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3.2 O INCENTIVO ESTATAL AO EMPREGO DE AGROTÓXICOS NA

3.2.3 Projeto de Lei n 6.299/2002: Pacote do Veneno

A legislação sobre agrotóxicos no Brasil, hoje, resume-se, sobretudo, à Lei n. 7.802, de 11 de julho de 1989 e ao Decreto n. 4.074, de 4 de janeiro de 2002 (ABRASCO; ABA, 2018).

Segundo o Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador, órgão técnico vinculado ao Ministério da Saúde, a legislação brasileira “é considerada uma

das mais robustas do mundo, representando avanços significativos para proteção à saúde humana e ao meio ambiente”, sendo que, ainda que seja necessário realizar atualizações em determinados pontos, “os pilares de saúde humana e de meio ambiente devem ser preservados” (ABRASCO, ABA, 2018, p. 77).

Todavia, justamente no sentido oposto, está tramitando na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei n. 6.299/2002, conhecido como Pacote do Veneno, que tem como intuito alterar

[...] os arts 3º e 9º da Lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989, que dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências (BRASIL, CONGRESSO, CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2019).

Contudo, como o PL possui trinta e nove apensos, os quais constituem projetos ​que estão tramitando no Congresso Nacional desde 1999 , as modificações não se limitam ao que 8 está disposto na ementa apresentada no sítio eletrônico da Câmara dos Deputados, alcançando até mesmo o Decreto n. 4.074/2002 que regulamenta a Lei n. 7.802/1989.

Diante de tantos projetos, é necessário ressaltar especificamente aquilo que não se adequa à legislação consumerista, principalmente, o que enfraquece a proteção à saúde e à segurança do consumidor.

Em atenção ao tema, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) e a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) reuniram notas técnicas de instituições de pesquisa, sociedades científicas, órgãos técnicos das áreas da saúde e ambiente, órgãos do judiciário, órgãos de controle social, da sociedade civil organizada e da Organização das Nações Unidas (ONU) para demonstrar que a Câmara dos Deputados pretende reduzir a relevância das medidas que visam proteger a saúde e o meio ambiente tanto nos

8PL 2495/2000,PL 3125/2000,PL 5884/2005,PL 6189/2005,PL 4933/2016,PL 3649/2015, PL 5852/2001,PL 4624/2019, PL 1567/2011, PL 4166/2012, PL 1779/2011, PL 3063/2011, PL 1687/2015, PL 3200/2015, PL 49/2015, PL 371/2015, PL 461/2015 , PL 5583/2019, PL 958/2015, PL 7710/2017, PL 8026/2017,PL 6042/2016, PL 2614/2019, PL 713/1999, PL 1388/1999, PL 7564/2006, PL 4412/2012,PL 2129/2015, PL 4228/2019, PL 4221/2019, PL 5218/2016,PL 3745/2019, PL 560/2019,PL 5131/2016, PL 10552/2018, PL 8892/2017, PL 9271/2017, PL 2546/2019, PL 3930/2019​.

procedimentos de registro quanto de fiscalização do empregos dos agrotóxicos (ABRASCO; ABA, 2018)

Ao analisar o referido PL, a FIOCRUZ criticou a substituição do termo agrotóxicos por produtos fitossanitários e produtos de controle ambiental, pois compreende que a alteração oculta a toxicidade intrínseca às substâncias químicas, bem como atribui uma ideia de “falsa segurança” e ainda induz uma crença em sua inocuidade” (ABRASCO; ABA, 2018, p. 15). Além é claro de contrariar a própria Constituição Federal que denomina os produtos químicos utilizados na agricultura de agrotóxicos e não de produtos fitossanitários ou produtos de controle ambiental (ABRASCO; ABA, 2018).

A FIOCRUZ também questiona a clareza do termo “produto idêntico” incluído no artigo segundo da Lei n. 7.802/1989, o qual seria um

produto fitossanitário de controle ambiental ou afim com composição qualitativa e quantitativa idêntica ao de outro produto já registrado com os mesmos fabricantes e mesmos formuladores, com as mesmas indicações, alvos e doses (ABRASCO; ABA, 2018 p. 19)

A referida instituição científica salienta esse ponto, porque defende que a definição não esclarece se o produto diz respeito ao ingrediente ativo isolado ou ao produto formulado como um todo, fato que impacta nas consequências à saúde humana, uma vez que, ainda que uma composição seja idêntica, nos termos da definição do PL, os seus prejuízos podem variar de acordo com os demais compostos inseridos no produto, tais como os adjuvantes (ABRASCO; ABA, 2018).

