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Quanto às percepções sobre o uso das TIC

5.1 ANÁLISE DOS DADOS

5.1.9 Quanto às percepções sobre o uso das TIC

Neste segmento consideramos as respostas ao Questionário 4 da disciplina, centrado na percepção dos alunos sobre a experiência com as TIC ao longo do primeiro bimestre letivo de 2019. É a verificação posterior às experiências e atividades que a turma vivenciou ao longo do período de estudos, que incluem as pesquisas com o auxílio do Facebook; a atividade com a fotografia no museu da aeronáutica na cidade de Panambi; a elaboração dos vídeos sobre as 1ª e 2ª Guerra Mundial, já no final do período analisado. Todas essas atividades também foram monitoradas pelo Diário de Bordo que escrevemos ao longo desse período, e que permitiu o registro das percepções dos alunos sob o ponto de vista do professor. Utilizamos a ferramenta do Diário, neste ponto, para auxiliar a interpretar as respostas dos alunos, complementando-as e as contextualizando a partir dos dados e fatos que registramos no Diário.

Vimos previamente que a experiência da turma era variada quanto ao uso das TIC, sendo que a maioria fazia uso delas para entretenimento e eventualmente para estudo, sem, no entanto, considerá-las como um elemento essencial para as atividades escolares.

No Questionário 4, aplicado já na fase final da investigação, essa percepção mudou de forma sensível. Tivemos uma percepção muito mais atenta ao papel das TIC, agora como elemento importante para as atividades didáticas e o estudo. É o que se percebe na síntese das respostas, que podem ser resumidas nos termos seguintes:

1 – Quanto aos fatores de aprendizagem com o uso das TIC em sala de aula, a turma em sua maioria (5) os relacionou aos instrumentos utilizados. Um remeteu à facilidade de transmissão de conteúdo e outro afirmou haver coisas boas e ruins no uso.

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2 – O Datashow foi o mais lembrado (6) ao lado do computador (3), livro (1) e Google (1).

3 – Todos (7) afirmaram não ter nenhuma dificuldade no uso das TIC na aprendizagem. 4 – Sobre diferenças no uso social e educativo, a maioria (4) disse ter ficado mais fácil, outros tangenciaram o tema (2) e (1) não viu diferença.

5 – Sobre como avaliavamm o uso em sala, comparando com e sem TIC, a grande maioria (6) viu de forma positiva a experiência, e apenas (1) não viu diferença.

6 – Sobre como avaliam os colegas nas atividades com as TIC, a maioria (5) os avalia de forma positiva, destacando o interesse e a concentração nas atividades, e apenas (2) como desinteressados.

7 – Sobre as mudanças em sala com o uso das TIC, a maioria (3) destaca o volume maior de matérias e de conteúdo, (2) destacam que não há mais escrita e (2) tangenciam a questão.

8 – Sobre se o professor contribuiu no processo, todos (7) responderam que sim. 9 – Sobre se as TIC contribuíram no ensino, todos (7) responderam sim (considerando- se pelo contexto que 3 delas de forma presumida).

Os alunos não se estenderam nos comentários, sendo que as repostas se ativeram ao essencial e às vezes sem distinguir o aspecto que estava sendo solicitado na pergunta, sobretudo no caso das questões 8 e 9.

Apesar do baixo retorno desse último questionário, vê-se que os alunos já têm mais consciência sobre o papel que a tecnologia desempenha na sua relação com o conhecimento, especificamente para a pesquisa no âmbito da História. Tais percepções, de forma geral, também se fizeram perceber em nossas anotações no Diário de Bordo. Notamos que o uso das TIC, apesar de ser uma constante na vida do aluno, nem sempre era percebido em sua dimensão de protagonismo para os estudos.

Um exemplo disso é o uso que a turma faz da ferramenta Google, como buscador de informações na internet. Ao final de sua experiência com as atividades envolvendo explicitamente o uso das TIC, a turma passou a identificar a pesquisa no buscador como importante ferramenta de estudo. Na atividade com o Facebook esse mecanismo de pesquisa foi utilizado de forma quase automática, revelando uma postura de incorporação acrítica e não necessariamente enriquecedora para o estudo.

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Vimos isso ao considerar, em item anterior, que os fóruns de discussão eram o mais das vezes respondidos com trechos copiados de sites como a Wikipédia e outros voltados para os tópicos da educação. Mas não havia necessariamente a apropriação desses conteúdos pelos alunos, já que eles não faziam a interpretação dessas informações nem as colocavam em seus próprios termos, conforme solicitávamos nos enunciados das atividades propostas.

O fato é que a incorporação da tecnologia nem sempre vai resultar necessariamente em melhores estratégias didáticas nem em avanços para o conhecimento. Se não houver a análise crítica e a reflexão sobre o que se está fazendo, a técnica tende a ser apenas um meio, sujeito ao bom ou ao mau uso. A experiência com o Facebook nos alertou para essas questões que vêm sendo discutidas há um bom tempo (GUTIERREZ, 2004; ALMEIDA; VALENTE, 2011), mas que somente com a experiência prática pudemos de fato encarar.

