido antecedido pelo Decreto 181, de 24 de janeiro de 1890, que instaurou o casamento civil e retirou qualquer valor jurídico que o casamento religioso pudesse apresentar.

Por seu turno, o texto da Constituição promulgada em 1934 representou a transição do liberalismo clássico capitalista para o intervencionismo estatal, preocupando-se o legislador em inserir a temática da família, da educação e da cultura (OLIVEIRA, 2002, p. 45).

Entretanto, segundo Jacques (1962, p. 259-260 apud OLIVEIRA, 2002, p. 48), ainda não havia um conceito substancial do que seria família, uma vez que “[...] a Constituição de 1934 preocupou-se mais com o ‘casamento’, origem da família, do que, como

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o devia, com a ‘família’ mesma; ateve-se à formalística e esqueceu-se a substancialidade da instituição”.

O artigo 144 da Constituição de 1934 prescrevia que:

Artigo 144. A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção do Estado.

Parágrafo único. A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação do casamento, havendo sempre recurso ex officio, com efeito suspensivo. (BRASIL, 1934).

Averbe-se que a imposição de constar a indissolubilidade do vínculo do casamento se atribui ao catolicismo, que possuía a maioria dos membros na Assembléia Constituinte de 1934 (OLIVEIRA, 2002, p. 50).

De todo modo, a Constituição de 1934 foi precursora na defesa da instituição da família, reservando para ela um capítulo especial. Seu artigo 146 permitia que o casamento realizado perante ministro de qualquer confissão religiosa produzisse os mesmos efeitos que o casamento civil, desde que o rito do ato não contrariasse a ordem pública ou os bons costumes, fossem observados os preceitos da lei civil e inscrito no Registro Civil (OLIVEIRA, 2002, p. 47).

Já a Constituição de 1937 tratou da família nos artigos 124 a 127 e sofreu pouca alteração, uma vez que foi outorgada pela mesma pessoa que chefiava o governo provisório, quando da elaboração da Constituição de 1934. Entre as mudanças ocorridas, destacam-se:

[...] procurou-se tratar da necessidade da educação da prole com a promessa da colaboração estatal de forma principal ou subsidiária; a questão da igualdade dos direitos dos filhos naturais em relação aos legítimos no que diz respeito à incumbência dos pais e ainda firmou posicionamento de que deveria ser objeto de cuidados e garantias especiais a infância e a juventude, com objetivo de que fosse assegurada às crianças e adolescentes uma vida digna, proporcionando-lhes desenvolvimento harmonioso de suas faculdades. Constata-se que o Estado se posiciona na condição de tutor da infância e juventude, em substituição aos pais na hipótese de caracterização do abandono. (OLIVEIRA, 2002, p. 53-54).

A quarta Constituição republicana, promulgada em 1946, dedicou o Capítulo I, do Título VI, para tratar do tema família, o que abrangia os artigos 163 a 165, trazendo poucas inovações em relação à Constituição de 1934. Manteve-se a tradição do casamento civil, com vínculo indissolúvel e o casamento religioso poderia equivaler ao civil, se inscrito no registro público, mediante prévia habilitação, conforme artigo 163, §2º, direito constitucional previsto na Constituição de 1934 e suprimido na Constituição de 1937 (OLIVEIRA, 2002, p. 57-58).

A Constituição de 1967, no que diz respeito ao tema família, reduziu a apenas um artigo e quatro parágrafos, limitando-se a manter os direitos conferidos na Constituição anterior. Ainda não trazia um conceito de família, conferia proteção jurídica apenas à família

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constituída pelo casamento celebrado de acordo com a lei, que ainda era considerado indissolúvel. (OLIVEIRA, 2002, p. 66-67)

A Constituição promulgada em 17 de outubro de 1969 teve origem na Emenda Constitucional n. 1 à Constituição de 1967, responsável por fazer emendas modificativas, supressivas e aditivas nesta.

