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população em geral da importância do leite como alimento completo.

embora essencial para as crianças até os 12 anos, o leite também é importante na fase adulta. Fonte rica de cálcio, vitaminas e proteínas, beber leite garante uma vida saudável na maturidade e ajuda a evitar problemas na melhor idade. (MACHADO, 2007, p. 1).

Além da vital importância para a saúde da população, o leite e a cadeia láctea são fundamentais à boa saúde da própria economia gaúcha, uma vez que são grande fonte de geração de renda e empregos. O setor lácteo movimentava já no ano de 2007 mais de 8 bilhões ao ano. E mais, conforme Lang (2009), no Estado existem 140 mil produtores de leite, sendo que muitos destes dependem unicamente dessa atividade como fonte de renda. A cadeia do leite compreende ainda o envolvimento direto e indireto de mais de 730 mil pessoas, o que, naquele momento representava 7% do total da população gaúcha. Dados estes que demonstram a magnitude desta atividade e reafirmam o valor do setor lácteo.

Além de toda importância nacional e internacional da cadeia leiteira, a região noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, foco maior desta pesquisa, está diretamente relacionada à produção e atualmente também em crescente expansão no beneficiamento do leite. Devido à estrutura fundiária de boa parte da região, associada ao clima e às características sociais e culturais da população rural, a atividade leiteira hoje ocupa um papel determinante ao sucesso especialmente das pequenas propriedades familiares da região, bem como está diretamente relacionada à permanência dessas famílias no meio rural. Para se ter uma ideia da importância do leite, apenas a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMATER-RS/ASCAR), regional de Ijuí, conta com 18.000 produtores. Com tamanha magnitude da atividade no contexto regional, o leite ocupa um papel determinante ao desenvolvimento regional, que será discutido nos dois subcapítulos a seguir.

1.5 Produção leiteira como agente de desenvolvimento rural .

O Estado gaúcho, em razão de suas condições ecológicas e socioeconômicas, detém características excepcionais para desenvolver um sistema de produção de leite particular e altamente competitivo. Este fato constitui-se, de

acordo com Silva Neto e Basso (2005), no principal argumento em defesa ao incentivo à produção leiteira como estratégia de promoção do desenvolvimento de algumas regiões do Estado. Os autores entendem que esta atividade é imprescindível para a construção de uma sociedade mais produtiva, socialmente mais justa e territorialmente mais equilibrada.

No entanto, Silva Neto e Basso (2005) destacam que o desenvolvimento da agropecuária e o desenvolvimento rural não são vistos como processos que se apresentem necessariamente positivamente correlacionados. O aumento da produção e da produtividade na agricultura de um determinado território nem sempre resulta no acréscimo da renda e no progresso das condições de vida da sua população como um todo.

Nesta mesma ótica, os autores atestam que existem duas visões quando se analisa o setor agropecuário. A primeira, que entende o desenvolvimento como um processo aberto e, consequentemente, evolutivo. A segunda relaciona-se ao pensamento hegemônico e trata o desenvolvimento como um processo fechado. Esta visão tem sido reforçada pelas instituições, tanto de governo quanto das empresas que têm desenvolvido e adotado normativas relacionadas à atividade leiteira, em especial aos produtores (SILVA NETO; BASSO, 2005).

Essas instituições e seus interlocutores que entendem o desenvolvimento como um processo normativo partem do pressuposto de que existe um único caminho e modelo de atuação na produção leiteira a ser adotado. Para tanto, esse caminho deve passar pela modernização, competitividade, eficiência, especialização, além de altos índices de escalas de produção. Partem da pressuposição de que o produtor eficiente é aquele adaptado ao modelo produtivo altamente dependente de insumos externos e que alcança os maiores rendimentos físicos na sua produção. Para o caso da atividade leiteira em especial, espera-se um sistema intensivo com grande número de animais por área e propriedade, assim como produção em escala. É possível observar-se que a adoção deste modelo não demonstra preocupação com a melhoria na renda dos agricultores, e que o impacto ambiental e socioeconômico dessas práticas também não é tratado como um fator limitante à continuidade no tempo desta atividade (OLIVEIRA, 2010).

Entretanto, conforme a posição de Oliveira (2010 apud SILVA NETO; BASSO, 2005), quando se considera o desenvolvimento como um processo evolutivo, pode- se compreender que os chamados “pacotes de desenvolvimento”, a exemplo da Revolução Verde, não contribuem para o desenvolvimento rural sustentável. Em especial, pelo fato de que eles acabam não considerando as diferenciações encontradas entre os agricultores e as regiões produtoras onde eles se encontram inseridos. Sendo assim, não é possível se propor a adoção de modelos padronizados, prontos para solucionar os problemas da agropecuária.

