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Probabilidade: O estranho caso

da falta de classe de referˆencia

Os cap´ıtulos anteriores tˆem nos dado ao menos algum sentimento pelas quais inferˆencias s˜ao dedutivamente v´alidas, e por que. Agora, est´a no momento de voltar `a quest˜ao da validade indutiva: ou seja, a validade daquelas inferˆencias em que as premissas fornecem apoio para a conclus˜ao; ainda que, mesmo as premissas sendo verdadeiras em alguma situa¸c˜ao, a conclus˜ao poderia se revelar falsa.

Como eu obeservei no Cap´ıtulo 1, Sherlock Holmes era muito bom neste tipo de inferˆencia. Vamos come¸car com um dos seus exemplos. O mist´erio da

Liga dos Cabe¸cas Vermelhas come¸ca quando Holmes e Dr. Watson recebem

uma visita de um certo Sr. Jabez Wilson. Quando Wilson entra, Watson olha para ver o que Holmes havia inferido a respeito dele:

‘Al´em do fato ´obvio que ele em algum momento da vida dele fez trabalhos bra¸cais, que cheira rap´e, que ´e um Freemason (socie- dade secreta), que j´a esteve na China, e que tem escrito bastante ultimamente, eu n˜ao consigo deduzir mais nada’.

Sr. Jabez Wilson come¸cou a se endireitar em sua cadeira com seu dedo indicador sobre o papel, mas seus olhos permaneciam sobre o meu companheiro.

‘Como, em nome da boa sorte, vocˆe sabia tudo aquilo, Sr. Hol- mes?’ Ele perguntou.

Holmes sente prazer em explicar. Por exemplo, a respeito de escrever muito:

‘O que mais poderia indicar aquele punho da manga t˜ao bri- lhante por cinco polegadas, e a esquerda com um remendo macio pr´oximo ao cotovelo onde vocˆe descansa o bra¸co sobre a mesa.’

Apesar de Holmes estar acostumado a chamar este tipo de inferˆencia uma dedu¸c˜ao, a inferˆencia ´e, na verdade, uma inferˆencia indutiva. ´E com- pletamente poss´ıvel que o casaco do Sr. Wilson mostrasse estes padr˜oes sem que ele tivesse escrito muito. Ele poderia, por exemplo, ter roubado de algu´em. N˜ao obstante, a inferˆencia ´e claramente boa. O que faz com que esta inferˆencia seja boa? Uma resposta plaus´ıvel pode ser dada em termos de probabilidade. Portanto, vamos falar sobre isto, e ent˜ao podemos retornar `a quest˜ao.

Uma probabilidade ´e um n´umero atribu´ıdo a uma senten¸ca, que mede o qu˜ao prov´avel ela, em algum sentido, ´e verdadeira. Vamos escrever pr(a) para a probabilidade de a. Convencionalmente, medimos probabilidades em uma escala entre 0 e 1. Se pr(a) = 0, a ´e certamente falsa; ent˜ao, a medida que pr(a) aumenta, se torna mais prov´avel que a seja verdadeiro; at´e que

pr(a) = 1, e a ´e certamente verdadeira.

O que mais podemos dizer sobre estes n´umeros? Deixe-me ilustrar com um simples exemplo. Suponha que consideremos os dias de alguma semana. Seja w uma senten¸ca que ´e ou falsa ou verdadeira todos os dias - digamos, ‘est´a calor’ - e seja r outra senten¸ca - digamos, ‘est´a chovendo’. Seja a informa¸c˜ao relevante dada pela tabela a seguir:

Seg Ter Qua Qui Sex Sab Dom

w    

r   

Um tique indica que a frase ´e verdadeira naquele dia; um espa¸co em branco indica que n˜ao ´e.

Agora, se estamos falando sobre esta semana em particular, qual ´e a probabilidade de em um dia, escolhido aleatoriamente, estar calor? H´a quatro dias com calor, e sete dias no total. Portanto, a probabilidade ´e de 4/7. Igualmente, h´a 3 dias chuvosos, portanto a probabilidade que choveu ´e de 3/7:

pr(w) = 4/7 pr(r) = 3/7

Em geral, se n´os escrevermos #a para representar os n´umeros de dias em que cada frase a ´e verdadeira, e N para o total de n´umeros de dias:

pr(a) = #a/N

Como a probabilidade se relaciona com a nega¸c˜ao, conjun¸c˜ao e disjun¸c˜ao? Primeiro consideremos a nega¸c˜ao. Qual ´e a probabilidade de ¬W ? Bem, havia 3 dias em que n˜ao estava calor, portanto pr(¬w) = 3/7. Note que

pr(w) e pr(¬w)somam 1. Isto n˜ao ´e um acidente. N´os temos:

#w + #¬w = N

Dividindo ambos os lados por N , obtemos:

#w

N +

#¬w

N = 1

Isto ´e, pr(w) + pr(¬w) = 1.

