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No capítulo IX, respondemos a algumas objeções feitas por outros e por nós mesmos. Logo depois, ao resolver as primeiras dificuldades examinadas, a crítica à teoria se ampliou, levando-nos, para melhor esclarecer e responder, a reexaminá-la, colocando-a diante da filosofia e de seus sistemas, diante das modernas orientações da biologia e das últimas conclusões da ciência astro- nômica e nuclear. Isto nos permitiu focalizar e esclarecer outros pontos, traba- lho próprio desta segunda parte, de análise e crítica.

Agora poderemos continuar a responder, de forma mais pormenorizada e específica, às várias perguntas e dificuldades que nos foram apresentadas pelos próprios ouvintes dos dois cursos realizados sobre o tema deste volu- me, nas capitais brasileiras de São Paulo e Rio de Janeiro, nos meses de in- verno deste ano de 1956. Este estudo, tirado diretamente do contato com os ouvintes dos cursos, representado pela discussão dos vários temas tratados, será aqui reproduzido tal como ocorreu, na forma de perguntas e respostas, para concluir o presente volume.

Podemos, assim, observar o choque entre duas psicologias: a humana co- mum, com os seus pontos de referência em nosso mundo, e a inspirada, que vê do alto os mesmos problemas. Temos de levar em conta também a primeira, pois nos possibilitará fazer uma observação sob novo ângulo, vendo as coisas e equacionando os problemas diversamente. Isto nos poderá conduzir a novos esclarecimentos, novas perspectivas, ainda não vistas ou não focalizadas per- feitamente. Sem dúvida, nos expõe ao risco de incorrer em algumas repetições, pois são trazidos a exame sempre os mesmos motivos. Outrossim, não será possível, nestes capítulos, manter uma ordem lógica e orgânica, pois devemos seguir o pensamento nascido na exposição dos vários temas, neles se inserindo com as discussões. Todavia, esforçamo-nos em reagrupar o material recolhido segundo os assuntos, em torno de cada tema. Este estudo tem a vantagem de nos mostrar a psicologia e as reações do ouvinte comum, quais são e como podem ser resolvidas as dúvidas que, surgindo geralmente do modo comum de conceber as coisas, costumam manifestar-se em todas as mentes. As reações se assemelham, demonstrando existir um fundo psicológico comum, originado pelos mesmos pontos de referência terrenos e humanos. Por isso estes capítu- los são proveitosos, pois nos permitem apresentar ao leitor respostas diretas às

perguntas que ele mesmo estará formulando ao ler os capítulos precedentes. Sem dúvida, seriam as mesmas que faria se tivesse assistido aos cursos, feitas pelos outros ouvintes no lugar dele. Dessa maneira, mesmo se tivermos que voltar a tratar temas já desenvolvidos, poderemos melhor alcançar o objetivo principal de toda a nossa obra, fazendo tudo ser bem compreendido. Além do mais, é difícil repetir um conceito de modo idêntico duas vezes, pois, quando se pensa repeti-lo, de fato se está acrescentando sempre algum pormenor ou aspecto diferente. Diante destas vantagens, não importa se agora os problemas não são enquadrados numa visão geral, nem se são tratados sem ordem, pois o leitor aí se encontrará um pouco, vendo resolvidas as próprias dúvidas, da ma- neira como costumam surgir na mente humana. Não devemos recusar nada que possa levar a esclarecimento e compreensão cada vez maiores.

Dito isto, passemos ao exame das objeções e às respectivas respostas. ◘ ◘ ◘

OBJEÇÃO:

Deus criou os espíritos tirando-os de Sua própria substância. Então tinham de ser de Sua própria natureza e possuir Suas mesmas qualidades. Ora, dado que, entre os atributos de Deus, devemos admitir em primeiro lugar a liberda-

de, temos de admitir, necessariamente, que os espíritos eram livres, de uma

liberdade completa, como era a de Deus. Segue-se daí a possibilidade de erro, pois uma liberdade em que não seja permitido tudo, até mesmo errar, onde alguma mínima coisa seja proibida, não é mais liberdade completa. Existia, pois, no Sistema a possibilidade de queda, como consequência do erro. Até aqui, de acordo. Mas aí começam as dificuldades.

