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Neste capítulo, o procedimento analítico apresentado resumidamente na introdução desta tese é detalhado, sendo expostos os fundamentos metodológicos adotados e as providências para a elaboração da tecnologia de projeto objetivada neste trabalho e a verificação do impacto desta sobre a composição arquitetônica da edificação penal.

Conforme o exposto na introdução desta tese, o estudo do paradigma tecnológico da edificação penal efetuado vislumbra o aprimoramento do espaço arquitetônico da prisão através de uma tecnologia de projeto ajustada às demandas do sistema penal nacional. Esta tecnologia de projeto sistematiza o conhecimento teórico, metodológico e técnico necessário à composição arquitetônico, ao coordenar as soluções espaciais mais aptas para a modalidade arquitetônica de segurança máxima. Neste sentido, a fundamentação desta pesquisa levanta os conceitos e princípios da arquitetura penal, assim como, as características formais (preconizadas nos modelo prisional) e informais (advindas da realidade prisional) da edificação penal, além da base teórico-metodológica. Enquanto o desenvolvimento da pesquisa concebe e aplica a tecnologia de projeto para a verificação da expectativa de incremento do espaço arquitetônico, por meio da revisão do conhecimento projetual específico. A concepção e a aplicação da tecnologia de projeto constituem as duas etapas analíticas desta tese, sendo explicadas a seguir.

No procedimento analítico foram utilizados conceitos e princípios do trabalho de Christopher Alexander (1974a), conforme o informado na introdução desta tese. Segundo Alexander, o objetivo do projeto é que a forma responda aos problemas colocados pelo contexto, de tal maneira que se obtenha um bom ajuste na relação contexto-forma.

[...] todo problema de projeto tem origem no esforço em se obter o ajuste entre duas entidades: a forma em questão e seu contexto. A forma é a solução para o problema; o contexto define o problema. Em outras palavras, quando falamos de projeto, o centro da discussão não é a forma em si, mas o conjunto que compreende a forma e seu contexto. Um bom ajuste é uma propriedade que se busca neste conjunto, que diz respeito à uma determinada divisão do conjunto em forma e contexto (ALEXANDER, 1977a, p. 15-16).

Esta pesquisa particulariza certos pontos instituídos por Christopher Alexander, de modo fundamentado em uma flexibilidade do processo de projeto vislumbrada pelo próprio autor (ALEXANDER, 1977a, p. 8). Segundo Moreira (2007, p. 55), os princípios descritos por Alexander não pretendem estabelecer um procedimento rigoroso, mas sim uma estrutura onde a concepção possa ser precisa em seus objetivos, além de reduzir a subjetividade do processo.

5.1 Concepção da tecnologia de projeto

A concepção da tecnologia de projeto foi precedida pela definição de uma estrutura analítica, providenciada por meio de programa arquitetônico. Segundo o trabalho de Christopher Alexander, o procedimento metodológico para a estruturação de um programa arquitetônico é composto das etapas de descrição e a análise do contexto para a definição do conjunto de requisitos funcionais74, seguida

das etapas de vinculação e agrupamento destes requisitos, cuja estrutura permite a organização do programa arquitetônico.

Nesta pesquisa, a descrição do contexto é efetivada na fundamentação, enquanto a análise do contexto é precedida por uma estrutura preliminar do programa arquitetônico75. Esta antecipação na disposição

metodológica de Alexander se deve ao conhecimento prévio do problema de projeto de estabelecimentos penais, encontrado no trabalho de Esteca (2010). Com esta estrutura preliminar, as etapas previstas para a formulação do programa arquitetônico foram simplificadas, ao se substituir um universo de maior complexidade, formado por um grande número de elementos dispersos, por outro já organizado em categorias analíticas (seções 6.1 a 6.3 do capítulo 6). Esta estrutura preliminar foi definida pelos quesitos de projeto concernentes ao planejamento do sistema penitenciário e à atividade prisional. Estes últimos definidos pelos quesitos panópticos (ver capítulo 2, desta tese).

Com base no padrão de problema adotado, um arcabouço de programa arquitetônico foi elaborado pela aplicação do diagrama de árvore à estrutura preliminar inicialmente obtida, hierarquizando as categorias analíticas (seção 6.3 do capítulo 6)76. Neste arcabouço de programa arquitetônico, os

requisitos funcionais e os respectivos vínculos são definidos pela análise do contexto (ver Apêndice D). No sentido da nitidez da informação, esta definição priorizou os conteúdos teóricos do Panóptico (capítulo 2) e técnico-normativos do modelo prisional (capítulo 3). Deste modo, poucos requisitos surgiram diretamente da análise da realidade prisional (capítulo 4). Esta medida buscou evitar a transposição de disparidades existentes na realidade prisional para os requisitos funcionais77.