Nesse sentido, as reflexões que conduzimos em nosso Diário de Bordo sobre as atividades na rede social ajudam a clarear a percepção que os alunos tiveram da experiência assim como o próprio professor naquele momento:

[...] o aluno acha que o desenvolvimento de uma atividade é para o professor ver e fornecer a nota, sobre o que ele produziu; no caso da atividade na rede social, serve principalmente para os colegas da classe: como fez, que assunto abordou, comparar o seu trabalho com o do colega, a dinâmica no trabalho, exemplos que pode seguir em outra produção. Tudo é enriquecedor quando se trata de aprendizagem (Diário de Bordo, 13/05/2019).

Da experiência de pesquisa com o uso do Facebook, a turma parece ter a percepção de que a pesquisa é de fato o que foi feito: a busca pelo Google da definição dos conceitos sugeridos pelo professor. Em certos casos, há como que uma naturalização dos meios de busca e da citação sem crédito às fontes consultadas. Em outros, o aluno demonstra que reconhece o limite entre o que é seu e o que é de outras fontes, e que percebe o papel desempenhado pela tecnologia nesse processo. Assim, a percepção da turma sobre essa primeira experiência parece refletir, de fato, o uso efetivamente feito da tecnologia: uma ferramenta por vezes tomada de forma irrefletida para alcançar um determinado objetivo (MARDA; MILAN, 2018).

Necessário registrar novamente que por diversas vezes chamamos a atenção da turma para a necessidade de referir as fontes e de atentar para elas ao procurar informações. Nas respostas ao Questionário 4, aparecem alguns indícios sobre como a turma lidou com isso: o acesso às TIC facilita a pesquisa. Tais respostas relevam talvez o início de uma maior

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consciência acerca do uso da TIC nas atividades de estudo, sobretudo por parte daqueles que haviam adquirido o hábito de usá-las sem refletir sobre esse uso.

Algo diferente se pode observar na percepção dos alunos quanto ao uso das TIC de forma mais ampla. Nesse ponto, acontece um fenômeno interessante: a turma avalia o uso dos equipamentos em termos positivos, sem os temores que se manifestaram no Questionário 1. A ampla maioria demostrou segurança no uso dos equipamentos e não referiu dificuldade ao avaliar a experiência.

A fala dos alunos reflete o que havíamos registrado no Diário de Bordo: a turma parecia bem mais à vontade para a realização da atividade de registro fotográfico, disposição essa que já percebêramos na viagem de estudos que realizamos para tal fim. O uso do celular para tirar fotos e gravar vídeos é talvez a chave para entender as respostas dos alunos sobre essa atividade. Aspectos técnicos, como a incidência de luz e o ângulo, o enquadramento e os efeitos especiais da edição – sombreamento, cortes, intensidade da cor etc. –, necessários para se obter um bom resultado talvez ajudem a explicar a percepção diferenciada da turma quanto à relação com as TIC nessa atividade.

Isso porque o aluno, ao fazer as fotos, tem de considerá-las de forma bastante objetiva, pois elas serão objeto de apreciação visual, o que implica a predisposição em ouvir a opinião dos colegas e do professor, de consultá-lo para saber o que acharam da fotografia, de tirar dúvidas sobre como obter esse ou aquele resultado, entre outros fatores que, por si sós, já demandam uma postura mais aberta ao diálogo e à reflexão sobre o que se está fazendo.

A familiaridade com as câmeras de celular tem também o seu quinhão no rol das explicações para a percepção da turma nesta atividade com as fotografias. Mas aqui não há naturalização da cópia, pois a atividade induz por si a um fazer que, esse sim, está muito naturalizado no cotidiano do aluno – a cultura das selfies, o aplicativo Instagram e outros fatores ajudam a entender esse fenômeno, na linha do que nos propõe Henry Jenkins (2009).

Na mesma linha, podemos analisar as respostas relativas à atividade de elaboração de vídeo. Aqui também se percebe que a percepção dos alunos após a experiência vivenciada no período letivo traz a marca da reflexão: os temores iniciais foram substituídos pela autoconfiança no trato com os equipamentos.

O diferencial, nesta atividade, foi o grau elevado de trabalho em grupo, sendo necessário, para chegar ao resultado final, uma coordenação das várias etapas do processo entre os integrantes de cada grupo. Isso certamente exigiu da turma uma racionalidade maior na

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hora de definir seu projeto e de efetivamente realizá-lo. E essa racionalidade transparece, a nosso ver, nas respostas ao questionário final. Nelas se pode notar a ênfase dada ao planejamento e às fases da atividade, bem como ao diálogo com os colegas.

No Diário de Bordo, também pudemos registrar alguns elementos que ajudam a contextualizar esse ponto.

