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CAPÍTULO 2 – OBJETO

2.2 Características do método e técnicas

2.2.1 Quem lida com o método?

No âmbito prático, como atividade social ou empreendedora, o método de monitoramento de redes sociais e suas técnicas pode ser observado como serviços oferecidos no mercado. Deste modo, identifica-se basicamente duas classes envolvidas diretamente com o método: produtores e consumidores.

A esfera da produção exige profissionais qualificados com habilidades específicas que podem ser divididos em dois times: times de negócios (business team) e time técnico (technical team), segundo KAUSHIK (2010, p. 388), compondo líderes e respectivas equipes. O time de negócios é formado pelo que talvez possamos denominar como “vendedores” que ocupam-se do contato direto com o portfólio de clientes e potenciais consumidores, reservam- se à esfera da comunicação institucional e divulgação de técnicas, à participação em eventos ministrando cursos e palestras. Entre esses profissionais há pessoas provenientes do campo da comunicação, da administração e “staff” - equipes de apoio ao serviço que envolve uma gama de profissionais da administração, contabilidade, estatística, profissionais da área de direito e secretariado. O time técnico é formado pelo que talvez possamos denominar como “inventores” que ocupam-se efetivamente com o desenvolvimento e aprimoramento de técnicas de monitoramento. Dentre eles, profissionais do campo da ciência da computação, arquitetura da informação, design de sistemas, matemática, engenharia e estagiários. Esses últimos são como “curingas” que auxiliam no serviço de aplicação de desenvolvimento ou aplicação de técnicas, dedicando-se a determinado problema ou à realização de tarefas específicas, ad hoc, como mineração de dados, análise e classificação de conteúdos. Entre eles: estagiários da comunicação, ciência da informação, ciência da computação e engenharia. Essa classificação quanto à esfera de produção, contudo, não é fixa. E é comum observarmos

maratonas de revezamento entre equipes que ocupam-se de problemáticas em relação às técnicas em que há envolvimento de freelancers ou de serviços terceirizados para a oferta de cursos ou treinamento de consumidores quanto ao uso e emprego de software. Como explica RADAFAHRER (2012):

À medida que as redes se tornam mais rápidas, móveis, versáteis e seguras, os profissionais passam a se organizar em equipes mais distribuídas, principalmente em empresas de serviços. Dois motivos contribuem para essa pulverização: o alto custo de se manter todos os profissionais em um único endereço e a maior facilidade de se encontrar talentos em vários mercados. A administração de equipes terceirizadas ou remotas, no entanto, não é tão simples. À medida que o tempo passa, profissionais vão sendo substituídos e as necessidades locais acabam se sobrepondo às demandas do resto da rede. Para piorar a situação, muitas tarefas são de longo prazo, ou não têm a começo ou final claramente determinado. Administrar uma equipe nessas condições se torna uma tarefa difícil como liderar uma equipe de revezamento em uma maratona. (RADAFAHRER, 2012, p. 69).

Deve-se ressaltar, como mencionou o autor, a velocidade de ações e decisões exigidas de profissionais que acompanham a dinâmica de serviços oferecida pelo método de monitoramento. O volume fluxo de dados que atravessa o software atende tanto à demanda de empresas de pequeno e médio porte quanto a grandes corporações. Há planos de serviços disponíveis para cada perfil de cliente/consumidor e o preço parace basear-se, fundamentalmente, no volume de dados mensal – conteúdos gerados por usuários - que precisam ser armazenados e estar disponíveis para acesso. A grande maioria de técnicas de monitoramento é paga, conforme constatou MILIC (2013, p. 11) em análise de 250 tipos de software. Entretanto, há técnicas gratuitas, há técnicas em versão fremium que permitem aos consumidores experimentar ou dão acesso a uso livre por determinado período de tempo, técnicas gratuitas e técnicas em versão beta-teste. A maioria de técnicas de monitoramento, segundo a autora, concentra-se nos em países como EUA, Inglaterra e Canadá, MILIC (2013, p. 14).

Classificação para equipes que lidam com o método de monitoramento foi proposta em JACKSON (2011, p. 11) que incluiu a categorias de analistas, ocupada por pesquisadores ou profissionais que encarregados da análise de dados. Segundo o autor o método foi capaz de alterar rotinas práticas de agências de publicidade e empresas a partir do momento em que transformou-se em “braço” ou em extensão de serviços já oferecidos em multinacionais dos ramos da publicidade e tecnologia. Essas alterações incluem a criação de novos postos de trabalho e profissões inseridas dentro do que o autor denominou como the hub hierarchy ou “hierarquia do hub”:

Dentre habilidades exigidas por profissionais que se ocupam do método de monitoramento de sites de redes sociais estão: uso e manejo de dados, ter experiência com diversas ferramentas ou recursos técnicos, manter-se atualizado e aprimorar conhecimentos para a inovação (inclui educação formal – cursos, palestras ou informal – buscar informações sobre técnicas e aprender por meio da experiência de outros profissionais), ser investigador de dados, conhecer conceitos básicos de estatística, saber trabalhar junto a equipes de negócios, manejar software de visualização de dados, ter know-how em criação e apresentação de dados. Essas habilidades foram descritas e detalhadas em KAUSHIK (2010, p. 393 a 398).

