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CAPÍTULO 4 – OPERÁRIOS TÊXTEIS E COMUNISTAS NA TESSITURA

4.1 Produção têxtil e corpo produtivo em meio às máquinas

Eram 6 horas. A sirene da Fábrica Carmen tocava pela primeira vez logo após o nascer do sol. Ecoava por Fernão Velho, sendo ouvida por todos que ali viviam e trabalhavam. Esse som se repetiria mais algumas vezes ao longo do dia. Cada vez que soava, operários e operárias entravam ocupando as seções para o exercício de suas funções laborais. Simultaneamente, outros saíam. Todos se alternavam, iam e vinham das suas casas, ou outros locais naquele território fabril. Era um tempo de produção contínua, sem cessar, com escalas de trabalho que adentravam a noite e continuava já em um novo dia. A sirene demarcava o tempo da produção.

Findava-se um turno, iniciava-se outro. Às 6 horas, entrava a primeira turma de operários, permanecendo até as 10 horas quando a sirene soava pela segunda vez no dia. Indicava a transição para o próximo turno que durava até às 14 horas. A segunda turma de operários entrava e assumia a produção. No início da tarde, às 14 horas, iniciava-se o terceiro turno que permanecia até as 18 horas. Nesse turno, retornavam os operários que cumpriram o primeiro horário pela manhã. Às 18 horas, a sirene então soava pela quarta vez no dia indicando o início do turno que se prolongava até as 22 horas. Retornava a turma do segundo turno pela manhã. Às 22 horas, a sirene soava pela quinta vez. Último turno! Os que adentrassem na Fábrica permaneciam até às 6 horas. Geralmente entrava quem queria fazer hora extra, receber por produção e preferiam trabalhar em um horário de oito horas corridas com um breve intervalo na madrugada.

Em Fernão Velho, além da sirene, os operários lembram que se ouvia permanentemente o barulho das máquinas que vinha da Fábrica.259 “Passei muitos e muitos anos ouvindo a tecelagem aí na frente de casa. A zoada era grande. Pááááá, páaaa... Centenas de máquinas. Páaaaaa, paaaaa. Era aquela zoada. O dia todinho, e a noite também”, relatou Zequinha Moura. À medida que a sirene demarcava a divisão do tempo em turnos, a “zoada” que durava dia e noite ecoava a incessante produção. As duas, em conjunto, expressavam o funcionamento da “engrenagem fabril” formada por máquinas, mas também por operários como parte do corpo produtivo.

Os operários da Fábrica eram diversos: homens, mulheres, jovens e pessoas de idade madura. Havia tecelões, urdideiros, fiandeiros, carpinteiros, caldeiros, contramestres, encarregados de setor, gerentes, cardistas, azeiteiros (que lubrificavam as máquinas) e o pessoal do acabamento e expedição. Trabalhavam diretamente na produção dos fios e tecidos. A denominação da função de cada operário se dava por meio da seção ou setor onde trabalhava. Havia também os motoristas, mecânicos, pedreiros, pintores, carpinteiros, lenhadores e vigias. Realizavam a manutenção da vila operária e da fábrica, além de dar apoio à produção quando necessário. A mudança de função era comum. O próprio Antônio Cardoso lembrou que trabalhou em diversos setores e atividades da Fábrica.

Na administração, também conhecida como “escritório”, trabalhavam cerca de 30 funcionários, relatou Zequinha Moura. Entre eles, estavam os offices boys, secretárias, trocadores (trocavam dinheiro miúdo para pagamento), entre outros, que não tinham necessariamente uma função nomeada, mas faziam de tudo um pouco no apoio à gestão. Eram em geral, considerados operários. Fora do labor fabril, a Fábrica empregava ainda enfermeiros, médicos, contadores e advogados (que também trabalhavam na administração), professoras e até o padre, a exemplo do padre Cabral que foi diretor do Colégio São José. Todos davam suporte à gestão do corpo produtivo e nos diversos serviços disponibilizados aos operários. A gestão do território fabril abrangia diferentes segmentos, dentro e fora da Fábrica. No âmbito da Vila Operária, havia o ambulatório, a escola, a carpintaria, manutenção e segurança.

