ELABORAÇÃO DO PROGRAMA DE ENSINO
4. Procedimento para formulação de objetivos de ensino
O procedimento para elaboração dos objetivos de ensino orientadores da formulação do programa, que simultaneamente aos procedimentos de descrição do problema, incluiu as seguintes atividades, descritas adiante:
1) exame das filmagens realizadas na unidade de internação de bebês egressos de UTI neonatal;
2) registro sintético, de palavras ou expressões relativas a dimensões (variáveis) do desempenho dos cuidadores presentes às situações filmadas;
2
3) indicação de verbos de ação correspondentes a classes de respostas de cuidadores relacionados ao lidar com o bebê, descrição destas classes em termos de condições antecedentes e subsequentes, e organização, em termos de relação de especificidade/generalidade entre elas, das classes de comportamentos desejáveis para cuidadores de bebês egressos de UTI neonatal, a partir das observações realizadas, dados obtidos em entrevistas com equipe técnica e de conhecimento disponível sobre atendimento a bebês egressos de UTI neonatal.
A partir das observações registradas por meio de filmagem, foram obtidas informações sobre os comportamentos das mães ou familiares durante a permanência no berçário em situações de interação com o bebê ou com membros da equipe técnica da unidade de saúde, que possibilitaram uma caracterização de comportamentos presentes e ausentes relacionados às interações com o bebê (cuidados maternos e comportamentos sociais) e com a equipe de profissionais, considerando condutas compreendidas como desejáveis pela pesquisadora para estas situações, em função de conhecimento prévio disponível sobre desenvolvimento infantil, particularmente no caso de bebês de risco. A derivação de comportamentos de interesse foi feita, assistindo às filmagens sucessivas vezes, e registrando, de modo anedótico, palavras ou expressões indicativas de aspectos dos comportamentos apresentados pelas mães (com propriedades apropriadas ou não de acordo com este conhecimento) ou omitidos por elas em circunstâncias nas quais determinados comportamentos poderiam ser considerados apropriados considerando este mesmo conhecimento, que chamavam a atenção.
A partir destes registros sintéticos, e tomando como referência os componentes de uma relação comportamental (condições antecedentes, ação e condições subseqüentes), tal como propõe Botomé (1996, entre outros), foram elaboradas descrições sucessivas correspondentes a condutas de mães de bebês de risco que podem ser desejáveis durante a situação de internação hospitalar de seu bebê. O resultado final deste processo de descrições, incluindo classes de comportamentos de diferentes níveis de abrangência, pode ser observado no Apêndice E - Descrição comportamental de classes de comportamentos de diferentes níveis de especificidade esperadas de cuidadores de bebês egressos de UTI neonatal. Foi utilizada, em alguns casos, para designar as classes de respostas, a mesma denominação utilizada para indicar a classe de comportamentos de interesse correspondente, como forma de tornar evidente, mesmo em situações de indicação sintética do comportamento, por meio do uso de verbo de ação, qual o comportamento de interesse.
Simultaneamente a este processo de descrição comportamental de classes de comportamentos esperadas de cuidadores de bebês na situação-alvo, foram sendo realizadas, de modo tentativo, organizações das classes de comportamentos identificadas e descritas, de modo a evidenciar classes mais gerais e específicas componentes destas classes mais gerais, bem como a indicação das funções predominantes de cada uma das classes gerais de comportamentos. O resultado deste processo de organização das classes de comportamentos identificadas como relevantes de serem apresentadas por cuidadores de bebês egressos de UTI neonatal pode ser visto, a seguir no Quadro 1.
Quadro 1. Classes de comportamentos gerais e específicas esperadas de cuidadores de bebês egressos de UTI neonatal.
