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Quadro legal nacional de acesso dos alunos imigrantes à educação 3 Imigração e educação – a reconstrução das políticas

PARTE II – DIVERSIDADE E INTEGRAÇÃO: UMA ANÁLISE DAS POLÍTICAS DE ACOLHIMENTO

1. Políticas de integração na Europa – abordagens teóricas 2 O acesso dos filhos dos imigrantes à educação

2.3. Quadro legal nacional de acesso dos alunos imigrantes à educação 3 Imigração e educação – a reconstrução das políticas

As culturas podem passar a coexistir sem diferenciação de estatuto e assim dialogar em pé de igualdade abrindo-se ao enriquecimento recíproco. (Roberto Carneiro, Fundamentos da Educação e da Aprendizagem, 2001, p. 267)

O reconhecimento da diversidade cultural europeia e da necessidade de promover a sua integração tem sustentado um conjunto de reflexões em torno dos modelos de incorporação e das orientações políticas comunitárias. O percurso que a história recente da Europa iniciou, em finais dos anos 80, suscitou novas questões e a relevância de definir novos caminhos na política multicultural europeia, ou melhor, na abordagem e tratamento da diversidade no espaço europeu. À diversidade cultural que já caracterizava a história da Europa, junta-se agora uma mobilidade entre o leste e o ocidente europeus que até à data não tinha sido vivida. A par desta, surge também a abertura à imigração de um conjunto de países europeus, nomeadamente do Sul, que até então se tinham mantido, fundamentalmente, no papel de emissores de população. Para Castles e Miller (2003), Foner e Lucassen (2012), estudar a imigração na actualidade implica mobilizar as experiências do velho continente em matéria de imigração. Nesta perspectiva, os autores referem-se à multiculturalidade na Europa como fazendo parte da sua história, razão pela qual os conceitos, tal como os métodos para estudar este fenómeno na actualidade têm necessariamente que ter uma relação com o passado. Os padrões de incorporação que caracterizam hoje as opções na integração de crianças e jovens imigrantes são o resultado de um passado de escravatura, segregação e movimentos pelos direitos civis (Foner & Lucassen, 2012). Muitos países da Europa que hoje acolhem população imigrante de origens diversas viveram no passado o papel de colonizadores e confrontaram-se, no pós-guerra, com movimentos migratórios com origem nessas colónias, na sequência dos processos de descolonização. O percurso recente da história europeia tornou claro, para muitas das antigas metrópoles, a importância da definição de políticas e estratégias de acolhimento de populações oriundas de outros países, mesmo que estas tivessem como ponto de partida uma antiga colónia. Assumir os recém-chegados como parte integrante da comunidade nacional, portanto cidadãos nacionais, colocou muitos Estados numa situação de alheamento face às necessidades efectivas de integração desta população (Foner & Lucassen, 2012). Porém, para os returnees na Holanda, os

repatriates na Alemanha, os retornados em Portugal ou os pieds noirs em França, a

integração numa sociedade que no seu modo de funcionamento, organização e atitudes perante o recém-chegado se afastava dos contextos de origem, implicava ultrapassar obstáculos nem sempre fáceis de transpor. A ideia de que estas populações transportavam consigo uma cultura de origem idêntica à da metrópole e, como tal, facilmente iriam fazer parte integrante da nova sociedade, rapidamente deixou de ser um apanágio. As dificuldades que entretanto se foram evidenciando no percurso desta geração e no das crianças que dela nasceram foram alertando os

políticos, governantes e também os investigadores para a urgência de pensar respostas no sentido da sua integração.

Aos imigrantes oriundos das ex colónias vieram juntar-se as populações que se deslocavam por motivos económicos e todas aquelas que, num processo de reunificação familiar, se moviam entre países da Europa ou chegavam de territórios exteriores a esta. A constatação de que a presença de imigrantes no Velho Continente era uma realidade que se consolidava e não apenas um momento particular da sua história e dos indivíduos envolvidos no processo, acentuou a necessidade de pensar a integração numa perspectiva que não se restringisse apenas ao mercado de trabalho, mas que englobasse outras dimensões da vida social.

