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5 ANÁLISE DO CASO HATTRICK

5.5 PRODUTO

Cavusgil e Zou (1994) disseram que características e especificidades do produto ou serviço oferecido pela empresa em suas empreitadas internacionais têm grande impacto sobre as estratégias adotadas e na escolha, por exemplo, de táticas mais agressivas ou defensivas de promoção e precificação. No caso do Hattrick, no entanto, esta premissa tem pouco impacto real.

Inicialmente é importante lembrar de que por ser um site aberto, qualquer um em qualquer parte do globo já tem livre acesso ao jogo, mesmo que não exista ainda uma liga específica para aquele país ou região. Assim sendo, não faz sentido e não há necessidade de implementar qualquer tipo de restrição de produtos com base na região do usuário ou visitante do Hattrick.

Além disso, o serviço prestado pelo site é basicamente único: o jogo. Existem especificidades no que diz respeito aos fóruns de discussão e dúvidas em língua local mas estes são criados assim que a região atinge um número adequado de usuários para que seja possível manter e controlar os fóruns adequadamente, e mesmo que não seja o caso, os fóruns internacionais estão sempre abertos a todos os visitantes.

Da mesma maneira, outro serviço provido pelo Hattrick e que é responsável por aproximadamente 15% da receita do site, o sócio-HT, está também disponível a todos que têm acesso ao jogo, mas não chega a impactar as estratégias de marketing empregadas pois as opções e benesses do programa de sociedade do site são iguais para todos os envolvidos, independente de sua região.

Finalmente, a última linha de ofertas do Hattrick é a Loja-HT, que também não recai sobre as premissas apresentadas por Cavusgil e Zou (1994). Ainda que ao vender produtos relacionados ao site, o Hattrick precise garantir que a entrega física ocorra para os usuários e compradores da melhor maneira possível, existem métodos para contornar a necessidade de parceiros locais como, por exemplo, o uso de parceiros globais de logística e finanças para entregas e cobranças.

Focando na oferta principal do Hattrick, o jogo em si, vemos que à época da criação o Hattrick era muito avançado para as tecnologias disponíveis. A possibilidade de interações em tempo real com outros usuários em qualquer lugar do planeta sem a necessidade de se instalar um software dedicado era visionária e surpreendente. Esta proposta foi responsável por atrair a legião de usuários que atualmente povoam a comunidade do Hattrick, mas teve um lado negativo no que toca a evolução e atualização do site. Devido à alta fidelidade que o jogo induz, modificações muito drásticas eram em geral recebidas com desagrado por parte dos usuários ativos, visto que impactavam suas estratégias de longo prazo e sua interação com o site. Exatamente por isso, o processo de atualização do Hattrick ao longo dos anos tem sido mais lento do que o possível, o que fez com que atualmente o Hattrick tenha um design antiquado, especialmente se comparado ao que é possível ser feito através da web 2.0.

Entrevistador: Sobre o desenvolvimento tecnológico, que começou nos anos 90 e agora é mais pungente, você encara estes avanços como oportunidade ou como desafios para o Hattrick?

Johan Gustafson: Quando começamos, nós éramos extremamente de ponta. Na verdade isso soa um pouco ridículo agora, mas não existia realmente nada feito de maneira remotamente similar. Era um jogo multiplayer em tempo real, que bastava se registrar para estar online interagindo com outros em 99. Era bastante avançado para a época, especialmente para um jogo livre e grátis.

Nós definitivamente não nos desenvolvemos tão rápido quanto outros sites e outras empresas e hoje, quando você olha o Hattrick, ele parece um pouco datado, mas isso é uma coisa natural. Nossos usuários são leais, mas eles também são bastante conservadores e não querem mudar muito. Portanto, temos que encontrar um

equilíbrio apropriado. Se tivéssemos começado hoje provavelmente seria diferente, seria mais ajustado às possibilidades da internet 2.0.

No entanto existem outras frentes de atualização que estão mais ativas dentro do Hattrick e que visam alterar de maneira mais profunda o relacionamento dos usuários atuais e potenciais com o jogo, como será apresentado mais adiante. Estas tocam mais diretamente o que Waheeduzzaman e Dube (2004) abordaram, mencionando que é importante se levar em conta o padrão de uso dos consumidores nos mercados de atuação, bem como o ponto no ciclo de vida do produto ou serviço nestes e a estrutura existente para o pleno atendimento das necessidades dos clientes e consumidores, observando para que não existam parcelas do mercado sub-atendidas ou sujeitas a ofertas sobrepostas ou contraditórias.

Boa parte dos planos futuros do Hattrick envolve aumentar sua presença em redes sociais, potencializando a principal estratégia de divulgação do jogo: o word-

of-mouth. Além de ser visto como uma importante tática promocional, este

movimento está alinhado com a alteração comportamental dos usuários da internet nos últimos anos, nos quais as redes sociais e, em nível global, o Facebook, se tornaram um dos principais drivers de acessos e uso da rede.