Entre as qualidades da Divindade, devemos admitir não somente a liber- dade, mas também a perfeição, e, pelas razões acima expostas, os espíritos também deviam possuir esta outra qualidade. E, se eram perfeitos, também deviam ser infalíveis, não sujeitos a erros, portanto não devia haver possibi- lidade de queda.

Todavia deviam possuir ainda outra qualidade da Divindade. Como Deus, deviam ser oniscientes e conhecer os prejuízos decorrentes de uma desobediên- cia. Logicamente, deveriam ter escolhido o melhor caminho, ou seja, da ordem e disciplina. É inadmissível que um ser inteligente, como os espíritos deveriam ser, venha a executar um ato cujas terríveis consequências já conhecia.

No entanto há mais. A revolta não era só um ato particular, de interesse somente dos espíritos rebeldes, mas interessava a todo o Sistema, pois atentava

sobre a sua integridade; interessava sobretudo a Deus, que era a mente e o cen- tro de tudo. Ora, Deus era consciente e sabia as consequências da revolta. Mas, se sabia delas, não devia permiti-la. Um pai amoroso impede, até com risco da própria vida, que seu filho caia no abismo.

Além disso, Deus também era onipotente. Se assim era, como pode ter construído um sistema que pudesse ruir, uma lei suscetível de ser violada, uma obra sujeita a falir? Tudo isso contradiz o próprio conceito de Deus. A obra de Deus devia ser perfeita como Ele, e um sistema perfeito não pode desmoronar. Se um edifício desmorona, é porque está mal construído, e, neste caso, a im- perfeição está no engenheiro, ou seja, em Deus. Se o Sistema ruiu mais tarde, isto significa que a obra era imperfeita e que, portanto, também imperfeito era o seu autor. Sendo isto absurdo, também é absurda a teoria da queda.

◘ ◘ ◘ RESPOSTA:

Diante de uma afirmação pode-se tomar duas atitudes: não discuti-la, de- monstrando apenas os absurdos provenientes de sua aceitação, ou então discu- ti-la, demonstrando seu absurdo diante dos fatos e da lógica. Seguiremos estes dois caminhos. Comecemos pelo primeiro.

a) Poderemos excluir a teoria da queda, mas não poderemos eliminar os fa- tos existentes. Compete, então, a quem nega a teoria, dar uma explicação des- ses fatos, que, sem ela, permanecem problema insolúvel. Partamos de um dado positivo indiscutível, conhecido por todos: a existência do mal e da dor. De que causa são eles efeito e como se originaram? É indispensável um ponto de partida, e a causa primeira só pode estar em Deus. Os fatos existem e não po- dem ser destruídos. Temos ao menos de explicá-los.

Se Deus é perfeito, como podem ter saído de Suas mãos coisas tão mons- truosamente imperfeitas? Admitir uma filiação direta significa negar Seu principal atributo: a perfeição. Como pode dela ter nascido tudo de horrível existente em nosso mundo? Como pode, numa obra que deveria ser perfeita, haver tal mancha indelével? Temos, de um lado, um Deus perfeito, gerador de tudo, e, de outro, criaturas muito imperfeitas, mas que não podem ter nas- cido senão Dele. Como é possível tão estreita relação de filiação entre dois elementos tão diversos? Então, se não quisermos cair no absurdo de dizer que as criaturas não foram geradas pelo Criador, devemos admitir entre os dois a ocorrência de algum acontecimento, ao qual se deve a transformação. Se Deus, sendo Ele o Todo, não pode ter criado senão tirando tudo de Sua

substância e se esta só podia ser perfeita, então nada de imperfeito podia ter saído de Suas mãos, muito menos criaturas imperfeitas. É, pois, absurda uma criação imperfeita para se aperfeiçoar depois, onde tenham sido criados espí- ritos imperfeitos, aos quais fosse imposta depois, contra a possibilidade de qualquer livre escolha, a angustiante fadiga de conquistar a perfeição com a evolução. Além disso, há inconciliabilidade entre espírito e imperfeição, sendo uma contradição falar de espíritos imperfeitos. As criaturas saídas da mão de Deus só podiam ser espíritos e perfeitos, porque saíram das mãos de Deus. A perfeição só pode existir no estado espiritual.

