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Em face dos objetivos da Política Nacional das Relações de Consumo e dos direitos básicos do consumidor expressos nos incisos I a IV do art. 6º do CDC, a publicidade enganosa foi expressamente proibida pelo Direito do Consumidor pátrio:

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

77 LÔBO, A informação como..., in Estudos de direito do consumidor, p. 39. 78 BENJAMIM et al. in: Código brasileiro de defesa do..., p. 278-280.

§1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

[...]

§3° Para os efeitos deste código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de a sobre dado essencial do produto ou serviço.

Observa-se que a Comunidade Européia possui Diretiva específica em matéria de publicidade enganosa, a 450, datada de 10 de setembro de 198479, cujo texto define a figura

em apreço e estabelece critérios por meio dos quais ela pode ser identificada: Artigo 1o

A presente directiva tem por objectivo proteger os consumidores e as pessoas que exercem uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, bem como os interesses do público em geral, contra a publicidade enganosa e as suas consequências desleais.

Artigo 2o

Na acepção da presente directiva, entende-se por:

1. Publicidade: qualquer forma de comunicação feita no âmbito duma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal tendo por fim promover o fornecimento de bens ou de serviços, incluindo os bens imóveis, os direitos e as obrigações;

2. Publicidade enganosa: a publicidade que, por qualquer forma, incluindo a sua apresentação, induz em erro ou é susceptível de induzir em erro as pessoas a quem se dirige ou que afecta e cujo comportamento económico pode afectar, em virtude do seu carácter enganador ou que, por estas razões, prejudica ou pode prejudicar um concorrente;

3. Pessoa: qualquer pessoa singular ou colectiva. Artigo 3o

Para determinar se uma publicidade é enganosa, devem ter-se em conta todos os seus elementos e, nomeadamente, todas as indicações que digam respeito:

a) às características dos bens ou serviços, tais como a sua disponibilidade, natureza, execução, composição, o modo e a data de fabrico ou de prestação, o carácter adequado, as utilizações, a quantidade, as especificações, a origem geográfica ou comercial ou os resultados que podem ser esperados da sua utilização, ou os resultados e as características essenciais dos testes ou controlos efectuados sobre os bens ou serviços;

b) ao preço ou ao seu modo de estabelecimento, e às condições de fornecimento dos bens ou da prestação dos serviços;

c) à natureza, às qualidades e aos direitos do anunciador, tais como a sua identidade e o seu património, as suas qualificações e os seus direitos de propriedade industrial, comercial ou intelectual, ou os prémios que recebeu ou as suas distinções.

Cabe notar que a publicidade enganosa nem sempre possui conteúdo falso em seus anúncios, conforme a doutrina. O que determina o seu caráter é a capacidade de ludibriar o consumidor. Nesses termos,

79 http://eur-lex.europa.eu/smartapi/cgi/sga_doc?smartapi!celexplus!prod!DocNumber&lg=pt&type_doc=

[...] uma publicidade pode, por exemplo, ser completamente correta e ainda assim ser enganosa, seja porque informação importante foi deixada de fora, seja porque o seu esquema é tal que vem a fazer com que o consumidor entenda mal aquilo que se está, realmente, dizendo. É, em síntese, o conceito de enganosidade, e não de falsidade, que é essencial aqui80.

Para o direito civil, o elemento subjetivo que move o agente que realiza a publicidade enganosa é irrelevante, sendo essencial para caracterizá-la o seu aspecto objetivo, externado numa alegação dotada de aptidão para enganar.81

Ainda conforme a doutrina civil, a capacidade para enganar é aferida por meio de um juízo abstrato, e não conforme o caso concreto. Explica-se, com base nessa lógica, que se afigura desnecessária a ocorrência efetiva de engano do consumidor, bastando a sua potencialidade.82

Para Cláudia Lima Marques83, o parâmetro para se identificar se a publicidade é

ou não enganosa deveria ser o observador menos atento, pois representaria a parcela mais vulnerável, e por isso não negligenciável, dos consumidores.

Pode a publicidade enganosa ser comissiva ou omissiva. Nos termos da lei, a segunda hipótese é mais restrita do que a primeira. Para que haja a omissão ilícita, deve o anunciante deixar de informar o elemento do produto ou do serviço que seja um dado essencial. Rizzato Nunes ilustra a enganosidade por omissão a partir de um anúncio de apartamento novo, em região nobre, com preço abaixo do que é normalmente praticado, sem a advertência de que inexistem vagas de garage. Para o autor, o pressuposto é o de que os imóveis novos bem localizados tenham garage inclusas.84 Ao contrário, a

publicidade enganosa comissiva pode até travestir dado de pouco relevo do bem anunciado.85

Registre-se que para a análise do caráter enganoso da publicidade deve-se ter em vista não só a literalidade do anúncio, mas também todo o contexto da publicação, em especial as imagens que a ilustram. É que a verdade literal de qualquer modo expressa no

80 BENITEZ, Ulf; DRAPER, John. Consumer protection in swedan: legislation, institutions and practice.

Stockholm: The Institute for Intellectual Property and Maket Law at the Stockholm University. 1981, 1981, p. 123, apud BENJAMIM et al. in: Código brasileiro de defesa do..., p. 2.

81 BAUERMANN, Estudo comparativo da publicidade..., in: Revista Portuguesa de..., p. 24. 82 NUNES, Curso de Direito do..., p. 469.

83 MARQUES, Contratos no código de..., p. 140. 84 NUNES, Curso de direito do..., p. 479.

85 Para Antônio Herman V. Benjamim, é justificável a restrição na modalidade omissiva, tendo em vista que

soaria exagero exigir que, numa fração de segundos de anúncio televisivo, por exemplo, fosse o anunciante obrigado a esclarecer sobre todas as características e riscos do produto ou do serviço, até mesmo os de pouca relevância para a aquisição ou a contratação (BENJAMIM et al. in: Código brasileiro de defesa do..., et al. In: Código brasileiro de defesa do..., p. 297).

anúncio pode servir para ludibriar se aplicada num contexto incompatível com a afirmação.86

Para a doutrina civil, não se exige que a maioria dos consumidores possa ser ludibriada pela publicidade enganosa; é possível que esta ocorra visando particularmente um grupo de pessoas mais vulnerável. Assim, no exemplo fornecido por Antônio Herman V. Benjamim os consumidores de uma região recentemente afetada por um incêndio tornam- se mais suscetíveis à exploração publicitária de produtos de combate ao fogo. Nesse raciocínio, explica o referido autor, utiliza-se um critério de dupla valoração: num primeiro momento, observa-se objetivamente o conteúdo do anúncio, mas, após, verifica- se a vulnerabilidade do público-alvo da publicidade. Tratando-se de pessoas mais vulneráveis ao engodo, a potencialidade para enganar será maior, de sorte que poderá se caracterizar a infração ainda que, para algumas pessoas o anúncio não ostente aptidão para enganar.87