• Nenhum resultado encontrado

Prioridades e estratégias para a educação: Banco Mundial, 1995

2. O TRABALHO DOCENTE NOS DOCUMENTOS INTERNACIONAIS E

2.1 A valorização do trabalho docente nos referenciais internacionais

2.1.2 Prioridades e estratégias para a educação: Banco Mundial, 1995

Não é demasiado salientar a constante presença do Banco Mundial7 no patrocínio de importantes Conferências Internacionais sobre variados temas, dentre

7

Criado em 1929, o Banco Mundial autodenomina-se como fonte vital de assistência técnica e financeira para ajudar os países em desenvolvimento a reduzir a pobreza através de projetos em áreas como educação, saúde, infra-estrutura, energia, proteção social e através do desenvolvimento de programas que ajudariam a melhorar a qualidade de vida das pessoas. Atuante junto ao Brasil desde 1949, financiou inúmeros projetos governamentais o que teria tornado o país o maior parceiro do BIRD, uma das suas instituições. Segundo consta no site do Banco, este realiza uma média de US$ 1,8 bilhão em novos empréstimos por ano ao Brasil para financiar projetos implementados principalmente pelos governos estaduais e federal, e normalmente requerem contrapartida igual ao valor do empréstimo. Além disso, após a aprovação e entrada em vigor de um empréstimo, o país tem de implementar o projeto ou programa de acordo com os termos acordados com o Banco (BANCO MUNDIAL, 2012).

elas a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, ocorrida em Jomtiem, Tailândia, 1990, evidenciando a atenção dessa agência para com a educação. Com base nas afirmações de Shiroma (2011), supõe-se que essa presença em diferentes espaços e eventos denota a atuação em rede no campo da política educacional rumo à construção de consensos e de legitimidade.

Pode-se melhor compreender a crescente atividade e a influência dessa agência no campo da educação a partir de Leher (1999), o qual identifica na crise estrutural do capitalismo, desde 1970, o aumento da vulnerabilidade econômica e política dos países periféricos, por consequência, um extraordinário aumento de poder do Banco Mundial. Leher (1999) comenta que, para tal panorama, colaborou um contexto de juros ascendentes, o qual, ao incapacitar os países endividados para o pagamento de seus empréstimos, os fez perder seu poder de pressão. A partir desses acontecimentos, os mesmos ficaram submetidos ao poderio do Banco Mundial, o qual passa a impor suas condicionalidades com uma abrangência inédita.

Aproximado ao ideário neoliberal, o Banco impôs aos países economicamente dependentes uma série de ajustes e de reformas estruturais no sentido de liberar o mercado e fortalecer a economia. O Banco Mundial sustentava que as políticas econômicas postas em curso configuravam a “era do mercado” a “globalização” e, na visão da agência, seria um tempo no qual o capital principal seria o intelectual, por isso, a educação, na condição de capital, tornou-se assunto de managers (LEHER, 1999).

O conjunto de ajustes e reformas educacionais trazido pelo Banco Mundial, segundo Leher (1999), teria como pressuposto a adequação institucional para “manejar” as contradições do sistema, ou seja, trazia um conteúdo carregado de ideologias apologéticas ao capital, nesse sentido, o debate educacional seria conduzido por “homens de negócios” e estrategistas políticos.

Inserido nesse processo, o documento Prioridades y estratégias para la

educación, produzido pelo Banco Mundial, teria como objetivo, conforme o próprio

Banco, além de apresentar o panorama educacional dos países vinculados ao Banco, instruir sobre políticas e medidas, especialmente para escolaridade básica.

Na interpretação do Banco Mundial, a educação básica contribuiria para o desenvolvimento econômico, para o aumento da produtividade dos pobres, para a melhoria da saúde, para a redução da pobreza e da fecundidade, devendo, por isso, receber prioridade por parte das autoridades.

Nesse sentido, o Banco recomenda o acompanhamento dos resultados da educação por meio da avaliação do desempenho escolar e, a partir deles, o estabelecimento das prioridades. Sugere, ainda, o zelo pela qualidade e equidade, o estímulo à participação da família na gestão escolar e à oferta de uma maior autonomia aos estabelecimentos educacionais.

