• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III: CATOLICISMO ROMANO E BUDISMO TIBETANO: UMA ANÁLISE

1.12 Quanto à concepção e visão de morte

Toda religião possui sua própria concepção de morte, sempre em conformidade com suas crenças. Ela desperta o interesse das pessoas de um modo geral quanto à questão do que a sucederá. É alvo de debates e reflexões teológicas / filosóficas desde a antiguidade, por isso e por outras razões, cada religião tem seu próprio conceito e concepções acerca deste fato natural. Nestes dois universos religiosos, encontramos algumas semelhanças que, apesar de possuírem concepções de pós-morte diferentes, se aproximam quanto à concepção de morte.

Analisaremos primeiro as concepções de morte em cada tradição, e logo em seguida, analisaremos a visão que os budistas e católicos possuem da morte. Devemos esclarecer que são coisas bem distintas, uma coisa são as concepções de morte fundamentadas em suas doutrinas, outra coisa é a visão que seus devotos têm acerca deste fato, acarretando em uma postura bem definida diante da morte.

Quanto às concepções, ambas entendem que a morte, enquanto fenômeno natural e universal, de fato, é imanente à condição humana. O ser humano nasce, cresce e morre, cumprindo um ciclo vital. Durante este ciclo, o homem fica sujeito a mudanças, pois que isso é que caracteriza a vida. O catolicismo fala que estas mudanças acontecem no tempo, disso resulta que nossas vidas são medidas por ele. Neste tempo, o homem envelhece, enfrentando sofrimentos causados pela doença e decorrente da própria velhice. Vemos certa semelhança quando o budismo se reporta a primeira Nobre Verdade através de Laumakis (2010, p. 69,71) dizendo que “tudo envolve o dukkha (sofrimento), desde o nascer até o envelhecer”.

No catolicismo, o tempo tem a conotação de limitar a vida humana, ou seja, traz à tona a questão da transitoriedade da vida, limitando-a a um começo e um fim. No budismo, a transitoriedade da existência humana é bastante enfatizada porque faz parte dos ensinamentos búdicos, ela é caracterizada pela impermanência (anicca) dos fenômenos, ou seja, estão em constante estado de mudança. Outra questão análoga é quanto a não ter apego à vida. Este apego é combatido por ambas as tradições. No catolicismo, a Sagrada Escritura diz: “quem tem apego à sua vida, vai perdê-la” (Jo 12, 25 – Evangelho segundo São João, capítulo doze, versículo vinte e cinco) (cf. CNBB, 1990, p.1373).

Este apego reside numa vontade de continuar sua peregrinação terrestre, usufruindo da convivência das pessoas amadas, dos bens adquiridos, dos animais de estimação, etc. No budismo, o apego às coisas e a vida também são combatidos, pois que escraviza o homem. Diante disto, o budista busca constantemente sua libertação no seu cotidiano através das práticas meditativas. Quanto à representação da morte, para ambas as tradições, a morte não representa o fim absoluto, ela é apenas uma transformação. Esta transformação para o catolicismo desemboca numa vida na eternidade, já para o budismo, conflui para outras vidas terrestres ou para a libertação total.

Muitas vezes, o que se apresenta como divergência a princípio, a posteriori contribui para uma convergência, como vimos acima. Fizemos uma análise das características mais latentes nas duas religiões, contudo, muitas outras devem existir. Esta correlação serve para aproximar dois universos, que a princípio, aparentam ser tão distintos. Contudo, muitas divergências existem, possuindo suas raízes nas crenças estabelecidas pelas respectivas doutrinas. Isto é, quando dizem respeito aos fundamentos doutrinários, então percebemos um grande distanciamento.

No catolicismo, a concepção de morte diverge totalmente da budista quando atribui seu sentido positivo a Cristo, morrer é viver em Cristo. Já a budista, também confere um sentido positivo a morte, porém, quando diz que é preciso morrer para experimentar outras vidas até a extinção completa do sofrimento, então diverge totalmente da católica. São concepções baseadas nos seus fundamentos, e estes por sua vez, nas suas crenças, desde as mais primordiais.

