• Nenhum resultado encontrado

O processo comunicativo onde as falas são oferecidas à interpretação do investigador actor-social

Capítulo 5 – Construção do Projecto dar voz às crianças nas suas diferentes formas de comunicar

3. O processo comunicativo onde as falas são oferecidas à interpretação do investigador actor-social

O investigador, obtém informação em interacção constante com os actores sociais, privilegia a sua participação, através da manifestação dos seus desejos, dos seus interesses e necessidades. Promovendo uma comunicação recíproca, através do diálogo, das conversas, de perguntas e respostas, que permitem suscitar a participação cidadã (para conhecer, provocar e apoiar) e desenvolver o pensamento crítico.

E os interesses ou as suas necessidades não foram pensadas em função do que o adulto pensava que fossem, mas sim em propostas, ideias, interesses, desejos, iniciativas, que o investigador actor social apoiou numa participação de aprendizagem recíproca e de cumplicidade, reconhecendo socialmente a capacidade da criança e jovem de decidir e executar. Desde o início do processo, que todos aprendemos a participar juntos, construindo atitudes de compreensão e de saber, aprendendo, fazendo, arriscando. As crianças e jovens puderam revelar livremente a sua visão sobre a sociedade, a escola, a sua cultura, o seu futuro, os problemas que mais os afectam nos seus quotidianos. A comunicação, o conhecimento que foi sendo construído, e que criou cumplicidade, permitiu-nos colaborar num processo de compromisso que nos permitiu estar juntos semanalmente num processo de ser escutado naquilo que efectivamente queriam dizer, cada um em função das suas diferentes realidades, competências desejos interesses. Confirmamos como é possível enfrentar o desafio de considerar as crianças e jovens capazes de lutar pela participação cidadã e pelos direitos, sabendo posicionar-se diante da realidade social que a sociedade e a família lhes impõem.

Desde a primeira reunião e nas subsequentes que estivemos juntos num diálogo comunicacional intenso, que as conversas que despoletámos foram geradoras de dados. Dados que iam construindo o nosso projecto e que nos informavam sobre a comunicação que interessava verdadeiramente às crianças e jovens e que nos permitiram construir categorias facilitadoras de interpretação e de análise desses mesmos dados.

A construção de categorias é um processo fundamental da construção teórica, sem o qual não é possível “analisar e ordenar a realidade em estudo” (Ezpeleta, cit. por Casa_Nova 2009). Ainda segundo a mesma autora as categorias são conceitos construídos, abstracções que sintetizam o sentido da busca e o estudo sistemático da realidade, constituindo assim ferramentas intelectuais para analisar e ordenar a realidade em estudo.

88

Uma categoria é portanto “ um conceito que permite nomear uma realidade presente no material recolhido “ e o trabalho de análise”sobre esa categoria “consistirá em precisar o seu conteúdo” (Maroy, cit. por Casa-Nova 2009)

Depois da leitura dos dados gerados, através das conversas e da observação participante, realizei a categorização de acordo com as temáticas mais consistentemente abordadas pelas crianças e jovens e ou resultantes do nosso trabalho de produção de conhecimento e posteriormente efectuei a respectiva análise dos dados.

As categorias que a geração de dados nos permitiu criar relacionam-se profundamente e fundamentalmente com os quotidianos das crianças, com a sua cultura, as relações familiares e a escola enquanto espaço de socialização e de alfabetização.

Assim exemplificamos a categorização do conteúdo das conversas comunicacionais que fomos mantendo ao longo do tempo que estivemos juntos e das quais faremos uma interpretação que nos remete para o quadro teórico já apresentado anteriormente e que nos confirma a necessidade de escutar as crianças e jovens.

Os diálogos que envolveram as conversas das crianças, permitem-nos voltar a reflectir sobre as questões teóricas que colocamos no início do Projecto e que são por elas abordadas de forma intensa, porque estão presentes nos seus quotidianos. E esses assuntos, que gostam de partilhar, são também assuntos que lhes dizem directamente respeito e que desejam comunicar aos “Outros” no sentido de lhes ser proporcionada uma participação cidadã, onde possam ser protagonistas, gozando dos Direitos que lhes confere a Convenção sobre os Direitos das Crianças.

Escutamos as crianças e percebemos, o quanto a infância se encontra excluída do acesso ao exercício da cidadania, mas esperançamo-nos quando estudamos autores como Sarmento, Soares, Tomás, Cortesão, que sustentam uma concepção de cidadania activa e crítica que concebe as crianças e jovens como agentes sociais imprescindíveis e participativos na sociedade, através do reconhecimento dos seus direitos, mas também das condições do seu exercício através de uma plena participação e de um real protagonismo, em todas as esferas da vida social.

Após a categorização dos dados gerados, numa experiência de investigação em que os actores sociais comunicam, as suas realidades culturais e sociais e o investigador as interpreta fundamentada nos diálogos das conversas tidas ao longo do projecto.

Pretende-se desta forma verificar a construção de conhecimento a partir da metodologia da investigação-acção participativa, onde as crianças Ciganas foram protagonistas, e se revelaram competentes para exercer a cidadania que se deseja urgentemente como uma realidade, no sentido da construção da “hermenêutica diatópica” enquanto “exercício de

89

reciprocidade entre culturas que consiste em transformar as premissas de argumentação de uma dada cultura em argumentos inteligíveis e credíveis noutra cultura” ( Santos, cit. por Casa- Nova,2009).

Torna-se visível ao interpretar os dados gerados que para as crianças Ciganas a Cultura da sua etnia as marca profundamente nas suas experiências de vida e nos seus quotidianos, e como explicitam o cumprimento das Leis Ciganas, (reguladora de atitudes e acções) a transmissão de geração em geração de questões ligadas por exemplo, ao casamento, abandono precoce da escolaridade, questões de género (papel da mulher na Cultura Cigana) a relação destas práticas da sua comunidade com os Direitos da Criança assim como as questões do racismo e da discriminação, muito evidenciada por todos.

4. E a Comunicação Aconteceu...