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A ética é um dos princípios fundamentais que os gregos instituíram para o Ocidente europeu por meio da Filosofia, destacando a consciência e a responsabilidade como condições indispensáveis da vida ética (CHAUÍ, 2000). A autora concebe a ética como “[...] estudo dos valores morais (as virtudes), da relação entre vontade e paixão, vontade e razão; finalidades e valores da ação moral; ideias de liberdade, responsabilidade, dever, obrigação, etc.” (CHAUÍ, 2000, p. 67). Ampliando essa concepção na perspectiva histórica e social, a autora afirma:

Consequentemente, embora toda ética seja universal do ponto de vista da sociedade que a institui (universal porque seus valores são obrigatórios

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Na dinâmica de desenvolvimento da pesquisa, algumas alterações foram realizadas em relação à proposta inicial delineada e são compartilhadas no decorrer deste capítulo.

para todos os seus membros), está em relação com o tempo e a História, transformando-se para responder a exigências novas da sociedade e da Cultura, pois somos seres históricos e culturais e nossa ação se desenrola no tempo (CHAUÍ, 2000, p. 435).

Como pesquisadores, entendemos que os desafios de uma atuação que se fundamenta em princípios éticos requer primeiramente que busquemos fortalecer nossa compreensão dos sentidos que imprimimos a essa questão e, sobretudo, como a traduzimos em nossos posicionamentos diante dos sujeitos de pesquisa.

Numa abordagem mais pragmática, Bogdan e Biklen (1994, p. 75) esclarecem que, “[...] em investigação, a ética consiste nas normas relativas aos procedimentos considerados corretos e incorretos por determinado grupo”. Os autores destacam os diferentes códigos pertencentes às áreas de estudo e pontuam que esses códigos podem tanto ter uma dimensão mais reflexiva e sensível ante os dilemas morais que os pesquisadores podem deparar quanto constituir forma de proteção aos profissionais envolvidos no estudo. Os mesmos autores afirmam que, no caso das pesquisas de abordagem qualitativa, cabe a nós pesquisadores atentarmos para os princípios éticos de “[...] proteção da identidade dos participantes [...]; respeito com os sujeitos [...]; negociação realista da pesquisa [...] e autenticidade ao apresentar os resultados” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 76).

Do ponto de vista da legislação, as questões, no Brasil, relacionadas à ética em pesquisas com seres humanos são principalmente orientadas pela Resolução 466/12, por meio das Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos (que revogou as Resoluções 196/96, 303/2000 e 404/2008) do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Essa resolução toma por princípio o respeito à dignidade, à liberdade e à autonomia do ser humano que embasa as determinações da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e dos Comitês de Ética em Pesquisa (CEP)28.

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Conforme previsto na Resolução n.º 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde (CNS), por meio da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, os Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) são colegiados interdisciplinares e independentes, de relevância pública, de caráter consultivo, deliberativo e educativo, criados para defender os interesses dos participantes da pesquisa em sua integridade e dignidade e para contribuir no desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos (RESOLUÇÃO n.º 466/2012).

As diretrizes29 e normas que regulamentam30 pesquisas envolvendo seres humanos determinam procedimento e concepções relacionados a termos e definições, responsabilidades do pesquisador31, atribuições do CONEP e dos CEP, protocolo de pesquisa, aspectos éticos e processo de consentimento livre e esclarecido. Consideramos importante a observância de que há controvérsias acerca dos sentidos que se compõem com base na ética institucionalizada e incorporada a um comitê, sendo elaboradas algumas críticas a esse modelo de organização vinculado à legislação32.

As reflexões que apresentamos até aqui são importantes em respeito às palavras outras que abordam as questões éticas em diferentes perspectivas. Entretanto, na ancoragem teórico-metodológica desta pesquisa, é em Bakhtin (2010) que encontramos uma expressão que nos torna responsáveis por cada ato singular de nossa vida e nos ampara na fundamentação ética da pesquisa em Ciências Humanas, já que “[...] eu ocupo no existir singular um lugar único, irrepetível, insubstituível e impenetrável da parte de um outro. [...] Tudo que pode ser feito por mim não poderá nunca ser feito por ninguém mais, nunca” (BAKHTIN, 2010, p. 96). Tais assertivas nos ajudam a refletir sobre as distintas posições de pesquisador e pesquisado, cada um em sua condição única, singular (BAKHTIN, 2010), porém enredados no processo dialógico em que cada ação se concretiza em resposta ao outro, cada enunciado se constitui mediante tantos outros já assimilados (BAKHTIN, 2011).

