• Nenhum resultado encontrado

III. CAPÍTULO UMA NOVA PRÁTICA COMUNICACIONAL NA IGREJA

3.4 Provocações e propostas para a Igreja Católica na América Latina

A sociedade latino-americana tem sofrido múltiplas e sucessivas transformações. Na sociedade do passado, num mundo mais homogêneo e monocultural, a fé cristã se apresentava como sentido último e dava respostas seguras às diferentes leituras existentes. A unidade cultural dominante oferecia à Igreja uma linguagem compreendida e vivida por todos. Hoje, o pluralismo cultural e religioso significa a coexistência e legitimidade de diferentes interpretações da realidade, e a fé cristã tornou-se apenas uma concepção acerca da vida humana ao lado de outras tantas.

Nesse cenário, qual perspectiva eclesiológica aos poucos se sedimenta a partir da pós-modernidade? Diante de uma intensa mudança no cenário religioso, segundo Bazán, a

Igreja Católica na América Latina e no Caribe se depara com dois processos contraditórios: de um lado, ganha força o caráter privado da crença e das práticas religiosas, de outro, assiste-se ao processo do “politeísmo pós-cristão,”497 em que a busca de sentido dirige-se para as

práticas esotéricas. Como afirma Martín Velasco, há uma “metamorfose do sagrado”498 e

também, é claro, da fé cristã, que inclui a queda da prática regular das religiões tradicionais, a adoção de práticas oriundas de outras tradições espirituais, o surgimento e o avanço de novos movimentos religiosos e, ao mesmo tempo, da indiferença religiosa.499 Na escala social de valores, o fator religioso desloca-se para o segundo plano, com o aprofundamento da

494 Cf. DAp. 187. 495 Cf. Ibidem. 243-245. 496 Cf. Ibidem. 209-215.

497 MAZA BAZÁN, Pedro. Para entender la postmodernidad. Op. cit. p. 156.

498 MARTÍN VELASCO, Juan Dias. Metamorfosis de lo sagrado y futuro del cristianismo. Op. cit. p. 130. 499 Cf. Ibidem. p. 132.

secularização. Nesse contexto, a Igreja, como instituição, passa por um processo de esvaziamento, e muitos de seus adeptos adotam a opção do crer sem pertencer à instituição religiosa. O afastamento da Igreja não se dá mais na forma de oposição ou abandono público, mas na forma discreta e tranquila do desinteresse: “hoje o desafio não é a heresia, mas a indiferença.”500 Nesse deslocamento da experiência religiosa para o indivíduo, sem as

mediações das instituições, dentro da valorização da subjetividade, ocorre a chamada „deseclesialização‟ e secularização501 no Ocidente, obrigando as Igrejas a renunciarem a

qualquer pretensão de impor à sociedade seus princípios e normas502.

Um dos grandes teólogos atuais Jean-Marie Roger Tillard se perguntava no final do século passado: Somos os últimos cristãos?503 Diante da pós-modernidade, geradora de

situações tão complexas, inseguras e movediças, é plenamente justificável perguntar pelas implicações que tudo isso traz à evangelização, bem como ao futuro do cristianismo nos países ocidentais.504A resposta não é tão simples! Na verdade, não é apenas constatar que a sociedade em seu conjunto tenha deixado de conduzir-se segundo as normas religiosas, ou que há um questionamento sobre a intervenção da Igreja na vida profana dos leigos, ou a exclusão das mulheres do poder religioso. Segundo Castiñeira, é tudo isso, acompanhado de

500 BORAN. Jorge. Os desafios pastorais de uma nova era. São Paulo: Paulinas, 2000, pp. 79-80.

501 Segundo Martín Velasco, “la secularización resulta una categoría muy apropiada para referirse a uno de los

aspectos más importantes del cambio religioso: el que atañe a la vigencia y relevancia del factor religioso en la sociedad y en la cultura y que puede resumirse de la siguiente manera:

1. La pérdida de vigencia cultural del factor religioso: (...) las creencias y valores religiosos ocupaban la cima de la escala de valores comúnmente aceptados, ahora la religión, y la palabra «Dios» resulta, para muchos, como un resto fósil que perdura por inercia en el lenguaje. (...)

2. El estrechamiento social del espacio religioso, que ha llevado a una situación en la que la religión queda reducida a la esfera del culto y a las agrupaciones religiosas específicas.

3. El paso de una situación en la que el factor religioso ejercía el monopolio del sentido y el valor para la vida, a otra en la que coexiste junto a otros valores y se reduce a opción personal y al ámbito de la conciencia.