Assim, alguns consideram que a Constituição de 1969 foi apenas uma emenda, na qual se reúnem em um único texto diversos pedaços da legislação, criados por meio de atos institucionais desde a decretação da Constituição de 1967. Outros doutrinadores, como José Afonso da Silva, consideram que, na verdade, foi promulgado texto constitucional integralmente reformulado, tendo, inclusive recebido o nome de Constituição da República Federativa do Brasil, enquanto a de 1967 foi denominada apenas de Constituição do Brasil (SILVA, 1998, p. 80 apud OLIVEIRA, 2002, p. 67).

A despeito da divergência aventada, o fato é que, tal qual nos contextos políticos precedentes, a forma de constituição da família permaneceu incólume, à medida que reconhecia apenas o casamento civil, que ainda era considerado indissolúvel. No tocante ao tema família, o texto constitucional permaneceu praticamente inalterado, apenas repetindo no artigo 175 o que constava na constituição anterior.

Em 1977, foi aprovada a Emenda nº 9, regulamentada por intermédio da Lei ordinária federal 6.515/77, denominada “Lei do Divórcio”, após grande debate nacional, com oposição do clero e de alguns juristas nacionais conservadores, que chegaram a apregoar que seria o fim da família brasileira. Essa emenda representou um marco fundamental para o início da modernização do direito de família, permitindo a dissolução do vínculo matrimonial e um novo casamento. A Lei nº 6.515/77 trouxe em seus artigos 35 e 40 a possibilidade do divórcio-conversão e do divórcio direto, normatizou os casos de dissolução da sociedade conjugal, seus efeitos e deu outras providências (OLIVEIRA, 2002, p. 71).

A partir deste breve marco legal, passa-se ao estudo dos estatutos normativos mais representativos no que concerne à família.

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No Brasil, ensina Venosa (2006, p. 16-17) que, a partir do século XIX, os códigos elaborados dedicaram normas relativas à família. A sociedade apresentava grande semelhança com a família da Antiguidade, sendo rural e patriarcal. O homem era considerado o chefe, administrador e representante da sociedade conjugal, enquanto a mulher apenas se dedicava aos afazeres domésticos.

Além disso, conforme o referido autor, por força da influência religiosa, o Estado guardou muitos traços do direito canônico. O Código Civil de 1916 foi fruto direto dessa época. O aludido código, bem como as leis vigentes no século passado, regulavam a família constituída unicamente pelo instituto do matrimônio, de modelo patriarcal e hierarquizada.

O Código de 1916, segundo Ribeiro (2002), disciplinava o direito de família no primeiro livro da parte especial, dividido em três grandes temas: casamento, relações de parentesco e os denominados direitos protetivos (tutela, curatela e ausência).

Não obstante o referido código tenha se furtado a definir o instituto da família, condicionou a sua legitimidade ao casamento civil, sem fazer qualquer alusão ao casamento religioso, consoante artigo 229 que estabelecia que “Criando a família legítima, o casamento legitima os filhos comuns, antes dele nascidos ou concebidos.” (BRASIL, 1916).

Da leitura deste artigo, denota-se que o Código de 1916 consolidou a importância do casamento para a constituição da família legítima. Assim, pode-se observar a existência de duas espécies de família na sociedade: “a família legítima, prevista em lei e baseada no casamento civil, com total amparo legal e proteção estatal; e, a família ilegítima, criada à margem da lei e sem as prerrogativas da primeira” (RIBEIRO, 2002).

Nesse particular, aduz a autora, as famílias consideradas ilegítimas eram as provenientes de uniões livres, como o concubinato. A sociedade sempre atribuiu sentido negativo a esse tipo de união, chegando-se ao ponto de impedir que os filhos incestuosos ou adulterinos fossem reconhecidos.

Assim, verifica-se que o diploma civil de 1916 reconhecia juridicamente apenas o relacionamento matrimonial, afastando qualquer outra forma de relação afetiva e não reservando direito algum às uniões que não fossem formadas pelo casamento, como a união estável. O afeto nas relações familiares tinha pouca relevância jurídica.

A rigidez do Código Civil de 1916 foi se tornando inadequada e desvinculada da realidade social (RIBEIRO, 2002). Nesse diapasão, paulatinamente, por meio de alterações legislativas e constitucionais, o direito das famílias foi ganhando uma nova roupagem, culminando com a Constituição Federal de 1988, como será visto adiante.