Toda a preparação para a morte no budismo tibetano tem como uma das finalidades o encaminhamento a uma existência física através do renascimento. No catolicismo é diferente, as expectativas escatológicas confluem para uma existência espiritual, neste contexto, é descartada qualquer possibilidade de uma existência material.

Quanto à visão que seus devotos têm a respeito da morte, então percebemos uma diferença no tocante a postura adotada. Para o budista, a morte desfruta de um status privilegiado, visto que ela está interligada a cotidianidade da vida. As práticas meditativas, qualquer que sejam as técnicas, levam o praticante a integrar a morte na sua vida. Isto não significa que o medo da morte foi extirpado do seu meio, pois como vimos, esse medo atinge a todos, indistintamente, contudo, sua postura conduz a uma aceitação. Já no católico, esse medo irá conduzir a uma rejeição, como vimos anteriormente em Ariès, Becker e Rodrigues. Essa conduta é denotada pelo esvaziamento das coisas relativas à morte, na qual esse novo fenômeno vem despontando desde o século XX, segundo os autores citados.

Em termos gerais, esta expressão “arte de morrer” ou “arte de bem morrer” se refere a um corpo de literatura religiosa cristã que versa sobre algumas práticas e orações, cujo objetivo principal é conduzir o devoto a uma boa morte. Estes tratados ou manuais não se dirigiam somente aos moribundos, mas a todos os que buscavam um fim último, que de certa forma, os levasse a salvação. Estes escritos cristãos começaram a surgir na Europa por volta do fim da idade média (século XV) e início da idade moderna, com o advento do renascimento122 (cf. EVANS-WENTZ, 2013, p. XX). Estima-se que sua duração se estendeu até o século XVIII.

Desse modo, existiu uma arte de morrer cristã e existe até hoje, uma arte de morrer budista. As duas artes se configuram como um meio propício para se chegar a um entendimento da morte, através de sua integração com a própria vida. Ambas contêm ensinamentos eficazes que proporcionam uma boa morte para o cristão e uma morte conscientemente e corretamente controladapara o budista.

Esta literatura da morte evidencia essencialmente o caráter frágil e breve da vida. Visando uma preparação para a morte, as regras de bem morrer cristãs deviam ser plenamente interiorizadas para surtirem os efeitos desejados. Esta interiorização deveria ser realizada cotidianamente, pois que estes manuais ressaltavam a todo o momento “a importância de viver na companhia da morte”. Todavia, as regras práticas a serem observadas aliavam uma arte de bem viver a uma arte de bem morrer (cf. RODRIGUES, 2006, p. 143).

Um dos autores que mais estudou estes tratados de morte foi o historiador francês Michel Vovelle. Assim como Ariès, algumas de suas obras se dispuseram a tratar da história da morte, detendo seu olhar mais nas transformações decorridas ao longo do tempo e suas prováveis causas. Dos muitos manuais que estudou minuciosamente, destacamos um trecho de um deles contendo alguns conselhos importantes.

Disposições remotas: I – Pensar todos os dias na morte: 1.Que é certa. 2. Que está próxima. 3. Que é enganosa. 4. Que é terrível. 5. Que é cruel. 6. Que é semelhante à vida. II – Bem viver: 1. Evitar o pecado mortal e venial de propósito deliberado. 2. Atacar sua paixão dominante. 3. Amar a cruz. 4. Frequentar os Sacramentos. 5. Praticar a oração e a obediência. 6. Ter uma grande devoção à Santa Virgem. III – Fazer cedo seu testamento. 1. Fazer

122 Foi um importante movimento cultural, artístico e científico, que se caracterizou principalmente por

valorizar as ações humanas (humanismo) e também por favorecer uma maior aproximação com Deus.

celebrar missas diante de sua morte. 2. Fazer seu testamento em boa forma. 3. Devolver os bens mal adquiridos. 4. Pagar suas dívidas. IV – Manter-se fiel a algumas práticas dos santos, para pensar na morte e se preparar para ela: 1. Ao se deitar, colocar-se na postura de um morto. 2. Comer em cada refeição um pedaço de pão para alimentar os vermes que comerão o corpo. 3. Olhar as doenças como companheiras da morte. 4. Ter uma caveira no quarto e meditar sobre o que ela foi, sobre o que ela fez, disse e pensou; o que ela é, o que ele será e refletir sobre si. 5. Fazer seu Relicário e seu Túmulo, e os beijar todos os dias (cf. VOVELLE, 1974 apud RODRIGUES, 2006, p.144).

