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3. Matérias legais abordáveis na impugnação

3.7. Inconstitucionalidade da lei que fundou o título judicial (art 475-L, parágrafo

3.7.1. Questão polêmica

O enunciado do parágrafo 1º do art. 475-L é equivalente ao quanto disposto no revogado parágrafo único do art. 741 do Código de Processo Civil: “para efeito do disposto no inciso II deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou em aplicação ou interpretação tidas por incompatíveis com a Constituição Federal”, acrescentado inicialmente pela Medida Provisória nº 1.997- 37/2000 – a qual vigia por força da Medida Provisória de nº 2.180-35/2001 –, e foi definitivamente incorporado ao Código pela Lei 11.232/2005, a par das muitas polêmicas que pesam sobre ele.

Em artigo publicado em julho de 2005, investigando o sentido e o alcance do disposto no art. 741, parágrafo único do CPC, Teori Albino Zavascki já mencionava a polêmica existente na doutrina e na jurisprudência acerca da questão, pontuando as seguintes correntes: i) “Por um lado, há os que simplesmente o consideram inconstitucional por ofensa ao principio da coisa julgada. É posicionamento que tem como pressuposto lógico – expresso ou

108 implícito – a sobrevalorização do principio da coisa julgada que estaria hierarquicamente acima dos outros princípios constitucionais, inclusive o da supremacia da Constituição” 45; ii) “Há, por outro lado, corrente de pensamento situada no outro extremo, dando prevalência máxima ao principio da supremacia do Constituição e por isso mesmo, considerando insuscetível de execução qualquer sentença tida por inconstitucional, independente do modo como tal inconstitucionalidade se apresenta ou da existência de pronunciamento de STF a respeito, seja em controle difuso, seja em controle concentrado”46; iii) “Entre as duas citadas correntes (que, com suas posições extremadas, acabam por comprometer o núcleo essencial de principios constitucionais, o da supremacia da Constituição ou o da coisa julgada) estão os doutrinadores que, reconhecendo a constitucionadade do dispositivo, buscam dar-lhe o alcance compatível com seu enunciado”47-48.

45 ZAVASCKI, Teori Albino. Embargos à execução com eficácia rescisória: sentido e alcance do

art. 741, parágrafo único do CPC. In: Revista de Processo. Ano 30, nº. 125, jul. São Paulo:

Revista dos Tribunais, 2005. p.79

46 Idem. p.80

47 Idem. p.81

48 E assim conclui tal raciocínio: “Mesmo entre esses, todavia, há divergências. Há quem sustenta

que a inexigibilidade do título executivo judicial seria invocável apenas nas restritas hipóteses em que (a) houver precedente do STF (b) em controle concentrado de constitucionabilidade, (c) declarando (ainda que sem redução de texto) a inconsitucionabilidade do preceito normativo aplicado pela sentença exequenda (Nesse sentido, v.g.: ASSIS, Araken de. ‘Eficácia da coisa julgada inconstitucional’, Revista Dialética de Direito Processual – RP 4:9-27). E há quem vê no texto normativo um domínio maior, abarcando não apenas as situações referidas, mas também (a) quando a sentança exeqüenda der aplicação a preceito normativo declarado inconstitucional pelo STF em controle difuso e suspenso por resolução do Senado (CF, art. 52, X); e também (b) quando a sentença exeqüenda nega aplicação a preceito normativo declarado constitucional pelo STF, em controle concentrado (Nesse sentido, v.g.: TALAMINI, Eduardo. ‘Embargos à execução de título judicial eivado de inconstitucionalidade (CPC, art. 741, parágrafo único)’, Repro 106:38- 83)”. Idem. Obra citada. p.81

109 Havida a reforma processual e a definitiva inserção do dispositivo no Código de Processo Civil através de Lei, e não mais através de Medida Próvisória, remanece a polêmica, lembrada por Ernane Fidélis dos Santos ao analisar a inconstitucionalidade como motivação da impugnação49. Para ele a celeuma

subsiste, pois “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada” (art. 5º, XXXV, CF).

Nos últimos tempos, muitos questionamentos surgiram a respeito, e alguns doutrinadores criaram teses para romper a rigidez da coisa julgada e relativizar esse ‘dogma’, entre eles José Augusto Delgado50, Humberto Theodoro Júnior e Juliana Cordeiro de Faria51 e Cândido Rangel Dinamarco52.