O espaço da produção era composto por diferentes seções. Havia a seção das caldeiras, armazém de algodão e almoxarifado com material para abastecer a Fábrica, a fiação, a

259 Gladson Macedo de Oliveira, em sua dissertação em Ciências Sociais sobre a Fábrica Maria Amália no

município de Curvelo, MG, que também era mantida pelo Grupo Othon, relata que os níveis de ruídos não eram respeitados até 1992, quando foi implantado o setor de Segurança do Trabalho e passou-se a usar equipamentos de segurança como protetor auricular e máscaras respiratórias. Antes disso, muitos ex-operários relataram ter alguma deficiência auditiva ou perda parcial da audição. OLIVEIRA, 2007.

preparação para a tecelagem, a tecelagem, o acabamento com sala de fazendas e expedição, o escritório onde era realizada toda a administração.

Carlos Caracciolo foi gerente de produção na Fábrica Carmen, onde também atuou controlando a qualidade do que era produzido. Possuía curso técnico em tecelagem realizado no Rio de Janeiro na década de 1960. Trabalhou em diversas fábricas têxteis em Pernambuco, Bahia, e Alagoas. Como funcionário do grupo Othon e sendo um operário experiente em seu labor, teve oportunidade de atuar na Fábrica Maria Amália no município de Curvelo, MG. Essa também era mantida pelos Othon. Atuando em diversas funções na Fábrica Carmen, relatou com detalhes a disposição de cada sala e galpão no seu interior. Embora tenha chegado a Fernão Velho nos idos da década de 1960, esclareceu que já encontrou essa estrutura quando ali foi trabalhador. Provavelmente encontrou consolidado o resultado das intervenções dos Othon naquele complexo de fábrica com vila operária.260 Em seu exercício de reminiscência – lembrança e esquecimento – sobre a produção e trabalho na Fábrica, cuja memória para mim parece ser labiríntica, foi capaz de representar a distribuição das seções de produção e seus respectivos setores.

Figura 4 – Fábrica Carmen: representação da distribuição de salas e setores de produção nos tempos dos Othon

Fonte: Acervo pessoal. Autor Carlos Caracciolo, 2015.

260 Informação prestada por Carlos Caraccioli em entrevista para esta pesquisa, realizada em Maceió em 11 de

Para compreensão de seu esforço de lembrança que se tornara útil para mim, recorro ao mito do poeta grego Simônides. Ele fora convidado por Escopas, rei de Céos, para produzir um poema épico em homenagem ao seu reinado e a Castor e Póllux, filhos de deuses. O poema foi declamado perante um público convidado pelo rei durante um banquete em seu palácio. Simônides cumpriu o acordado, porém, no fim da homenagem, os filhos dos deuses tiveram mais destaque. Foram ovacionados pelo público. No ato de pagamento pelo serviço, o rei Escopas lhe deu apenas uma parte, sugerindo que o restante fosse cobrado a Castor e Póllux. O poeta tornou-se alvo de escárnio diante do público. Perambulou envergonhado pelo palácio, com lentas passadas pelas salas e antessalas. Foi quando um lacaio se aproximou e avisou que havia dois jovens à sua espera fora do palácio.

Saiu com pressa, mas não os encontrou do lado de fora, porém, logo ao sair, o palácio desabou! Esse lugar suntuoso transformou-se em ruínas. Seus escombros mataram todos ali dentro, desfigurando os corpos que se tornavam identificáveis. Questionava-se quem era quem? Era necessário sepultá-los, dando a cada morto o devido ritual, de acordo com seu distinto papel social naquele reino, mas o barqueiro261 que levaria os corpos do mundo dos vivos para o dos mortos não poderia esperar que se fizessem as devidas distinções! Prevalecia o risco de esquecimento.

Simônides, como único sobrevivente, levava consigo o testemunho de cada sala e antessala pela qual passou, as pessoas que a ocupavam e a vestimenta que usavam. Em meio às ruínas do palácio e das pessoas desfiguradas, viu-se em um labirinto. Suas lembranças lhe serviram como um mapa do palácio. Sendo o único sobrevivente, guiou as buscas e a identificação dos corpos, apontando locais e pessoas. O barqueiro então pode seguir sua viagem ao mundo dos mortos, e entre os vivos, permaneceram as memórias do passado.

261 Na mitologia grega, trata-se de alguém que transita o rio que limita o mundo dos vivos e dos mortos. Nesse

trânsito, carregava almas em troca de moedas. Era costume na Grécia Antiga, sepultar os corpos deixando junto uma moeda, de modo a evitar que a alma do morto vagasse perdida sem a condução do barqueiro.

