• Nenhum resultado encontrado

4.1 TEORIZAÇÕES DA AVALIAÇÃO NA PERSPECTIVA DOS

4.1.2. Quem avalia?

Ao reconhecer alunos e professor como protagonistas da constituição do processo educativo, a avaliação, na perspectiva investigativo-formativa, compreende que uma das primeiras tomadas didático-pedagógicas no avaliar é levar os aprendentes a se verem como autores dessas práticas e, com isso, do ensinar e do aprender. Esse agir ético e estético confere produções de alteridades (BAKHTIN, 2008) a quem avalia e é avaliado, necessárias a uma prática educativa que projeta aprendizagens com vistas à formação humana autônoma.

A construção da alteridade está fundamentada no modo como é dado vez ao sujeito para narrar sobre si, sobre suas interpretações do mundo e dos outros. Para isso somos desafiados a nos ver como escritores de nossa história de vida, no modo contínuo de inventariar nossas experiências de aprendizagem. Contudo, essa constituição não é isolada; é produto de um processo dialógico (FREIRE, 2001) do aprendente consigo mesmo e com os outros: professor, colegas, família etc.

63

Para Bakhtin (1992, 2008) o sujeito se constitui no processo da interação dialógica com os outros com quem se relaciona em sua história. A linguagem está sempre em movimento, sempre inacabada, susceptível de renovação pela dependência da compreensão que acontece no diálogo, no qual se constitui a singularidade, pelo fato de a intersubjetividade ser anterior á subjetividade e de a relação entre interlocutores ser responsável pela construção de sujeitos produtores de sentidos. Desse modo, o autor coloca que compreender os atos dos sujeitos é tomar seus enunciados na direção desta como uma atitude responsiva, ou seja, implica uma ação concreta dotada de intencionalidade (isto é, não involuntária) praticada por alguém. Bakhtin (1992) destaca o caráter da responsabilidade do sujeito na produção da enunciação, ou seja, no responder pelos próprios atos, na relação com a responsividade, o da produção de respostas a alguém ou a algo.

175

Portanto, é fundamental que a prática avaliativa atue nos encontros e desencontros das práticas de leituras (CERTEAU, 1996) do ensino e aprendizados de professores e alunos: partindo da noção de que o aprender é um processo inventariado nessa dialogia. Destacamos que é de responsabilidade do docente levar os aprendentes a se perceberem como protagonistas da ação avaliativa, assumindo a postura de mediador do processo educativo, conferindo-lhe lugar de autoridade negociada. Esse fazer se constitui, fundamentalmente, na centralidade de abertura à escuta dos educandos, instigando-os a narrar-se: rememorando o praticado com o conhecimento compartilhado e constituindo sentidos que projetam experiências de aprendizagens.

É no compromisso com uma formação do sujeito autônomo que é necessária uma concepção dialógica (FREIRE, 2001) de prática avaliativa. Por esse fazer, a escuta das narrativas é sua marca ambiciosa na: reflexão para ação do processo de construção do conhecimento. Avaliar narrando-se exige assumir o conflito, as relações de força entre opiniões formadas, sugeridas, além de humildade e responsabilidade, ao aceitar a necessidade de mudanças na prática educativa, para aperfeiçoamento da projeção do aprendizado.

Salientamos que o processo formativo também é do professor, pois o diálogo com os alunos, na escuta de suas narrativas, leva-os ao exercício da pesquisa da promoção do aprender e, com ele, da (re)significação de sua atuação profissional. Essa ação investigativa desenvolve processos (auto)formativos e aprendizagens com o ensinar.

A opção pela exterioridade do olhar avaliativo vem impedindo que movimentos de interpelação do vivido no cotidiano escolar da educação básica possam acontecer entre os autores, subtraindo a potência formativa do encontro. Os múltiplos protagonistas em ação devem somar-se nas leituras entrecruzadas que fazem a realidade vivida ser revisitada e aperfeiçoada, tendo, como produto desse processo, aprendizagens projetadas. É esse fazer que se responsabiliza pelo não desperdício das experiências (SANTOS, 1989) do aprender de professores e alunos.

176

Por isso, chamamos a atenção, na prática avaliativa investigativo-formativa, para o modo como as intencionalidades são diferenciadas e, ao mesmo tempo, congruentes das leituras do vivido pelo professor e pelo aluno. O encontro reside no foco da promoção do aprender com a construção do conhecimento. Já o diferencial está no como cada sujeito se posiciona para ocupar o lugar da invenção do processo educativo.