Outra novidade destacada pela FIOCRUZ está relacionada à concessão de registro e autorização temporárias para produtos que já são permitidos em outros países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, visto que a liberação de substâncias químicas, ainda que de forma temporária, sem a realização dos estudos cabíveis no Brasil, além de reduzir a importância das agências reguladoras do país, ignora que a toxicidade de um agrotóxico pode ser influenciada por aspectos que extrapolam as questões físico-químicas dos produtos, pois “características genéticas, socioculturais, epidemiológicas e edafoclimáticas, por exemplo, interferem diretamente na toxicidade e variam entre países” (ABRASCO; ABA, 2018, p. 23).

Desse modo, os consumidores ficariam ainda mais vulneráveis aos riscos dos agrotóxicos, tendo em vista que se submeteriam ao consumo de substâncias sem qualquer pesquisa brasileira que comprove a mínima segurança. Interessante perceber, ainda, que, apesar do PL propor a autorização das substâncias químicas com fundamento em padrões de outros países, o mesmo não é sugerido para a proibição, o que evidencia que se trata de uma forma de flexibilizar o emprego de agrotóxicos e não uma pretensão de inserir medidas que garantam a segurança do consumidor (ABRASCO; ABA, 2018).

Por sua vez, em sua manifestação, a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia acentuou que a transferência da análise das substâncias químicas e do registro somente ao Ministério da Agricultura constitui uma maneira de tornar o controle sanitário mais brando, pois retira a função de outros órgãos que possuem a devida competência técnica, como a ANVISA (ABRASCO; ABA, 2018).

Nessa perspectiva, o Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhadorfrisa que a utilização dos verbos “apoiar”, “homologar” e “priorizar” enfatizam a redução das atribuições dos órgãos da área da saúde que passariam a exercer meras atividades auxiliares nos procedimentos de registro e de reavaliação (ABRASCO; ABA, 2018, p. 78).

Outro aspecto importante salientado pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia diz respeito à permissão de “produtos com risco aceitável”, uma vez que tal autorização poderia expor a população a diversos riscos, tendo em vista a existência de literatura médica que indica que os agrotóxicos são potencialmente danosos ao sistema endócrino (ABRASCO; ABA, 2018, p. 51).

Aliás, quanto ao risco aceitável, a Associação Brasileira de Agroecologia questiona como e quem definiria do se trataria tal termo, já que o PL não apresenta parâmetro objetivos capazes de indicar qual seria o caminho (ABRASCO; ABA, 2018).

Nesse sentido, o Ministério Público Federal (MPF), por meio da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Meio Ambiente e do Patrimônio Cultural, observa que, ao contrário do que está disposto na legislação atual, o PL nada dispõe sobre substâncias químicas com “características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas, ou que provoquem distúrbios hormonais e/ou danos ao sistema reprodutivo”, somente se limita a afirmar que seriam proibidos aqueles produtos com “risco inaceitável para os seres humanos ou para o meio ambiente”, o que leva a crer que as características supramencionadas serão desconsideradas (ABRASCO; ABA, 2018, p. 91).

Como se não bastasse, o MPF, ainda, acentua que o PL facilita e flexibiliza a

utilização dos agrotóxicos ao permitir que determinadas substâncias químicas obtenham autorização temporária ou o próprio registro quando os órgãos da Agricultura, do Meio

Ambiente e da Saúde não se manifestarem contrariamente no prazo de doze meses

(ABRASCO; ABA, 2018). Diante de todo o exposto, considerando o desrespeito ao direito à saúde, à alimentação

adequada e ao meio ambiente, o Conselho Nacional dos Direitos Humanos, o Conselho

Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional bem como o Conselho Nacional de Saúde

recomendaram a rejeição do PL n. 6299/2002 e seus apensos (ABRASCO; ABA, 2018). De igual forma, um grupo de servidores do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e

integrantes do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos, nos âmbitos

federal, estadual e municipal, declararam ser contrários ao PL n. 6299/2002 e recomendaram

a elaboração de normas que tenham como propósito a promoção da saúde e do meio ambiente,

bem como o incentivo ao Programa Nacional de Redução de Uso de Agrotóxicos, ao Plano

Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, à Vigilância da Saúde de Populações

Expostas a Agrotóxicos e claro, ao Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em

Alimentos (ABRASCO; ABA, 2018). Por fim, até mesmo a ANVISA se posicionou de forma contrária às alterações à

legislação que trata dos agrotóxicos e ainda, destacou que o PL em nada contribui para a

promoção de alimentos ou tecnologias mais seguras e tampouco para a solidificação do

sistema que regula os agrotóxicos, o que evidencia que a população, que deveria ser o foco do

PL, na verdade, está em segundo plano (ABRASCO; ABA, 2018). Frente a esses tópicos, constata-se que o Estado nitidamente age em prol dos

agrotóxicos. Ao atuar dessa forma, ele ignora os preceitos da legislação consumerista no que

toca à saúde e à segurança, bem como descumpre o seu dever de assegurar a defesa do

consumidor. Por esses motivos, é fundamental buscar novas perspectivas para a agricultura a

fim de que, com o auxílio da atuação estatal, o sistema agrícola, gradativamente, torne-se menos dependente de substâncias químicas.

Uma vez demonstrado o contexto no qual o consumidor está inserido, a caracterização do alimento com agrotóxico como defeito do produto e a contribuição estatal para a perpetuação de um ciclo contrário às disposições legais, verificar-se-á de que modo o cenário pode se tornar mais favorável à saúde e à segurança do consumidor.

Embora o risco zero seja algo inalcançável, sendo a incerteza inerente à sociedade de risco (LOPEZ, 2010), cumpre ao Estado, por meio do sistema jurídico e do sistema político, cumprir o seu dever de defender o consumidor, bem como garantir a qualidade e a segurança dos produtos (BENJAMIN; MARQUES; BESSA, 2007).

A atuação estatal está diretamente relacionada ao Direito que diante da sociedade de risco e do paradigma da tecnociência se encontra submerso em incertezas (PARDO, 2015).

A despeito disso, o Direito ainda possui o dever de regular as relações estabelecidas em uma sociedade, de modo que a velocidade do desenvolvimento tecnológico e o sistema pautado na segurança jurídica não podem representar obstáculos para a sua atuação (PARDO, 2015).

Dentre as possibilidades elencadas no primeiro capítulo, a combinação de duas soa mais adequada para o problema ora analisado.

Conforme Pardo (2015, p. 197), “as presunções são uma típica fórmula idealizada pelo Direito para resolver e decidir em situações de incerteza. Não se aspira dar a verdade objetiva, se não, simplesmente, resolver as questões que o próprio direito tem na sua frente [...]. ”

Nesse sentido, Pardo (2015, p. 197) esclarece que essa presunção não se assemelha à presunção legal tradicional, pois, enquanto a segunda se fundamenta em uma “máxima de experiência”, ou seja, “presume-se o que muito provavelmente ocorre ou ocorreu segundo acredita a experiência comum”, a primeira está relacionada à proteção de valores, sujeitos ou bens jurídicos que estão em uma posição vulnerável em virtude do contexto de incerteza.

Assim, o indivíduo que se encontra em uma situação desfavorável pode ter o equilíbrio restabelecido pelo Direito (PARDO, 2015). Dito de forma mais clara, o foco deixa de ser a certeza e passa a ser a equidade (PARDO, 2015).

Pardo (2015, p. 200), ainda, sugere que essas “presunções institucionais ou orgânicas” sejam baseadas em uma autoridade científica escolhida pelo legislador. No entanto, considerando o cenário brasileiro, sobretudo, os interesses econômicos relacionados ao tema dos agrotóxicos, dificilmente, essa escolha privilegiaria a saúde e a segurança do consumidor.

Por isso, soma-se à sugestão de Pardo, a ideia de subpolítica de Beck (2011), a qual está relacionada a uma maior participação social nas decisões vinculadas ao progresso, de modo que as questões se tornem acessíveis ao público e se submetam, de fato, à responsabilidade parlamentar. Na prática, isso aconteceria por meio da participação dos mais diversos setores, entre cidadãos, movimentos sociais e grupos especializados (BECK, 1997).

Dito isso, acentua-se que, no segundo e terceiro capítulos, foram apresentadas as concepções de diversos campos da sociedade e todas elas convergem no mesmo sentido: o alimento com agrotóxico constitui um risco ao consumidor. Sendo assim, faz-se imperioso repensar o sistema agrícola brasileiro.

