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Quantificação dos volumes de afluências indevidas

3 AFLUÊNCIAS INDEVIDAS EM SISTEMAS DE DRENAGEM DE ÁGUAS

3.5 Quantificação dos volumes de afluências indevidas

O diagnóstico das origens de afluências indevidas permite concluir sobre a pertinência desta temática para a gestão de redes de drenagem de águas residuais. É necessário quantificar, com unidades volúmicas (m3) ou monetárias (euro) a real dimensão desta problemática, de modo a auxiliar a definição de prioridades no processo decisório.

A quantificação de caudais de infiltração pode revelar-se um trabalho difícil e moroso, que determina a fraca qualidade e insuficiente quantidade de registos auxiliares à compreensão da problemática das afluências indevidas. Esta carência de dados dificulda a definição de relações causa-efeito e, portanto, uma análise fiável ao problema.

Para se concluir o balanço volúmico associado às infiltrações, há que separar caudais definidos na fase de projecto, aquando a determinação dos caudais de dimensionamento, e os caudais associados à fase fase de exploração, avaliando o desempenho do sistema em termos técnicos e económicos. Assim, não basta prever o caudal de infiltração antes da entrada em operacionalidade do sistema, mas também relacionar a componente desse caudal de infiltração com caudal total drenado (Coelho, 2013).

3.5.1 Cálculo do caudal de infiltração em fase de projecto

Em Portugal, para se quantificar o caudal de projecto há que acautelar, de acordo com os regulamentos em vigor, os volumes indevidos de águas parasitas. Assim, a sua expressão de cálculo é:

Em que:

 Qprog representa o caudal de projecto;

 k simboliza o coeficiente de afluência (0,8 ou 0,9);

 Pop define a população, dada em habitantes equivalentes;

 Cap representa a capitação, em l ou m3 por habitante e por unidade de tempo;  Qind simboliza o caudal industrial;

 Qinf representa o caudal de infiltração ou afluências indevidas

Para determinar a população associada à utilização da estrutura de um determinado projecto, recorre-se, de modo usual, aos censos levados a cabo pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). A essa base de dados, são aplicadas projecções de modo a determinar os habitantes servidos pela rede nessa bacia de drenagem, no ano horizonte de projecto.

A capitação é um valor regulamentar, tabelado e normalizado consoante a tipologia de cada caso em estudo. Contudo, devido a características como a flutuação da população, pode ser ajustada com base empírica de situações semelhantes e fazendo jus às premissas de cada projecto.

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O caudal industrial está associado à proximidade da rede de drenagem a uma zona industrial, cujos caudais diferem em muitos parâmetros das descargas domésticas e que, por isso, devem ser tratados de forma diferenciada. Esses caudais dependem, não só, dessa proximidade ou presença de zona industrial, mas também da natureza das indústrias envolvidas.

Como tem sido referido ao longo desta dissertação, não existe uma forma simples, concisa e directa de determinar caudais de infiltração. Para além disso, em Portugal demoram a ser tomadas medidas que facilitem essa tarefa como, por exemplo, o estabelecimento de uma base de dados a nível local.

Em Portugal, para o cálculo de infiltrações em fase de projecto, os projectistas apoiam-se, face à inexistência de dados, no Deceto-Lei nº 23/95, de 23 de Agosto, coloqualmente designado como Regulamento Geral dos Sistemas Públicos e Prediais de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais (RGSPPDADAR). Este regulamento define valores pré- estabelecidos para caudais de infiltração, de acordo com a dimensão e extensão da rede a montante. Todavia, a estimativa do caudal infiltrado é normalmente pouco fiável, já que não considera factores como a natureza topográfica e geológica da zona analisada.

Devido à incerteza existente na determinação de volumes infiltrados, cada país procurou identificar um valor regulamentar a nível nacional ou uma formulação adequada, com base nas características topográficas e geológicas de cada área, assim como em função do diâmetro e da extensão da rede a montante. Apesar de não ser aconselhável, os caudais de infiltração podem ser numericamente superiores aos valores de caudal de projecto, facto que espelha o rendimento do sistema em causa (Bonito, 2014).

Naturalmente, torna-se um exercício interessante comparar o regulamento nacional com directrizes de outros países. Existem, inclusivamente, países com mais do que uma solução. Apesar do vasto leque de escolhas para estimar infiltrações, não existe consenso nem precisão para a comunidade científica na quantificação desse fenómeno (Bertolino, 2013).

