• Nenhum resultado encontrado

AlteragÓes Químicas Causadas por Microrganismos

PROTEÍNAS

As proteínas sáo cadeias de aminoácidos unidos por ligagoes peptídicas que podem ser destruidas por hidrólise catalisada por enzimas. De maneira geral, as proteínas sao degradadas, através de proteinases a peptídeos e em seguida aminoácidos, através de peptidases.

Os microrganismos sé conseguem aproveitar as moléculas menores de proteína, os peptídios, e nao a proteína intacta, pois esta náo consegue atravessar a membrana celular. Para tanto, alguns microrganismos tais como Clostridium, Bacillus e Pseudomonas, e, ocasionalmente, espécies de outros géneros, secretam enzimas extracelulares que rápidamente hidrolisam moléculas de proteínas a peptídios solúveis e aminoácidos. Algumas bactérias secretam enzimas que hidrolisam urna grande variedade de substrato protéico; outras secretam enzimas que preferencialraente hidrolisam gelatina ou colágeno. Essas gelatinases e colagenases sáo de importancia em produtos cárneos.

A putrefagáo, um tipo de biodeterioragáo proteica, fácilmente detectada, resulta da agáo de microrganismos sobre aminoácidos, nucleotídios e outros compostos nitrogenados de baixo peso molecular. Nesta reagáo ocorre a formagáo de substancias de odor pútrido (mercaptanas, aminas etc.). Aruptura da molécula proteica provoca, entre outros defeitos no alimento, alteragoes na textura, como o amolecimento dos tecidos, e alteragóes no aroma. Quanto mais avangado estiver o processo de deterioragáo, mais marcantes seráo as alteragóes verificadas nos alimentos.

Somente após a utilizagáo dos compostos de baixo peso molecular disponíveis é que os micror­ ganismos iráo atacar as proteínas de maior peso molecular.

Dependendo do tipo de microrganismo, da temperatura, da quantidade de O2 disponível e das

possíveis substancias inibitórias presentes, a degradagáo dos aminoácidos pode ocorrer através da: — desaminagáo oxidativa ou redutora: a desaminagáo oxidativa produz amónia e alfa-cetoáddos

desaminagáo redutora é realizada somente por anaerobios estrilos, produzindo amóniae ácidos orgánicos. Algumas vezes, a deterioragao de pescados é detectada através da produgáo de ácidos orgánicos voláteis de baixo peso molecular, tais como ácidos fórmico, acético, propiónico, butírico e outros;

— desaminagáo redutora e oxidativa: essa reagáo é conhecida como reagáo de Stickland. Os clostrídios metabolizam aminoácidos através dessa reagáo, que envolve a combinagáo da desaminagáo oxidativa da L-alanina com a desaminagáo redutora de um outro aminoácido, glicina por exemplo, dando como produtos ácido acético, CO2 e amónia. Além da alanina,

outros aminoácidos, como valina, leudna e isoleucina, podem atuar como doadores de hidrogénio na reagáo de Stickland, formando ácido isobutírico, ácido isovalérico e ácido alfa-metilbutírico como produtos fináis, respectivamente.

Somente a glicina, a prolina e a hidroxiprolina sáo redutivamente clivadas através da reagáo de Stickland, com a prolina e a hidroxiprolina sendo convertidas, respectivamente, aos ácidos y-amino- valérico e y-amino-a-hidroxivalérico.

— descarboxilagao: há remogao do grupamento carboxila por enzimas descarboxilases es­ pecíficas. A descarboxilagao anaerobia produz diferentes aminas. As mais conhecidas sao histamina, cadaverina e putrescina provenientes, respectivamente, dos aminoácidos histidina, lisina e ornitina. Essas aminas sáo voláteis e utilizadas como índice químico da qualidade do pescado;

— produgáo de H2S: esta substancia, produzida a partir de aminoácidos contendo enxofre em sua molécula, como cisterna ou metionina, é conhecida devido ao odor característico de ovo podre que corriere a produtos protéicos deteriorados. Entre as bactérias produtoras de H2S, Desul-

fotomaculum nigrificans é urna das mais conhecidas como deteriorante de alimentos en­ vasados ou enlatados, produzindo H2S a partir da cisterna;

— decomposigáo do radical do aminoácido: neste tipo de deterioragao, os microrganismos produzem substancias características, como o indol, a partir do triptofano. O indol é usado como índice químico de qualidade do pescado.