Da prioridade atribuída à educação básica decorrem orientações as quais poderiam ser interpretadas como postulantes da valorização do trabalho docentes, algumas delas serão aqui mencionadas.

Ao eleger a universalização da educação básica, como necessidade imperiosa dos países em desenvolvimento, o Banco Mundial acena ser preciso aumentar o número de matrículas e diminuir a evasão e a repetência, para tanto aconselha modificações e maiores investimentos nessa etapa, incluindo “Em muitos casos, a ampliação da matrícula exigirá investimentos para ampliar a capacidade escolar, formar docentes qualificados e proporcionar materiais didáticos adequados”

8

(BANCO MUNDIAL, 1995, p. 107).

A descentralização como impulsionadora de maior autonomia às escolas, para a tomada de decisões acerca dos próprios interesses e necessidades é outro aspecto destacado pelo Banco Mundial. Para tanto, na visão do Banco, seria necessário superar a administração centralizada e burocrática, comum nos países em desenvolvimento. Conforme é indicado no documento, “[...] os órgãos dirigentes, os diretores e o pessoal docente das escolas, que conhecem as condições locais, são os que estão em melhores condições de escolher o conjunto de investimentos mais apropriados” 9

(BANCO MUNDIAL, 1995, p. 9).

Outra ação indicada diz respeito ao estabelecimento de um Plano Nacional de Educação. Esse serviria como um meio de orientar o professor a centrar sua atenção no ensino e para conduzir “[...] a uma maior participação dos professores na tomadas de decisões nas escolas”10

(BANCO MUNDIAL, 1995, p.145).

8 “Em muchos casos, la ampliación de la matrícula exigirá inversiones para ampliar la capacidad

escolar, formar docentes calificados y proporcionar materiales didácticos adecuados” (BANCO MUNDIAL, 1995, p. 107).

9 “[...] los órgãos rectores, los diretores y el personal docente de las escuelas, que conocen

íntimamente las condiciones locales, son los que están em mejores condiciones de seleccionar el conjunto de insumos más apropiados” (BANCO MUNDIAL, 1995, p. 9).

10 “[...] a una mayor participación del personal docente em la adopción de decisiones en las escuelas”

Somado a isso, no entender do Banco Mundial (1995), haveria que se dar flexibilidade ao docente como forma de aumentar a eficiência da aprendizagem, assim “Aos professores deve ser facultado a escolha dos métodos de ensino, dentro dos limites estabelecidos pelo plano nacional de educação”11

(BANCO MUNDIAL, 1995, p. 142).

Acrescenta-se a esse conjunto de orientações a adoção da avaliação do desempenho dos alunos das escolas públicas, a qual serviria como parâmetro para acompanhar o nível do ensino, para a definição de políticas e para a ação pedagógica. Ao referir-se à avaliação, o Banco Mundial se reporta aos estudos de Larach e Lockeed (1992) e atribui a essa avaliação a capacidade de “[...] oferecer informações aos professores sobre as necessidades de aprendizagem dos alunos individualmente”12

(BANCO MUNDIAL, 1995, p, 112).

No seguinte apontamento, o Banco sugere a interação entre professores de diversas áreas e escolas no sentido de facilitar a troca de experiências: “A realização de conferências e cursos periódicos pode proporcionar oportunidades para que os professores de diferentes grupos mostrem seu trabalho aos colegas”13

(BANCO MUNDIAL, 1995, p. 146).

No documento, o Banco Mundial também se reporta aos sindicatos dos professores. Interpretada como protagonista no âmbito político nacional, a representação docente precisaria mostrar sua anuência perante as propostas de reforma. Para obter esse apoio o Banco toma como exemplo o trabalho do PNUD14 em dois países:

11 “El personal docente debe estar facultado para determinar las prácticas de enseñanza, dentro de

ciertos limites establecidos por um plan de estúdio nacional amplio [...]” (BANCO MUNDIAL, 1995, p. 142).

12 “[...] proporcionar información as los profesores acerca das necesidades de apredizage de los estudiantes considerados individualmente” (BANCO MUNDIAL, 1995, p, 112).