Estas recomendações procuravam facilitar a vida dos cristãos, tentando tornar natural o fim último. Contudo, nesse período moderno, a morte não é mais encarada com tanta naturalidade. Ela não ocupa mais o centro da vida. O grande desafio destes tratados de morte é fazer com que o cristão não perca a esperança na vida e nem na morte. A ideia que agora se tem da morte vai repercutir em cada mente. A morte não possui mais uma conotação coletiva, ela se individualiza quando se começa a refletir sobre a própria morte, quanto a sua não aceitação, quanto a pensar nela a contragosto e até quanto a ser obrigado a se preparar quando não se acredita mais nela (cf. RODRIGUES, 2006, p.144).

Diz-se que os primeiros escritos cristãos sobre a arte de morrer ocorreram realmente por volta do século V, possuindo uma conotação um pouco diferenciada da arte de morrer do século XV. Esta primeira versão seria destinada somente ao momento final da morte, ou seja, quando o moribundo estivesse no leito de morte. Seu objetivo seria preparar o moribundo para o arrependimento final como último ato para se alcançar a salvação. Esta arte de morrer estaria totalmente voltada para a morte, essa seria sua característica mais marcante. Não nos estenderemos com relação a esta primeira propagação de escritos cristãos por não termos ainda uma fonte segura para nos apegarmos.

Por outro lado, a arte de morrer cristã (do século XV), é praticamente desconhecida aqui no ocidente, Evans-Wentz (2013, p. XX) atribui isso a relutância em morrer por parte do homem ocidental. Já com relação à arte de morrer budista, conhecida pelos seus devotos tanto no oriente quanto no ocidente, ele ressalta a importância e a eficácia do Livro Tibetano dos Mortos, onde suas orientações estão dirigidas não só para a morte, mais também para a vida. Ele diz que:

[...] aquele que está para morrer deverá enfrentar a morte não só lúcida, calma e heroicamente, mas com o intelecto corretamente treinado e dirigido, transcendendo mentalmente, se for necessário, os sofrimentos e enfermidades do corpo, como se tivesse podido praticar eficientemente durante sua vida ativa a Arte de Viver, e, próximo da morte, a Arte de Morrer (cf. EVANS-WENTZ, 2013, p. XX).

Através de um método peculiar e profundo, este grande manual composto de vários textos de libertação, conduz o budista a se encaminhar para uma nova vida. Por ser uma obra ritual, sua eficácia está na correta orientação dada pelo mestre em consonância com o treinamento espiritual desenvolvido pelo morto quando ainda vivo. Esta postura com relação ao Thödol é fundamental, pois como declaram os mestres iogues, “quando a humanidade houver amadurecido e fortalecido espiritualmente, a morte será vivida extaticamente, nesse estado conhecido pelos orientais como samadhi123. Através da correta prática de uma fidedigna Arte de Morrer, a morte terá, então, perdido o seu sentido negativo e redundará em vitória” (cf. EVANS-WENTZ, 2013, p. XXII).

Com isto, se percebe a forte influência na contemporaneidade da arte de morrer budista. Nela encontramos instruções para a vida e para a morte, colocando uma na dependência da outra. Outro motivo que nos leva a pensar sobre esta influência, seria a questão da não rejeição à morte por parte do oriental. Uma vez que o budista não recusa a morte, consequentemente incorporará em sua vida esta prática de bem morrer. Diferentemente da cultura ocidental, que descarta qualquer possibilidade de praticar uma arte porque não consegue introduzir a morte na vida. A arte de morrer cristã, apesar de estar voltada também para o bem viver, não conseguiu ultrapassar as barreiras da modernidade.

