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Capítulo 4 Metodologia de Investigação

4.5. Procedimentos de análise dos dados

Antes de iniciar o tratamento dos dados atribuí nomes fictícios aos alunos sele- cionados, de modo a preservar o seu anonimato. Também atribuí nomes fictícios às professoras, mas estes foram as próprias que os escolheram, apesar de estarem envolvi- das no grupo colaborativo. Desta forma procurei manter o anonimato da escola.

O processo de análise de dados é uma “busca e organização dos materiais (…) que foram sendo acumulados, com o objetivo de aumentar a sua própria compreensão” (Bogdan & Biklen, 1991, p. 205). Segundo os mesmos autores, este processo de análise consubstancia-se nas fases de organização dos dados, divisão dos dados em unidades manipuláveis, procura de padrões e descoberta de aspetos importantes. Neste estudo, a base de análise que permite conhecer os percursos dos alunos ao longo da experiência de ensino, são os registos vídeo das aulas, os registos do diário de bordo da investigado- ra, os documentos escritos dos alunos produzidos durante as aulas, os testes e as entre- vistas aos alunos.

O processo de análise de dados foi concretizado em dois momentos. No primei- ro, concomitante com a recolha de dados, foi realizada uma análise preliminar de modo a permitir uma organização e interpretação de todos os elementos à medida que iam sendo recolhidos. Neste processo, dos dados provenientes das turmas, destaquei aqueles que correspondem aos grupos de que fazem parte os quatro alunos escolhidos, incluindo os registos produzidos em grupo (relatórios e registos da resolução de problemas), os diálogos dos grupos durante o trabalho autónomo e durante a discussão da tarefa na aula. Neste processo inicial de análise, destaquei ainda os dados relevantes provenientes

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do trabalho individual dos quatro alunos escolhidos, provenientes dos testes e das entre- vistas. Esta análise também permitiu identificar algumas respostas dos alunos a questões dos testes que deveriam ser alvo de esclarecimento nas entrevistas procurando assim uma melhor compreensão das estratégias usadas. Deste modo, a primeira análise permi- tiu estruturar a apresentação dos vários aspetos do raciocínio proporcional dos quatro alunos, procurando salientar nas suas respostas as alterações que ocorreram durante os seus percursos de aprendizagem durante unidade de ensino. De referir que esta análise teve por base as dimensões e respetivas categorias de análise definidas relativas ao raciocínio proporcional e que estas categorias foram alvo de refinamento durante o desenvolvimento deste estudo, em resultado do contributo da apresentação e discussão de segmentos do estudo, em seminários de investigação nacionais e internacionais.

O segundo momento de análise foi realizado depois da conclusão da unidade de ensino e teve como objetivo responder ao problema e às questões da investigação, pelo que foi realizada uma análise aprofundada, tendo em consideração os aspetos teóricos discutidos nos capítulos 2 e 3, procurando compreender a natureza das estratégias usa- das pelos alunos, tendo como referencial os aspetos envolvidos na capacidade de racio- cínio proporcional. Assim, o raciocínio proporcional dos alunos foi analisado tendo em conta os três aspetos: (i) distinguir relações de proporcionalidade direta daquelas que não o são; (ii) compreender a natureza multiplicativa da relação de proporcionalidade direta; e (iii) resolver vários tipos de problemas, revelando flexibilidade para usar dife- rentes abordagens, sem ser afetado pelos dados numéricos, contexto e representação (Silvestre & Ponte, 2009). As questões do estudo decorrem dos aspetos que envolvem o raciocínio proporcional e estão relacionadas com as dimensões de análise: (i) resolução de problema que envolvem uma relação de proporcionalidade direta (valor omisso e comparação); e (ii) resolução de problemas que envolvem a distinção de relações de proporcionalidade direta daquelas que o não são.

As dimensões da análise, níveis e respetivas categorias, como já referi anterior- mente, foram definidas antes da primeira fase da análise de dados e posteriormente alvo de refinamento. A definição das categorias de cada uma das duas dimensões de análise foi feita com base no quadro teórico sobre o raciocínio proporcional (ver o capítulos 2) e sobre unidades de ensino (ver capítulo 3) e contempla as estratégias de resolução dos alunos, observáveis a dois níveis: (i) procedimentos de cálculo; e (ii) representações. Estes dois níveis estão relacionados mas para operacionalizar a análise optei por separá- los. A figura 4.1 mostra as dimensões e os respetivos níveis a que a análise se processa.

81 Figura 4.1. – Dimensões e níveis de análise

Os procedimentos de cálculo usados na resolução de problemas que envolvem uma relação de proporcionalidade direta caracterizam as categorias de análise e permi- tem descrever a natureza das estratégias usadas pelos alunos. O quadro 4.3 apresenta essas categorias de análise.

Quadro 4.3. – Resolução de problemas de proporcionalidade direta: estratégias

Descrição dos procedimentos dos alunos Estratégia

Revela compreen- são da relação de covariação e/ou

invariância das variáveis

Revela clara compreensão da natureza multiplicativa da relação de proporcionalidade direta:

 Utiliza o fator escalar ou funcional. Compreende e utiliza as propriedades da multiplicação.

 Determina a constante de proporcionalidade e descreve o seu significado.

 Escreve a razão e descreve o seu significado.

Proporcional

Não revela clara compreensão da natureza multiplicativa da relação de proporcionalidade direta:

 Utiliza a composição/decomposição numérica envolvendo procedimentos aditivos e multiplicativos para gradualmente se aproximar dos valores numéricos pretendidos.

 Utiliza a razão unitária e procedimentos aditivos para gra- dualmente se aproximar dos valores numéricos pretendidos.

 Determina a razão unitária mas nem sempre sabe explicar o seu significado.