Outro aspecto negativo observado por Oliveira (2010) é a tendência da política de preços adotada pelas indústrias do leite em concentrar a produção em um número cada vez menor de produtores. Os estímulos pagos por litro aos maiores volumes de produção demonstram, ano a ano, que, mesmo com o aumento no total de leite produzido anualmente, o número de produtores vem caindo. Este fato acaba por originar um problema social. Com a falta de novas alternativas para atender à demanda desse tipo de produtores no campo, estes acabam sendo obrigados a saírem rumo às cidades em busca de novos empregos, fortalecendo, assim, a formação dos chamados bolsões de pobreza, e pior, em alguns casos tornando-se vítimas da própria marginalidade.

Silva Neto e Frantz (2003 apud OLIVEIRA, 2010) ressaltam que a implantação deste sistema proposto pelas indústrias poderia apresentar consequências negativas também para o desenvolvimento rural, uma vez que originaria concentração de renda e poderia provocar uma queda no seu nível global, resultando na exclusão de um elevado número de pessoas da atividade leiteira.

Conforme os autores,

Para que o aumento da produção e para que os ganhos da produtividade da agropecuária possam repercutir favoravelmente sobre a economia e o desenvolvimento de uma região é imprescindível que estes sejam compatíveis com a manutenção de uma população relativamente elevada no campo, o que pressupõe produções com valor agregado suficientemente elevado e com uma distribuição eqüitativa (SILVA NETO; FRANTZ, 2003 apud SILVA NETO; BASSO, 2005, p. 55-56).

Acerca desta discussão, os autores entendem que, no Estado do Rio Grande do Sul, as regiões que apresentam um processo de desenvolvimento mais dinâmico são aquelas onde predomina a agricultura familiar. Silva Neto e Frantz (2005) referem-se ao processo de desenvolvimento rural como influência da história da urbanização do interior gaúcho à qual foram submetidos. Neste contexto, delimitam- se como as principais regiões produtoras de leite do Estado justamente aquelas coloniais, nas quais a agricultura familiar é largamente predominante.

Um dos fatores que está associado ao grande número de produtores integrados à produção leiteira é a capacidade que a atividade possui de adaptar-se a diferentes situações ecológicas e socioeconômicas. Assim, a produção de leite constitui-se em uma atividade fundamental para um amplo número de agricultores das regiões em que predomina a produção familiar, sobretudo aquelas que dispõem de pequenas e médias unidades de produção. Concretizar a atividade leiteira na esfera da produção familiar é determinante não apenas por representar uma fonte regular de renda, mas em especial pela sua magnitude em relação ao mercado. Wilkinson (1997 apud SILVA NETO; BASSO, 2005, p. 60) assinala que “a competitividade a baixos níveis de concentração e produtividade significa que a produção de leite ainda é uma opção para um grande número de produtores”.

Outro fator importante a ser analisado ao se propor um modelo para a produção de leite, que colabore efetivamente para o processo de desenvolvimento de uma região, refere-se à necessidade de se partir de uma visão global dos sistemas de produção e não apenas da produção de leite isoladamente. Para o produtor e sua família, o determinante não é a competitividade de uma produção isoladamente, mas sim a garantia das condições para a sua reprodução social a partir do sistema de produção como conjunto de todas as possíveis atividades (SILVA NETO; BASSO, 2005).

Para os autores, a elaboração de alternativas focadas na estratégia de desenvolvimento do setor leiteiro no Rio Grande do Sul deve estar embasada no estímulo aos pequenos e médios produtores, sendo importante que as ações estejam atreladas aos representantes da indústria de laticínios e cooperativas de produtores, bem como aos representantes do Estado e das organizações dos

produtores rurais. Cabe ressaltar que, na elaboração dessas alternativas, além da viabilidade técnica e econômica, é essencial dar importância às condições financeiras para sua implementação (SILVA NETO; BASSO, 2005).