Mas, em nosso universo, não existem apenas o mal e a dor. Existe também a matéria. Se Deus não é senão puro espírito, donde e como se derivou a maté- ria? Se só podemos conceber Deus como um estado espiritual perfeito, como pode ter nascido Dele, em direta relação de filiação, este tão diferente estado material imperfeito? Há um fato positivo, indiscutível: o nosso universo é dua- lista. Há nele o lado material e o espiritual. Cada elemento se constrói da con- tradição entre dois princípios opostos. Ora, o conceito de Deus só pode corres- ponder a um princípio único, estritamente monista. O dualismo, então, só pode ser aceito como uma corrupção ocorrida depois. Não é admissível em Deus o contraste ou a contradição, nem uma dissensão interna entre dois princípios contrários. Não se pode aceitar o conceito de um Deus dividido contra si mes- mo, conceito de um centro que não seja unidade absoluta.

Diante de todos esses fatos positivos, ou seja, o mal, a dor, a imperfeição de nosso mundo, a matéria, o dualismo etc., devemos concluir que ou Deus não criou tudo isso, portanto há outro criador e Deus não é o centro nem abarca tudo, ou, se não existe um anti-Deus criador de todas essas coisas, então foi Deus que as criou, portanto Ele errou e agora procura salvar Sua obra, remedi- ando o mal feito. Mas, se achamos esta segunda conclusão absurda, pois faz parte do próprio conceito de Deus que Ele não possa errar, então perguntamos: quem errou? Se devemos excluir como absurda também a primeira hipótese, de um segundo Deus criador diferente, não nos resta outra causa possível se- não Deus ou as Suas criaturas, pois, fora disso, não existe outra coisa. Então, se esses efeitos, como vimos, não podem ser atribuídos ao Criador, só nos res- ta atribuí-los à criatura. Neste caso, somente com a teoria da revolta e da queda podemos encontrar uma explicação lógica para tudo, porque, dessa forma, Deus não é o motor imediato e a causa direta do atual estado de coisas, uma vez que, entre Seu trabalho perfeito e as consequências imperfeitas, haveria

sido interposto o fato novo da revolta, causadora dessa imperfeição, que não pode de maneira nenhuma ser atribuída a Deus.

Não. O mal não pode ter sido criado por Deus, porque, se assim tivesse acontecido, deveria ser como a Sua substância, isto é, eterno e indestrutível. O mal estaria definitivamente instalado na obra de Deus, como mancha indelé- vel, e seria dada, então, a essa força inimiga o poder de arruinar para sempre a obra Divina. Não! Se não quisermos contradizer o único conceito que devemos fazer Dele, só podemos conceber o mal, a dor etc. como uma exceção tempo- rária, um incidente, uma doença curável, um desvio na obra de Deus, e não como uma parte integrante do Sistema. Ele é positivo, afirmativo e construtivo em tudo, e algo negativo não pode de forma alguma fazer parte Dele, nem de- rivar de Sua criação direta. A luz não pode gerar a escuridão, nem o bem pro- duzir o mal, nem o amor engendrar o ódio, nem a felicidade criar a dor. Vemos aqui uma inversão de valores. Trata-se exatamente de qualidades emborcadas, e só uma revolta pode explicar-nos isso. Não se trata de uma criação diferente, estranha, mas do emborcamento da criação perfeita de Deus. O efeito que te- mos sob os olhos apresenta-se-nos exatamente na posição que, invertida, al- cançaria a causa que conhecemos em Deus. Então, dado não ser possível en- contrar outras causas – a única possível, nós a vemos aparecer invertida neste efeito – só resta uma saída para resolver o problema: ligar aquela causa a este efeito por meio do fenômeno que chamamos revolta e queda. Assim, tudo fica perfeitamente explicado. Contudo, se negarmos esta teoria, tudo permanece, ao contrário, mistério e contradição. Diante dos fatos reais, não basta negar, é indispensável resolver, demonstrando. Podemos, portanto, repudiar esta teoria só quando nos for oferecida outra explicação melhor para os fatos existentes, que não podem ser eliminados pela simples negação.