Mediante seu trânsito por entre as instalações da fábrica ao longo de sua vida, com passadas pacientes, Carlos Caracciolo pode dispor de uma memória. Produziu um mapa imaginado com lugares e pontos de referência, permitindo-me posteriormente narrar na reconstrução imagética da Fábrica e seu passado para um reconhecimento atualizado no presente262.

Fotografia 22 – Fábrica Carmen após ampliação nos tempos dos Othon

Fonte: Acervo de Marcelo Góes Tavares, 2015.

Autor desconhecido. Fim dos anos 1990 e início dos anos 2000. Foto extraída de um prospecto de propaganda e demonstração de tecidos da fábrica, cedido por Carlos Caraccioli na ocasião de sua entrevista com uso da metodologia de história oral.

A fábrica era dividida em seções e os respectivos setores. Seus sons expressavam diferentes movimentos, engrenagens, equipamentos, máquinas, temperaturas, ambientes e os esforços físicos dos operários nas suas funções laborais .

262 É relevante aqui esclarecer que o esforço por recuperar o processo produtivo da Fábrica esbarrou em algumas

dificuldades. A principal delas foi a falta de acesso a fontes documentais da administração da Fábrica Carmen que possibilitasse o mapeamento da produção dentro do seu espaço físico, bem como descrições sobre as máquinas e etapas da produção. A distância no tempo foi outro fator problemático, uma vez que no período analisado nesta tese – 1940-1960 – as tecnologias usadas na Fábrica Carmen hoje não são mais empregadas na indústria têxtil.

ARMAZEM SEÇÃO DE FIAÇÃO SEÇÃO DE TECELAGEM PREPARAÇÃO DA TECELAGEM ACABAMENTO ESCRITÓRIO CALDEIRA SEÇÃO DE FIAÇÃO

Figura 5 – Produção fabril em Fernão Velho nos tempos da Fábrica Carmen: do algodão ao fio, do fio ao tecido

PROCESSO DE PRODUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE SEÇÕES NA FÁBRICA CARMEN

A representação ora apresentada foi produzida por imaginação, intercambiando as experiências dos operários de outrora em Fernão Velho, inclusive com estudos sobre os processos contemporâneos de fabricação de linhas e tecidos263. Esses últimos, em grande medida, ainda resguardam certas funções laborais e vocabulário técnico da fabricação têxtil de outrora.

A produção seguia toda uma cadência de movimentos sequenciados, todos devidamente quadriculados dentro do espaço produtivo que era organizado de forma a assegurar eficiência. Para isso, era relevante um corpo produtivo de excelência, que dominasse suas atividades e o ritmo necessário da produção em meio ao conjunto da maquinaria produtiva. Exigiam-se também conhecimentos técnicos e/ou práticos sobre os materiais, condições ambientais (níveis de umidade e temperatura) de cada seção, medidas e elasticidade dos fios, quantidade de fios necessários no urdimento e tramas de cada tipo de tecido a ser fabricado, entre tantos outros.

Os operários de Fernão Velho lembram que havia uma balança. Ficava na rua mesmo, próxima à entrada da Fábrica. Todo carregamento de algodão, quando chegava, era levado

263 A representação da produção de fios e tecidos na Fábrica Carmen materializada na Figura 5 foi possível em

virtude dos relatos de memória dos operários Carlos Caraccioli e Zequinha Moura, entre outros, que trabalharam em Fernão Velho. Destaco também o relato de Luiz Paulino que trabalhou na Fábrica de Saúde, bairro de Ipioca em Maceió, o qual tive a oportunidade de registrar quando fui conhecer esta fábrica e bairro.

Do algodão ao fio Do fio ao tecido

CALDEIRA ARMAZÉM FIAÇÃO PREPARAÇÃO DA TECELAGEM

TECELAGEM ACABAMENTO

para a pesagem nessa balança. Somente após aferido o volume e o peso da matéria-prima, é que era encaminhada para o armazém. Durante os tempos da Companhia União Mercantil e Fábrica Carmen até o início da década de 1960, o armazém era localizado fora da Fábrica, na Rua Barão de Jaraguá, onde funciona a Escola de Ensino Fundamental Hermínio Cardoso.264 Era uma localização mais próxima à estação ferroviária. Uma vez no armazém, o algodão permanecia durante certo tempo antes de ser usado na produção, uma espécie de quarentena, pois era necessário para que ele perdesse seu excesso de umidade. Somente, então, era encaminhado para a fabricação.

