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6.2 Análise do processo decisório no Episódio 2

6.2.2 Programa Prioritário de Termelétricas (2000-2002)

O Programa Prioritário de Termelétricas, especialmente defendido pelo ministro Tourinho Neto, foi o resultado de um processo caracterizado por ter de superar numerosas dificuldades e conflitos. O objetivo do programa estava alinhado com as

14 BRASIL. Ação Direta de Inconstitucionalidade (Medida Liminar) -2005-6. Supremo Tribunal Federal,

Brasília Disponível em

preferências do governo, e incentivaria a participação de empreendedores privados com projetos que poderiam ser iniciados mais rapidamente que as grandes hidrelétricas, com custos de investimento menores e lucro maior. Porém, a necessidade de negociar com a Petrobrás pelo fornecimento de gás, com a Eletrobrás pelas garantias de compra da energia térmica, com o Ibama pelos prazos das licenças ambientais e com o Ministério dea Fazenda sobre a possibilidade de afetar a balança de pagamentos deixaram evidências da setorização de interesses, com agentes externos exercendo influência no output. Segundo os indicadores, o processo pode ser entendido em termos do Modelo III.

- Múltiplos atores com uma coordenação central. O ministro Rodolpho Tourinho Neto lança o programa por decreto presidencial. As negociações posteriores desenvolvem-se primeiro no MME, e depois no âmbito da GCE. A Figura 6 é a expressão gráfica do processo decisório. De novo, os atores defensores do projeto figuram em azul, e a maioria deles têm acesso ao núcleo central do processo decisório. Porém, dada a natureza do programa, que envolve uma complexa interação e coordenação entre atividades e entidades diferentes, os conflitos resultaram não apenas evidentes mas marcantes do desenvolvimento do próprio processo decisório, e ainda dos outputs deste. Ao longo do processo, o programa foi sempre defendido e o processo decisório coordenado pelo órgão governamental especializado (o MME primeiro e a GCE durante a crise), devendo negociar e resolver sequencialmente os diferentes conflitos surgidos com a Aneel, com o Ministério da Fazenda e com Petrobrás, além de lidar com os casos particulares de concessão de licenciamento ambiental. Tanto investidores quanto membros da associação representativa dos geradores termelétricos representam atores fortemente interessados na pronta definição do programa, porém sem muita influência sobre o processo decisório da regulamentação e aplicação do programa. Finalmente, comparado com o evento do episódio anterior, com a situação crítica da energia elétrica, o presidente FHC passa a ser parte do núcleo central do processo decisório, além de alterar o topo da estrutura decisória.

Figura 6 Mapa de posicionamento dos atores: Programa Prioritário de Termelétricas

- Objetivo estratégico claro e compartilhado. As bases e propostas do programa estavam completamente alinhadas ao objetivo estratégico da Gestão FHC, gerando um mercado no qual a expansão da oferta fosse por meio de investimentos de agentes privados.

- Conflitos visíveis, os atores negociam possíveis soluções. A Figura 715 representa graficamente o posicionamento dos atores. Tanto o Ministro Tourinho quanto o Presidente da República ou a GCE representam os principais defensores da política, apresentada como a alternativa mais coerente com o objetivo de incentivar investimentos privados, considerando a rápida amortização das termelétricas, e o relativamente

15 A representação gráfica pode resultar enganosa por uma deficiência do software, que não permite

distinguir entre o apoio a alguns elementos, como os objetivos da política, e a oposição a outros, como as propostas específicas. Daí que low support (apoio fraco) e low opposition (oposição fraca) possam ser entendidos em realidade como espaços cinza onde apoio e oposição tornam-se muito relativos à situação particular de cada ator.

rápido efeito na expansão da oferta de energia elétrica considerando o contexto de crise hídrica. Porém, a proposta encontrou resistência de entidades específicas em relação às propostas do programa que afetavam diretamente suas funções. Entre as oposições figuram a do Ministério da Fazenda pela conversão do preço dolarizado do gás, a reticência da Petrobras e da Eletrobrás a correr com os riscos da importação de gás e os novos investimentos, a oposição à Aneel em relação à intervenção nos preços, a intromissão da ANP no controle do mercado do gás, a falta de interesse dos investidores e a lentidão no licenciamento ambiental. Cada uma dessas oposições significou alterações e atrasos no programa original.

Figura 7 Posicionamento dos atores com relação à política - Programa Prioritário de Termelétricas

- Agentes alheios têm influência decisiva. Nos sucessivos relançamentos do projeto foram sendo incorporados novos acordos em relação às tarifas do gás, compra de energia, tarifas e licenciamentos.

- Prazos superpostos. O Programa foi desenhado como forma de amenizar a dependência da hidroeletricidade, de forma a incentivar a participação da iniciativa privada. Ao longo das sucessivas tentativas de definição das regras do programa, o contexto de crise econômica e energética, a incapacidade da Eletrobrás de fazer investimentos pelo acordo com o FMI, e a proximidade das eleições foram alterando o processo decisório.

- Atenção difusa: atenção a problemas urgentes. Lançado como prioridade da gestão de Tourinho Neto, a GCE dará atenção ao projeto

tão importante para amenizar no curto prazo a crise energética com o aumento da oferta de energia, e minimizar os custos políticos de um racionamento longo.

- Atores acumulam funções e tarefas. Tanto no momento em que foi lançado quanto durante a crise, a função de expansão do parque gerador, qualquer fosse a fonte, era da Aneel por indicação do ONS. O Programa Prioritário de Termeletricidade (PPT) representa uma alteração à norma.

- Descentralização. Primazia de líderes individuais. As regras para implementação do programa foram o resultado da barganha entre diferentes atores, incluindo o presidente FHC, o Ministro Parente, o ministro Tourinho, o diretor da ANP Zylbersztajn, a ANEEL, a Eletrobrás e o ministro Jorge.