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Procedimentos metodológicos

No documento claudeteimaculadadesouzagomes (páginas 39-44)

1.1 Uma vida em poucas páginas

1.2.2 Procedimentos metodológicos

O campo configura-se, principalmente, a partir de conversas com professoras e professores construindo narrativas e cenas para problematizar a ação docente e as escolas e pensar as condições de emergência das questões de gênero e sexualidades nesses espaços. As/os participantes da pesquisa são docentes de três escolas do município de Juiz de Fora – Escola Municipal Heleith Saffiot, Escola Municipal Chiquinha Gonzaga e Escola Municipal Cora Coralina - situadas na área urbana da cidade, em cujas sedes é oferecido o segundo

segmento do Ensino Fundamental, representado pelos 6º ao 9º ano de escolaridade da Educação Básica.

E como perguntas desencadeiam buscas que engendram várias possibilidades de respostas e outras tantas perguntas, num processo que nunca está finalizado ou completo (MEYER, & SOARES. 2005) torna-se fundamental ouvi-los/las e buscar entender como se formam e atuam em suas concepções de relações de gênero e sexualidades, e como a cada dia e a cada nova proposta pedagógica as diferentes abordagens se tornam possíveis.

Como instrumento de coleta de dados, partimos da aplicação de um questionário inicial, através do qual foi possível perceber quais/quantas/os docentes, em cada uma das escolas visitadas por mim, estariam dispostas/os a participar da próxima etapa da pesquisa. Neste contato inicial, optei por elaborar apenas 03 questões, de maneira simples e bastante objetivas:

1) Você aborda, durante suas aulas, os temas referentes a relações de gênero e sexualidades?

( )Sim ( )Não

Se a resposta foi afirmativa, quais temáticas são abordadas dentro desses temas? 2) A escola é um bom espaço para as discussões de gênero e sexualidades? 3) Você identifica problemas, preconceitos, discriminações, ligadas a gênero e sexualidade em suas aulas? Descreva um pouco o que tem observado.

Foi através destas questões que busquei identificar, inicialmente, as/os participantes para a pesquisa. Partindo da análise desse recurso inicial, posteriormente fiz o convite a alguns(mas) docentes que haviam enviado suas respostas para a participação em encontros em grupo focal, onde as/os professoras/professores que se mostrassem dispostas/os poderiam contribuir comigo, falando de suas experiências em sala de aula, na comunidade escolar e na vida. Cada entrevista e encontro em grupo focal foi gravada e transcrita. Inicialmente, pensei em entrevistar dois/duas docentes em cada uma das escolas, mas, obedecendo a dinâmica do campo, isso também se modificou ao longo da caminhada. Adotei também um registro escrito de minhas impressões/emoções em cada escola que visitei, em meu diário de campo, busquei sentir o ambiente, a energia das pessoas e do lugar, dos espaços ocupados e atravessados pelo meu tema de pesquisa e cada um/uma que participa de sua prática, seja como aluno/a, colega, ou membro dessa comunidade escolar.

Em mais uma etapa do trabalho, construí a análise gradativamente, e enquanto pesquisadora que parte das perspectivas pós-estruturalistas, eu trabalhei na problematização

das respostas que chegaram através dos questionários, e por algumas questões centrais que surgiram ou se reforçaram durante as conversas. Os olhares sobre as informações que chegaram através das conversas moldaram o caminhar da pesquisa, e foram construindo comigo o trabalho, sem prever um resultado, apenas sentindo e recebendo o campo.

Como ponto de partida para o diálogo com as/os docentes utilizei as respostas recebidas através dos questionários iniciais e categorizadas. As categorias criadas ali, formaram nosso guia inicial no caminho seguido durante nossos encontros. Segundo Zélia Alves e Maria Helena Silva (1992) “há quem chame a esse processo de afunilamento tendo em vista a seleção entre tópicos pela sua maior ou menor abrangência e importância para a pesquisa” (p.67), mas eu prefiro chamar de escolha. Escolha pelos termos, falas e posições que mais marcaram as minhas escutas e trocas com as/os docentes, em que cada um mergulhou na discussão, de acordo com suas afinidades pelos temas e situações apresentadas e segundo a minha percepção naquele momento.