Verificamos que existe exatamente uma relação de inversão entre a causa em Deus e os efeitos que vemos em nosso mundo, e a teoria da revolta nos revela precisamente um impulso dessa natureza. Temos, assim, sob os olhos as peças de uma máquina desmontada ou os fragmentos destacados de um único desenho. Experimentamos juntá-los e achamos que, em determinada posição, eles coincidem perfeitamente, dando-nos a reconstrução da máquina ou dese- nho. Temos esses resultados sob os olhos, e não são fruto de fantasia. Eles resolvem de fato o problema. Por que não aceitá-los, se assim tudo se explica, enquanto, de outra maneira, nada fica explicado?

Concluamos a primeira parte desta resposta. Se não quisermos contradizer o conceito que devemos fazer de Deus, devemos dizer que, se Ele não é tudo, então não é Deus. Portanto não pode haver nenhuma causa além Dele. Mas, se Nele não podemos achar as causas direta do mal, da dor, da imperfeição, da matéria etc., porque estas contradizem Sua natureza, devemos encontrar Nele as causas indiretas. Isto significa ter a causa primeira, que deve perma- necer sempre em Deus, sofrido um processo de inversão antes de atingir o seu efeito. Permanece íntegra a relação causa-efeito e a sua derivação, expli- cando-se, dessa forma, a mudança. A chave da solução do problema está jus- tamente na teoria da revolta. Só assim se explica porque vemos reaparecer em nosso mundo, sob a forma de qualidades invertidas, as qualidades que devem ser de Deus. Esses efeitos só podem derivar de uma causa que, embo- ra provindo de Deus, pôde em seguida erigir-se em vontade diversa, porque era, por sua natureza, livre, portanto capaz de desviar-se do caminho traçado e, por um impulso próprio, imprimir uma direção diferente ao impulso da causa original. Dessa forma, vemos chegar a seus lugares todas as peças do desenho, que fica assim totalmente refeito.

Esta opinião nos é confirmada, quando observamos que a evolução, muito mais do que um processo de criação, representa um processo de reconstrução. Mais do que uma formação do nada, a evolução representa um trabalho de reconstituição, de reconstrução do destruído. Não é criação, mas um despertar. Só assim se explica o telefinalismo da evolução e a razão pela qual o ponto de chegada já possa ter sido dado, antes de ter sido realizado o caminho para al- cançá-lo. A felicidade estava na ordem e é alcançada com a reordenação. O erro foi de desobediência e é corrigido pela obediência à lei de Deus. Nosso universo é uma clínica onde se curam os enfermos da doença de rebelião. O trajeto é lógico e completo: na ordem, um impulso errado gera a desordem; impõe-se então a evolução como processo de reordenação de elementos caídos na desordem. A revolta não tem poder para criar ou destruir. Tudo permaneceu no Anti-Sistema, mas ficou fora de lugar. Trata-se apenas de tornar a arrumar tudo como estava antes. Em nosso mundo há matéria prima para qualquer construção; em nosso espírito jazem latentes as ideias para fazer qualquer des- coberta e para civilizar as relações sociais até à felicidade, segundo a lei de Deus. No Anti-Sistema, desvio do Sistema, existem todos os elementos para a reconstrução do Sistema. Basta levá-los à sua devida disciplina. Uma vez re- constituída a ordem antes destruída, desaparecerá o mal, a dor, a imperfeição,

a matéria, o dualismo e todas as qualidades deste mundo decaído, filho da re- volta. Basta retornar à Lei, e reaparecerão todas as qualidades destruídas do Sistema. A criatura foi criada feliz, com a condição de obedecer à Lei. Saindo da Lei, ela saiu da felicidade para entrar na infelicidade. Reentrando na Lei, a criatura sairá da infelicidade para reentrar na felicidade. Assim, a vida, reorga- nizando inicialmente os elementos em formas simétricas (cristais), depois em vegetais e animais (organismos), a seguir em unidades coletivas, segundo pla- nos construtivos cada vez mais complexos, realiza, ao evoluir, o grande traba- lho de reorganização da ordem, desfeita no caos pela revolta.