Muito se pergunta: qual o momento ideal para inserir vídeos? Uns falam que no início da nova matéria; outros, interagindo e contextuando juntos; e outros depois do conteúdo. Sempre costumo empregar didaticamente do meio para o final daquele conteúdo. Vejo que os alunos assimilam melhor o vídeo quando têm um conhecimento prévio; vai reviver, somar, compreender melhor o conteúdo e a incorporação de novo conhecimento, que o vídeo geralmente traz novos elementos que não estavam no livro didático (Diário de Bordo, 12/06/2019).

O envolvimento da turma nos chamou a atenção, como se vê nas anotações do Diário, mais do que o que observamos nas duas atividades anteriores. O caráter de atividade em grupo parece-nos a chave para entender as razões da percepção da turma sobre o uso das TIC na atividade com o vídeo. Tal como na fotografia, ela demanda um mínimo de domínio técnico, num grau talvez mais complexo que o da fotografia: a imagem em movimento implica uma linguagem própria, como sabemos, assim como a presença do áudio, o roteiro, e sobretudo a confluência dessas linguagens a partir da palavra escrita que serve de base, via de regra, para as narrativas elaboradas.

Com isso, queremos ressaltar que foi necessária, nessa fase das atividades, uma maior sincronia entre os alunos, entre esses e o professor, e entre todos e a possível audiência dos vídeos elaborados. Essa complexidade, a nosso ver, se reflete nas percepções externadas pelos alunos. Eles acabam por se estender sobre os aspectos técnicos da experiência e na relação entre esses e os conteúdos estudados – no caso, as informações e fontes sobre a Segunda Guerra Mundial.

Novamente aqui, temos a presença de um aparato técnico que se impõe à reflexão, dada a necessidade de considerar questões como a ideia da narrativa (MEDINA, 2006), a forma como ela se materializou num roteiro (SARAIVA; CANNITO, 2004), os recursos utilizados para contar a história – sonoros, visuais, textuais, dramáticos etc. Isso resultou em considerações específicas sobre o uso das TIC para a realização da atividade, que mostram como o aluno passou a lidar com a variável da tecnologia no seu processo de aprendizagem.

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Quando afirma, por exemplo, que a atividade exigiu esforço para dominar a linguagem do vídeo, o aluno tem de considerar os imperativos da tecnologia, suas limitações e possibilidades, na realização da tarefa proposta. Aqui, diferentemente do que observamos na atividade com o Facebook, referida acima, não é possível “copiar e colar” as repostas no fórum... O que força, de certa forma, a uma outra postura diante do conhecimento – mais ativa, mais questionadora e mais focada no fazer.

Some-se a isso a necessária interação com os demais integrantes do grupo, e temos um vislumbre sobre a boa acolhida da atividade e os resultados que obtivemos com ela. Talvez também o fato de ter sido a última das várias atividades propostas tenha resultado em uma compreensão mais aprofundada, que só pode advir com a maturação e o tempo.

Sintetizando o que recolhemos quanto à percepção da turma no uso das TIC, é possível afirmar que os alunos absorveram o uso da tecnologia ao longo do processo, reagindo conforme a complexidade da atividade proposta, assim como conforme o grau de familiaridade com o uso da ferramenta e conforme o tipo de interação havida. Todos esses fatores, e outros que talvez nos tenham passado sem o devido registro, concorreram para formar uma percepção acerca das TIC por parte da turma. Que percepção seria essa? A princípio, um entendimento sobre como a tecnologia pode contribuir para as atividades propostas.

Ao trazer para o primeiro plano a presença das TIC no processo de ensino e aprendizagem, nossa intenção era justamente suscitar a reflexão por parte do aluno acerca desse processo, instilando a visão crítica no cotidiano da escola (FREIRE, 1987). A turma passou a considerar o instrumento técnico sob a dimensão do aprendizado, não apenas como um meio neutro a ser empregado para a consecução de determinado objetivo. A avaliação feita pelos alunos sobre esses instrumentos apresenta diferentes vieses: alguns ressaltam a familiaridade já existente na vida cotidiana, o caráter quase automático do uso feito das TIC. Outros se detêm sobre aspectos normalmente ignorados, ressaltando o estranhamento e as novas possibilidades que o uso das TIC trouxe para as atividades em sala de aula.

Ao problematizarmos a experiência, fazendo explícitas as observações que antes ficavam restritas a uma prática quase automática de uso das TIC, as percepções foram sendo modificadas, com um olhar mais atento para aquilo que a técnica pode agregar ao ensino. Assim, por exemplo, uma simples pesquisa no buscador Google, que antes era um procedimento naturalizado, passou a suscitar questões como a veracidade das informações, da autoria e da ideologia subjacente ao processo de pesquisa.

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Dessa forma, a depender do grau de envolvimento e da experiência prévia do aluno, tivemos percepções matizadas, cada uma delas refletindo as peculiaridades da experiência de uso da tecnologia em diferentes vivências em sala de aula e fora dela.

De qualquer maneira, o material analisado traz elementos que podem contribuir para que compreendamos o alcance do impacto da tecnologia nas atividades de ensino da área de História.