Para conjun¸c˜ao e disjun¸c˜ao: H´a dois dias em que estava calor e chovendo, portanto pr(w&r) = #(w&r)/N = 2/7. E h´a cinco dias em estava ou chovendo ou estava calor, portanto pr(w∨ r) = #(w ∨ r)/N = 5/7. Qual ´e a rela¸c˜ao entre estes dois n´umeros? Para achar o n´umero de dias em que w∨ r ´

e verdadeiro, podemos come¸car por somar os dias em que w ´e verdadeiro, ent˜ao somar o n´umero de dias em que r ´e verdadeiro. Isto n˜ao vai resolver, dado que alguns dias foram contados duas vezes: quarta e s´abado. Estes foram os dias que estava chovendo e calor. Portanto, para conseguir a conta correta, temos que subtrair o n´umero de dias em que estavam ambos calor e chovendo:

#(w∨ r) = #w + #r − #(w&r)

Dividindo ambos os lados por N , obtemos:

#(w∨r) N = #w N + #r N #(w&r) N Isto ´e,

pr(w∨ r) = pr(w) + pr(r) − pr(w&r)

Esta ´e a rela¸c˜ao geral entre as probabilidades de conjun¸c˜oes e disjun¸c˜oes. No ´ultimo cap´ıtulo, vimos que os graus da verdade podem tamb´em ser medidos entre 0 e 1, e poderia ser natural supor que os graus de verdade e probabilidades s˜ao os mesmos. Eles n˜ao s˜ao. Em particular, conjun¸c˜ao e disjun¸c˜ao funcionam bem diferentemente. Para graus da verdade, disjun¸c˜ao ´

e uma fun¸c˜ao da verdade, especificamente, |w ∨ r| ´e o maximum de |w| e |r|. Mas, pr(w∨r) n˜ao ´e determinada por pr(w) e pr(r) sozinhos, como acabamos de ver. Em particular, para os nossos w e r, pr(w) = 4/7, pr(r) = 3/7 e

pr(w∨ r) = 5/7. Mas, se |w| = 4/7 e |r| = 3/7, |w ∨ r| = 4/7, e n˜ao 5/7.

Antes de voltarmos `as inferˆencias indutivas, h´a mais um pouco de in- forma¸c˜ao sobre probabilidade que precisamos. Dado nossa semana modelo, a probabilidade de estar chovendo em um dia, escolhido aleatoriamente, ´e de 3/7. Mas, suponha que vocˆe saiba que o dia em quest˜ao era um dia de calor. Qual ´e a probabilidade agora que tenha chovido? Bem, houve quatro dias de calor, mas somente em dois deles estava chovendo, portanto a probabilidade ´e de 2/4. Este n´umero ´e chamado de probabilidade condicional, e escrito desta forma: pr(r|w), a probabilidade de r dado w. Se pensarmos sobre isto um pouco, podemos dar uma f´ormula geral para calcular probabilidades condici- onais. Como chegamos ao n´umero 2/4? Primeiro, nos restringimos aos dias em que w ´e verdadeiro; ent˜ao dividimos pelo n´umero de dias em que r era verdadeiro, ou seja, o n´umero de dias em que ambos w e r s˜ao verdadeiros. Em outras palavras:

pr(r|w) = #(w&r) ÷ #w

Um pouco de ´algebra nos diz que isto ´e igual a:

#(w&r)

N ÷

#w

N

E isto ´e, pr(w&r)÷ pr(w).

Portanto, eis nossa f´ormula geral para probabilidade condicional:

O m´ınimo de cuidado ´e necess´ario ao aplicar esta f´ormula. Dividir pelo n´umero 0 n˜ao faz nenhum sentido. 3/0, por exemplo, n˜ao tem nenhum valor. Matem´aticos chamam este quociente de indefinido. Na f´ormula para pr(w|r), dividimos por pr(w), que faz sentido somente se ele n˜ao for zero, ou seja, somente se w for verdadeiro ao menos algumas vezes. Em caso contr´ario, a probabilidade condicional ´e indefinida.