Em referência a essas reflexões, Faraco (2011) argumenta que a ética em Bakhtin é

29 Uma dessas diretrizes consta na Norma Operacional n.º 001/2013, que estabelece: “É

indispensável o cadastro na Plataforma Brasil, para apresentação da pesquisa à apreciação do Sistema CEP/CONEP e para sua respectiva avaliação ética, de todos os pesquisadores, dos CEP e das instituições envolvidas nas pesquisas.” Disponível em: <http://conselho.saude.gov.br/web_comissoes/conep/aquivos/CNS%20%20Norma%20Operacional% 20001%20-%20conep%20finalizada%2030-09.pdf>. Acessado em: 8 jun. 2014

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A Plataforma Brasil é uma base nacional e unificada de registros de pesquisas envolvendo seres humanos para todo o sistema CEP/CONEP. Ela permite que as pesquisas sejam acompanhadas em seus diferentes estágios – desde sua submissão até a aprovação final pelo CEP e pela CONEP, quando necessário – possibilitando inclusive o acompanhamento da fase de campo, o envio de relatórios parciais e dos relatórios finais das pesquisas (quando concluídas). Disponível em: <http://aplicacao.saude.gov.br/plataformabrasil/visao/pesquisador/gerirPesquisa/gerirPesquisa.jsf>. Acessado em: 8 jun. 2014.

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Em cumprimento às normas do CEP/CONEP, esclarecemos que esta pesquisa foi submetida à análise dos órgãos responsáveis por meio de cadastro na Plataforma Brasil, sendo aprovada em 11/12/2014.

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baseada no princípio tanto do sujeito moral sobre as normas quanto da alteridade sobre a individualidade. O autor afirma que o ato responsável tem como base o meu existir único. E esclarece:

O conceito de excedente de visão vale, assim, também para suas reflexões sobre a vida e participa de uma articulação de coordenadas que fundamentam sua filosofia geral: a singularidade de cada um, a alteridade, a interação. E, ao articular por dentro essas coordenadas, Bakhtin sustenta toda uma ética. É no excedente de visão – em seu sentido, pressupostos e consequências – que vamos encontrar o chão comum para a estética e a ética em Bakhtin (FARACO, 2011, p. 24).

Situando o foco de nossa pesquisa no campo da EI e, portanto, compreendendo que vivenciamos o encontro com os sujeitos, nos enunciados tanto dos documentos analisados quanto de suas vozes nas entrevistas, acreditamos que as situações interativas são intensamente variadas, o que exige de nós o compromisso ético. Com base em concepções de responsividade, excedente de visão, alteridade e

relações dialógicas, buscamos compreender necessidades e singularidades dos

envolvidos, assim como estar atentos às opções que fazemos nesse processo. Nesse contexto, a atuação ativa e responsiva do pesquisador pode intensificar a dinâmica dialógica e discursiva com os sujeitos pesquisados, além de possibilitar interlocuções ilimitadas, firmadas em posicionamento ético quanto às peculiaridades de cada sujeito e em consonância com sua constituição por intermédio do outro.

No propósito da responsividade e em atendimento ao protocolo de pesquisa, esclarecemos que o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi elaborado e apresentado à Secretaria de Educação de Vitória (APÊNDICE K), autorizando-nos a desenvolver a pesquisa. Os TCLE referentes às instituições onde desenvolvemos a pesquisa foram apresentados aos sujeitos (APÊNDICE L) participantes das entrevistas, sendo assinados por todos e arquivados, conforme protocolo do CEP.

Na sequência deste capítulo, compartilhamos, em consonância com os procedimentos de análise documental e entrevista semiestruturada, nosso percurso de delineamento das fontes, do lócus de pesquisa e dos sujeitos.