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Na representação formal, a análise do contexto deriva um conjunto de requisitos funcionais (ALEXANDER, 1977a, p.1), o que torna o processo de projetação mais objetivo (CARVALHO, p. 60).

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A adequação do procedimento original se embasou em considerações do próprio Alexander. No trabalho Community and privacy, Alexander apresenta um estudo de caso de implantação de um grupo de residências em uma cidade para exemplificar o método por ele desenvolvido, no qual admite uma padronização prévia do problema de projeto (CHERMAYEFF; ALEXANDER, 1966, p. 152).

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Alexander (1977a, p. 74) propõe a decomposição do contexto através de mecanismo de análise denominado ‘diagrama de árvore’. Esta decomposição ocorre hierarquicamente do geral para o particular, na qual são representadas apenas as ligações principais e os agrupamentos mais independentes. Isto significa ressaltar os valores de projeto ou as qualidades mais importantes em um edifício (HERSBERGER, 1999, p. 53).

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A definição dos requisitos funcionais busca atender a recomendação de Christopher Alexander de objetividade na elaboração do programa arquitetônico, transpondo os cuidados do autor, exemplificados com o projeto de uma aldeia na Índia (ALEXANDER, 1977):

Para evitar o perigo de ir contra o padrão [estrutural do problema de projeto] vamos observar apenas os aspectos familiares e conhecidos das residências e das suas conexões com a cidade, selecionando apenas os requisitos que são específicos e que não

Como última providência para a montagem do programa arquitetônico, os vínculos entre os requisitos funcionais são contabilizados e classificados, segundo a natureza destes requisitos: externa (relacionados ao planejamento do sistema penitenciário), interna (intrínsecos à atividade prisional) ou ligados aos elementos centrais da edificação penal. Esta providência revisou o diagrama de árvore preliminarmente obtido na elaboração do arcabouço programático, ao explicitar novas subordinações entre os subgrupos de quesitos (seções 6.4 e 6.5 do capítulo 6).

Com a definição do programa arquitetônico, os procedimentos analíticos se voltam para a definição das soluções integrantes da tecnologia de projeto, através da caracterização formal e informal da arquitetura em cada requisito funcional, seguida da comparação destas instancias em duas abordagens diferentes, explicadas a seguir.

A caracterização formal do espaço arquitetônico refletiu as demandas do modelo prisional, abordado no capítulo 3 (instrumentos legais e técnico-normativos), além de princípios penalógicos sistematizados pelo Panóptico (ver capítulo 2). Esta caracterização também envolveu o padrão arquitetônico modular de segurança máxima, inclusive o modelo supermax norte-americano (ver Apêndice A). A caracterização informal refletiu os projetos de referência adotados nesta pesquisa (ver Apêndice A), em conjunto com as exigências da realidade prisional tratadas no capítulo 4.

Em um primeiro momento, a comparação analítica aborda a equivalência entre as características formal e informal de cada requisito funcional (seção 6.6 do capítulo 6 e Apêndice E), segundo os critérios: convergência plena (equivalência); convergência parcial (maioria de elementos comuns); divergência parcial (maioria de elementos dissonantes); e divergência plena (as características destoam na sua totalidade). Esta equivalência é definida com base nos projetos de referência adotados (ver Apêndice A), sendo estabelecida a partir dos resultados obtidos individualmente em cada um destes projetos. A equivalência encontrada nos requisitos funcionais é então contabilizada em relação ao programa arquitetônico, aos subconjuntos de quesitos e aos projetos de referência. Esta primeira avaliação permite ponderações entre a convergência ou divergência das características formais e informais da edificação penal.

Em um segundo momento, a comparação analítica define as melhores soluções arquitetônicas (seção 6.7 do capítulo 6 e Apêndice E), ao avaliar as características formais e informais no atendimento dos critérios estabelecidos no estudo do paradigma tecnológico da edificação penal (ver introdução). Esta

obscurecidos pelas semânticas mal compreendidas; e que podem ser descritos de modo preciso, que poderão ser reconhecidos como lugares familiares e funcionais em nossas vidas diárias e que não sejam questões de gosto.

avaliação considera o atendimento de todos os critérios, o atendimento de parte dos critérios ou o não atendimento dos mesmos. Os critérios aplicados são:

a) Segurança78: a graduação e a homogeneidade do sistema de segurança em termos da

estanqueidade, impermeabilidade, inexpugnidade, disciplina interna e controle, com a minimização de vulnerabilidades do esquema de segurança; a preservação da integridade dos funcionários (exposição aos riscos); e a manutenção da ordem (disciplina dos presos).