4. Y, como resultado más palpable, la pérdida de influjo de la religión en los terrenos político, social y, últimamente, en el de la vida cotidiana”. In: MARTÍN VELASCO, Juan Dias. Metamorfosis de lo sagrado y

futuro del cristianismo. Op. cit. pp. 128-129.

502 Cf. Idem.

503 Cf.TILLARD, Jean-Marie Roger. Somos os últimos cristãos? São Paulo: Loyola. 1999.

504 Para Martín Velasco, “nada justifica las visiones catastrofistas del futuro del cristianismo. La situación actual

no es ni nueva ni peor que otras anteriores. Y no faltan datos que permiten vislumbrar señales esperanzadoras de un futuro mejor. Pero, mejor o peor, esta situación es la nuestra y es en ella donde habrá que descubrir los signos de la presencia de Dios en nuestra historia”. In: MARTÍN VELASCO, Juan Dias. Metamorfosis de lo sagrado

uma série de fatos que estão na mesma direção, tais como: “o fim dos praticantes, a descatolização, a crise de observâncias obrigatórias, a perda da influência sobre a sociedade, a ruptura da homogeneidade, a desvalorização dos bens simbólicos.”505

Diante dessa realidade, qual projeto eclesial aos poucos deverá se configurar? É oportuno aceitar uma conclusão pessimista acerca do cristianismo, e da fé católica, numa época denominada „pós-cristã‟?506 Para Castiñeira, no meio da banalização e do pluralismo

religioso fragmentado, a postura não é de pessimismo, mas de realismo.507 Segundo François Houtart, o cristianismo e todas as religiões são pressionadas a passar do pensamento simbólico, que identifica a realidade com o símbolo, a um pensamento analítico, que dá um caráter imanentista à origem dos fenômenos físicos e sociais.508 Essa passagem é difícil e

implica um processo de perda da credibilidade das expressões e crenças religiosas. No entanto, um desafio fundamental para as Igrejas é o de adotarem o pensamento analítico509 sem que ocorra o „desencantamento do mundo‟, com a imposição da racionalidade instrumental, estimulada pela cultura capitalista.510 Seguindo essa mesma linha de pensamento, a Igreja deve deixar de lado todo conservadorismo religioso ou fanatismo ou ainda intolerância que, por vezes legitima a ordem estabelecida e abençoa o poder, para desempenhar “um papel claramente progressista e libertador que favoreça a re-legitimação do que se poderia chamar a cultura da religião”.511 Para Castiñeira, há de se encontrar um estilo

capaz de adaptar-se a uma cultura pós-cristã e assumir a vocação de ser estimulador de

505 CASTIÑEIRA, Ángel. A experiência de Deus na pós-modernidade. Op. cit. pp.163-164. 506 Cf. Ibidem. p. 162.

507 Cf. Ibidem. p.170.

508 DIAS-SALAZAR, Rafael. Cambios religiosos y transformaciones sociaes em um mundo globalizado.

Entrevista com François Houart. Disponível em: < http://www.iglesiaviva.org/209/n209-2.htm.> Acesso em: 25 agosto 2011, 11:33:10.

509 “O pensamento analítico é uma forma de pensamento com objetivo de explicar as coisas através da

decomposição em partes mais simples, que são mais facilmente explicadas ou solucionadas, e uma vez entendidas tornam possível o entendimento do todo. O comportamento do todo é assim explicado pelo comportamento das partes. Estas partes, em geral, podem ser relatadas a outra pessoa por aquele que pensa.” In: Cf. WIKIPEDIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Pensamento_analit%C3%ADtico>. Acesso em: 25 ag. 2011, 09:13:40.

510 DIAS-SALAZAR, Rafael. Cambios religiosos y transformaciones sociaes em um mundo globalizado.

Entrevista com François Houart. Op. cit. Acesso em: 25 agosto 2011, 11:33:10.

esperança entre os homens.512 É claro que há um cuidado de que a experiência religiosa não se torne uma aspirina para os pós-modernos deprimidos ou uma terapia social que sirva de refúgio às desordens ou insatisfações sociais, permitindo evadir-se dos problemas reais e mundanos. Segundo Castiñeira, o risco que se corre é qualificar o Deus da pós-modernidade como “Deus-oásis do que como Deus dos pobres ou Deus-plenitude-dos-homens.”513 Mas

numa sociedade carente de ideais coletivos, a motivação religiosa pode contribuir para atitudes de solidariedade com o mundo, a humanidade e a história.514 Segundo Azevedo, as religiões que tiverem a “capacidade de orientar a vida social como um todo, hoje são apenas uma das possíveis fontes de sentido para o mundo e a pessoa”.515

