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Neste capítulo foi apresentada uma investigação do que artigos de revisão de literatura anteriores à data de escrita desta dissertação trouxeram sobre a temática da inserção de tópicos de FMC/MQ em diferentes níveis de ensino. Tentamos identificar, através desses artigos, panoramas das pesquisas em diferentes momentos e dessa forma um certo estado da arte das publicações nessa linha de pesquisa. Identificamos as formas de categorização empregadas em cada uma das revisões, conforme quadro 1. Após tal identificação, traçamos categorias comuns empregadas nessas revisões. Quatro categorias foram destacadas e, na sequência, discutimos a evolução histórica por qual cada uma dessas categorias passou, sob a lente das revisões anteriores.

Em um segundo momento, propusemos uma nova revisão. Justificamos o delineamento de nossa revisão que se limitou a artigos publicados em periódicos nacionais nos anos de 2017 e 2018. Usamos as quatro categorias que emergiram de nosso olhar para as revisões anteriores para classificar os trabalhos que foram selecionados em nossa busca. Apresentamos brevemente os 16 trabalhos selecionados, de um total de 61 que retornaram na busca. Identificamos um trabalho na categoria de concepções de estudantes; nove na categoria de propostas de intervenções didáticas (na qual, 6 são explicitamente direcionados para o EM e os outros três foram considerados adequados a esse nível de ensino); quatro implementações avaliadas em sala de aula de EM; e dois que avaliam materiais didáticos, mais especificamente os livros didáticos aprovados no plano nacional de livro didático (EM) de 2015.

Por fim, iniciamos uma problematização com respeito à forma como categorizamos os trabalhos. Questionamos o uso de categorias a priori que emergiram das revisões anteriores. Essa forma de categorizar pode ter se mostrado pertinente em cada contexto, mas destacamos que atualmente uma distinção que destoa diz respeito à natureza dos referenciais adotados nas

4 Apesar de estudos sobre argumentação terem seu foco no discurso, não os consideramos como integrantes da

40 pesquisas, categoria empregada por Pantoja, Moreira e Herscovitz (2011). Embora os autores não delineiem sua categorização nesse sentido, é perceptível a predominância da presença de referenciais cognitivas que inclusive, orientam os autores. Destacamos a preocupação dos trabalhos mais recentes, tanto os identificados nessa revisão, quanto aqueles discutidos em outros trabalhos que fizeram levantamentos de publicações (ROCHA; MOREIRA; HERSCOVITZ, 2018; NETTO; OSTERMANN; CAVALCANTI, 2018), com os discursos emergentes nas aulas de Física.

A mudança de foco das pesquisas, passando da preocupação com aspectos cognitivos para uma preocupação com o discurso caracteriza a chamada “virada linguistíca” ou “virada sociocultural” no Ensino de Ciências (LEMKE, 2001; MORTIMER; SCOTT, 2002; PEREIRA, 2012). Percebemos autores que se ocupam com referências da linguagem e da argumentação, por vezes, articulados com referenciais da psicologia do desenvolvimento. Identificamos que essa “virada” que marcou a área de Ensino de Física no final do século passado, começa a ser identificada na linha de pesquisa de inserção de tópicos de FMC no Brasil nos últimos anos. Tratamos esse movimento como uma importante tendência para as quais as novas produções venham a se inserir nos debates ainda incipientes, de como trabalhar com os discursos emergentes nas aulas de MQ.

Além da tendência de recorrer ao uso de referenciais ligados à perspectiva sociocultural, identificamos também o uso de recursos experimentais de baixo custo, leituras de textos de divulgação científica, obras de arte e de simulações computacionais. O recurso mais utilizado identificado nos artigos são os experimentos de baixo custo, em especial, propostas de elaboração de espectroscópios. Porém, as discussões que esses trabalhos trazem estão mais ligados à modelos atômicos e astronomia. A divisão entre a física clássica e a física moderna não é clara, como discutem diversos trabalhos (OSTERMANN; MOREIRA, 2000; PESSOA JR., 2006; MEDEIROS; CROVADOR; SILVA, 2018). Conforme Pessoa Jr. (2006), um dos marcos pode ser a dualidade onda-partícula, marco esse que o autor adota. Corroboramos que a dualidade onda partícula é um conteúdo fundamental para se introduzir a FQ. Como uma demanda das revisões mais pioneiras (OSTERMANN; MOREIRA, 2000; MOREIRA; GRECA, 2001), uma abordagem conceitual e fenomenológica da FQ pode ser uma alternativa de se introduzir seus tópicos no EM.

Alguns pesquisadores abordam formas de se tratar conceitualmente a dualidade onda partícula através do interferômetro de Mach-Zehnder (PEREIRA, et al., 2012; NETTO; OSTERMANN; CAVALCANTI, 2018). Uma dentre as simulações computacionais

41 identificada em nossa análise da literatura é justamente o IVMZ (OSTERMANN; PRADO; RICCI, 2006). Como o uso de simulações é um dos recursos mais empregados dentre os recursos metodológicos de ensino nos artigos investigados e o IVMZ se mostra uma simulação com potencial na área (NETTO; OSTERMANN; CAVALCANTI, 2018), propomos implementar uma atividade que aborde conceitual e fenomenologicamente a dualidade onda-partícula através do IVMZ. Há certo consenso da área em se levar os tópicos de FMC para o EM através de abordagens conceituais e fenomenológicas; o IVMZ se mostra uma simulação com potencial na área (NETTO; OSTERMANN; CAVALCANTI, 2018); e concordamos que um conteúdo importante da MQ é a dualidade onda partícula optamos por explorar esse conteúdo usando como recurso o IVMZ. Dessa forma, situamos a presente pesquisa em duas tendências identificadas através da revisão na linha de pesquisa em inserção de tópicos de FMC no EM: O uso de referenciais alinhados à perspectiva sociocultural e o uso de simulações computacionais, especificamente, o IVMZ para abordar a dualidade onda partícula.

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3. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO: A AÇÃO MEDIADA

No capítulo anterior foi apresentada uma revisão de literatura que buscou um panorama geral das pesquisas atuais sobre inserção de tópicos de FMC/MQ no Ensino de Física, em particular, na educação básica. Nas conclusões do capítulo, o trabalho foi situado enquanto uma proposta que será desenvolvida e aplicada à luz de referenciais alinhados à perspectiva sociocultural. No presente capítulo será apresentado o referencial adotado: a vertente da abordagem sociocultural do psicólogo norte-americano James Wertsch (1991, 1998), que assume como unidade de análise a ação mediada. Para Pereira e Ostermann (2012), “embora Wertsch seja frequentemente citado em estudos que utilizam como aporte teórico autores como Vygotsky e Bakhtin, sua verdadeira contribuição intelectual, têm sido pouco apreciada como fundamentação teórica em pesquisas em educação em ciências” (p. 24). Assim como esses autores, apresentaremos as ideias de Wertsch e seu potencial como um possível referencial teórico para as pesquisas em educação em ciências e para as práticas em sala de aula. Também exploramos, neste capítulo, os aspectos metodológicos das obras de Wertsch. Discutimos implicações das ideias do autor para o delineamento de uma metodologia de análise do discurso emergente em aulas de ciências.