Agora, finalmente, podemos voltar `as inferˆencias indutivas. O que ´e pre- ciso para uma inferˆencia ser indutivamente v´alida? Simplesmente que as premissas fa¸cam a conclus˜ao mais prov´avel do que menos prov´avel. Ou seja, a probabilidade condicional de c, a conclus˜ao, dada p, a premissa (ou a con- jun¸c˜ao das premissas se houver mais que uma) ´e maior do que a da nega¸c˜ao de c:

pr(c|p) > pr(¬c|p)

Deste modo, se estamos raciocinando sobre a semana da nossa ilustra¸c˜ao, a inferˆencia:

Era um dia chuvoso, portanto era um dia de calor; ´

e indutivamente v´alida. ´E f´acil checar que, pr(w|r) = 2/3, e pr(¬w|r) = 1/3. A an´alise pode ser aplicada para mostrar porque a inferˆencia de Holmes com a qual come¸camos ´e v´alida. Holmes concluiu que Jabez Wilson havia escrito bastante ultimamente (c). A premissa dele era sobre o efeito de que havia certas marcas de desgaste na jaqueta de Wilson (p). Agora, se n´os tiv´essemos ido a Londres nos tempos de Holmes, e tiv´essemos coletado todas aquelas pessoas com roupas no mesmo estado da roupa em quest˜ao, ent˜ao a maioria deles seriam escritur´arios, pessoas que passam a vida escrevendo - ou assim poder´ıamos supor. Deste modo, a probabilidade que Jabez tinha escrito bastante, dado que a jaqueta dele continha aquelas marcas, ´e maior do que a probabilidade que ele n˜ao tinha escrito. A inferˆencia de Holmes ´e, de fato, indutivamente v´alida.

Deixe-me terminar por observar um enigma no qual o mecanismo que aca- bamos de empregar faz surgir. Como temos visto, uma probabilidade pode ser calculada como um quociente: pegamos uma certa classe de referˆencia; ent˜ao calculamos os n´umeros de diversos grupos contidos nela; ent˜ao fazemos algumas divis˜oes. Mas, qual classe de referˆencia usamos? No exemplo ilus- trativo a respeito do clima, comecei especificando a classe de referˆencia em

quest˜ao: os dias de uma semana em especifica. Mas, os problemas da vida real n˜ao s˜ao apresentados desta forma.

Volte a Jabez Wilson. Para resolver as probabilidades relevantes neste caso, sugeri que peg´assemos como classe de referˆencia as pessoas vivendo em Londres nos tempos de Holmes. Mas, por que isto? Por que n˜ao as pessoas que viviam em toda a Inglaterra, ou em toda Europa, ou apenas os homens de Londres, ou apenas as pessoas que tinham o privil´egio de ir conhecer Holmes? Talvez, em alguns destes casos, n˜ao fizesse muita diferen¸ca. Mas certamente em outros faria. Por exemplo, as pessoas que vieram ver Holmes eram todas relativamente ricas, e provavelmente n˜ao eram de usar casacos usados. As coisas seriam bem diferentes com uma maior popula¸c˜ao. Portanto, qual deveria ter sido a classe de referˆencia mais apropriada? Esta ´e um tipo de pergunta que tira o sono dos estat´ısticos (as pessoas que tentam descobrir os fatores de risco para as empresas de seguros).

Em ´ultima an´alise, a classe de referˆencia mais precisa parece ser aquela contendo apenas o Sr. Wilson. Afinal, o que os fatos sobre outras pessoas tˆem a ver com ele afinal? Mas, nesse caso, ou ele havia escrito muito, ou n˜ao. No primeiro caso, a probabilidade que ele tinha escrito muito, dado que o punho da sua manga estava brilhante, ´e 1, e a inferˆencia ´e valida; na segunda, ´e 0, e a inferˆencia n˜ao ´e v´alida. Em outras palavras, a validade da inferˆencia depende inteiramente da verdade da conclus˜ao. Portanto, vocˆe n˜ao pode empregar a inferˆencia para determinar se a conclus˜ao ´e ou n˜ao ´e verdadeira. Se n´os formos at´e este ponto, a no¸c˜ao de validade ´e inteiramente in´util.

Ideias centrais do cap´ıtulo

• A probabilidade de um enunciado ´e o n´umero de casos no qual ele ´e

verdadeiro, dividido pelo n´umero de casos na classe de referˆencia.