Diante de um mundo dominado pelo individualismo, a tentação é fazer uma Igreja virtual, onde o exercício da comunhão fique mais simbólico do que real. Porém, se faz parte da “essência da Igreja a experiência da comunionalidade,”516 a reserva comunitária do

cristianismo517 abre perspectivas prometedoras. O que agrega, vivifica, transcende e abre-se para um novo quadro interpretativo da realidade é o evento Jesus Cristo – suas ações, suas palavras, sua morte e ressurreição. Segundo o texto de Aparecida, há quatro eixos que devem estabelecer uma nova configuração eclesial, são eles: a experiência religiosa, a vivência comunitária, a formação bíblico-doutrinal e o compromisso missionário de toda a

512 Cf. Ibidem. 513 Ibidem. p. 167.

514 Castiñeira questiona o que pode hoje oferecer o cristianismo ao homem pós-moderno? O cristianismo “pode

fazer convergir o homem vivente com o Deus vivente, sem anular um nem outro. (...) Por isso, o cristianismo deve renunciar a explicar tudo, mas sem ter que calar. Deve ser um cristianismo que ouse recordar a origem, assinalar a promessa não possuída, denunciar a constante criação dos novos ídolos, as atitudes desesperançosas, sem que por isso tenha de deixar de reconhecer as próprias inseguranças. O cristianismo se torna eloqüente quando manifesta a presença e a ação de Deus, quando é capaz de narrar e demonstrar o amor de Deus.” Ibidem. p. 174.

515 AZEVEDO, Dermi. Desafios estratégicos da Igreja Católica. In: Lua Nova, no. 60. São Paulo: CEDEC,

Centro de Estudos de Cultura Contemporânea, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ln/n60/a04n60. pdf>. Acesso em: 26 agosto 2011, 13:01:10.

516 CIPOLINI, Pedro Celso. Igreja e seu rosto histórico. In: Unidade Cristã no Brasil. REB. Op. Cit. p. 846. 517 “O cristianismo possui enorme dinamismo comunitário que vem desde sua origem judaica, passando pelas

experiências da comunidade primitiva, pelas inúmeras outras experiências ao longo dos séculos.” LIBÂNIO, João Batista. Prospectivas teológicas e pastorais do cristianismo. In: LOPES SANCHES, Wagner.(coord.)

Cristianismo na América Latina e no Caribe, trajetórias, Diagnósticos, prospectivas. São Paulo: Paulinas.

comunidade.518 O documento reconhece em alguns católicos a fraqueza da fé plasmada num contexto de cristandade frente à atual sociedade: normas e proibições, práticas devocionais, adesões parciais às verdades da fé, participação sacramental apenas ocasional, doutrinas sem compromissos, moralismos.519 A motivação principal dessa nova configuração eclesial é a própria realidade missionária da Igreja. Segundo o documento de Aparecida “a firme decisão missionária deve impregnar todas as estruturas eclesiais e todos os planos pastorais da Igreja.”520 E, como “todas as autênticas transformações se forjam no coração das pessoas,”521

ela exige primeiramente uma conversão pastoral “que implica escutar com atenção e discernir o que o Espírito está dizendo às Igrejas (Ap 2,29) através dos sinais dos tempos em que Deus se manifesta.”522 À medida que cresce a consciência dos cristãos leigos, aumenta a

corresponsabilidade, a colegialidade e a subsidiariedade eclesial, que se traduz como comunhão e participação.523 Todos são irmãos em Cristo, todos constituem a comunidade, todos são responsáveis, todos são ativos na propagação do Reino, todos devem participar , a seu modo, das orientações e das decisões da Igreja. É claro que a recepção dessa eclesiologia “exige não só mudanças na mentalidade de muitas autoridades, como transformações institucionais”.524

Ao identificar na pós-modernidade o deslocamento da experiência religiosa para o indivíduo, sem a mediação das instituições, dentro de uma lógica de valorização da subjetividade, qual ser humano a Igreja precisa estar atenta em formar?