As duas artes de morrer, tanto a budista como a cristã, possuem a mesma intenção quanto à preparação de seus devotos para a morte. Contudo, atualmente, apenas a arte budista tibetana sobrevive através do Bardo Thödol. A Grande libertação pela auscultação constitui uma arte do viver e do morrer. Como vimos no segundo capítulo, ela guia a consciência do moribundo ou morto através dos três bardos ou estados. A sua eficácia está no treinamento cotidiano através das práticas meditativas. Já a arte de morrer cristã se perdeu no tempo em consequência do seu

123 O samadhi é o equilíbrio extático alcançado pela profunda meditação (cf. EVANS- WENTZ, 2013,

desuso, porque não mais atendia aos anseios de uma sociedade que cada vez mais silenciava a morte. Na civilização ocidentalizada, esta arte perdeu todo seu sentido, ela foi esvaziada quanto aos meios e fins de sua proposta, em virtude de uma crescente desvalorização da morte.

3. Correlação entre ritos e práticas funerárias

Quanto aos ritos, no catolicismo romano, não existe um rito que possamos comparar com a ritualização contida no Thödol, isto é, com a Grande libertação pela auscultação. O único rito católico que precede à morte é o Sacramento da Unção dos Enfermos, também chamado de Extrema-Unção124. Todavia, não podemos tê-lo como parâmetro de comparação por possuir meios e fins incompatíveis com o rito budista, são de natureza distinta.

Este rito católico, cuja natureza é sacramental125, geralmente se realiza num breve espaço de tempo. Nele, o sacerdote administra o sacramento da unção através de um roteiro litúrgico específico para este fim, como também asperge água benta em um ou vários enfermos ao mesmo tempo. Esta celebração pode ser realizada tanto na casa do moribundo, como no hospital ou na igreja. Geralmente os que recebem o sacramento em casa ou no hospital são aqueles que estão num estágio avançado da doença. Quando se realiza o sacramento da unção na igreja é porque os enfermos não estão na iminência do perigo da morte (cf. CNBB, 2000, p. 414-416).

Segundo o catecismo, os efeitos desta celebração no enfermo, são: um dom particular do Espírito Santo; a união com a paixão de Cristo; uma graça eclesial e uma preparação para a última passagem. Em outras palavras, os efeitos sacramentais proporcionam um reconforto e coragem para enfrentar os sofrimentos causados pela doença ou velhice. É um sacramento realizado exclusivamente pelos bispos e presbíteros da igreja, deste modo, possui também o efeito de absolvição

124 A unção dos enfermos ou extrema-unção, como é mais conhecida, se caracteriza por ser um rito

sacramental da igreja que visa atender aos doentes, aqueles que correm perigo de morte, seja por doença, debilitação física ou velhice. Por ser cada vez mais conferido aos agonizantes, este sacramento ficou conhecido como extrema-unção (cf. CNBB, 2000, p. 415-416).

125 Esta natureza sacramental significa que o rito foi instituído por Jesus Cristo, com o objetivo de

dos pecados (cf. CNBB, 2000, p. 416,419). O sentido deste rito está na sua utilidade, que é dar conforto ao moribundo126 que está em vias de morrer, quanto a resignar-

se com a doença, mantendo viva a fé e a esperança.

Já o rito budista, que também começa antes da morte, ultrapassa o estado jacente e continua pelo estado de morte, até que se tenha a certeza da saída da consciência. Geralmente é um rito longo, pois que dependerá de cada devoto, se ele teve ou não um treinamento prévio. Requer um guia espiritual o tempo todo junto ao moribundo ou morto para poder introduzir as orientações (que são muitas) contidas no Thödol. É um rito extremamente ordenado, com início, meio e fim previamente determinados. Cada rito é destinado a uma única pessoa, visto que, as instruções são dadas bem junto ao ouvido do morto. Aqui, o sentido está na finalidade de instruir o moribundo/ morto a encaminhar a consciência para alcançar a iluminação, ou pelo menos, para um novo nascimento.

Como vimos acima, não temos parâmetros para uma análise comparativa entre os dois ritos, o católico “sacramental” e o budista “orientador”, por possuírem naturezas diferenciadas. Contudo, poderíamos compará-los enquanto rito religioso, vivenciado pelo praticante de ambas as tradições, mas sem a pretensão de associá- los a um mesmo fim. Dessa forma, qualquer análise comparativa fugiria do nosso propósito. Todavia, podemos analisar os costumes e as práticas funerárias que sucedem à morte em ambas as tradições.

