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Processo de atribuição social e a Teoria das Representações Sociais

SUMÁRIO INTRODUÇÃO

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.2. Processo de atribuição social e a Teoria das Representações Sociais

Camino (1996) afirma que o estudo das representações sociais foi caracterizado na Psicologia Social enquanto processo coletivo de atribuição ao nível societal, ou seja, quando o processo atributivo é investigado a partir das crenças compartilhadas pelas pessoas de uma sociedade. No entanto, Vala e Monteiro (2004) questionam a inclusão da teoria das representações sociais na abrangência da atribuição coletiva desenvolvida pela cognição social. Para tal justificam esse posicionamento assinalando as principais diferenças entre as orientações da cognição social e do conhecimento social. Para os mesmos, nas representações sociais existe uma relevância central dos conteúdos e articulação contextual (histórica e cultural), dos processos de interação social, emoção e avaliação do indivíduo e finalmente, da concepção molar3 do pensamento social, com articulação e configuração de novos conhecimentos.

No estudo sobre os processos atributivos e na discussão proposta por Doise (2002) sobre as articulações entre as explicações de ordens individuais e societais da Psicologia Social, o referido autor aponta quatro níveis de análise: o nível intra-individual (enfatiza o mecanismo de processamento da informação), o nível interpessoal ou interindividual (atribuição com base na interação entre os indivíduos), o nível intergrupal (trabalha com diferentes atores sociais no tecido das relações sociais) e o nível societal (sistemas de crenças, representações, avaliações e normas sociais).

De acordo com Sá (1998) os fenômenos das representações sociais são difusos e multifacetados, por isso precisam ser derivados em objetos de pesquisa através de uma elaboração do universo reificado da ciência. Para realizar esta transformação, torna-se necessário decidir sobre: (a) o objeto a ser pesquisado, de forma a evitar representações próximas a ele; (b) definir os grupos que representam o objeto (através de suas manifestações discursivas e comportamentais investiga-se o conteúdo e a estrutura da representação); e, (c) considerar o contexto sócio-cultural para esclarecer a formação e manutenção da representação.

3Molar enquanto espiralar, processo continuado. Diferente da proposição molecular da cognição social onde o conhecimento equivale a descrição de processos sucessivos e estruturas mais simples. (Vala & Monteiro, 2004, p. 373).

Recentemente, Jodelet (2009) propôs um esquema de análise sobre a construção de objetos para as representações sociais, considerando esferas de pertença social dos indivíduos, como demonstra a figura 2.

Ainda segundo a autora citada, o sujeito que representa é um ser ativo, por isso quando se remete à “subjetividade”, está implícita a perspectiva de que este sujeito é um ator social, inserido no contexto social. Esta participação se caracteriza tanto pelo saber e pela interação social quanto pela pertença social, onde este indivíduo possui um papel social e sua inserção nos grupos define sua identidade social. No entanto, o fato de buscar compreender o semelhante e o compartilhado do pensamento social não exclui os processos individuais, como a própria Jodelet (2009) afirma: “... seria redutor eliminar da análise a parte que diz respeito aos processos através dos quais o sujeito se apropria e constrói essas representações.” (p. 77). Também não há pensamento “desencarnado” porque não há divisões entre o sujeito e o mundo, portanto, fazem parte do pensamento social: emoções, afetos, sentimentos, imaginário e fatores de identidade social, que juntos

Contexto das

interações Espaço social e público

Intersubjetivo Subjetivo Trans-

subjetivo

RS

Não há indivíduo isolado Não há pensamento desencarnado Figura 2. Esferas de pertencimento das representações sociais. Fonte: Jodelet (2009).

formam a subjetividade individual e coletiva, e fomentam as representações sociais.

A segunda esfera demonstrada graficamente por Jodelet(2009) traduz a interação entre os indivíduos (inter-subjetividade) onde numa relação dialógica, saberes são construídos, informações repassadas, significações e ressignificações desenvolvidas pelo consenso e divergências são resolvidas. A terceira esfera refere-se a trans- subjetividade que constituída no espaço social se caracteriza pelos modos de pensar e de agir das pessoas, repassados pelas normas e valores culturais. É formada pelo que os historiadores denominam de sistemas de representações, estas são responsáveis pela orientação das práticas coletivas que ultrapassam a interação social e que se apresentam de forma consolidada servindo de cenário para a construção das representações partilhadas (Jodelet, 2009).

Para compreender a representação social de um grupo, torna-se necessário considerar o contexto comunicativo do conteúdo da mensagem que este grupo apresenta. Segundo Jodelet (1989) a teoria das representações sociais indica que para apreender o processo de assimilação e de não-assimilação4 das informações, devem ser consideradas as noções, valores e modelos de pensamento e de conduta que os indivíduos utilizam para se apropriar dos objetos, principalmente os novos objetos. Os grupos utilizam as representações sociais existentes no universo consensual para conhecer o objeto, após o conhecimento ocorre o julgamento e conseqüentemente um posicionamento, caracterizado como uma intenção de comportamento em relação ao mesmo. Uma representação dá origem a um conjunto de atitudes e o que gera um conjunto de representações é uma formação ideológica (Rouquette, 2005).

Para Jodelet (2001) as representações sociais intervêm em processos variados, como a difusão e a assimilação dos conhecimentos, o desenvolvimento individual e coletivo, a definição das identidades pessoais e sociais. A teoria das representações sociais indica que a representação opera uma transformação no sujeito e no objeto, no primeiro ao ampliar sua categorização e no segundo ao se acomodar no repertório do sujeito, neste processo o conceito e a percepção tornam-se intercambiáveis (Arruda, 2002). Doise (2001) conclui que as pesquisas

4Assimilação como processo de aquisição, semelhante, mas não equivalente ao termo também utilizado pela Teoria Construtivista proposta por Jean Piaget (1896-1980), que foi referência teórica para Moscovici no desenvolvimento da Teoria das Representações Sociais.

sobre representações sociais apresentam um caminho para integrar os sistemas sociais de relação aos estudos de sistemas individuais de atitudes, oferecendo um conceito de atitude mais integrado, não apenas restrito a relação entre indivíduos, mas também entre grupos.

As representações sociais são compostas também pelas atitudes, além do seu conteúdo e do campo da representação. O estudo das atitudes se insere no estudo das representações sociais, não como parte exclusivamente individual, mas como componente do pensamento e conhecimento social, articulada entre o individual e o social, sendo que essa articulação movimenta-se e modifica-se. As representações sociais são sempre tomadas de posições simbólicas, organizadas de maneiras diferentes (opiniões, atitudes ou estereótipos), portanto, em cada conjunto de relações sociais, princípios ou esquemas, organizam-se as tomadas de posição simbólicas ligadas a inserções específicas nessas relações, atuando como os princípios organizadores dessas relações simbólicas, estruturando as relações entre indivíduos ou grupos (Doise, 2001).

Vários estudos foram realizados na intenção de integrar conceitos e teorias da Psicologia Social buscando promover uma convergência ou aproximação da comunalidade existente, facilitando a compreensão dos processos e conteúdos psicossociológicos e cognitivos (Abric, 2003; Doise, 1994; Greenwald, Banaji, Rudman, Farnham, Nosek & Mellott, 2002; Jodelet, 1994; Liu, Hung, Loong, Gee & Weatherall, 2003; Murray, 2002; Salesses, 2005). No entanto, mesmo considerando as semelhanças de conteúdo e diferenças teóricas, torna-se necessário dissolver a “competição” entre as teorias, mas evitando o reducionismo.