O homem atual vive em sociedades complexas, nas quais estão presentes e vivas várias culturas. Há pessoas que vivem mais na modernidade, outras que ainda vivem mais na pré-modernidade e outras que estão já mais marcadas pela pós-modernidade. Em todas elas

518 Cf. DAp. 226. 519 Cf. Ibidem. 12. 520 Ibidem. 365. 521 Ibidem. 538. 522 Ibidem. 366.

523 Cf. CIPOLINI, Pedro Celso. Igreja e seu rosto histórico. In: Unidade Cristã no Brasil. REB. Op. cit. p. 849. 524 FRANÇA MIRANDA, Mário. O desafio de Aparecida: uma configuração eclesial para a América Latina. In:

há, no entanto, valores, condutas e buscas típicas das três culturas; nelas estão presentes, ao mesmo tempo, o pluralismo e o individualismo, a experiência das mudanças rápidas, a busca de um sentido orientador para a vida. Há muitas pessoas que não conseguem viver sem as tecnologias de informação e de comunicação. Bento XVI olhando com otimismo tudo isso vai afirmar que

as novas tecnologias estão a mudar não só o modo de comunicar, mas a própria comunicação em si mesma, podendo-se afirmar que estamos perante uma ampla transformação cultural. Com este modo de difundir informações e conhecimentos, está a nascer uma nova maneira de aprender e pensar, com oportunidades inéditas de estabelecer relações e de construir comunhão.525

Perante essa ampla transformação cultural, as possibilidades tecnológicas ensaiam relações superficiais e perigosas sem aparente risco, bem como estimulam com os recursos de som, imagens e ilusão de proximidade através de experiências sem limites. Na base dessa cultural digital está o homem ciberespacial, o homem da cidade, vocacionado para a liberdade e desafiado a lutar pela sobrevivência. Essa Tecnologia da Informação torna-se imprescindível no mundo do trabalho, entre os profissionais liberais, os operários de grandes e pequenas empresas. O caminho virtual se mostra promissor no campo intelectual, profissional e econômico. Sem apontar os problemas e dificuldades para quem entra na cultura digital, e ao reconhecer que a Igreja está em processo de transformação, quais seriam

os paradigmas para esse homem digital? Sabe-se que o futuro do cristianismo aposta no movimento oposto a todo individualismo. O excesso da centralidade do eu afeta a fé, tornando-a mais individual, menos comunitária e menos comprometida. A utilidade e

525 BENTO XVI. Verdade, anúncio e autenticidade de vida, na era digital. Mensagem para o 45º Dia Mundial

das Comunicações Sociais. 05 de Junho 2011. Disponível em < http://www.vatican.va/holy_father/ benedict_ xvi /messages/communications/documents/hf_ben-xvi_mes_20110124_45th-world-communications-day_po. html>. Acesso em: 29 agosto 2011. 15:16:40.

rentabilidade 526 passam a ser dois valores que definem esse homem pós-moderno. Porém, a mesma tecnologia que o fecha em si permite que ele se abra para relações solidárias. Segundo Libânio, cabe uma globalização da solidariedade, alimentada pelos caminhos virtuais, podendo-se “injetar o soro do altruísmo em corpos fadados à morte por egocentrismo.”527

No final do século XX, o dominicano francês Yves Congar assinala que a capa protetora com que o catolicismo „pós-tridentino‟ havia protegido os fiéis está sendo arrancada pela secularização e pelas mudanças sociais, e acrescenta que o catolicismo atual ou se assenta sobre o centro da vida cristã – a experiência e a vida interior – ou perderá toda a possibilidade de sobreviver.528 Impõe-se a necessidade de renovar a espiritualidade cristã, cujo ponto de apoio deve situar-se na experiência que se faz de Deus na oração e na contemplação. Isso supõe que se tenha descoberto o verdadeiro rosto de Deus, esse rosto que Jesus veio revelar, ele que é a forma humana de Deus: um Deus libertador, e, por isso mesmo, humanizador. Nessa mesma linha de pensamento, Velasco argumenta ser conveniente levar em conta que, para explicar a fé, a composição religiosa expressa um forte predomínio da experiência intimista sobre a razão. É fácil entender que, se o pós-modernismo rejeita a possibilidade de uma verdade e uma compreensão completa da realidade na sua totalidade, então a ênfase será sobre a experiência religiosa. Experiência, aqui entendida como a totalidade daquilo que ocorre com o homem na vida, através de sua consciência. Segundo Jean Pierre Jossua, “não são as impressões fugazes que importam, mas o alongamento permanente da consciência. A experiência, de acordo com isso, abarca a totalidade daquilo que a razão adquire no exercício da sua profissão”.529 A pós-modernidade convida à

humildade de pensamento, a evitar sistemas fechados e rígidos. Para transmitir essa

526 Cf. COMBLIN, José. Vocação para a liberdade. São Paulo: Paulus, 1998, p.144. 527 LIBÂNIO. João Batista. Caminhos de existência. São Paulo: Paulus, 2009, p. 172.

528 CONGAR, Yves apud MARTÍN VELASCO, Metamorfosis de lo sagrado y futuro del cristianismo. Op.

cit. p. 146.