b) Funcionalidade79: a compatibilidade da estrutura física, a qualidade dos espaços disponíveis e as relações entre os espaços. O primeiro ponto verificou a viabilidade das atividades: as características das atividades juntamente com o número de participantes em relação à quantidade de espaço disponível. O segundo ponto trouxe as questões da individualização/coletivização, racionalidade geométrica, compactação e especialização das atividades, tendo como metas a redução de tarefas e a simplificação dos procedimentos80. O

terceiro ponto considerou a acessibilidade e mobilidade das pessoas e a integração da equipe funcional. Em particular, nos elementos centrais da edificação penal (cela, pátio de sol dos presos e posto de controle) foram considerados outros critérios da sistemática de Graeff (2006), como a compartimentação e o dimensionamento, ou ainda são complementados pela avaliação das aberturas, circulações, equipamentos e mobiliário.

c) Conforto ambiental81: a ventilação e a iluminação naturais (a posição, localização, tipificação

e dimensionamento das aberturas, a relevar a padronização e compatibilização das soluções, além do número de pessoas atendidas e áreas internas livres).

d) Custos82: a compactação espacial e funcional com redução de tarefas e simplificação de

procedimentos (diminuição de áreas e de pessoal, além da otimização das estruturas física e

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A segurança se balizou na descrição da modalidade arquitetônica de segurança máxima, realizada no capítulo 1, sendo exemplificada pelo modelo super-max norte-americano, associada aos requisitos físicos e operacionais do estabelecimento penal encontrados no Panóptico (ver capítulo 2) e no modelo prisional nacional (ver capítulo 3), complementados pela realidade prisional (ver capítulo 4).

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A funcionalidade diz respeito à eficiência do edifício do ponto de vista das atividades a serem desenvolvidas pelos indivíduos. Compreende a estrutura física necessária para a correta aplicação da pena, em torno do binômio da privação de liberdade/programa de benefícios aos presos, segundo o previsto no modelo prisional e concretizado na realidade prisional. Neste sentido, abordou prioritariamente o cumprimento de pena na perspectiva da prisão como atividade econômica. Além disto, compreendeu a composição arquitetônica na perspectiva das necessidades espaciais associadas aos padrões de bem-estar das pessoas, em particular, no exercício das suas relações sociais eda sua individualidade. O respeito à condição humana na prisão remete à adequação do edifício do ponto da prisão como atividade social. Na pragmática penitenciária, estes itens se traduzem em comodidades para os usuários – funcionários e presos.

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A redução de tarefas e simplificação de procedimentos está relacionada ao tempo gasto no cumprimento das rotinas da prisão pelos funcionários e é identificada como velocidade da prisão. Outra abordagem do tempo gasto na rotina prisional é a permanência das pessoas nos locais. Estes parâmetros e a sua mensuração foram fornecidos pelos funcionários nas entrevistas realizadas (ver Apêndice C).

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A condição humana é tratada essencialmente nos direitos dos presos, consubstanciados na legislação e nas políticas penitenciárias. No entanto, estes instrumentos não apresentam parâmetros claros ou diretos para o projeto arquitetônico penal, com exceção de cuidados com a higiene ou salubridade. Neste sentido, o respeito à condição humana na prisão na pesquisa focou a característica e o dimensionamento de ambientes e as aberturas de iluminação e ventilação.

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Os custos envolvem a construção e a operação do edifício prisional. O custo de construção recaiu sobre a superestrutura (edifício). Os custos de operação se limitaram aos operacionais, especialmente no que tange ao contingente de funcionários de segurança estática (postos de controle). Os custos de utilização (manutenção e substituição) não foram abordados. Importante realçar que os custos foram tratados em um nível estimativo (método expedito e paramétrico de orçamento) que oscila a margem de erro entre 10 e 20% (CARVALHO,

operacional); redução da relação custo por vaga (coletivização e generalização funcional dos espaços com aumento das capacidades).

As soluções arquitetônicas formais ou informais com melhor avaliação (atendimento dos critérios apresentados) são indicadas para compor a tecnologia de projeto. Ao mesmo tempo em que a consistência do conjunto é avaliada em relação às equivalências levantadas na primeira análise e em relação à compatibilidade com o objetivo de aprimoramento do espaço arquitetônico de segurança máxima desta pesquisa (conclusão analítica do capítulo 6). No procedimento realizado, a avaliação do conjunto apontou uma inconsistência que levou a estudos complementares, de forma a diluir qualquer impasse ou incorreção, o que integra o capítulo 783.