Ainda segundo as autoras, “pesquisar através de uma análise qualitativa quer dizer estar "apreendendo" o fenômeno dentro de todo o seu contexto e interpretando seu significado”. Concordo com ambas quando trazem que o que chamam de dois contatos — literatura e outros pesquisadores – como bases/recursos

são tão importantes e procurados com frequência porque através deles o estudo se insere, de fato, na área, e se "atualiza" com as ideias e o pensamento do passado e do presente. Coaduna com esse propósito de pesquisa a ideia de atuar com a “riqueza do delineamento de novos espaços, de inesperados territórios de poder, de outras formas de produzir saber e modos de ver. (COSTA & BUJES, 2005, p.8).

Ao receber das escolas os questionários iniciais e trabalhar com eles, veio o momento de eleger e convidar as/os docentes para uma conversa pessoal, inicialmente na forma de grupos focais. Os contatos foram feitos a partir de solicitação de números de telefone ou endereço de e-mail dos escolhidos, à secretaria de cada escola, já que as páginas contendo as questões iniciais traziam apenas os nomes e as disciplinas com as quais cada uma/um trabalhava. Os contatos foram sendo obtidos aos poucos e de diversas fontes: secretaria escolar, uma supervisora, que gentilmente intermediou os contatos em duas das escolas, amigos que atuam nessas escolas e intermediaram outros contatos e assim fui falando com elas/eles. De início, nenhum/a das/os convidadas/os da segunda etapa da pesquisa se recusou a participar dos encontros, mas esbarramos na impossibilidade de encontrar um dia e horário que atendesse a todas/os.

Durante pelo menos duas semanas tentei encontrar um dia, uma hora e um local onde todas e todos pudessem estar, mas isso não foi possível, devido aos compromissos profissionais e pessoais de cada uma/um com suas escolas e outros afazeres, como aulas em cursos de pós-graduação e outros afazeres. Diante dessa condição, decidimos reunir aquelas/es cujas disponibilidades coincidissem e marcar entrevista individual com as/os demais. Isso nos ajuda a perceber como está se configurando o cotidiano das/dos professores no atual cenário político/social/econômico no qual nos encontramos. Todas/todos demonstraram interesse em participar da pesquisa, mas quando falamos de tempo disponível para tal atividade o cenário muda, diante do grande número de tarefas que precisam ser assumidas por cada docente.

Ao chegar a essa conclusão, a de que teria que recorrer à conversa em grupo e também à entrevista para ter a oportunidade de ouvir mais docentes, e também ouvi-los por mais tempo, parti da escrita de Marisa Vorraber Costa (1996), na qual a autora argumenta que “não importa o método que utilizamos para chegar ao conhecimento: o que de fato faz diferença são as interrogações que podem ser formuladas dentro de uma ou outra maneira de conceber as relações entre saber e poder” (p.10). Lancei-me aos nossos encontros da forma como foi possível a cada participante, com o propósito de ouvi-las/los, entrar em contato com suas experiências em suas escolas, com suas/seus alunas/os, colegas de docência, comunidades escolares, sociedade, e como suas vidas são atravessadas por todas essas pessoas e lugares, e como cada uma/um é capturado pelas histórias e formas de vida que transitam nos espaços escolares.

Tinha o propósito de ter essa conversa com 02 docentes de cada escola, onde eu tivesse, ao final, 06 pessoas, sendo três do gênero masculino e três do gênero feminino. Porém, com o desenrolar dos contatos novas impossibilidades foram surgindo, e eu me vi diante de nova necessidade de adaptação, pois as coisas não fecham assim, como nós imaginamos, já que, no decorrer dos contatos, algumas/uns desistiram e outras/os foram sendo contatadas/os e convidadas/os a participar da pesquisa. Ao final fechamos com 05 docentes, sendo três professores e duas professoras.