• pr(¬a) = 1 − pr(a)

• pr(a ∨ b) = pr(b) + pr(b) − pr(a&b) • pr(a|b) = pr(a&b)/pr(b)

• Uma inferˆencia ´e indutivamente v´alida exatamente se a probabilidade

condicional da conclus˜ao dada a (conjun¸c˜ao das) premissas ´e maior que a da sua nega¸c˜ao dadas as premissas.

Problema

O seguinte conjunto de estat´ıstica foi coletado a partir de dez pessoas (cha- madas 1-10).

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Alto    

Saud´avel     

Feliz      

Se r ´e uma pessoa randomicamente escolhida nesta cole¸c˜ao, avalie a va- lidade indutiva da seguinte inferˆencia. r ´e alto e saud´avel; portanto, r ´e feliz.

Cap´ıtulo 12

Probabilidade Inversa: Vocˆe

ao pode ficar indiferente a seu

respeito!

O cap´ıtulo anterior nos deu um conhecimento b´asico de probabilidade e o pa- pel que ela pode ter em inferˆencias indutivas. Neste cap´ıtulo, iremos olhar al- guns aspectos mais avan¸cados. Vamos come¸car considerando uma inferˆencia indutiva muito famosa.

O cosmos f´ısico n˜ao ´e uma bagun¸ca puramente aleat´oria. Ele mostra padr˜oes muito distintivos: a mat´eria ´e organizada nas gal´axias, que est˜ao organizadas, por sua vez, em estrelas e sistemas planet´arios, e em alguns destes sistemas planet´arios, a mat´eria ´e organizada de tal forma que produz seres vivos como vocˆe e eu. Qual ´e a explica¸c˜ao para isto? Vocˆe poderia dizer que a explica¸c˜ao ´e provida pelas as leis da f´ısica e biologia. E assim poderia ser. Mas por que as leis da f´ısica e biologia s˜ao da forma que s˜ao? Afinal, elas poderiam ter sido bem diferentes. Por exemplo, a gravidade poderia ter sido uma for¸ca de repuls˜ao, e n˜ao atra¸c˜ao. Neste caso, nunca haveria existido peda¸cos est´aveis de mat´eria, e a vida assim como a conhecemos teria sido imposs´ıvel em qualquer lugar no cosmos. Isto n˜ao nos d´a raz˜oes excelentes para acreditar na existˆencia do criador do cosmos: um ser inteligente que trouxe o cosmos `a existˆencia, junto com as leis da f´ısica e da biologia, para algum prop´osito ou outro? Em resumo, o fato que o cosmos f´ısico ´e ordenado n˜ao nos d´a raz˜oes para acreditar na existˆencia de algum Deus de alguma forma?

Este argumento ´e freq¨uentemente chamado de “Argumento do Des´ıgnio” (para a existˆencia de Deus). Ele poderia muito bem ser chamado de Argu- mento para o Des´ıgnio; mas esque¸ca isto. Vamos pensar sobre isto de mais perto. A premissa do argumento, o, ´e uma declara¸c˜ao para o efeito de que o cosmos ´e ordenado em uma certa forma. A conclus˜ao, g, afirma a existˆencia de um Deus criador. A menos que g fosse verdadeiro, o n˜ao seria muito prov´avel; portanto, o argumento segue, dado que o, g ´e prov´avel.

Agora, ´e certamente verdadeiro que a probabilidade condicional de o dado que g ´e verdadeiro, ´e muito mais elevada do que de o dado que g ´e falso:

1. pr(o|g) > pr(o|¬g)

Mas, isto n˜ao nos fornece o que queremos. Para o ser uma boa raz˜ao indutiva para g, n´os precisamos que a probabilidade de g, dada o, seja maior do que a de sua nega¸c˜ao:

2. pr(g|o) > pr(¬g|o)

E o fato de pr(o|g) ser alto n˜ao necessariamente significa que pr(g|o) seja alto. Por exemplo, a probabilidade que vocˆe est´a na Austr´alia, dado que vocˆe vˆe um canguru, ´e muito alta. (Em qualquer outro lugar, ele teria que ter fugido de um zool´ogico.) Mas a probabilidade que vocˆe vˆe um canguru, dado que vocˆe est´a na Austr´alia, ´e muito baixa. (Eu morei na Austr´alia por cerca de 10 anos at´e que eu visse um.)