529 Segundo Jean Pierre Jossua. In: MOLTMANN, Jürgen. O Espírito de Vida. Uma pneumatologia integral.

experiência não cabe utilizar os recursos ou argumentos dogmáticos ou morais ou até mesmo uma linguagem fria, antiquada e complexa, mas dar testemunho de uma maneira simples e direta, através da narrativa da experiência, de forma a recuperar a paixão, a personalização, a novidade e a segurança daquilo que se anuncia. Se para o homem pós-moderno não cabe a linguagem conceitual para falar de Deus, recupera-se a linguagem narrativa, mais perto dos Evangelhos e, em geral, da Bíblia.

Qual a compreensão da Igreja da América Latina e do Caribe acerca dos meios de comunicação? Para os anos que se sucederam ao Concílio, a reflexão acerca dos meios de comunicação tornou-se muito mais clara e definida, principalmente na influência e reprodução que os mesmos exerceram e exercem sobre as mais variadas culturas e suas articulações repletas de significados. A Igreja, aos poucos, deixou de focar apenas sobre os instrumentos – como fez no século passado – para adotar nas conferencias do CELAM – depois de Puebla uma postura de avaliação crítica. Havia uma tentativa positiva de superar o „deslumbramento ingênuo‟ de acreditar que a tecnologia poderia resolver os problemas da ação evangelizadora, para uma saída que repensasse a comunicação a partir de novos paradigmas. Num olhar atento ao contexto latino americano e caribenho se descobre que em meio a essa realidade de mudança cultural, emergem novos sujeitos, com novos estilos de vida, maneiras de pensar, sentir, perceber e com novas formas de se relacionar. São produtores e atores da nova cultura.530 Se há uma mudança dos destinatários, os meios de comunicação também acompanham as transformações políticas, econômicas, sociais e culturais com sérias implicações éticas, tais como: o controle e a manipulação ideológica que poderes políticos e econômicos exercem com os meios de comunicação, bem como a violação dos direitos individuais, através da exploração dos sentimentos, paixões, violência e sexo;531 o

530 Cf. DAp. 51. 531 Cf. CP. 1069.

monopólio da informação tanto por parte do governo como de interesses privados;532 o sistema publicitário e o uso do esporte como elemento de evasão e alienação da realidade;533 os meios de comunicação como veículo de propaganda do materialismo reinante, pragmático e consumista;534a busca por impor uma „autêntica cultura‟ baseada no estético, na felicidade, na percepção da realidade e na utilização de uma nova linguagem; 535a imposição de culturas artificiais com um acentuado exagero ao direitos individuais e subjetivos, pragmáticos e imediatistas, sem preocupação com os critérios éticos.536 O documento de Aparecida incentiva discípulos e missionários de Jesus Cristo, que com a presença ética coerente, possam semear os valores evangélicos nos novos areópagos.537

Puebla identifica evangelização com comunicação;538 dessa forma, a comunicação

social não pode mais ser considerada como um campo isolado de atividade, especialmente reservada para certos especialistas. A Igreja, nestes últimos tempos, tem buscado, pelos seus documentos, fazer compreender que a comunicação deve permear e integrar toda a sua ação evangelizadora. Nessa mesma linha de pensamento, o documento de Aparecida afirma que o primeiro anúncio, a catequese e o aprofundamento da fé não podem prescindir dos meios de comunicação539. Na verdade, os documentos do CELAM querem chamar a atenção para os seguintes aspectos:

 Se há uma insistência quanto ao diálogo, a participação e „não exclusão‟, os meios de comunicação devem favorecer, através das paróquias, comunidades, centros culturais e instituições educacionais católicas a criação de pontos de rede e salas digitais para promover a inclusão digital;540

532 Cf. Ibidem. 1071. 533 Cf. Ibidem. 1072. 534 Cf. Ibidem. 1073. 535 Cf. DAp. 45. 536 Cf. Ibidem. 46-47. 537 Cf. Ibidem. 491. 538 Cf. DP. 1063. 539 Cf. DAp. 485. 540 Cf. Ibidem. 490.

 Se há uma preocupação com os formadores de opinião pública, a evangelização e a formação de pensadores e pessoas devem acontecer com esforço e criatividade, atingindo os políticos, empresários, dirigentes comunitários, sindicais e de cooperativas;541

 Se há uma predileção para com os mais pobres, os meios de comunicação não podem abandonar essa opção preferencial542, pelo contrário, devem servir de voz para os que não têm voz, incentivando-os a lutar pela sua dignidade e cidadania;

 Se a comunicação deve ser feita para construir uma nova sociedade, todo o processo comunicacional deve contribuir para aquilo que os bispos chamam, em Aparecida, de