Classe geral de comportamentos
Classes específicas componentes da mais geral
Tipo de função que predomina
Falar com o bebê, em qualquer oportunidade de interação Tocar o bebê, sempre que possível ou necessário, de
forma adequada Acarinhar o bebê, em qualquer
oportunidade de interação (Alisar a pele do bebê, Beijar
o bebê)
Pegar o bebê no colo, em qualquer oportunidade de interação e sempre que necessário, de forma adequada
(Embalar o bebê) Sorrir para o bebê em qualquer
oportunidade de interação (Expressar na face alegria por
estar com o bebê) Manter contato visual com o bebê, sempre que possível, ao
interagir com ele INTERAGIR
ADEQUADAMENTE COM O BEBÊ
Manusear o bebê/deslocar o bebê, de forma adequada
sempre que necessário
Promoção e estimulação da
qualidade da relação entre mãe-
bebê Conforto psicológico do bebê e da mãe SUPRIR NECESSIDADES DO BEBÊ OBTER INFORMAÇÕES SOBRE O BEBÊ
Observar o bebê de modo constante
(Olhar para o bebê)
Identificação de necessidades do bebê Identificação da qualidade do estado/bem-estar do bebê
Manipular / Deslocar o bebê com segurança (Posicionar o bebê corretamente deitado na incubadora/berço, Posicionar o
bebê corretamente para a amamentação, Posicionar o
bebê corretamente para a higienização, Posicionar corretamente a cabeça do bebê
em diferentes posturas e manuseios)
Segurar o bebê corretamente nas diferentes posturas, manuseios e deslocamentos GARANTIR
CONDIÇÕES DE SEGURANÇA PARA
O BEBÊ
Proteger o bebê de estímulos nocivos e ou inadequados (estímulos visuais, auditivos,
táteis, vestibulares e sociais)
Segurança e conforto físico, embora envolva também a condição de estímulo em função do modo de fazer Banhar o bebê Limpar o umbigo do bebê
Enxugar o bebê Trocar o bebê Pentear o bebê Vestir roupa no bebê Passar pomada para assadura
no bebê
Enrolar o cueiro no bebê
Higiene Conforto físico GARANTIR CONDIÇÕES DE HIGIENE E CONFORTO FÍSICO DO BEBÊ Posicionar o bebê adequadamente em função das
necessidades e situações
Conforto físico Amamentar o bebê no peito
Alimentar o bebê com seringa e chuca/mamadeira ALIMENTAR O
BEBÊ
Alimentar bebê com copinho
Alimentação, embora envolva
também a estimulação e fortalecimento da relação entre mãe - bebê em função do
modo de fazer Solicitar orientação sobre o
bebê
Obter informação sobre o bebê pelo contato com os
profissionais CRIAR CONDIÇÕES FAVORECE-DORAS PARA LIDAR ADEQUADA- MENTE COM O BEBÊ NO BERÇÁRIO
Obter informação sobre o bebê pela experiência própria
Possibilitar um ambiente propício para troca de informações e orientações Possibilitar a potencialização da interação entre o bebê e mãe Estimular o estreitamento da relação
Falar com diversas pessoas sobre o bebê (Diferentes profissionais e mães na mesma
situação ou que já passaram por ela)
Expressar sentimentos em relação ao bebê (Necessidade
de hospitalização, Desenvolvimento normal,
entre outros) Expressar sentimentos em
relação a si mesma Expressar sentimentos e idéias
em relação a assuntos diversos: casa, companheiro,
outros filhos Reservar um período do dia e/ou da noite para cuidar de si mesma, realizar autocuidados CRIAR CONDIÇÕES PARA CUIDAR DE SI MESMA Relaxar Possibilitar um ambiente propício para apoio emocional e psicológico Possibilitar um ambiente propício para troca de experiências Oferecer o peito para o bebê
Pegar o bebê no colo, em qualquer oportunidade de interação e sempre que necessário, de forma adequada
(Embalar o bebê) Falar com o bebê, em qualquer
oportunidade de interação Manter contato visual com o
bebê
Tocar o bebê, sempre que possível ou necessário, de
forma adequada Acarinhar o bebê, em qualquer
oportunidade de interação (Alisar a pele do bebê, Beijar
o bebê) TRANQUILIZAR O
BEBÊ
Acomodar o bebê no local em que dorme
Promoção e estimulação da
qualidade da relação entre mãe-
bebê Conforto físico e
psicológico do bebê e da mãe
Foram indicadas, ainda, para cada um destes comportamentos, condições que poderiam ser consideradas como favorecedoras ou desfavorecedoras para que as mães apresentassem tais comportamentos, considerando as que eram impostas pelas condições observadas ou existentes no ambiente do berçário externo. Deste processo de exame e organização sucessivos, emergiram classes gerais de comportamentos desejáveis destes cuidadores, tais como interagir adequadamente com o bebê, obter informações sobre o bebê, garantir condições de segurança para o bebê, garantir condições de higiene para o bebê,
alimentar o bebê, criar condições favorecedoras para lidar adequadamente com o bebê no berçário, criar condições favorecedoras para cuidar de si mesma enquanto o bebê estiver no berçário e tranqüilizar o bebê.