A experiência no acolhimento de populações imigrantes vivida em França, na Alemanha, no Reino Unido e na Holanda denota, no final dos anos 80, a debilidade de algumas políticas de integração experimentadas por estes países. A recessão dos anos 70 veio acentuar e acelerar alguns dos problemas que já se faziam sentir entre as populações imigrantes, tornando evidente a situação de fragilidade social em que estas populações se encontravam e alertando para a necessidade de repensar as políticas de integração. O desemprego, a criminalidade, a segregação residencial, e também as taxas de abandono e reprovação escolar entre os jovens são sinais que surgem, na perspectiva de Wacquant, de forma mais acentuada nos centros das cidades e em algumas áreas dos subúrbios das grandes metrópoles, de que são exemplo Paris e Londres (Foner & Lucassen, 2012).

Diversos autores (Castles, 1995; Hollifield, 1997; Favell, 1998; Entzinger, 2005; Penninx, 2008; Crul & Schneider, 2012; Alba, Reitz & Simon, 2012; Foner & Lucassen, 2012) que se têm debruçado sobre a análise dos modelos de integração adoptados pelos diversos países europeus revelam existirem diferenças nas experiências migratórias vividas, assim como nas atitudes perante a imigração. Tomando como exemplo, numa breve abordagem, os critérios adoptados na atribuição da cidadania a populações oriundas da imigração por dois países, com longos percursos no acolhimento de imigrantes, França e Alemanha, é perceptível a diferença de concepções e políticas dos Estados perante o fenómeno. Em França, um Estado laico e republicano que defende os ideais de igualdade, uma criança descendente de imigrantes que tenha nascido em território nacional é considerada como estrangeira até aos 18 anos. Na Alemanha, é a nacionalidade dos pais que determina a dos filhos, e desde 2000, momento em que se tornou possível a obtenção da cidadania alemã por parte dos trabalhadores migrantes, que este título assume um carácter provisório até à idade de 23 anos, para as crianças nascidas em território nacional.

Se atendermos às atitudes relativas ao acesso à cidadania e identidade nacional, nos países com tradição no acolhimento de imigrantes, a literatura identifica três modelos de integração ou gestão da diversidade cultural: o modelo anglo- saxónico ou multicultural, o modelo francês assimilacionista e o modelo alemão, de jus

sanguinis. Estes modelos, defendidos pelos países que os adoptam, são estruturantes

interferindo na definição das políticas de integração desenvolvidas por cada um dos Estados. Em França, a ideia de uma ameaça ao equilíbrio étnico e cultural, em particular por parte da imigração muçulmana, conduz o governo a importantes medidas restritivas quer à entrada, quer à aquisição da nacionalidade. As noções de tolerância cultural e religiosa, assim como as relações inter-raciais são muito questionadas e a sua aceitação é posta em causa perante a possibilidade de se tornarem hostis à cultura e ao Estado. Por seu turno, no Reino Unido, a ênfase colocada nas relações interétnicas, minorias étnicas e tolerância cultural, num sistema mais liberal, é determinante na definição da política de integração.

Perante os dois modelos apresentados, não é unânime a opinião sobre o sucesso de cada um e, em particular, os próprios países são muito críticos face às políticas implementadas pelos territórios vizinhos. Recorrendo ao exemplo dos modelos britânico e francês, Favell (2008) refere-se ao olhar crítico que a França lança ao modelo multicultural britânico de integração, considerando que este contribui para a manutenção das desigualdades e das situações de racismo, dificultando também a construção de uma identidade nacional e não impondo obrigações aos recém- chegados. Por sua vez, o Reino Unido critica a excessiva carga assimilacionista do modelo francês, classificando-o de intolerante e propiciador de situações de exclusão.