Já a organização da cadeia produtiva do leite, privilegiando o fortalecimento da produção a partir da ideia de escalas mínimas de produção que permitisse à maioria das famílias rurais alcançar o patamar de reprodução social, implicaria pensar a organização sob a ótica do desenvolvimento rural e não apenas do ponto de vista da acumulação privada dos agentes individuais nela envolvidos. Entretanto, uma organização nessas bases não se dá automaticamente, devendo ser o resultado de uma construção social que passa por uma relação muito estreita entre o Estado, os produtores rurais, as indústrias e as redes de distribuição.

Neste sentido, os pesquisadores concordam com Wilkinson (1997 apud SILVA NETO; BASSO, 2005, p. 70) quando este assegura que

[...] fortalecer a produção leiteira com base nas unidades familiares depende menos de sua competitividade tecnológica e organizacional do que do surgimento de uma coalizão de atores comprometidos com a redefinição das prioridades econômicas do desenvolvimento rural local a partir do potencial produtivo do sistema de produção familiar. Para isso, as agências públicas e os segmentos industriais precisariam superar suas tradicionais posturas de discriminação negativa em relação aos produtores com menor escalas, passando a privilegiar os tipos de agricultores e de sistemas de produção cujo papel seja mais relevante para o processo de desenvolvi- mento rural.

Sob este aspecto, quaisquer que sejam as decisões referentes às políticas direcionadas para o desenvolvimento rural do Estado, elas ocasionarão consequências não apenas sobre as populações rurais, mas sobre a sociedade gaúcha em geral. Desta forma, as políticas direcionadas ao setor leiteiro assinalam- -se como um modelo de uma demanda mais ampla que envolve a necessidade de se decidir conscientemente a respeito de qual sociedade se quer estabelecer para o Rio Grande do Sul. Na realidade, esta questão está diretamente relacionada com a proposta de desenvolvimento que se espera para o Estado, uma vez que o presente modelo, caracterizado pela concentração das atividades econômicas e a centralização urbana da renda e da população, tem originado sérios limites ao desenvolvimento do Estado e do Brasil como um todo (SILVA NETO; BASSO, 2005).

Como alternativa para construção de um novo modelo de desenvolvimento, capaz de assegurar uma melhor qualidade de vida para a sociedade riograndense, enfatiza-se a necessidade de definição de uma política direcionada ao meio rural que assegure a distribuição equilibrada da renda e da população sobre o território gaúcho (SILVA NETO; BASSO, 2005).

Por outro lado, a produção em grande escala, indicada e fomentada pela indústria e seus atores nos anos mais recentes, pode acabar gerando um problema do qual ainda não se tomou consciência. De acordo com Oliveira (2010), os agricultores que possuem terra suficiente para atingir uma boa rentabilidade nas suas propriedades com apenas a cultura de grãos, só irão ingressar na atividade leiteira sob condições muito mais vantajosas do que aquelas enfrentadas pelos pequenos produtores. Assim, o abastecimento da indústria pode ter sua sazonalidade comprometida, principalmente nos momentos de crise quando esses agricultores tornam muito menos estáveis sua atividade por se apresentarem outras alternativas para as suas propriedades.

Silva Neto e Frantz (2003 apud OLIVEIRA, 2010) ressaltam ainda que a continuidade na implantação do sistema proposto pelas empresas lácteas virá a determinar uma série de drásticas implicações ao desenvolvimento do meio rural, uma vez que poderia exacerbar ainda mais a concentração de renda no campo, ocasionando uma queda em sua condição global e provocando a eliminação de uma importante parcela de produtores da atividade leiteira. Emerge assim, como alternativa para construção de um novo modelo de desenvolvimento, capaz de assegurar uma melhor qualidade de vida para a sociedade rio-grandense, a distribuição equilibrada da renda e da população sobre o território gaúcho, por meio de uma política direcionada ao meio rural (SILVA NETO; BASSO, 2005).

Tentando responder a esta problemática, o capítulo dois irá tratar tanto dos impactos das transformações, como das novas exigências da cadeia láctea, especialmente a produção. Também serão discutidas algumas políticas direcionadas ao setor e ações que vêm acontecendo por parte tanto do poder público, representados pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e pela EMATER, como de outras entidades envolvidas na busca de alternativas à

produção leiteira, sobretudo aquela desenvolvida pela pequena propriedade familiar. Por fim, será realizada uma breve apresentação sobre a importância da atividade e a dimensão dos dados da cadeia do leite sob o ponto de vista do Secretário da Agricultura, Pecuária e Abastecimento no governo Yeda Crusius.

2 A ATUAL NECESSIDADE DE REESTRUTURAÇÃO DA CADEIA REGIONAL DO