Com isto, terminamos a primeira parte da resposta à objeção, sem discuti-la para demonstrar-lhe o absurdo, mas apenas demonstrando em quais absurdos cairíamos se a aceitássemos.

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b) Prossigamos, agora, na segunda parte da resposta, discutindo as afirmati- vas da objeção, opostas à teoria da queda, para ver se correspondem à verdade. Sustenta a objeção que, sendo os espíritos perfeitos e oniscientes, não po- diam pecar nem errar. Entretanto, quando tivermos compreendido o valor a ser dado ao conceito de perfeição e onisciência, isto é, que essas duas quali- dades não devem ser compreendidas no sentido simplista e absoluto, como apareceu na objeção, então poderemos perceber que essa afirmativa não cor- responde à verdade.

Já dissemos, no Capítulo VI, sobre Deus criador, que a primeira criação dos espíritos puros produziu não uma simples multiplicidade, mas um verdadeiro organismo, um sistema, com hierarquia de posições e distribuição de funções, como é indispensável em qualquer organismo ou sistema. A estrutura orgânica não foi apenas uma necessidade para contrabalançar o processo divisionista, de onde derivara a criação e que podia ameaçar a coesão da unidade do todo. O Sistema assumiu a estrutura orgânica sobretudo porque a criação de tantos seres diferentes se baseava no princípio do Amor. Esta é a força que continuou a cimentá-los, o impulso que devia mantê-los unidos em sistema, única forma de existência possível num regime de absoluta liberdade. Por isso não podia ser eliminada a priori, no Sistema, uma possibilidade de revolta, justamente porque a vida do organismo não podia basear-se senão sobre uma livre aceita- ção. A revolta não podia ser impedida pela violação da liberdade dos espíritos, reduzindo-os à escravidão, mas somente pela força do princípio do Amor, que devia funcionar neles, em direção a Deus, com a mesma plenitude que aquele

princípio havia funcionado de Deus para eles. Ao princípio de Amor era confi- ada, de modo livre, a tarefa de frear e disciplinar o impulso oposto separatista do egocentrismo individual, cujo predomínio foi a origem da revolta. Por ter sido uma rebelião contra o princípio fundamental da criação, grande foi essa culpa, que conduziu a tão duras consequências.

Da revolta já falamos no Capítulo VII. Quisemos aqui apenas lembrar como o Amor representa o princípio de coesão e fusão, ao qual estava confiada a manutenção da organicidade do Sistema, princípio cuja função foi organizar os egocentrismos individuais numa ordem hierárquica. Dessa maneira, contraba- lançando o Amor, que une, e o egocentrismo, que divide, chegou-se à estrutura hierárquica do Sistema. É necessário compreender bem esse conceito, a que, em geral, não se dá importância, mas que produz mal-entendidos e incompre- ensões. Deste conceito derivam importantes consequências.

O princípio hierárquico vigente no Sistema satisfaz também outra exigência e cumpre outra função. Se a criação dos espíritos tivesse produzido uma sim- ples multiplicidade de seres, todos iguais, não só seria impossível a distribui- ção e organização de atividades, como ainda, dentro da igualdade universal, Deus não seria mais centro nem seria possível distingui-lo da criatura. A orga- nicidade do Sistema é também uma consequência da necessidade de manter em Deus a centralidade dirigente do todo.

Eis que o princípio hierárquico nos leva à ideia de distribuição, de distin- ção, de diferença entre os vários elementos. Ocupar na organização do Sistema posições diferentes significa possuir qualidades diferentes, para executar tare- fas diferentes. Chegamos, agora, ao âmago da questão, em condições de poder avaliar mais exatamente o valor do conceito de perfeição e onisciência nos espíritos. Podemos dizer que estas qualidades não podem se entendidas no sentido absoluto, mas somente no relativo; não como um fato em si, como se supõe na objeção, mas apenas como uma posição proporcional, em relação à função que devia ser realizada na hierarquia do organismo. Fica incólume, assim, o conceito da centralidade de Deus no Sistema, princípio do qual deri- vam os princípios de ordem, de lei e de obediência. Na homogeneidade geral,