Um dos costumes do catolicismo que é extremamente diferenciado do budismo se refere ao uso do caixão e a inumação. Comumente o católico se utiliza do caixão para enterrar seus mortos, pois é um costume antigo, como vimos no primeiro capítulo. Porém, na antiguidade e também na idade média, frequentemente os cristãos mais pobres se utilizavam de lençóis e da padiola para enterrarem os mortos. Somente os mais abastados eram enterrados em caixão (ataúde). Ainda hoje continua o costume de usar o caixão, independente da classe social.

No catolicismo, o sentido de enterrar os mortos está contido na Sagrada Escritura, quando diz que o homem voltará a terra, pois dela foi tirada, portanto, o homem é pó e ao pó retornará (Gn 3, 19 – Livro do Gênesis, capítulo três, versículo

126 Acreditamos que este rito ofereça também um conforto para a família, principalmente quanto à

dezenove). Este é um dos motivos, talvez o principal, do enterro ser a prática mais comum entre os cristãos, o segundo, acreditamos que a prática de enterrar responde melhor a questão da fé na ressurreição.

No budismo tibetano, não há o costume de utilizar caixões nos seus funerais como os ocidentais fazem, pois, suas práticas diferem um pouco das práticas católicas. Seu uso é desnecessário, visto que a prática funerária comumente realizada pelo tibetano comum é o funeral no céu. Neste tipo de funeral, o morto é envolto em um lençol e levado num tipo de padiola até o local onde o corpo (já em decomposição) será desmembrado, os ossos esmagados até virar uma farinha e ofertado à natureza, para que as aves do céu possam se alimentar. Neste ritual sagrado, o corpo se torna a própria oferenda, para que dele a natureza possa tirar proveito, alimentando outros seres.

Todavia, segundo Peacock (2005, p.124-125), o uso do caixão no budismo tibetano fica restrito àqueles que morreram em decorrência de doença contagiosa e aos marginais (assassinos e outros criminosos). Como vimos no segundo capítulo, “para estes o funeral no céu é proibido”. Outro costume marcante que vislumbramos no budismo é quanto ao comportamento dos familiares antes e após os atos póstumos. Não é recomendado qualquer tipo de demonstração de pesar enquanto o corpo ainda está na casa, por dificultar o renascimento. No catolicismo atual, não há nenhuma interdição neste sentido, os familiares podem dar vazão aos seus sentimentos, porém, sem exageros, diferentemente dos excessos praticados pela cristandade medieval.

Após o funeral budista, a família tem o costume de alterar seu cotidiano por recomendação do lama. Atitudes simples como pentear os cabelos, falar alto, lavar o rosto, dentre outras, se tornaram regras a serem observadas, assim como cobrir todos os espelhos da casa, tudo isso tinha como objetivo facilitar o renascimento do falecido. Atitudes parecidas com estas, encontramos também somente na cristandade medieval, não mais na contemporânea. Não existe nenhuma regra católica relativa a tais atitudes, até porque não teria sentido em se tratando de ressurreição. No caso do budismo faz sentido por sua concepção de pós-morte ser a reencarnação ou renascimento.

Durante o funeral, bem como na condução do corpo para sua destinação final, destacamos algumas peculiaridades. No budismo, o mestre espiritual e as carpideiras fazem parte do contexto fúnebre, juntamente com a família e amigos, cumprem todo o trajeto até o local da prática funerária. No catolicismo atual, não se tem mais o costume de contratar as carpideiras, pois isto foi uma prática relativamente comum no medievo. Quanto à presença dos padres no funeral e no enterro ou cremação do católico comum, ainda é um fato verificado com restrição. O próprio livro das exéquias abre espaço para o laicado da comunidade católica, quando permite que este conduza todo o ritual fúnebre, desde o velório até o sepultamento e a deposição das cinzas na urna.

Com relação às práticas funerárias, no budismo evidenciamos um total de cinco, incluindo a prática restrita aos grandes mestres, que é o embalsamamento. Cada prática dessas dá uma destinação diferente aos corpos, porém, vale salientar, que a concepção de um pós-morte permanece a mesma. O que muda é o simbolismo que permeia cada prática e também as indicações dadas pelos lamas