O Quadro 3.2 apresenta a comparação das directrizes nacionais com quatro países. A escolha destes países é baseada na variada existência de normas (EUA), na comparação com outro país de língua portuguesa (Brasil) e com dois países europeus, com diferentes abordagens na estimativa de caudais de infiltração (Alemanha e Irlanda).

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Quadro 3.2 – Critérios da quantificação em projecto da contribuição da infiltração (Cardoso et al., 2002)

Na prática, as entidades gestoras tendem a padronizar valores superiores àqueles estipulados legalmente, particularmente em zonas com incidência de fenómenos hidrológicos mais críticos, com reservas aquáticas abundantes e, nem sempre, detectáveis (Cardoso et al, 2002).

País Norma Critério

Portugal Decreto-Lei nº 23/95 (1995)

Para D ≥300 mm: igual ao caudal médio anual Para D <300 mm: entre 0,5 e 4 m3/dia.cm.km

Depende do estado de conservação dos colectores, podendo ser considerados valores inferiores se assegurada a estanquidade da

rede

EUA

USEPA Guidelines Caudal de infiltração igual a 140 l/dia por mm de diâmetro e por km de comprimento da rede

Metcalf & Eddy (1981) Taxa de infiltração de 0,15 a 0,60 l/s.km. Valor para 160m de rede por hectare. Dados originais em função da área drenada.

American Society of Civil Engineering - Water Environment Federation

(EPA, 2001)

0,05 a 1,39 m3/dia.cm.km. Variação de valores de referência local nos EUA.

Water Authoritires Association (1989)

Taxa de infiltração de 0,15 a 0,60 L/s.km. Valor para 160m de rede por hectare. Dados originais em função da área drenada.

Brasil

SABESP (Companhia de Saneamento Básico do

Estado de São Paulo, 1984) 0,05 a 0,50 L/s.km ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) - NBR 9649 (1986) 0,05 a 1 L/s.km

Irlanda Greater Dublin Area Sewer Network

Caudal de infiltração entre 10% a 15% do caudal médio diário em tempo seco.

Alemanha Norma ATV118 (ATV- DVWK 2003)

100% do caudal doméstico (em casos justificados pode assumir outra magnitude) - sistemas separativos

Negligenciada no dimensionamento dos colectores mas considereada no dimensionamento de estruturas especiais e

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3.5.2 Cálculo do caudal de infiltração em fase de exploração

Ao contrário do que ocorre na fase de projecto, onde as infiltrações são tratadas unitariamente, na fase de exploração é possível segregar os caudais de infiltração em infiltração directa e infiltração indirecta.

Figura 3.1 – Identificação gráfica das afluências indevidas (adaptado de Metcalf et al., 2004) Como foi referido na secção 3.3.1., o caudal de infiltração directa é, independentemente do seu carácter sazonal, constante ao longo do tempo. Contrariamente, as afluências indevidas indirectas caracterizam-se por serem de carácter mais repentino, inconstante e, por isso, mais imprevisível. Apesar de existirem formulações que permitem quantificar ambos os tipos de infiltração (em conjunto ou de forma individual), nenhum desses métodos prevalece em relação aos outros, conferindo um carácter ambíguo ao cálculo de volumes infiltrados e impossibilitando a uniformização e clarificação desta temática. É possível calcular e quantificar os caudais de infiltração através de:

 Balanços hídricos, que consistem numa metodologia apoiada na subtração de valores de caudal a montante aos valores verificados a jusante que, maioritariamente, descrevem o volume de água afluente à ETAR;

 Hidrogramas, que são métodos rigorosos similares aos utilizados nos hidrogramas de cheia, em hidrologia e recursos hídricos;

 Marcadores, nos quais se quantifica o volume indevido afluente em função de uma particularidade distinta das águas residuais onde ocorre infiltração;

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 Modelos de simulação, baseados em modelos computacionais, que utilizam algoritmos semelhantes aos utilizados nos modelos de percolação e que permiterm a previsão de eventos na bacia hidrográfica alvo de simulação.

Por consequência da ambiguidade que caracteriza o cálculo dos volumes infiltrados, concluiu- se ser necessário separar os métodos de cálculo de afluências indevidas existentes, consoante os mesmos quantifiquem infiltração directa, indirecta ou ambas.