Desse modo, diante de todos os indícios apresentados, se é possível constatar que os resíduos de agrotóxicos podem provocar efeitos negativos à saúde humana, ainda que não haja certeza científica absoluta, bem como que essa conclusão está em desacordo com o ordenamento jurídico, uma vez que a legislação consumerista veda produtos que causem danos físicos e psicológicos ao consumidor, cabe ao Estado, mesmo que a transformação não seja imediata, atuar em prol da defesa dos consumidores.

Como relatado por Benjamin, Marques e Bessa (2007), em razão do seu dever de defender o consumidor, o qual constitui um direito fundamental, cabe ao Estado agir positivamente para garantir a proteção e concretizar ações que favoreçam os interesses dos consumidores.

Todavia, como foi demonstrado, a atuação estatal está em dissonância com o seu dever e por conseguinte, com o próprio CDC, contribuindo para a perpetuação de um sistema que desrespeita a proteção do consumidor.

Para a concretização de uma mudança, ainda que seja de forma gradual, faz-se necessário explorar novas perspectivas, as quais se relacionam justamente com o oposto do que tem sido feito pelo Estado.

Como mencionado, até outubro de 2019, em contraposição ​aos 90 registros concedidos para produtos formulados à base de produto técnico equivalente, apenas ​24 eram relativos às substâncias de caráter biológico e orgânico (BRASIL, 2019).

Ocorre que o controle biológico constitui importante alternativa às substâncias químicas, pois a

a sua premissa básica [...] é controlar as pragas agrícolas e os insetos transmissores de doenças a partir do uso de seus inimigos naturais, que podem ser outros insetos

benéficos, predadores, parasitóides, e microrganismos, como fungos, vírus e bactérias. Trata-se de um método de controle racional e sadio, que tem como objetivo final utilizar esses inimigos naturais que não deixam resíduos nos alimentos e são inofensivos ao meio ambiente e à saúde da população (EMBRAPA, 2019).

A fim de estimular o uso dessa alternativa, a EPAGRI (2019a) promove encontros com agricultores e lhes apresenta produtos biológicos para utilizar no cultivo da cana-de-açúcar, aipim e hortaliças.

Recentemente, a EPAGRI (2019b, s/p) venceu a categoria agricultura sustentável do Prêmio Fritz Müller, promovido pelo Instituto do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (IMA), com o projeto “Biodiversidade e potencial de uso de parasitoides no controle biológico da mosca-das-frutas sul-americana no Meio-Oeste de Santa Catarina” que tem como intuito “estudar a biodiversidade de inimigos naturais da principal praga das frutíferas de clima temperado do Sul do Brasil [...]. ”

Nessa perspectiva, vale destacar também que o controle biológico não se limita aos animais, a alternativa pode ser aplicada também em face das plantas daninhas por meio dos fitopatógenos, sobretudo, os fungos (OLIVEIRA; BRIGHENTI, 2018). Todavia, em que pese três fungos originários do Brasil já tenham sido empregados em outras regiões do mundo, não há uma implementação efetiva desse método no território brasileiro (OLIVEIRA; BRIGHENTI, 2018).

Tal fato demonstra que, apesar do controle biológico estar previsto como umas das medidas alternativas previstas no PL n. 6.670/2016, denominado de Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA), que tramita na Câmara dos Deputados (ABRASCO; ABA, 2018), o mercado de produtos biológicos brasileiro e sua participação nas culturas que possuem opção biológica ainda são tímidos (EMBRAPA, 2019).

Diferente do que é observado hoje, uma política tributária alinhada aos direitos básicos do consumidor poderia servir de instrumento de fomento desse mercado. Nesse sentido, destaca-se que o estado de Santa Catarina inovou ao tentar implementar por meio da Medida Provisória n. 226/2019 a denominada Tributação Verde, a qual prevê a incidência de ICMS 9 sobre os agrotóxicos de acordo com o nível de toxicidade, bem como a isenção dos produtos biológicos (FCCIAT/SC, 2019).

9​A MP passaria a surtir efeitos a partir de janeiro de 2020. No momento, segue tramitando na Assembleia

De outro norte, a despeito da ausência de incentivo, existem produtores que cultivam de forma totalmente diversa do atual modelo agrícola, como é o caso do único azeite biodinâmico da América Latina (GLOBO RURAL, 2019). O método biodinâmico constitui uma maneira de plantar sem o emprego de agrotóxicos, sendo calcado em conhecimentos geológicos, químicos e astronômicos (GLOBO RURAL, 2019).