No âmbito do consumo encontra-se uma grande variedade de clientes, desde indivíduos, personalidades públicas, celebridades, órgãos do governo, agências de publicidade que vendem serviços de monitoramento terceirizados, empresas de pesquisa, universidades, etc. É possível observar, igualmente, a existência de hierarquias entre consumidores do método, pois há responsáveis pelo budget ou contratação do serviço (diretores de empresas, vice-presidentes, diretores de instituições ou diretores de marketing) e aqueles que efetivamente utilizam a técnica para alcançar metas definidas por outrem. Esses são, em sua grande maioria, jovens estagiários das áreas de comunicação, estatística, ciência da computação e ciência da informação que atuam diariamente na interface do software realizando atividades orientadas por diversos objetivos quanto aos resultados que se busca extrair de técnicas. GALLOWAY (2012, p. 89), menciona a influência de interfaces de

Figura 4: The Hub People Fonte: JACKSON (2011, p. 9).

software em reverberar ideologias e alegorias da vida cotidiana.

A questão não é simplesmente a funcionalidade do software, mas o falseamento provocado pela interface de software acerca da tensão entre o maquínico e a narrativa, entre o funcional e o disciplinar, o fluido e o fixo, o digital e o analógico, trata-se de uma imagem alegórica para o modo como aspectos políticos e sociais da realidade são resolvidos atualmente[...] pelas regras do código[...] (GALLOWAY, 2012, p. 89).

Considerando design de software para apropriação através de estudos etnográficos, DIX (2007) ressaltou dois aspectos importantes em processos de interação com interfaces: improvisação, adatação. Dentre vantagens apresentadas por processos de apropriação encontram-se intervenções contextuais, dinâmicas e necessidades de mudança nos ambientes e a posse da tecnologia, que pode ser desde o simples sentimento de controle, orgulho pela utilização do software até a subversão. De alguma forma, “apropriar-se” significa não “jogar segundo as regras” estabelecidas pelos programadores, mas refere-se à habilidade do usuário final de adaptá-las para situações de interação ou alcançar objetivos definidos que podem ser incluir objetivos de interesse pessoal. É nessa instância de consumo prático de técnicas de monitoramento que poderíamos dizer ou observar fenômenos em que limiares entre sujeto humano e objeto sujeito se mesclam no método e o que ocorre é a hibridização entre o violeiro e a sua própria viola, em que um passa a ser também o outro, e vice-versa, por causa da música que se quer tocar. Sentimentos despertados pelo uso da tecnologia são tão importantes quanto atividades que realizamos por meio dela.

Em última instância na cadeia de consumo, pessoas que lidam com técnicas de monitoramento, geralmente, adquirem o hábito de “abrir” a <<ferramenta>> como “a primeira tela do dia”. E ela permanece ali, lado a lado junto à tela de e-mail e sites de redes sociais. Há uma convivência cotidiana velada entre esses “autômatos” e consumidores. Certamente soluções de monitoramento sabem muito sobre nós, pois foram programadas para observar e registrar informações que nos dizem respeito. Por outro lado, nós, que lidamos e extraímos objetivamente delas resultados conhecemos pouco sobre sua biografia. Pode-se dizer que técnicas de monitoramento, ao serem consumidas, explicitam certas propriedades ergódicas. Hipóteses sobre sistemas ergódicos foram introduzidas por Boltzmann, em 1871, para descrever cálculos sobre sistemas dinâmicos em que ocorre o movimento de fluidos ou gases ao ocupar espaço sobre superfícies irregulares, WALTERS (1982). Conceito e características ergódicas foram adaptadas à ciência da computação. De modo amplo e, traduzindo o conceito para as ciências humanas, a ergodicidade de sistemas pode ser

caracterizada como a ocupação de espaço que determinados grupos de software exercerm em nosso cotidiano:

Em sua interpretação mais ampla a teoria ergódica é o estudo das propriedades qualitativas de ações de grupos em espaços. O espaço tem uma estrutura (por exemplo, o espaço é um espaço de medida, ou um espaço topológico, ou uma variedade suave) e cada elemento do grupo atua como uma transformação no espaço e preserva a estrutura dada (por exemplo, cada elemento actua como uma medida transformação preservando, ou em uma transformação permanente, ou em uma transformação suave). (WALTERS, 1982, p.1).

Ao analisar a estrutura de software, DODGE e KITCHIN (2004) denominam movimentos de “ocupação” de sistemas por “transdução” de espaços. Pessoas e dispositivos tecnológicos que convivem em meio a complexas redes de mobilidade, interações e transações encontram-se vinculadas através de diferentes níveis ou escalas. A natureza “instantânea de infraestrutura e processamento de códigos em escalas 'locais' e 'globais' transforma-se em redundância em cada rede, simultaneamente, conectando pessoas, objetos e espaços”, DODGE e KITCHIN (2004, p. 12 e 13). Para os autores características de transdução de espaços não são resultantes de causa e efeito, mas contigentes, negociadas e repleta de nuances. De semelhante modo, TAEFEL (2015) observou maneiras como a atual technocultura contemporânea afeta e exerce impacto na construção e percepção de tempo e espaço, ou seja, nossa própria realidade. Essa dimensão não escapa aos “inventores” de técnicas de monitoramento. Cientes do tempo de vida que se passa consumindo a técnica ou, tocando a viola, muitos serviços de monitoramento agregam jogos, quizzes, mensagens e informações que não só afetam hábitos e práticas de quem lida com interfaces do método, quanto aderem características humanas a códigos.