Enquanto isso, as caldeiras funcionavam a todo vapor, produzindo a energia elétrica utilizada na Vila Operária, mas, sobretudo, para a Fábrica. Além de fonte energética, aquecia a água necessária em diversas etapas da produção, para a lavagem do algodão, engomação e desengomagem dos fios, tingimento e alvejamento dos tecidos.

A fabricação propriamente dita iniciava-se na seção de fiação, que compreendia seis processos: os batedores, a carda, o passador, os bancos, o filatório e a bobinadeira.

Primeiramente, o algodão chegava ao setor dos batedores. Eram fardos e mais fardos de algodão para um primeiro tratamento. Eles eram abertos, limpos e transformados em flocos. Posteriormente, eram encaminhados para o setor da Carda. Nesse setor os operários eram chamados de cardistas. Manipulavam o algodão colocando-o em uma máquina que o transformava em mantas, o que facilitava a retirada das impurezas como caroços, palha, insetos entre outros possíveis que restaram. Uma vez realizado esse processamento, as mantas então eram transformadas em cordas quando submetidas às máquinas passadoras.

As cordas caíam em grandes baldes, que eram preenchidos até a borda, e saíam deles passando pelos bancos e filatório onde tinham sua espessura e volume reduzidos. Nos passadores, as cordas eram submetidas a um grande cilindro, misturando e uniformizando suas fibras em peso e comprimento, sendo enroladas em bobinas onde já se aproximavam a uma espessura de cordões, quase se tornando fios. Os operários fiandeiros e cardistas então encaminhavam as bobinas para a seção seguinte, nesse caso, a preparação para a tecelagem. Nessa seção a temperatura do ambiente oscilava entre 60 e 80 graus centígrados.

Os “quase fios” saíam das bobinas e passavam pelas máquinas urdideiras, sendo torcidos, esticados e afinados, transformando-se em fios que rompiam com frequência e facilidade. Precisavam ser novamente unidos, sendo necessárias as mãos ágeis e delicadas de

operários, os urdideiros. Cabia ao urdideiro uni-los novamente, fazendo emendas, como relatou Dona Emília ao lembrar seu trabalho nessa seção de preparação da tecelagem.

Os fios eram manipulados de modo a se manterem unidos, encaminhando-os para serem enrolados em tubos menores, muito embora ainda não estivessem prontos para serem encaminhados à tecelagem. Não tinham a resistência e elasticidade necessária para aguentar a força das próximas máquinas, assim como também apresentavam pequenas pelugens de algodão que soltavam, podendo impedir sua passagem por pequenos orifícios na tecelagem. Para adquirir melhor homogeneidade, menor espessura e maior resistência e flexibilidade, quando saíam das urdireiras, seguiam para grandes rolos que os submetiam a um processo de engomação. Sobre esse processo, o entrevistado Zequinha Moura assim explicou:

Os rolos iam para o setor de engomadeira. Eles botavam os rolos lá e a goma ia descendo a linha para poder ficar no tanque cheio de goma. Ali o fio saía engomado. Dali o fio já saía engomado e ia justamente para a tecelagem.

Os tubos eram mergulhados em gomas preparadas por substâncias naturais como gomas de mandioca, milho, entre outras, sendo acrescidos componentes químicos que facilitavam sua fixação. Era um setor muito quente. Os fios durante a engomação eram aquecidos, esticados e novamente enrolados em outros tubos, formando rolos menores nas máquinas liçadoras, alimentando cones denominados espulas. Nessa etapa, pode-se afirmar que o fio já fora transformado em linha. A linha, ao ser engomada, reduzia seu atrito com a máquina acelerando seu deslizamento na produção do tecido, ao mesmo tempo, evitando seu rompimento. Zequinha Moura complementou:

Vinham os rolos de fio, de linha, e era para passar por dentro de uma lamelazinha para a máquina. Botava a linha aqui e puxava. Era muito rápido. Colocava na lamelazinha e passava para a máquina. Os fios ficavam naquela lamelazinha e ia enrolando. Essa função era no setor de tecelagem.