13

La celebración de conferências o cursos práticos periódicos puede proporcionar oportunidades para que los maestros que representan as diferentes agrupaciones den a conocer su labor a sus colegas” (BANCO MUNDIAL, 1995, p. 146)

14

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento: prioriza ações nas áreas de governança democrática, redução da pobreza, tecnologia da informação, políticas de energia, meio ambiente e combate à Aids. Tem representação nos países da América Latina e do Caribe e apóia programas locais em diversos países. Foi fundado para estimular o desenvolvimento global por meio do intercâmbio de conhecimentos, experiências e recursos entre as nações. Em 1990, criou o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que mede o desenvolvimento com base no PIB per capita, na longevidade e na educação, indicador utilizado para a definição de metas e prioridades das políticas sociais de vários países, incluindo o Brasil (PNUD, 2012).

Na Bolívia e na República Dominicana o PNUD tem financiado mecanismos de consulta para fomentar a criação de consenso nacional em torno da reforma da educação. Em ambos os casos, os sindicatos dos profesores, os representantes de pais e os principais partidos políticos aprovaram um documento de política sobre a reforma e um programa de investimento público que foram mostrados com êxito nas reuniões de doadores, incluindo o Banco Mundial (BANCO MUNDIAL, 1995, p.155).15

No que diz respeito às prioridades dos empréstimos concedidos pelo Banco Mundial, está incluída a capacitação de professores, entendida como meio de melhorar a educação. O Banco justifica que, a partir de 1980, substitui-se o modelo que priorizava dar suporte à edificação da estrutura física por formas de investimentos envolvendo:

[...] melhorar a qualidade e a administração da educação, a saber, livros didáticos, capacitação dos professores, equipe de laboratório, evolução da aprendizagem, sistemas de exame, administração educacional, assistência técnica e investigação (BANCO MUNDIAL, 1995, p. 169).16

Entende-se que, nesse documento, a aparente valorização do trabalho docente, pode ser interpretada como: maior autonomia, diálogo junto aos sindicatos, investimento em preparo e formação, participação nos processos decisivos, diálogo entre pares, avaliação de desempenho educacional como fonte de informações para bases de trabalho, estabelecimento de um plano nacional de educação para orientar a ação docente, qualificação.

De nossa perspetiva, o Banco Mundial, por sua natureza de racionalidade econômica, fundamenta quaisquer de seus projetos na relação custo-benefício, com a educação não seria diferente. Para Figueiredo (2008), o intento do Banco diz respeito a reduzir a pobreza e a desigualdade sem abrir mão do aumento do uso

15

En Bolívia y la República Dominicana, el PNUD ha financiado mecanismos de consulta para fomentar la creación de consenso nacional em torno a la reforma de la educación. Em ambos casos, el sindicato de maestros, los representantes de los padres y los principales partidos políticos aprobaron un documento de política sobre la reforma y um programa de inversión pública concomitante, que se presentaron com éxito em las reuniones de donantes, incluido el Banco Mundial (BANCO MUNDIAL, 1995, p.155).

16

[...] mejorar la calidad y la administración de la educación, a saber, libros de texto, capacitación de maestros, equipo de laboratorio, evaluaciones del aprendizaje, sistemas de examen, administración educacional, asistencia técnica e investigación (BANCO MUNDIAL, 1995, p. 169).

eficiente do gasto social, por isso a proposta de reformar as instituições públicas, dentre elas a educação, implementando nelas a lógica da economia privada.

Sobre a relação do Banco Mundial com o Brasil, Peroni (2003, p. 100) escreve: “O Brasil assinou acordo com o banco por dez anos, que “inclui e não inclui empréstimos”; quer dizer, o banco mais sugere as políticas do que investe dinheiro, [...] e dita as áreas onde se deve investi-lo; [...]”.

Em resumo, pode-se afirmar que o discurso do Banco Mundial passa a requisitar dos trabalhadores docentes uma resposta competente às novas demandas sociais. Nesse contexto, o novo modelo de professor propalado internacionalmente é legitimado pelas políticas públicas para a educação, as quais reproduzem os indicativos de valorização docente trazidos no plano das agências internacionais.

2.1.3 Educação e conhecimento: eixo da transformação produtiva com