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Das legislações posteriores ao diploma civil de 1916, destacam-se a Lei da Adoção (Lei nº 3.133/57), que regulamentou o reconhecimento da adoção como instrumento formador de relação de parentesco, a Lei do Divórcio (Lei nº 6.515/77), que regulou os casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivo processo, bem como o Estatuto da Mulher Casada (Lei nº 4.121/62), que emancipou a mulher casada e inaugurou a igualdade entre os cônjuges (WALD, 2005, p. 22-23).

Conforme norma fundamental, a partir da qual emanam todas as demais normas, faz-se mister, doravante, destacar o texto constitucional vigente.

2.5 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Foi a partir da metade do século XX que o direito passou a seguir rumos próprios, adaptando-se a nossa realidade. A Constituição Federal de 1988 garantiu a transformação que se fazia necessária, uma vez que o Código Civil de 1916 há muito já não retratava o panorama atual da família. Conforme Venosa (2006, p. 17), “A Constituição de 1988 consagra a proteção à família no art. 226, compreendendo tanto a família fundada no casamento, como a união de fato, a família natural e a família adotiva”.

Com efeito, estabelece o artigo 226 da Constituição Federal:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.

§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.

§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. (BRASIL, 1988)

Dentre as mudanças advindas com a Constituição, cumpre ressaltar que a entidade familiar passa a ser plural e não mais singular, tendo várias formas de constituição, o

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reconhecimento da união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, bem como a família monoparental (família constituída apenas pelo pai ou pela mãe e seus descendentes) e a igualdade entre o homem e a mulher no exercício dos direitos e deveres referentes à sociedade conjugal.

Acerca do conceito de família trazido pela Constituição de 1988, ressalta Pereira (1988, p. 25 apud OLIVEIRA, 2002, p. 88):

A relevância do amor, do afeto, do ângulo emocional, da convivência respeitosa, da existência recíproca, do prazer da companhia, do desvelo mútuo, sempre em detrimento da união forçada, artificial, hipócrita, doentia, conflitada, destruidora; eis um parâmetro essencial, alicerçante de quase todas as transformações na família e em sua normatização jurídica. Quer-se autenticidade das relações. Rejeita-se a falsidade.

Nesse contexto é que se verifica que o conceito de família baseado apenas no casamento há muito já não servia para explicar as diversas estruturas familiares existentes. A Constituição Federal de 1988 apenas reconheceu uma evolução que já se manifestava há anos na sociedade brasileira. De acordo com Gomes (2002, p. 34), a nova carta constitucional:

[...] realizou enorme progresso na conceituação e tutela da família. Não aboliu o casamento como forma ideal de regulamentação, mas também não marginalizou a família natural como realidade social digna de tutela jurídica. Assim, a família que realiza a função de célula provém do casamento, como a que resulta da “união estável entre o homem e a mulher” (art. 226, §3º), assim como a que se estabelece entre “qualquer dos pais e seus descendentes”, pouco importando a existência, ou não, de casamento entre os genitores (art. 226, §4º).

Depreende-se que a Constituição de 1988 evoluiu sobremaneira em relação a todas as anteriores. Ao se admitir outras formas de constituição familiar além da tradicionalmente reconhecida, formada por meio do matrimônio, o elemento afeto, embora não tenha recebido valor jurídico, foi reconhecido como fundamental na entidade familiar. Isto porque, não obstante se admita sua constituição de forma livre, ainda se considera que a família é a base da sociedade (artigo 226) e importante elo no relacionamento do homem com esta, como já exposto no início deste capítulo.

Cumpre obtemperar que o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º, III, da Constituição, também trouxe mudança ao paradigma da família. Tal princípio constitui a base da comunidade familiar, garantindo o pleno desenvolvimento e a realização de todos os seus membros. A partir dele, são identificados novos elementos que compõem as relações familiares, dos quais se destacam os vínculos afetivos que norteiam a sua formação. Desde então, a família socioafetiva vem sendo priorizada na doutrina e na jurisprudência.