pr(o|g) e pr(g|o) s˜ao chamados de probabilidades inversas, e o que temos

visto ´e que para o argumento de des´ıgnio funcionar, a rela¸c˜ao entre elas deve ser tal que nos fa¸ca passar de 1 a 2. ´E isso? Existe, na verdade, uma rela¸c˜ao muito simples entre probabilidades inversas. Lembre-se da equa¸c˜ao CP do ´

ultimo cap´ıtulo que, por defini¸c˜ao:

pr(a|b) = pr(a&b)/pr(b)

Portanto:

3. pr(a|b) × pr(b) = pr(a&b)

Analogamente:

Portanto:

4. pr(b|a) × pr(a) = pr(b&a)

Mas, pr(a&b) = pr(b&a) (dado que a&b e b&a s˜ao verdadeiros exata- mente nas mesmas situa¸c˜oes). Deste modo, 3 e 4 nos fornece:

pr(a|b) × pr(b) = pr(b|a) × pr(a)

Supondo que pr(b) n˜ao ´e 0 - farei suposi¸c˜oes deste tipo sem men¸c˜ao adi- cional - podemos reorganizar esta equa¸c˜ao para obter:

INV: pr(a|b) = pr(b|a) × pr(a)/pr(b)

Esta ´e a rela¸c˜ao entre probabilidades inversas. (Para recordar isto, pode ajudar notar que do lado direito, ´e primeiramente um b seguido por um a, e ent˜ao um a seguido por um b).

Usando INV para reescrever as probabilidades inversas em 1, obtemos:

pr(g|o) × pr(o)pr(g) > pr(¬g|o) ×pr(pr(o)¬g)

E cancelando pr(o) em ambos os lados, temos:

pr(g|o) pr(g) >

pr(¬g|o) pr(¬g)

Ou, rearranjando a equa¸c˜ao:

5. pr(pr(g¬g|o)|o) > pr(pr(g)¬g)

Lembre-se que, para o Argumento do Designio funcionar, temos que che- gar a 2, que ´e equivalente a:

pr(g|o) pr(¬g|o) > 1

Pareceria que a ´unica coisa plaus´ıvel que ir´a nos levar a isto a partir de 5 ´

e que pr(pr(g)¬g) ≥ 1, isto ´e:

Os valores pr(g) e pr(¬g) s˜ao chamados de probabilidades a priori; ou seja, as probabilidades de g e¬g anteriores `a aplica¸c˜ao de qualquer evidˆencia, tal como o. Consequentemente, o que parece precisar para fazer com que o Argumento funcione ´e que a probabilidade a priori de que existe um deus criador ´e maior que (ou igual) `a probabilidade a priori que n˜ao existe.

´

E isso? Infelizmente, n˜ao h´a raz˜ao para acreditar que sim. Na verdade, parece que ´e o contr´ario. Suponha que vocˆe n˜ao saiba que dia ´e da semana. Seja m a hip´otese de que ´e uma segunda. Ent˜ao ¬m ´e a hip´otese que n˜ao ´

e segunda. Qual ´e mais prov´avel?, m ou ¬m? Certamente, ¬m: porque h´a muito mais maneiras para que n˜ao seja segunda, do que h´a para que seja segunda. (Poderia ser ter¸ca, quarta, quinta...) Igualmente com Deus. De maneira conceb´ıvel, existem muitas diferentes formas que o cosmos tenha vindo `a existˆencia. E intuitivamente, um n´umero relativamente muito pe- queno destes s˜ao significamente ordenados: a ordem ´e algo especial. Que afinal, ´e o que d´a ao argumento do Des´ıgnio a sua for¸ca. Mas ent˜ao, existem relativamente poucos cosmos poss´ıveis em que se haja um ordenador. Por- tanto, a priori ´e muito mais prov´avel que n˜ao exista criador algum do que exista.

O que vimos, ent˜ao, ´e que o Argumento do Des´ıgnio falha. ´E sedutor porque freq¨uentemente se confunde probabilidades com os seus inversos e, portanto, deixa de lidar com uma parte crucial do argumento.