Uma vez identificadas classes gerais de comportamentos esperados de cuidadores de bebês egressos de UTI neonatal, a partir do processo de organização das diferentes classes de comportamentos identificadas pela pesquisadora, estas foram descritas comportamentalmente, e o resultado pode ser visto no Apêndice F - Comportamentos esperados de cuidadores de bebês hospitalizados egressos de UTI neonatal.
A partir destas classes foram, então, propostos objetivos para o programa de ensino, em termos de comportamentos de mães ou seus substitutos, a serem instalados em participantes do programa, de diferentes níveis de abrangência (BOTOMÉ, 1977; 1981; 1996; 2000). Os procedimentos e critérios utilizados para definição dos objetivos de ensino consideraram não somente o contexto geral em que as mães estavam inseridas, isto é, um serviço de atendimento a bebês que haviam necessitado de internação em unidade de atendimento intensivo numa santa casa e que ainda necessitavam de procedimentos técnicos específicos para garantia de sobrevivência, mas também o contexto das mães que, embora pudessem ter tido contato com a maternidade anteriormente, nessa situação parecem desprovidas de autonomia e independência quanto aos cuidados a serem desempenhados por elas. Dessa forma, o programa de ensino pretendeu abarcar as situações nas quais eram solicitados desempenhos das mães nos cuidados de seus bebês inseridos na rotina do serviço.
Como parte do programa, foram então propostos, como objetivos terminais, comportamentos das mães que se referiam a cuidados maternos que eram necessários de serem desempenhados pelas mães no berçário, desde aqueles mais gerais até outros específicos componentes dos mais gerais. Foram contemplados, nos objetivos do programa, ainda, comportamentos das mães que se referiam a propriedades relevantes do contato das mães com seus bebês, considerando o conhecimento existente sobre desenvolvimento infantil, antes, durante ou após esses cuidados. Assim, desde o processo de identificação dos objetivos (Estudo 1), até a implementação do programa (Estudo 2), ocorreu um processo de revisão dos objetivos identificados como relevantes para aquela situação; como resultado deste processo, alguns objetivos inicialmente previstos não foram incluídos no programa. Assim, embora se mantivesse a importância de preparar as mães para lidar com suas próprias necessidades (cuidar de si mesma), foi observado que sua atenção e esforços estavam prioritariamente voltados para o bebê, o que provavelmente concorreria com esse tipo de objetivo no programa; por esta razão, objetivos correspondentes a este conjunto de habilidades acabaram
não sendo mantidos no programa de ensino. Por outro lado, alguns objetivos que não foram identificados especificamente a partir do Estudo 1, foram considerados como necessários, e inseridos como pré-requisitos (embora não constem dos recursos intermediários de planejamento do programa), como aqueles contemplados nos módulos de informações gerais e recomendações gerais ao cuidar e lidar com o bebê pré-termo. Assim, alguns objetivos inseridos nos módulos inicias como requisitos tanto para “cuidar de bebês” quanto para “interagir com bebês”, referem-se a comportamentos relevantes para a relação de mães com bebês - não apenas com bebês pré-termo. Foram, nestes casos, derivados não das situações em que foram observadas mães participantes do Estudo 1, e sim referenciados pela literatura como benéficos para o desenvolvimento infantil.