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2.6 O CÓDIGO CIVIL DE 2002

Após inúmeras mudanças sociais e o advento da Constituição de 1988, foi aprovado o Código Civil de 2002, seguindo o que já determinara a Magna Carta e procurando fornecer uma nova compreensão de família.

O novo Código Civil, Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, cuja entrada em vigor ocorreu em 11 de janeiro de 2003, tem origem no projeto encaminhado ao Congresso Nacional em 1975, ou seja, anteriormente à Constituição Federal. Entretanto, como foram realizadas inúmeras alterações durante sua tramitação, foi adequado à Magna Carta.

Acerca do Código Civil de 2002, enfatiza Dias (2010, p. 31) que:

[...] o projeto necessitou sofrer modificações profundas para adequar-se às diretrizes ditadas pela Constituição. Daí o sem-número de emendas que sofreu, tendo sido bombardeado por todos os lados. Inúmeros remendos foram feitos, o que, ainda assim, não deixou o texto com a atualidade e a clareza necessárias para reger a sociedade dos dias de hoje. [...] Assim, o “novo” Código, embora bem-vindo, chegou velho.

Em conformidade com a Constituição de 1988, a nova legislação civil não faz mais alusão à família legítima ou ilegítima. Para Monteiro (2007, p. 16) “a família tanto pode ser constituída pelo casamento como pela união estável, como, ainda, por um dos genitores e sua prole”.

De outra banda, conforme Monteiro (2007, p. 17), o novo código enfatiza a igualdade dos cônjuges (artigo 1511) nos efeitos pessoais e patrimoniais do casamento, bem como no que se refere à guarda dos filhos e à chefia conjunta da sociedade conjugal. Além disso, elimina discriminações existentes entre os filhos, inclusive no que se refere ao seu reconhecimento, regula a união estável e corrige falhas da Lei nº 6.515/77, no tocante às consequências da separação judicial culposa e não culposa e diminuição dos prazos para a dissolução consensual (artigo 1574) e para a baseada na doença mental do cônjuge (artigo 1572, §2º).

No livro “Do Direito de Família”, assim como em todo o Código Civil, encontram-se dispositivos de proteção à dignidade da pessoa humana, contendo normas amoldadas à Constituição de 1988. O código estabelece no artigo 1566, como dever oriundo do casamento, respeito e consideração mútuos, que tem como objeto os direitos da personalidade do cônjuge. O artigo 1704, estabelece que está sujeito a perda do direito a alimentos somente o cônjuge declarado como responsável na separação judicial, por ter

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descumprido gravemente dever conjugal. Já o parágrafo único do mesmo artigo, como tutela à vida da pessoa humana, prescreve que o cônjuge culpado tem direito a receber alimentos indispensáveis à sua sobrevivência, desde que não tenha parentes em condições de prestá-los ou aptidão para o trabalho. Porém, cessa o direito aos alimentos se o cônjuge cometer procedimento indigno perante o devedor da pensão alimentícia, nos termos do artigo 1708 (MONTEIRO, 2007, p. 19-20).

Outro dispositivo que também parece conferir proteção à dignidade da pessoa humana é o artigo 1584 do Código Civil, que estabelece que a guarda deve ser atribuída a quem revelar melhores condições de exercê-la.

Em linhas gerais, como observa Dias (2010, p. 32), o Código Civil de 2002, buscou atualizar as características principais do direito das famílias, incorporando boa parte das mudanças que haviam ocorrido por meio de legislação esparsa. Entretanto, deixou de dar um passo mais ousado ao eximir-se de “operar a subsunção, à moldura da norma civil, de construções familiares existentes desde sempre, embora completamente ignoradas pelo legislador infraconstitucional”.

Corolários do sistema jurídico vigente, os princípios apresentam-se como parâmetros fundamentais e norteadores deste, o que justifica a imprescindibilidade de serem abordados na seção a seguir.

2.7 PRINCIPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO DAS FAMÍLIAS

Com o advento da Constituição Federal de 1988 houve um avanço no direito brasileiro no que se refere à consagração da força normativa dos princípios constitucionais, superando o efeito simbólico que lhes era atribuído (LÔBO, 2008, p. 34).