Pré-proporcionais

Não revela compreensão da natureza multiplicativa da relação de proporcionalidade direta:

 Utiliza composição/decomposição numérica envolvendo pro- cedimentos aditivos para gradualmente se aproximar dos valores numéricos pretendidos.

 Utiliza procedimentos de contagem associados à representa- ção pictórica e/ou contagem unitária.

Não proporcional

Não revela com- preensão da rela- ção de covariação

e/ou invariância das variáveis

 Utiliza parte dos dados do problema.

 Utiliza procedimentos de cálculo sem sentido. nd

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Os procedimentos usados na resolução de problemas que envolvem uma a dis- tinção de relações de proporcionalidade direta daquelas que o não são, constituem as categorias de análise e permitem identificar a natureza das estratégias corretas e incorre- tas usadas pelos alunos. Dada a natureza dos problemas colocados aos alunos, as cate- gorias de análise englobam também as estratégias incorretas associadas ao facto de os alunos consideraram existir uma relação de proporcionalidade direta em problemas onde essa relação não existe. O quadro 4.4 apresenta as categorias de análise:

Quadro 4.4. – Distinção da proporcionalidade direta de outra que o não é: estratégias

Problema Descrição dos procedimentos dos alunos Estratégia

Ps eu d o p ro p o rcio n al Relação aditiva

Revela compreender a natureza aditiva da rela-

ção descrita no problema. Aditiva

Não revela compreender o problema descrito e incorretamente considera existir uma relação de proporcionalidade direta (covariação e/ou inva- riância das variáveis.

(incorretas) Proporcional ou pré-proporcional ou

não proporcional Não revela compreender o fenómeno descrito

no problema. nd

Relação propor- cionalidade inver-

sa

Revela compreender relação de proporcionali- dade inversa descrita no problema (descreve a relação).

Proporcional inversa* Não revela compreender o problema descrito e

incorretamente considera existir uma da relação de proporcionalidade direta (covariação e/ou invariância das variáveis.

(incorretas) Proporcional ou pré-proporcional ou

Não proporcional Não revela compreender o fenómeno descrito

no problema. nd

Sem relação aditi- va, proporcionali- dade direta ou

inversa

Revela compreender a inexistência de relação

entre os fenómenos descritos no problema. Inexistência das relações Não revela compreender o problema descrito e

incorretamente considera existir uma da relação de proporcionalidade direta (covariação e/ou invariância das variáveis).

(incorretas) Proporcional ou pré-proporcional ou

Não proporcional Não revela compreender o fenómeno descrito

no problema. nd

(nd, significa não descriminadas)

*Descritiva de uma relação em que as variáveis covariam inversamente pois os alunos ainda não estuda- ram a noção de proporcionalidade inversa.

** Problemas colocados aos alunos depois de se iniciar o ensino formal da proporcionalidade direta.

O desenvolvimento das categorias de análise sobre os procedimentos usados pelos alunos na resolução de problemas, descritas nos dois quadros anteriores, foi um trabalho complexo pois procurei conjugar o conhecimento proveniente dos ciclos ante- riores da experimentação com o conhecimento proveniente de vários estudos (ver capí- tulo 2). Considero que este conhecimento é relevante para que o raciocínio proporcional

83 seja considerado algo mais que a proficiência na resolução de problemas que envolvem uma relação de proporcionalidade direta, sendo desejável a sua divulgação junto dos professores. Deste modo procurei que as categorias de análise pudessem constituir tam- bém um instrumento de análise útil para os professores, isto é, um contributo para a transposição do conhecimento proveniente da investigação para a prática, com conse- quências positivas no desenvolvimento do raciocínio proporcional dos alunos. Assim, a descrição dos procedimentos dos alunos foi redigida de modo acessível a um conjunto alargado de atores educativos, indo ao encontro dos critérios de qualidade do design research.

As representações são outro nível de análise neste estudo, como já referi ante- riormente. Este nível de análise decorre de um prossuposto da unidade de ensino (ver Capítulo 3) associado ao uso flexível de diferentes representações. É um pressuposto baseado na literatura que refere a influência positiva da utilização de múltiplas represen- tações no desenvolvimento da compreensão de noções matemáticas. O quadro 4.5 apre- senta as categorias de análise baseadas na classificação das representações apresentada por Lesh, Post e Behr (1987) e Tripathi (2008).

Quadro 4.5. – Categorias de análise para as representações usada pelos alunos (adaptado de Lesh, Post e Behr (1987) e Tripathi (2008))

Representações Descrição

Contextuais

O conhecimento é organizado em torno de fenómenos do mun- do real que servem para interpretar e resolver outro tipo de pro- blemas.

Modelos manipuláveis Barras Cuisenaire; barra de frações; blocos lógicos; linha numé- rica.

Visuais Imagens; diagramas organizados; tabelas; gráficos; imagens dinâmicas.

Linguagem oral Utilização da linguagem natural com léxico comum e/ou espe- cializado do tema matemático.

Linguagem natural

escrita Envolve escrita de frases na linguagem natural Linguagem matemáti-

ca escrita Envolve escrita em linguagem (ex. x+3=7)

A apresentação dos dados e a sua análise é composta na forma de uma narrativa do percurso aprendizagem de cada um dos alunos. Desta narrativa fazem parte uma apresentação individual dos alunos e a apresentação em sequência cronológica do seu

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trabalho individual – testes e entrevistas – e do seu contributo para o trabalho coletivo durante o desenvolvimento das cinco fichas de trabalho da unida unidade de ensino.

Finalmente, é realizada uma análise transversal dos percursos de aprendizagem dos alunos, a partir da qual é realizada discussão final sobre o desenvolvimento dos aspetos do seu raciocínio proporcional, tendente às conclusões do estudo.

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