Carlos Caracciolo lembrou que os gerentes de produção nessa seção julgavam que as mãos femininas eram mais adequadas em razão da suposta delicadeza para a manipulação das máquinas espuladeiras.

Fato esse que coadunava com a idealização presente nas conclusões de um “inquérito científico” sobre o trabalho feminino realizado ainda em 1931 por Clodoveu Doliveira,

funcionário do Departamento Nacional do Trabalho à época. 265 Afirmava que o trabalho feminino seria mais conveniente para a produção. As mulheres, segundo o inquérito, não teriam aspirações financeiras e também não faziam uso de vícios como o fumo. Desse modo, seria mais pedagógico o zelo da moral e do trabalho. Produzia um mito de eficiência para essa força de trabalho. Este era pautado na repetição de tarefas e movimentos, cumprimento de horários, responsabilidade pelo seu labor e por suas atividades domésticas. Trata-se de uma idealização que expressava o caráter machista e patriarcal do trabalho fabril, mesmo quando havia expressiva presença feminina. Eram trabalhadoras submetidas à subserviência em um ambiente predominantemente gerido por homens, seja na direção da fábrica, seja nas suas seções com os gerentes e contramestres.

Com o Grupo Othon (1943-1996), a preocupação com esse modelo de gestão dos operários na produção também fora registrado em suas outras fábricas têxteis,266 talvez se aproveitando das mãos femininas acreditando que fossem mais adequadas e sensíveis para manipulação dos fios. As próprias mulheres, predominantes nos diversos setores e seções, exceto nas atividades que exigiam maior força física como os mecânicos, azeiteiros, caldeireiros, armazém e setor de acabamento, eram passíveis de ser exemplo de boas operárias para os demais.

Dona Emília lembrou com orgulho que seu retrato era exposto na Fábrica da Macaxeira pertencente aos Othon em Recife. Embora nunca tenha ido a essa fábrica, assegurou que sua informação era verdadeira, pois tomou conhecimento de sua exposição pelo próprio Alberto, um dos proprietários. Ela era considerada uma das melhores urdideiras, a ponto de ser conhecida por todos, dos contramestres e chefes até os donos da Fábrica. Destacou que sempre recebia prêmio por produção. Ganhou fogão, retalho de tecidos, entre outros. Demonstrou alegremente ter sido reconhecida como boa operária, o que a entusiasmava ao rememorar seu passado como trabalhadora. Contudo, um sentimento ambíguo dado que sua alegria pode ser também compreendida como positivação e sujeição aos interesses da fábrica. Os patrões, ao primar pela eficiência e disciplina, utilizavam prêmios como forma de incentivar a eficiência no trabalho.

Após o setor das urdideiras, a produção seguia pelas espuladeiras, onde era formatado o tipo de tecido a ser produzido na tecelagem. Cada tipo de tecido tinha certa quantidade de linhas a serem submetidas ao processo de urdidura e trama na tecelagem.

265 Esse estudo se constitui como fonte e está disponível em PINHEIRO, 1981.

266 O sociólogo Gladson M. de Oliveira destaca que essa situação também ocorreu em Curvelo, MG, na Fábrica

Maria Amália. A maior parte dos trabalhadores nas seções de fiação e tecelagem era composta por mulheres. OLIVEIRA, 2007, p. 77.

Na tecelagem, ocorria o processo de fabricação do tecido. Nessa seção a temperatura ambiente era mais baixa, oscilando em torno de 20 a 30 graus centígrados. Trabalhavam os contramestres de tecelagem, ajudantes de contramestres, ajudantes de tecelagem, os tecelões, puxadores dos rolos, azeiteiros, mecânicos e liçadeiros. Todos para assegurar uma eficiente fabricação dos tecidos, principal produto da fábrica.

Desde os tempos anteriores aos Othon, a preocupação com a produtividade e a disciplina em Fernão Velho incidia até na disposição dos equipamentos e operários nas suas seções, quadriculando o espaço da produção. Era definido o lugar que cada um deveria ocupar para realizar sua função. Na tecelagem, as máquinas eram dispostas de forma perfilada para facilitar a distribuição de energia e fios que as alimentavam.

Esse “quadriculamento” assegurava também a possibilidade de circulação de operários entre um tear e outro, sobretudo, dos gerentes e contramestres que fiscalizavam e controlavam o ritmo do trabalho. “A moderna instalação e a organização em série das machinas facilitando