Outras substáncias nitrogenadas náo-protéicas também sáo utilizadas pelos microrganismos. As amidas, imidas e uréia podem ser transformadas em grande quantidade de amónia; guanidina e creatina, quando degradadas, originam uréia e amónia e a biodeterioragao de aminas, purinas e pirimidinas leva á produgáo de uréia.

Entre as substáncias nitrogenadas náo-protéicas, a redugáo do óxido de trimetilamina (TMAO) a trimetilamina (TMA) é de grande importancia na avaliagáo da qualidade do pescado, urna vez que apresenta aroma característico e pronunciado.

Ao contrário do que ocorre na deterioragao de carboidratos, na qual há urna queda do pH devido á produgáo de ácidos, nabiodeterioragáo protéicaverifica-se, ao contrário, umaelevagáo do pH. Essas alteragóes nos valores do pH sáo indicadoras da degradagáo dessas substancias.

LIPÍDIOS

Os principáis lipídios presentes em alimentos sáo ésteres de glicerol e ácidos graxos, denominados triglicerídios. Aestrutura geral é apresentada na Fig. 5.2.

Os radicáis Ri, R2 e R3 sáo ácidos graxos, que podem ser idénticos ou nao ñas tres posigóes.

Os óleos puros e as gorduras nao sáo atacados por microrganismos, urna vez que eles náo crescem na ausencia de água. No entanto, nos alimentos gordurosos que também contém água, a situagáo é diferente. Urna vez que a interagáo entre água e gordura é baixa, a existencia de urna fase aquosa associada á gordura é suficiente para o desenvolvimento microbiano. É o que acontece em alimentos como margarina, manteiga e creme de leite.

As gorduras podem ser transformadas por reagóes de hidrólise, oxidagao e outros procesaos, em compostos que acarretam modificagoes agradáveis ou náo no aroma do alimento.

A deterioragáo da gordura é conhecida como rancificagáo. Existem dois tipos de rancificagáo: a hidrolítica, geralmente de origem enzimática podendo ser causada por microrganismos, e a oxidativa, que náo depende da agao de microrganismos.

o II a-CH2 O C Ri O P -C H O

i

* 2 a-CH2 O C R3 II O

Fig. 5 2 —Estrutura geral dos triglicerldios.

Algumas bactérias como Pseudomonas fragi, P. fluorescens, fungos (por exemplo, Penicittium roqueforti, Rhizopus oligosporus, Thamnidium elegans) e leveduras, como Candida lipolytica e C. fresenii, produzem lipases que liberam ácidos graxos ñas posigóes 1-3 ou a - a ’ de um triglicerídio

muito mais rápidamente do que na posigáo 2 ou p da molécula do triglicerídio.

Outros microrganismos, no entanto, como Aspergillus flavus, Staphylococcus aureus e Geotri- chum candidum, hidrolisam, de preferencia, os grupamentos de áddo graxo ligados na posigáo 2 ou

p do triglicerídio.

Microrganismos lipolíticos produzem cetonas mediadas e átidos graxos voláteis a partir de óleos e gorduras. Entre eles podem ser citados C. lipolytica, P. roqueforti, G. candidum e micrococos que produzem cetonas mediadas juntamente com seus álcoois secundários correspondentes. Essas subs­ tancias originam-se diretamente do metabolismo de átidos graxos livres liberados pela |3-oxidaqao, resultando no p-cetoácido correspondente. Este p-cetoácido pode, entao, sofrer urna descarboxilagáo originando a metilcetona correspondente ou a acetil-coA e ácidos graxos de cadeia menor por clivagem. As moléculas de acetil-coAsao subseqüentemente oxidadas a C 02 através do tildo do ácido

tricarboxílico.

A rancificagáo oxidativa produz substancias com aroma pronunciado e desagradável devido á decomposigáo dos hidroperóxidos em compostos carbonílicos (misturas de cetonas e aldeídos saturados e insaturados). Na rancificagáo hidrolítica ocorre a liberagáo de ácidos graxos das moléculas de triglicerídios, sendo que os de cadeia curta, como o butírico, capróico e caprílico, causam odores estranhos nos alimentos nos quais estao presentes.

Os fosfolipídios sao hidrolisados por enzimas específicas — as fosfolipases — que recebem diferentes letras em sua designado; fosfolipase A, fosfolipase B, fosfolipase C e fosfolipase D, dependendo da ligagáo éster na qual ela age. As fosfolipases A e B clivam ésteres de ácidos graxos, enquanto que as fosfolipases C e D hidrolisam ligagoes éster-fosfato.