Reconhecemos o lugar aula, em seu jogo de troca de posições entre professor e aluno, com vistas à tessitura do aprender. Se, em um primeiro momento, o docente, ao sugerir uma ação pedagógica, se apresenta em um lugar estratégico (CERTEAU, 1994), ao compartilhar o que se tem a aprender; por outro, o aluno, ao consumir o que lhe é ofertado, produz, taticamente, espaços singulares e assume, com essa constituição, lugar de autoria e protagonismo ao aprender. Ele, com esse movimento, vai se responsabilizando pelo seu processo formativo.

Dessa maneira, corroborando o pensamento de Esteban (2002), entendemos que a tessitura da prática avaliativa se dá no entrelugar: espaço de negociação dialógica entre as leituras do professor e as do aluno sobre o praticado no processo educativo. Nessa direção, a avaliação está comprometida com a produção do conhecimento, desafiadora e reflexiva, na ação de o docente instigar, por diversificadas maneiras de narrar, a rememoração do vivido e, com isso, também estimular, a todo o momento, o aprendente a constituir múltiplas relações do praticado na escola, com experiências anteriores, gerando, outros sentidos ao aprendido. Esse produto é a marca singular do aluno para expressar o que ele fez com o que aprendeu.

Assim, avaliar, tomando como centralidade o que o aluno fez com o que aprendeu, exige do docente, ação mediadora provocativa de, a todo o momento, levar o aprendente à ampliação das leituras sobre o ensinado. Para isso, o acompanhamento contínuo do professor, nas maneiras diversas como o discente narra o que vem apendendo, é fundamental, pois esses dizeres ofertam os indícios (GINZBURG, 1989) que determinam a necessidade de mudanças nas práticas educativas por meio da sistematização de outras vivências didáticas com o conhecimento. Ao mesmo tempo, cabe ao educador

177

levar o discente a ocupar o lugar de responsivo e responsável da formação de suas aprendizagens.

Como o aluno é protagonista da construção de sua formação humana e escrita de suas histórias de aprendizagens, avaliar também se torna uma prática social na centralidade das narrativas do aprendente. Por isso a perspectiva investigativo-formativa dá centralidade aos alunos como autores do processo avaliativo, em (co)responsabilidade com o professor.

Nesse sentido, assumir os alunos como autores da avalição é entender que sua produção é tecida na polifonia de opiniões, embates e consensos da construção dos conhecimentos e, nesses fazeres, há a formação ética e estética do aprendente, ao levá-lo a se conhecer, a ser desafiado, a saber fazer escolhas, reconhecer os seus erros e vê-los como aprendizado a projeções de outras práticas sociais.

O processo avaliativo deve ser promovido na ação de o professor auxiliar os alunos a assumirem o controle do seu processo de aprendizagem, por meio de ações dinâmicas em que os educandos sejam desafiados a problematizar como aprenderam e o que fizeram com o que aprenderam. Assim, as práticas autoavaliativas são importantes de serem fomentadas, apresentando-se como momentos de reflexão sobre a progressão do aprender, na intenção de, ao narrar suas histórias, o aluno escolher quais caminhos trilhar, no encontro consigo mesmo e com os outros (professor e colegas) que também se (auto)avaliam e avaliam ao outro. Essas ações polifônicas do avaliar se fundamentam na noção de que o processo de aprendizagens se amplia na ideia de que ―A realidade não pode ser modificada, senão quando o homem descobre que é modificável e que ele pode fazê-lo. É preciso: provocar uma atitude de reflexão, que comprometa a ação‖ (FREIRE, 1979, p. 79).

Em síntese, na concepção da avaliação investigativo-formativa narrativa é nos encontros dialógicos dos sujeitos aprendentes, consigo e com os outros que eles se constituem como autores da prática avaliativa e da promoção de aprendizagens. Essa dialogia é incitada pelo professor que, no lugar de mediador, desafia os alunos a assumirem o lugar de protagonistas do processo educativo, ao serem levados a narrar, em diferentes momentos e

178

diversas linguagens, o que aprenderam, bem como apontar como aperfeiçoar o desenvolvimento e a continuidade das construções com o aprender.

Para essa prática docente mediadora, é fundamental que saibamos sobre qual processo de construção de conhecimento a avaliação estará atuando. Isso determina o modo como avaliar pode atuar na projeção das aprendizagens e na escrita da história dos aprendentes.