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Quanto a esta problemática da cultura de m assa, o governo militar posicionou-se da seguinte forma: com o propósito de incentivar a cultura brasileira, os

PROJETO CULTURAL

45 Quanto a esta problemática da cultura de m assa, o governo militar posicionou-se da seguinte forma: com o propósito de incentivar a cultura brasileira, os

militares proporcionaram a implantação da infra-estrutura tecnológica do sistem a de telecomunicações, infra-estrutura esta explorada pela empresa privada. Porém, Renato Ortiz, ao destacar a oposição cultura e técnica no discurso do Conselho Federal de Cultura, que, segundo o autor, se reproduz através da categoria do “hum anism o”, mostra que o Conselho defende a cultura popular, vista aqui no sentido de folclore, (que no caso representaria a cultura) em detrimento da cultura de m assa (que representaria a técnica). A contradição exposta aqui, ou seja, o fato de o Estado, disseminador do capitalismo, absorver um discurso que se contrapõe à modernização explica, segundo Ortiz, o porquê da incapacidade dos intelectuais tradicionais de elaborarem um plano nacional de cultura, fazendo com que o Estado se volte para outro tipo de intelectual, os administradores. Enquanto Argumento põe em cheque a cultura de m assa em relação à cultura erudita, o CFC se preocupa com a cultura de m assa em relação à cultura popular, folclórica, o que vem ao encontro da política de turismo implantada e que, sobretudo no Nordeste, causava um a mercantilização da cultura popular. Por outro lado, como a crítica à cultura de m assa não se adequava aos ideais de modernização do governo, preferiu-se romper com os intelectuais em questão e dar lugar a cultura massificada.

Literatura e crítica

Verificou-se que Argum ento traz à to n a a s diferenças sociais do B rasil d a época e m arca, com isso, a posição de se r u m meio esclarecedor de d e n ú n c ia dos problem as sociais e de resistên cia ao regime en tão im posto, configurando-se u m a publicação c o n tra a d ita d u ra , à esq u e rd a do p en sam en to político e c u ltu ra l in stitu íd o voltado p a ra ideais conservadores. A lite ra tu ra n a rev ista tam b ém não ficou fora deste posicionam ento, j á que e ra to m ad a como p a rte form adora d a totalidade d a c u ltu ra p e n sa d a pelo periódico. A crítica literária tin h a tam b ém u m a p o s tu ra p a rtic u la r coerente com os objetivos e com o posicionam ento d a rev ista e, por isso, to rn a-se u m a im p o rtan te q u estão a ser refletida d en tro do projeto c u ltu ra l que e stá se ten ta n d o delinear.

O inform e46 sobre o relan çam en to d a revista Boletim d e

Ariel, publicado n a q u a rta edição, rem ete a u m a polêm ica localizada n a

crítica literária brasileira, a q u al tem como p ro tag o n istas Antonio C ândido e Afrânio C outinho. O a u to r do informe, Paulo Emílio Salles Gomes, co m en ta ironicam ente que, por se r organizada por Afrânio C outinho e conter, no segundo n úm ero, u m a p redom inância de artigos do próprio organizador, a revista - Boletim d e Ariel -, então relan çad a, poderia receber u m a “m elhor” denom inação: Boletim de Afrânio

Coutinho, e s u s te n ta que Afrânio c o n tin u a, n a q u elas páginas, a explicar

a “nova crítica”.

Antonio C ândido e o u tro s colaboradores d a á re a literária em Argumento, como Roberto Schw arz, Davi Arrigucci e Jo ão Luiz Lafetá, “discípulos” de Cândido, prim am p o r u m tipo de análise do literário que co n sid era os elem entos ex tratex tu ais, p ro cu ran d o estabelecer a s relações en tre a lite ra tu ra e a sociedade, trab a lh a n d o com u m a leitu ra dialética. Por isso e s ta crítica p a sso u a ser conhecida por “crítica dialética” ou “sociológica”.