OUTRAS DETERIORAgÓES

Entre outras deterioragóes ou alteragóes que ocorrem devido ao crescimento microbiano, levando á rejeigáo do alimento, podem ser citadas as modificagoes na viscosidade e as alteragoes de cor devido á produgáo de pigmentos ou ao crescimento do micélio de bolores.

Al t e r a q ó e sn a Vis c o s id a d e

Assim como alguns microrganismos sao capazes de hidrolisar polissacarídios, existem aqueles que realizam o processo inverso, isto é, polimerizam dissacarídios sintetizando os polissacarídios. Leuconostoc mesenteroides, B. subtilis e E. cotí, por exemplo, utilizam sacarose e maltose para a produgáo de amiloses e dextranas. Essas substáncias alteram o alimento, produzindo limo superficial

em alimentos sólidos on alterando a viscosidade dos alimentos líquidos. No leite, por exemplo, o crescimento de Enterobacter aerogenes e Alcaligenes causa o aumento da viscosidade. L. mesen- teroidesy B. subtilis e E. cotí alterara a viscosidade do leite e de sucos concentrados. Cepas de Lactobacillus plantarum, por exemplo, afetam principalmente bebidas — cerveja — e produtos de origem vegetal, como chucrute e outros. A sPseudomonas provocam o aparecimento de limosidade superficial em carnes frescas refrigeradas.

Al t e r a q ó e s NA COLORACÁO

As alteragoes na colorado do alimento podem ser provocadas por diversos géneros bacterianos produtores de pigmentos. Esses pigmentos, quando hidrossolúveis, difundem-se pela água livre do alimento podendo ser visualizados nao apenas no local do crescimento bacteriano mas também em outros pontos. Os lipossolúveis, por sua vez, só seráo visíveis nos pontos onde houver crescimento bacteriano.

Entre as bactérias produtoras de pigmentos podem ser citadas as do género Serrada, pertencentes á familia Enterobacteriaceae, cujos pigmentos, insolúveis em água, variam do róseo ao vermelho. Pigmentos de cor amarela, laranja ou vermelha, também insolúveis em água, sao produzidos por Flavobacterium. Violaceína, substancia insolúvel em água de cor violeta, é produzida por Chromobac- terium. Os géneros Halococcus e Halobacterium, halófilos importantes na deteriorado de produtos cárneos e de pescados, desidratados e salgados, produzem pigmento denominado bactorubeína, de cor que varia do róseo ao vermelho.

As bactérias do género Pseudomonas sao importantes no que se refere á deteriorado de alimentos, produzindo pigmentos de diferente natureza e colorado* Entre eles tem-se os pigmentos fluorescentes de coloragao ámarelo-esverdeada quando sob luz ultravioleta em comprimento de onda inferior a 260 nm, e os nao-fluorescentes, de colorado verde (clororafina), laranja (fenazina) ou azul (piocianina). Todos esses pigmentos sao hidrossolúveis.

Al t e r a q ó e s Dev id asa o Cr e s c im e n t o d e Bo l o r e se Le v e d u r a s

Os bolores e leveduras apresentam características fisiológicas similares, conforme visto anterior­ mente.

Ao se comparar a velocidade de multiplicado de bactérias, bolores e leveduras constata-se que as primeiras apresentam o menor tempo de gerado. Por isso, sao os principáis agentes deteriorantes quando o alimento oferece condiqócs ideáis para sua multiplicado. Se, noentanto, existirem condi§oes seletivas, como pH ácido, atividade de água inferior a 0,94, temperatura entre 25-28°C e substrato rico em carboidratos, os microrganismos predominantes serao as leveduras.

As leveduras apresentam duas características distintas: podem ser deterioradoras ou promotoras do processo tecnológico. Um exemplo típico é o Saccftaromyces cerevisiae, utilizado na obtendo de vinhos e álcool etílico, mas, quando presente em sucos de frutas ou bebidas carbonatadas, pode ser agente deteriorante.

Os vegetáis sao o hábitat desses microrganismos, urna vez que sao ricos em carboidratos, substancias importantes para seu desenvolvimento.

A aqáo das leveduras sobre as proteínas e outras substancias nitrogenadas é pratícamente nula. Por outro lado alguns géneros, como Candida e Torulopsis, sao capazes de atuar sobre os lipídios.

A utilizado dos carboidratos pode ser em aerobiose ou anaerobiose, num processo respiratorio ou oxidativo.