Na propriedade localizada em Minas Gerais, são plantadas três variedades de oliveiras: a koroneiki, a grappolo e a arbequina (GLOBO RURAL, 2019). As árvores possuem seis anos e chegam a produzir até 70 quilogramas de frutos (GLOBO RURAL, 2019). O cultivo das azeitonas leva em consideração os movimentos da lua para definir os dias favoráveis para as práticas agrícolas e ainda, utiliza um espaço exclusivo de produtos orgânicos para processar as azeitonas e transformar em azeite (GLOBO RURAL, 2019).

Frente a todo o exposto, denota-se que, ainda que o caminho seja longo, existem alternativas ao agrotóxico que devem ser incentivadas pelo Estado que, com o respaldo do Direito e com a participação de diversos setores da sociedade, deverá estabelecer um novo modo de agir que, finalmente, estará em consonância com o seu dever perante o consumidor.

CONCLUSÃO

A fim de compreender o cenário no qual o consumidor está inserido, no primeiro capítulo, buscou-se relacionar a sociedade de risco à de consumo e por conseguinte, aos sistemas jurídico e político.

Se, por um lado, é possível concluir que inexiste um controle efetivo dos riscos por parte das autoridades competentes, seja em razão das suas características ou até mesmo da velocidade com que a tecnologia avança, por outro, verifica-se que o fato dos riscos serem suscetíveis de interpretações causais, de modo que a sua confirmação, muitas vezes, depende da palavra de um especialista, possibilita não somente o reconhecimento desses riscos, mas a sua “normalização” também. Isto é, a depender de quem realiza a análise, a potência danosa dos riscos poderá ser ajustada para atender determinados objetivos.

Nessa perspectiva, é interessante perceber que, a partir do primeiro terço do século XX, iniciou-se um processo de alteração na ciência que culminou na sua transformação em fonte de probabilidades e ainda, na sua subordinação à finalidade técnica e não mais à mera investigação.

Essa inversão da ordem entre investigação científica e aplicação técnica mostra-se relevante para visualizar os fundamentos da atuação estatal, uma vez que, tendo em vista, as situações cada vez mais complexas que surgem na sociedade, a ciência ocupa um importante lugar, pois, além de suscitar as dúvidas, é ela que delimita o espaço decisório das autoridades competentes.

Desse modo, as pesquisas com objetivos previamente estabelecidos com base em interesses de determinados grupos que, geralmente, financiam esses estudos tornam-se fundamento de importantes decisões políticas que impactam na vida de toda a coletividade.

Esse raciocínio, aplica-se igualmente ao Direito, mas há um outro aspecto que merece destaque, qual seja, a relação do sistema jurídico com a incerteza, haja vista que, embora a ciência suscite questões que despertam as dúvidas, ela não apresenta, ao menos, não de imediato, as soluções cabíveis, de modo que o Direito é forçado a regular relações sociais com fulcro na segurança jurídica, mas coberto por uma incerteza científica.

Nesse contexto, é evidente que o consumidor é prejudicado, pois, uma vez inserido em uma sociedade de consumo e de risco, encontra-se duplamente vulnerável às consequências negativas decorrentes dos produtos e serviços inseridos no mercado de consumo, como, por exemplo, o alimento com agrotóxico.

Com base em dados do Agrofit e do MAPA (BRASIL, 2018), demonstrou-se que, em 2014, a quantidade de agrotóxicos comercializados no Brasil chegou a 1.552.998.056 quilogramas, bem como que, dentre os agrotóxicos mais empregados, alguns são temas de intensos debates sobre a sua potencialidade para causar danos à saúde.

Diante disso, no capítulo segundo, o objetivo foi, principalmente, comprovar que os agrotóxicos empregados nos alimentos geram malefícios à saúde humana e portanto, constituem uma violação à legislação consumerista.

Sendo assim, verificou-se, por meio do relatório do PARA de 2016 que somente 5.062 (42,0%) das amostras de alimentos estavam livres de resíduos de agrotóxicos, isto é, mais da metade apresentaram resíduos em quantidades iguais ou menores ao limite máximo de resíduos, resíduos de agrotóxicos não autorizados para aquele tipo de cultura e quantidades acima do limite máximo.

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