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Capítulo II – Orquestrando a pesquisa

2.5 Procedimentos para a coleta de dados

Tomei como referência a recomendação de Bauer e Aarts (2002), que sugerem as seguintes etapas da construção do corpus nas ciências sociais: “a) selecionar preliminarmente; b) analisar essa variedade; c) ampliar o corpus de dados até que não se descubra mais variedade” (p. 55). No caso deste estudo, foi feita uma observação participante, com baixo grau de intervenção, mas consciente de que o pesquisador “também é um ator agindo e exercendo sua influência” (Laville & Dionne, 1999, p. 33).

Quase todas as aulas foram observadas, com exceção de três delas, devido a imprevistos. Foram observados a atuação dos participantes na sala juntamente com seus colegas e professora, sua relação com o contexto de sala de aula, os momentos em que falavam mais, ou que falavam menos, quão ativos eles eram nas atividades em grupos ou em duplas e sua postura como alunos. Durante a observação, fiz anotações subjetivas, de impressões pessoais, as quais depois comparei com outras informações, a partir das gravações e dos instrumentos escritos.

Para a coleta do discurso natural dos alunos, as aulas foram gravadas em áudio a partir da oitava aula, após a questão burocrática da instituição de confirmação da turma, e após a assinatura dos termos de consentimento (anexos VI e VII) por todos os alunos. Há, na sala de aula, cinco mesas com capacidade para até cinco alunos cada. Durante as aulas, um aparelho de gravação de áudio foi colocado em uma, duas ou três mesas alternadamente, procurando sempre as mesas onde os participantes desta pesquisa se sentavam.

A escolha das partes das aulas que foram filmadas foi feita no próprio momento em que ocorriam. Os principais critérios de escolha foram o tipo de tarefa e o tema abordado, por ter considerado terem eles mais ou menos potencial para narrativas e observação das identidades. A tecnologia de vídeo permite, segundo Johnson (1992), a captura da natureza do contexto físico, da identidade dos participantes da interação e de outros aspectos não- verbais como os gestos e contato visual.

O vídeo foi captado pela câmera embutida no meu computador. Assim, apesar de não esconder que estava filmando determinados momentos, nem sempre os participantes percebiam quando estavam sendo gravados. Isso impediu o desconforto natural e a falta da

espontaneidade da gravação em vídeo. Eles tiveram acesso a esse material posteriormente, nas SRV.

Pica (1997) considera que, apesar do pressuposto de que os dados mais autênticos são obtidos dentro do discurso natural, é normalmente muito difícil conseguir amostras suficientes dentro desse tipo de discurso. Portanto, nesta pesquisa, além da observação do discurso natural, foi necessário o uso de instrumentos que viabilizaram a coleta de dados controlada.

Antes da aplicação do questionário escrito aos participantes, foi aplicado um questionário piloto com cinco alunos da mesma instituição que serviu como forma de verificação da adequação e clareza dos questionamentos e para uma visão prévia dos dados que poderiam surgir9.

Os QE foram entregues, então, aos quatro participantes da pesquisa em uma aula com a indicação de que me devolvessem na aula seguinte. A idéia era de que eles respondessem sem muita pressão, mas que também não se demorassem demais com os questionários, o que poderia interferir na espontaneidade das respostas10.

Para as narrativas, segui a orientação de Barcelos (2006), que afirma que “através das histórias de nossos alunos podemos compreender melhor suas crenças sobre aprendizagem e quem eles são ou se tornaram como aprendizes” (p.150). Elaborei, assim, um impulso para narrativa escrita (anexo VIII), onde esclareço que tipo de informações gostaria que eles escrevessem. Nesse texto, dou o exemplo das minhas próprias emoções, relatando como decidi estudar alemão e como foi meu primeiro dia de aula como aluna de alemão, esperando com isso criar um clima de confiança entre nós. Infelizmente, talvez pelo estilo da minha própria NE ter sido resumido, dois participantes foram muito econômicos em suas NE, e um não pôde escrevê-la por estar muito atarefado, o que me levou a pedir as NO. As NO trouxeram um quadro mais geral e detalhado das experiências,

9 Mesmo que o questionário piloto não tenha levantado nenhum problema de compreensão das questões, quando o QE foi aplicado aos participantes, pude notar que a apresentação de uma das questões não está totalmente clara.

10

Apesar de o QE ter satisfatoriamente alcançado o objetivo, que era começar a captar as experiências, crenças e identidades dos participantes, faltou nele um aprofundamento quanto ao perfil dos participantes. Por exemplo, a informação da origem do participante se mostrou importante, mas aconteceu com todos os participantes de eu só ter acesso a essa informação na ocasião da entrevista. Outro exemplo que poderia ter vindo no questionário são outras línguas estrangeiras que eles já falavam ou estudavam, buscando suas experiências de aprendizagem de LE.

crenças e identidades dos alunos, pois os participantes explicitaram mais sua fala, devido à interação.

A partir dos dados destes primeiros instrumentos, preparei um roteiro de entrevista oral para cada participante e marquei com cada um individualmente. Busquei, conforme indicam Rosa e Arnoldi (2006), tentar neutralizar a presença do gravador e de outros meios de coleta de dados e minha própria presença como elemento estranho. Além disso, procurei adequar meu comportamento social e lingüístico ao do entrevistado. As EI têm duração de aproximadamente: Lúcia – 17 minutos; Marcos – 32 minutos; Kélia – 35 minutos; e Vicente – 39 minutos. Dentro desse tempo, pude levantar as questões do roteiro e desenvolver outras que emergiram no momento das EI, fazendo delas um forte instrumento para a análise, sempre suportada pelas narrativas, notas de campo e gravações em áudio e vídeo.

Finalmente, após a aplicação de todos os instrumentos e análise preliminar, houve as sessões reflexivas e de visionamento, onde expus todos os dados coletados aos quatro participantes da pesquisa individualmente. Para a apresentação dos dados, marquei com canetas marca-texto de quatro cores diferentes os dados específicos de cada participante; assim foi possível distinguir facilmente as observações das NC e das TA e os dados que me pareceram mais relevantes nas transcrições das narrativas e das entrevistas e nos questionários. E, no mesmo encontro, assistimos aos vídeos capturados na aulas. Os participantes comentaram e analisaram suas ações, sua postura, sua fala, e minhas próprias impressões destas11. Esse foi um momento de grande importância na pesquisa, pois os participantes refletiram sobre seu discurso, suas ações, suas crenças e suas identidades, e colaboraram na própria análise.