E sta perspectiva de crítica já havia sido tra ta d a , de c e rta form a, em o u tra s g ran d es o b ras de Antonio Cândido: Formação d a

literatura brasileira: m om entos decisivos, p re p a ra d a e redigida en tre os

a n o s de 1945 e 1951 e p u b licad a em 1959; e Literatura e sociedade, p u b lic a d a em 1965. Em Formação d a literatura brasileira, o a u to r a p o n ta p a ra o u so de u m m étodo que considere o histórico e o estético

ao m esm o tem po, enfatizando a im p o rtân cia dos fenôm enos

h is tó ric o s/so c ia is n a co n stru ção do literário.47 M as os fatos histórico- sociais, n a s an álises de C ândido, não são focalizados como fatores “de fora”, e sim são su rp reen d id o s no literário, ou seja, o social, segundo o a u to r, h a b ita o literário, e s tá n a co n stitu ição d a e s tr u tu r a deste e, p o rtan to , é tam b ém interno.

Em Literatura e sociedade, m ais precisam ente, no prim eiro e segundo capítulos, o a u to r vai refletir m ais d etidam ente sobre a relação do social com o literário, p ro cu ran d o d iscern ir sociologia d a lite ra tu ra de crítica literária. A este propósito, Antonio C ândido afirma:

“Quando fazemos um a análise deste tipo [crítica literária], podemos dizer que levamos em conta o elemento social, não exteriormente, como referência que permite identificar, na matéria do livro, a expressão de um a certa época ou de um a sociedade determinada; nem como enquadramento, que permite situá-lo historicamente; mas como fator da própria construção artística, estudado no nível explicativo e não ilustrativo.”48

Assim, C ândido n ão d e sc a rta o aspecto estético d a obra, a p e s a r de negar a s a n álises c e n tra d a s a p e n a s n a s qu estõ es estéticas, o “esteticism o m al com preendido”, como o próprio a u to r nom eia. C onsidera o aspecto estético a p a rtir de s u a relação dialética com os

46 Argumento, Rio de Janeiro, n.4, fev. 1974, p. 159.

47 CÂNDIDO, A. “Prefácio da 2 a edição”, in: Formação da literatura brasileira: momentos decisivos. 8. ed. Belo Horizonte; Rio de Janeiro: Itatiaia, 1997. p. 16.

o u tro s fatores. Conforme o au to r, “n a d a im pede que c a d a crítico ressalte o elem ento d a s u a preferência, desde que o utilize como com ponente d a e stru tu ra ç ã o d a o b ra.”49

E ste esteticism o, condenado po r C ândido, tin h a como principal expoente no B rasil outro crítico renom ado: Afrânio C outinho. D esse modo, en q u a n to C ândido publicava n a Argum ento em 1973 se u ensaio “L iteratu ra e subdesenvolvim ento”, no qu al põe em p rá tic a s u a perspectiva crítica, Afrânio C outinho publicava “A lite ra tu ra como fator de nacionalização brasileira” em Tempo Brasileiro, u m periódico que, a p e sa r de in d icar em se u editorial s u a função de “p e n sa r a realidade brasileira”50, d escartav a de s u a s reflexões os problem as sociais p re sen te s n e s ta realidade.

Tais publicações m arcam a co n tin u ação de u m a polêm ica que vem se delineando desde os an o s 50. Foi n e s ta d écad a que Afrânio C outinho escreveu tam b ém s u a h istó ria d a lite ra tu ra - A literatura no

Brasil -, ata c a n d o a crítica histó rica e defendendo c e rta au to n o m ia do

literário, do intrínseco. P ara o au to r, a lite ra tu ra é u m a a rte e a h istó ria literária é a h istó ria d e ss a a rte e não d a c u ltu ra , posição e s ta que tem b ase n o s e stu d o s do N ew criticism norte-am ericano: “o conceito d o m in an te do livro é literário, isto é, e n c a ra a lite ra tu ra como literatu ra, reduzindo-se por isso aos gêneros p ro p riam en te literários”51, afirm a o au to r. É n este sentido que, no ensaio publicado n a revista Tempo

Brasileiro, Afrânio C outinho p ro cu ra com provar que a nacionalização é

u m a c o n sta n te n a evolução do p en sam en to brasileiro. S u s te n ta que:

“A autonomia literária não deve ser colocada em termos políticos, não tem conteúdo e significado

político, nem deve ser identificada com a

independência política. Os dois processos podem coexistir, ser paralelos, porém um não depende do

49 Idem. Ibidem. p. 7.

50 COUTINHO, A. A literatura como fator de nacionalização brasileira. Tempo