Leveduras oxidativas, também eonhecidas como film yeasts, apresentam-se rugosas e brancas, crescendo na superficie de alimentos ácidos como pieles e sucos envasados em jarras de vidro, além de também aparecerem na superficie de domas ou tanques de fermentado. Essas leveduras, ao utilizarem ácidos orgánicos e álcoois, elevara o pH do produto. Podem ser citadas espécies dos géneros Pichia, Hansenula, Debaryomy.ces, Candida e Trichosporon, Com a elevado do pH pode ocorrer o

desenvolvimento de microrganismos pouco resistentes a áddos, como é o caso dos patógenos, entre eles de C. botulinum em pieles e outros alimentos ácidos.

Entre as leveduras, o Zigosaccharomyces bailii é urna das raais estudadas como agente de deteriorado. É urna levedura osmófila, crescendo em meios com até 70% de glicose, além de tolerar concentrares moderadas de etanol, 10% de NaCl e apresentar resistencia a alguns conservadores químicos, como benzoato e sorbato de sódio.

Os bolores, por serem em absoluta maioria microrganismos aerobios, apresentam apenas meta­ bolismo oxidativo, com CO2 e H2O como produtos fináis do metabolismo de carboidratos.

Estes microrganismos, ao contrário das leveduras, sáo ativos produtores de enzimas capazes de hidrolisar os polissacarídios — amido e pectina, por exemplo —, sendo algumas espécies do género Aspergillus importantes nesse tipo de deteriorado. Byssochlamys, bolor com a peculiaridade de se desenvolver em anaerobiose, causa deteriorado em vegetáis envasados, devido á sua atividade pectinolítica. Alguns bolores também sáo produtores de proteinases extracelulares, e espédes dos géneros Alternaría, Aspergillus, Penicillium, Mucor e Rkizopus apresentam atividade lipolítica.

Os bolores tomam o alimento inaceitável para o consumo quando seu cresdmento, representado pelo micelio, é visível. O micélio é urna massa de hifas que pode apresentar diferentes aspectos: seco e pulverulento, úmido, gelatinoso, compacto ou nao, com aparénda cotonosa; pode ser incolor ou colorido com tonalidades de vermelho, amarelo, castanho, verde cinza ou preto.

Outro grupo de bolor importante é o que provoca deteriorado em graos ou cereais armazenados. Sáo os “bolores de armazenamento”. Exemplo: Aspergillus glaucus, A. candidus, A . flavus e Penicillium spp. Algumas espédes produzem micotoxinas tomando importante o controle da prolife- rado desses microrganismos em alimentos.

Os bolores sáo responsáveis por grandes perdas ñas produ§óes de frutas, cereais e hortalisas, por serem agentes fitopatogénicos.

Aprésenla de micélio, de fragmentos de hifas e de esporos em alimentos industrializados é razáo para a rejeido do produto, urna vez que tal fato indica utilizado de matéria-prima de má qualidade ou falhas higiénicas durante o processamento.

Alguns bolores sáo psicrotróficos, provocando a deteriorado de alimentos refrigerados. Exem- plos: espécies de Penicillium, Cladosporium, Trichothecium e Aspergillus. Os alimentos salgados e parcialmente desidratados podem ser deteriorados por espécies halófilas de bolores, como é o caso da alterado denominada dun em bacalhau salgado, ocasionada por Sporendonema expizoun. Essa alterado é caracterizada principalmente por pequeños tufos ou pontos de cor preta ou castanho na superficie do alimento.

BIBLIOGRAFIA

1. Banwart GJ. Basic food microbiology. 2nd ed. New York, AVI, p. 431,1989.

2. Brock TD, Madigan MT, Martinko JM, Parker J. Biology of microorganisms. 7th ed. Englewood Giffs, Prentice-Hall International, Inc., 909p, 1994.

3. Eskin NA, Henderson HM, Townsend RJ. Biochemistry of foods. Academic Press, p.153-217,1971.

4. Holt JG, BrunsMA, Caldwell BJ,Pease CD. Steadman’s Bergey’s bacteria words. Williams & Wilkins, Baltimore, 1992. 5. Jay MJ. Modem food microbiology. 4th ed. AVI New York, 701p., 1992.

6. Leitao MFF. Microbiología de alimentos. In: Roitmam Travassos LR, Azevedo JL. Tratado de Microbiología. Manóle Sáo Paulo, p.3-81,1988.

Deterioragao Microbiana