Foram realizados 02 encontros em grupo, sendo o primeiro com um professor e uma professora, que atuam na mesma escola, Escola Municipal Heleieth Saffioti – Marìlia e Paulo. Marília está afastada para cursar mestrado e Paulo, é professor contratado, lecionando história, e concilia as atividades docentes com o curso de doutorado em ciência da religião. Ela é professora de geografia efetiva da escola há mais de 20 anos, já tendo ocupado cargo de direção, está concluindo o primeiro ano do mestrado em outra cidade. Ambos atuam apenas

nesta escola. No segundo encontro, uniu-se a esse grupo mais um professor, da Escola Municipal Chiquinha Gonzaga, que atua como professor de educação física. O docente, que aqui chamamos de Cristiano, concluiu o mestrado em educação há um ano e atua em duas escolas, sendo uma municipal e outra estadual, como professor efetivo, em ambas. É graduado pela UFJF, há 11 anos. Os encontros com esse grupo foram realizados em uma sala da Secretaria Municipal de Educação de Juiz de Fora, que nos foi gentilmente cedida para esse fim, e registrado em áudio e vídeo.

Contei com mais um professor, de Inglês, da E. M. Chiquinha Gonzaga, Luiz Carlos, que, além de atuar na referida escola, também exerce atividades docentes em uma escola estadual e uma terceira escola da rede privada. Luiz Carlos fez sua graduação na Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ, e cursos nos Estados Unidos. Por último, concluímos o trabalho de conversa e escuta com a professora de história Ana Paula, da Escola Municipal Cora Coralina, docente em duas escolas municiais, e graduada pela UFJF há 17 anos. Estes dois últimos são os que preferiram dar entrevista, ao invés de participarem da conversa em grupo. As entrevistas foram realizadas nas próprias escolas nas quais atuam esta/e docente, por preferência de ambos, e também devidamente registradas em áudio e vídeo, no caso do professor Luiz Carlos, e somente em áudio no caso da professora Ana Paula, por pedido dela, que argumentou que não sentia à vontade com a câmera de vídeo, pedido ao qual eu atendi prontamente.

A partir das falas das/os próprias/os docentes procuramos aprofundar as discussões, de forma a buscar um entendimento inicial do universo possível das escolas pesquisadas. Estas conversas, com frequência, foram desviadas pelas/os entrevistadas/os e chegaram a outras questões que incialmente o roteiro não abarcava, o que se mostrou extremamente positivo, pois trouxe novas informações e possibilidades à nossa busca por pensar as abordagens praticadas nesses espaços, a partir das diferentes trajetórias de cada uma/um e o olhar individual para a escola e seus acontecimentos. Pensar a interseccionalidade17 se tornou uma necessidade para abarcar os temas novos surgidos durante as discussões, e outros que já haviam sido sugeridos anteriormente, mas chegaram de forma mais representativa, vindo

17 A literatura existente demonstra a utilização deste termo, inicialmente, para designar a interdependência das

relações de poder de raça, sexo e classe, em um texto da jurista afro-americana Kimberlé W. Crenshaw (1989). A problemática da “interseccionalidade” foi desenvolvida nos países anglo-saxônicos a partir dessa herança do Black Feminism, desde o início dos anos de 1990, dentro de um quadro interdisciplinar, por Kimberlé Crenshaw e outras pesquisadoras inglesas, norte-americanas, canadenses e alemãs. Com a categoria da interseccionalidade, Crenshaw (1994) focaliza sobretudo as intersecções da raça e do gênero, abordando parcial ou perifericamente classe ou sexualidade (HIRATA. 2014. P.62)

enriquecer o trabalho com as questões de raça, classe e religiosidade, trazendo os atravessamentos constantes e necessários que ocorrem no campo da educação hoje.

A partir das definições iniciais de caminhos possíveis, busca pelo campo, disciplinas, discussões, trocas de saberes, chega o momento de mais uma etapa de construção do trabalho, e essa etapa se configura como o primeiro capítulo dessa dissertação. Nesse momento, escolho fazer uma discussão teórica a respeito de alguns significados possíveis do corpo e como esses significados estão atravessando as práticas docentes, o currículo escolar e as existências dos atores e atrizes que compõem cada escola, e suas subjetividades.

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