A questão também foi mencionada por Cássio Scarpinella, o qual a justificou a controvérsia pela existência de ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil contra o dispositivo em comento, sob o argumento de violação, por ato infraconstitucional, da coisa julgada, agasalhada como cláusula pétrea no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal53.

49 SANTOS, Ernane Fidélis dos. As reformas de 2005 do Código de Processo Civil. São Paulo:

Saraiva, 2006. pp.63-65

50 DELGADO, José Augusto. Efeitos da coisa julgada e os princípios Constitucionais. In: Coord.

NASCIMENTO, Carlos Valder do. Coisa Julgada Inconstitucional. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004. p.40

51 FARIA, Juliana Cordeiro de; THEODORO Jr. Humberto. A coisa julgada inconstitucional e os

instrumentos processuais para o seu controle. In: Coord. NASCIMENTO, Carlos Valder do. Coisa

julgada inconstitucional. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2004. p.125

52 DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma do Processo de Execução e o Problema da Coisa

Julgada Inconstitucional. In: Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil. Ano V, n° 29,

mai.-jun. Curitiba: Síntese, 2004. p.17. Nota: assunto também tratado em Revitalizar a coisa

julgada material. In: Revista de Processo. Ano __, nº 109, jan.-mar. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2003; Nova era do processo civil. São Paulo: Malheiros, 2007.

110 A primeira delas foi intentada quando houve a inovação do parágrafo único art. 741 do CPC (ADI n. 2.418) e, rigorosamente, perdeu seu objeto com as reformas. No entanto, permanecem os autos conclusos com o Relator Cezar Peluso, sem qualquer movimentação processual desde 08/10/200454. A segunda foi proposta quando entrou em vigor da Lei nº. 11.232/2005, a qual renovou o dispositivo e lhe deu a forma atual, e foi distribuída (ADI nº. 3.740) por prevenção ao ministro Cezar Peluso. Os autos permanecem, agora, com vistas ao Procurador Geral da República desde 26/09/2006 55.

Cássio Scarpinella faz severa crítica sobre o assunto: “pode a declaração de inconstitucionabilidade de lei ou ato normativo ou uma aplicação ou interpretação tidas por contrárias à Constituição Federal tirar juridicidade (rectius, exigibilidade) de título executivo mesmo naqueles casos em que a sentença condenatória que o formou ter transitado em julgado? A possibilidade de retroatividade das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em ações diretas de inconstitucionabilidade e em ações declaratórias de constitucionabilidade (Lei n. 9.868/99, art. 27) não agride a coisa julgada, protegida pelo inciso XXXVI do art. 5º da Constituição Federal? Faz diferença, para fins de aplicação do dispositivo, que o trânsito em julgado do ‘título executivo’ já se tenha dado há mais de 2 anos? Esta hipótese de ‘inexigibilidade de título’, tal qual criada, é – ao menos é o que o texto da lei quer – mais poderosa que qualquer ação rescisória jamais concebida pelo direito nacional”56.

54Disponível em:

http://www.stf.gov.br/processos/processo.asp?PROCESSO=2418&CLASSE=ADI&ORIGEM=AP& RECURSO=0&TIP_JULGAMENTO=M. Acessado em 29/01/2008 às 16:50 horas.

55Disponível em:

http://www.stf.gov.br/processos/processo.asp?PROCESSO=3740&CLASSE=ADI&ORIGEM=AP& RECURSO=0&TIP_JULGAMENTO=M. Acessado em 29/01/2008 às 16:51 horas.

111 A questão não pareceria ser tão polêmica e não causaria tamanha euforia caso fosse analisada pelo devido ângulo. Não se trata de relativizar a coisa julgada, tampouco de uma nova e extraordinária hipótese de rescisão da coisa julgada57, mas, tão somente, de uma forma de declarar a inexistência de uma sentença a qual não tem o condão de transitar em julgado58. Explica-se: o título judicial fundamentou-se em lei declarada inconstitucional, ou seja, em lei que nunca entrou no ordenamento jurídico e, assim, não poderia ser aplicada. Frise-se que não pode subsistir sentença com base em lei que não existe.

Esse é o entendimento de Araken de Assis: “A remissão do inciso II do art. 475-L esclarece que o desaparecimento da base legal da condenação se passa no plano da eficácia, apagando-lhe o efeito executivo e a indiscutibilidade resultante da coisa julgada (art. 467), motivo por que cabe a impugnação, e, não, ação rescisória”59.