Após os ajustes do conjunto obtido, a tecnologia de projeto é elaborada como um quadro sintético (ver Apêndice F), baseado no programa arquitetônico concebido. Este quadro apresenta os conteúdos teóricos, metodológicos e técnicos desenvolvidos para cada requisito funcional que justificam, instrumentam e parametrizam as soluções arquitetônicas dispostas nos requisitos funcionais. Os conteúdos teóricos trazem a fundamentação penalógica e arquitetônica, eventualmente complementada por considerações advindas do modelo e da realidade prisional. Os conteúdos metodológicos apontam os objetivos e os processos para a implementação das soluções arquitetônicas definidas. E os conteúdos técnicos exibem as referências normativas relevantes, além de parâmetros de dimensionamento. Os conteúdos apresentam os vínculos existentes entre os requisitos funcionais.

5.2 Aplicação da tecnologia de projeto

A segunda parte analítica desta pesquisa visou ao teste da tecnologia de projeto, determinando as relações lógicas para uma conclusão final com base na coerência dos resultados obtidos, no avanço científico e nas aplicações práticas (ver capítulo 8). Este teste objetivou avaliar o impacto da tecnologia de projeto na composição arquitetônica, no sentido do aprimoramento da edificação prisional objetivado na pesquisa proposta (hipótese de pesquisa). Esta experiência evidenciou as convergências e divergências no material tecnológico aplicado, o que ensejou ajustes ou a necessidade de novos testes.

2007). As estimativas calculadas na análise de custos realizada utilizaram as médias aritméticas simples dos valores e índices. Os custos foram definidos por itens físicos e operacionais do estabelecimento penal, por isto é um item crítico, ao permear todos os demais critérios.

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Para Alexander, a organização dos requisitos funcionais e seus agrupamentos no programa arquitetônico define partes interdependentes, assim, quando se altera uma das propriedades do edifício, ela intervém nas demais. Esta representação formal possibilita haver ajustes até a obtenção da opção mais apropriada (contexto-forma). Para Moreira (2007, p. 81 apud PEREIRA, 2010), o programa arquitetônico permite a análise do contexto em partes, de modo a analisá-lo em seus pormenores e entender a estrutura do problema, onde o entendimento das interações é mais importante que o das partes separadas.

No teste realizado, a tecnologia de projeto foi aplicada aos projetos de referência desta pesquisa: a Penitenciária do Distrito Federal, o projeto padrão da penitenciária compacta do Estado de São Paulo, o projeto padrão de cadeia pública do Ministério da Justiça e o modelo de penitenciária da empresa Verdi Construções S/A (ver Apêndice A). A avaliação consistiu em verificar o desempenho dos projetos revistos em comparação aos originais, segundo os critérios de segurança, funcionalidade, conforto ambiental e custo de construção e operação (Apêndice H).

A aplicação da tecnologia de projeto aos projetos de referência foi auxiliada pela confecção de desenhos-síntese de uma unidade prisional e dos elementos centrais da edificação penal (barreira perimetral, cela, pátio de sol dos presos e posto de controle) (seção 8.1 do capítulo 8 e Apêndice G). Estes desenhos-síntese se baseiam no conceito de croqui-síntese de Alexander, tendo sido utilizado para condensar e representar visualmente as soluções da tecnologia de projeto desenvolvida84.

A avaliação dos projetos de referência abrangeu quatro abordagens, em termos da comparação entre as características físicas e econômicas dos projetos originais e ajustados: os dados gerais do espaço arquitetônico projetado; estes dados comparados às caracterizações da edificação penal formuladas nos estudos do modelo e da realidade prisional (capítulos 3 e 4), assim como, às características do desenho-síntese de unidade prisional elaborado; individualmente, em cada um dos requisitos funcionais da tecnologia de projeto desenvolvida (Apêndice F); e especificamente quanto aos elementos centrais da edificação penal.

A avaliação realizada destacou alguns índices gerais da edificação penal: custo por vaga, custo por área construída, área construída por vaga e número de funcionários por vaga. O índice de custo por vaga estabelece a otimização do programa arquitetônico em função dos recursos disponibilizados para as políticas penitenciárias de ampliação do parque penal. O índice de custo por área construída complementa a avaliação do custo do estabelecimento penal, diluindo eventuais distorções do custo por vaga. O índice de área construída por vaga indica a proporção de áreas voltadas para o programa de sociabilização e de benefícios aos presos, assim como, para a segurança penitenciária. O índice do número de funcionários por vaga denota a eficiência operacional do edifício, no sentido de que um contingente menor aponta uma unidade penal arquitetonicamente mais bem resolvida.

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Conforme Duerk (1993, p. 9), na fase de síntese do processo de projeto, cada requisito funcional deriva uma parte da forma e então para uma solução formal geral (proposta arquitetônica). Assim, a elaboração dos desenhos-síntese inicia a síntese arquitetônica prevista no processo de Christopher Alexander. A confecção de croquis-síntese se baseia na constatação de Alexander, da maior capacidade do arquiteto em reter informações visuais.

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