Segundo Bonavides (1999, p. 237 apud DIAS, 2010, p. 57), “os princípios constitucionais foram convertidos em alicerce normativo sobre o qual assenta todo o edifício jurídico do sistema constitucional [...]”, deixando de servir apenas de orientação ao sistema jurídico infraconstitucional e tornando-se imprescindíveis para a aproximação do ideal de justiça.

Os princípios constitucionais podem ser expressos ou implícitos, inexistindo hierarquia entre eles. A Constituição consagrou alguns princípios, transformando-os em

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direito positivado. Já a doutrina e a jurisprudência têm reconhecido vários princípios constitucionais implícitos, o que torna difícil enumerar todos os princípios que norteiam o direito das famílias. Por essa razão, não há consenso entre os doutrinadores do direito das famílias sequer quanto à quantidade de princípios (DIAS, 2010, p. 61).

Feita a ressalva, a seguir, elencam-se alguns princípios norteadores do direito das famílias, os quais foram eleitos segundo critérios de pertinência com o tema proposto e conforme constituam os de menor divergência.

2.7.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

O princípio da dignidade da pessoa humana é o princípio maior, fundamental do Estado Democrático de Direito e da ordem jurídica, afirmado já no artigo 1º da Constituição Federal de 1988, in verbis:

Art.1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III – a dignidade da pessoa humana; [...]

(BRASIL, 1988).

O princípio da dignidade humana é o mais universal de todos os princípios, um macroprincípio do qual se irradiam todos os demais e serve de norte ao ordenamento jurídico nacional. Dias (2009, p. 102) anota que está consagrado, ainda, no Preâmbulo da Constituição, no momento em que assegura o direito à igualdade e à liberdade e garante “o exercício dos direitos sociais e individuais, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos”.

Silva (1994, p. 548) conceitua a dignidade da pessoa humana como:

[...] um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. “Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais, observam Gomas Canotilho e Vital Moreira, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade da pessoa humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos cesquecendo-asos de direitos sociesquecendo-ais, ou invocá-lesquecendo-as pesquecendo-aresquecendo-a constituir ‘teoriesquecendo-a do núcleo desquecendo-a personalidade’ individual, ignorando-a quando se trate de direitos econômicos,

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sociais e culturais.” Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim, assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização social (art. 193), à educação ao desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana.

De acordo com Sarlet (1988, p. 60 apud DIAS, 2009, 102-103):

[...] dignidade da pessoa humana é a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, em complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar a promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.

No direito das famílias, referido princípio significa igual dignidade para todas as entidades familiares, sendo “indigno dar tratamento diferenciado às várias formas de filiação ou aos vários tipos de constituição de família” (DIAS, 2010, p. 63).

Na família, a dignidade da pessoa humana encontra:

[...] o solo apropriado para florescer. A ordem constitucional dá-lhe especial proteção independentemente de sua origem. A multiplicação das entidades familiares preserva e desenvolve as qualidades mais relevantes entre os familiares – o afeto, a solidariedade, a união, o respeito, a confiança, o amor, o projeto de vida comum –, permitindo o pleno desenvolvimento pessoal e social de cada partícipe com base em ideais pluralistas, solidaristas, democráticos e humanistas. (DIAS, 2010, p. 63)

A Constituição tutela a família com base no princípio da dignidade humana, explícito em algumas normas, como nos artigos 226, §7º, 227, caput e 230. A entidade familiar não é tutelada para si, o que se busca é o desenvolvimento da dignidade das pessoas humanas que a integram (LÔBO, 2008, p. 39). Em razão disso, o princípio da dignidade da pessoa humana está diretamente ligado ao princípio da solidariedade.

2.7.2 Princípio da solidariedade familiar

A solidariedade dispõe de conteúdo ético, já que o significado da expressão compreende a fraternidade e a reciprocidade (DIAS, 2010, p. 67). A solidariedade compele um a ajudar o outro.

O princípio da solidariedade está fundamentado no artigo 3º, I, da Constituição Federal. No capítulo destinado à família, pode-se perceber a influência do princípio no dever

Referências

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