Muitos argumentos indutivos requerem que pensemos a respeito de proba- bilidades inversas. O Argumento do Des´ıgnio n˜ao ´e especial nesta quest˜ao. Mas, muitos argumentos s˜ao mais bem sucedidos ao fazer isto. Deixe-me ilustrar. Suponha que vocˆe visite o cassino local. Eles tem duas roletas. Chame-as de A e B. Vocˆe foi informado por um amigo que uma delas est´a viciada - embora o seu amigo n˜ao possa lhe dizer qual exatamente. Ao inv´es de dar vermelho a metade do tempo e preto a outra metade do tempo, como uma roleta normal deveria fazer, esta d´a vermelho por 3/4 do tempo, e preto por 1/4 do tempo. (Falando precisamente, as roletas reais `as vezes d˜ao verde ocasionalmente tamb´em; mas vamos ignorar este fato para manter as coisas simples.) Agora, suponhamos que vocˆe assista uma das roletas, digamos a roleta A, e um cinco giros consecutivos ela mostrou os resultados:

R, R, R, R, B

(R para vermelho e B para preto). Vocˆe tem motivos para inferir que esta ´e a roleta que est´a viciada? Em outras palavras, seja c o enunciado para o efeito

de que esta seq¨uˆencia em particular aparece, e f o enunciado de que a roleta A est´a mexida. A inferˆencia de c para f ´e uma boa inferˆencia indutiva?

Precisamos saber se pr(f|c) > pr(¬f|c). Usando a equa¸c˜ao INV con- vertendo para uma rela¸c˜ao entre probabilidades inversas, o que isto significa que:

pr(c|f) × pr(f )pr(c) > pr(c|¬f) × pr(¬f)pr(c)

Multiplicando ambos os lados por pr(c) temos:

pr(c|f) × pr(f) > pr(c|¬f) × pr(¬f)

Isso ´e verdade? Para come¸car, quais s˜ao as probabilidades a priori de f e ¬f? Sabemos que uma das duas A ou B est´a viciada (mas n˜ao ambas). N˜ao temos mais raz˜oes para acreditar que seja a roleta A, ao inv´es de roleta B ou vice-versa. Portanto, a probabilidade que ´e a roleta A ´e 1/2 , e a probabilidade que ´e a vroleta B ´e 1/2 tamb´em. Em outras palavras, pr(f ) = 1/2, e pr(¬f) = 1/2. Ent˜ao, podemos cancelar estas probabilidades, e a condi¸c˜ao relevante se torna:

pr(c|f) > pr(c|¬f)

A probabilidade de observar a seq¨uˆencia indicada por c, dado que a roleta est´a viciada como ´e descrito, pr(c|f), ´e (3/4)4×1/4. (N˜ao ligue se n˜ao souber por que: vocˆe pode confiar em mim). Isto ´e 81/45 , que resulta em 0,079.

A probabilidade que a sequˆencia ´e observada, dado que a roleta n˜ao est´a viciada, e portanto pr(c|¬f), ´e (1/2)5 (novamente, confie em mim se quiser), que resulta em 0,031. Isto ´e menos que 0,079. Portanto, a inferˆencia ´e v´alida. A forma como trabalhamos as probabilidades a priori aqui ´e digno de nota. Temos duas possibilidades: ou a roleta A est´a viciada, ou roleta B est´a. E n˜ao temos nenhuma informa¸c˜ao que diferencie entre estas duas possibilidades. Portanto, atribu´ımos a elas a mesma probabilidade. Isto ´e uma aplica¸c˜ao de algo chamado o Princ´ıpio da Indiferen¸ca. O Principio nos diz que quando

temos um n´umero de possibilidades, sem nenhuma diferen¸ca relevante entre elas, todas tˆem a mesma probabilidade. Assim sendo, se h´a N possibilidades no total, cada uma tem a probabilidade 1/N. O Princ´ıpio da Indiferen¸ca ´e um tipo de princ´ıpio da simetria.

Observe que n˜ao poder´ıamos aplicar o Principio no Argumento do Des´ı- gnio. No caso da roleta, h´a duas situa¸c˜oes poss´ıveis que s˜ao completamente sim´etri-cas: roleta A est´a viciada, roleta B est´a viciada. No Argumento do Des´ıgnio existem duas situa¸c˜oes: um Deus criador existe; um Deus criador n˜ao existe. Mas estas duas situa¸c˜oes n˜ao s˜ao mais sim´etricas como: hoje ´e segunda; hoje n˜ao ´e segunda. Como vimos, intuitivamente, existem muito mais possibilidades na qual n˜ao existe um criador do que possibilidades na qual exista um.

O Principio da Indiferen¸ca ´e uma importante parte do racioc´ınio intuitivo sobre probabilidade. Vamos acabar este capitulo por notar que n˜ao ´e isento de problemas. ´E bem conhecido que leva a paradoxos em certas aplica¸c˜oes. Eis aqui uma.

Suponha que um carro parte de Brisbane ao meio dia, viajando a uma

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