Esta integração, que inicialmente pensou-se fazer através de aplicativos dentro do Facebook, mostrou-se mais delicada do que inicialmente previsto, uma vez que o necessário agora é, além de tornar possível operar funcionalidades do Hattrick através do Facebook, agregar também recursos do Facebook diretamente a partir do Hattrick. O principal desafio neste processo reside, portanto, em oferecer aos usuários as opções de sinergia desejadas, mas sem retirar acessos e visitas do site do Hattrick e de seus fóruns.

Entrevistador: Especialmente no caso das redes sociais, você vê o Hattrick tentando algo associado ao Facebook?

Johan Gustafson: Sim, definitivamente. Nós tentamos, fizemos um aplicativo do Facebook, mas o Facebook muda tão rapidamente que o que agora é material muito bom, em dois anos deixa de ser suficiente. Ter apenas uma página no Facebook não é uma boa ideia porque o que se deve buscar é uma integração simultânea com o Facebook, para que você seja capaz de fazer coisas diretamente no Facebook a partir do Hattrick, ao invés de ir para um aplicativo especial do Facebook para fazer alguma outra coisa.

Entrevistador: E isso é provavelmente muito importante para o crescimento contínuo do Hattrick.

Johan Gustafson: Eu acho que o Facebook é o nosso maior meio de referência atualmente. De modo que, esse compartilhamento...

Entrevistador: Então, o Facebook é uma ferramenta de word-of-

mouth?

Johan Gustafson: Sim, definitivamente, e o jogo depende bastante disto, então temos que estar lá.

Analisando a oferta atual do Hattrick segundo a ótica de Szymanski, Bharadwaj e Varadarajan (1993), é possível traçar um paralelo entre o que os autores mencionam quanto à extensão de linhas de produto e a internacionalização do jogo. Considerando cada adaptação internacional do Hattrick – a tradução e a gestão local dos GM’s – como um produto novo oferecido aos clientes dentro da mesma linha de produtos, o link entre a extensão desta linha e market-share e lucratividade fica evidente.

Quanto mais opções de tradução e ligas locais o Hattrick oferecer (ou seja, quanto maior a extensão da linha de produtos Hattrick), maior o número de usuários que se identificará com o jogo e maior o share obtido em cada um destes mercados específicos. Além disso, por ter uma versão na língua local, o Hattrick se blinda contra novos entrantes nesta região tendo nela a vantagem de first mover, impedindo que competidores ganhem consumidores e participação com suas próprias inovações ou novos produtos e serviços adaptados, o que mais uma vez impacta positivamente a participação potencial naquele mercado.

Ao mesmo tempo, e como também prenunciado por Szymanski, Bharadwaj e Varadarajan (1993), estes esforços de adaptação a todos os mercados de atuação teriam um impacto negativo na lucratividade da empresa. Isto porque, para que tal extensão da linha de produtos fosse possível, seria necessária uma equipe de voluntários locais significativamente maior, o que levaria a uma redução da qualidade e a uma consequente queda na identificação e fidelização dos usuários e à redução das receitas do site ou, alternativamente, que parceiros fossem contratados para realizar tais tarefas, elevando em muito os custos de operação do Hattrick e, novamente, impactando negativamente sua lucratividade.

5.6 PREÇO

As estratégias de precificação são uma face da operação do Hattrick pouco explorada pela administração, principalmente por boa parte da oferta ser gratuita. Ainda assim, analisando este aspecto sob a luz das teorias de adaptação e

padronização na internacionalização, é possível observar táticas consoantes com as outras estratégias de marketing adotadas pela empresa em sua expansão.

A decisão de não cobrar pelo jogo e, mais ainda, de assumir uma postura administrativa não comercial podem ser observadas em todos os mercados de atuação do Hattrick. Esta característica faz parte da essência do Hattrick e de seu posicionamento como atividade comunitária e colaborativa na internet. Até mesmo nos produtos e serviços pagos oferecidos – o sócio-HT e os itens vendidos na loja- HT – a precificação é homogênea e padronizada ao longo dos mercados de atuação: sempre cobrando em dólares americanos, o Hattrick consegue garantir que todos os jogadores tenham acesso às mesmas ofertas, destacando a paridade de status a que todos estão sujeitos.

A padronização de estratégias de marketing observada no Hattrick como um todo – e mais pungentemente na precificação das ofertas – reflete não apenas o melhor caminho enxergado pela administração para o sucesso, mas também e principalmente uma crença pela igualdade entre todos os usuários, o que acaba por impactar fortemente o senso de criação de comunidade e de fidelização dos usuários, peças fundamentais para que a máquina de voluntários opere satisfatoriamente e para que, enfim, o Hattrick possa continuar sua expansão internacional através da região cultural virtual.