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A partir de (i) recomendações gerais da literatura sobre a importância da argumentação para a vida das pessoas, para a educação, e especificamente, para o Ensino de Ciências; (ii) recomendações específicas da literatura a respeito da potencialidade do ensino fundamentado em modelagem para o desenvolvimento da argumentação científica; (iii) minhas observações, enquanto professora, sobre a potencialidade de atividades fundamentadas no diagrama Modelo de Modelagem para favorecer o desenvolvimento desse raciocínio; decidimos investigar como o ensino fundamentado em modelagem pode contribuir para o desenvolvimento da argumentação de estudantes do ensino médio. Inicialmente, tínhamos o intuito de realizar tal análise a partir da avaliação das habilidades investigadas por Kuhn (1991) (apresentadas na seção 2.5, páginas 43 e 44).

Durante os anos de 2008 e 2009, nos preocupamos em propor um instrumento de coleta de dados (entrevista) (Mendonça, Correa, & Justi, 2009; Mendonça & Justi, 2009c) que pudesse ser utilizado para avaliar essas habilidades dos sujeitos antes e após a instrução por modelagem em dois contextos distintos: ciências sociais (inspirados nos problemas investigados por Kuhn (1991)) e ciências naturais (inspirado no material IDEAS (Osborne et al., 2004b) e na modelagem). A escolha dos dois tipos de problema se deveu à busca por elementos para perceber se havia ou não transferência de habilidades de um contexto ao

outro – algo não consensual na literatura. A ideia de acessar as mesmas habilidades em dois

momentos distintos visava favorecer a discussão sobre a evolução dos sujeitos antes e após o ensino por modelagem.

Assim, em 2009 foi realizada a coleta de dados visando buscar elementos para responder as seguintes questões de pesquisa:

1. Quais habilidades argumentativas são desenvolvidas pelos alunos ao participarem

do processo de modelagem?

2. Como essas habilidades se relacionam com as fases do processo de modelagem?

3. Como a modelagem contribui para o desenvolvimento dessas habilidades?

4. Quais as habilidades pedagógicas do professor necessárias para a condução da

Com as entrevistas, julgávamos ter dados relativos às habilidades iniciais dos sujeitos, isto é, antes do ensino por modelagem, e as habilidades finais, após o ensino por

modelagem. Assim, a comparação das habilidades e do estudo do processo de ensino – a

partir do levantamento das habilidades evidenciadas pelos estudantes durante o processo, assim como das relações das mesmas com aspectos do diagrama Modelo de Modelagem e com aspectos metodológicos relativos à aplicação das atividades de modelagem, como a atuação do professor – poderia subsidiar a discussão das questões de pesquisa destacadas no parágrafo anterior.

Inicialmente, nosso intuito era aplicar apenas as atividades de ensino por modelagem para o tema ligações iônicas. Mas, devido a observações da pesquisadora quanto à evolução da turma ao longo das atividades, leituras a respeito da necessidade de várias oportunidades para o desenvolvimento das habilidades, bem como a disponibilidade e comprometimento da professora, decidimos aplicar as atividades de ensino de introdução ao temas interações intermoleculares. Tais atividades já haviam sido aplicadas por outros professores e por mim, isto é, já estava validada em nosso grupo de pesquisa.

Após a coleta de dados, percebemos que havia um volume imenso de dados para serem analisados tanto em relação às entrevistas realizadas com os estudantes (dez entrevistas com os mesmos estudantes antes e após a instrução por modelagem para dois temas) quanto ao processo de ensino (dados relativos a três grupos em dois processos de ensino por modelagem). Além disso, ficou evidente que havia uma grande riqueza de aspectos a explorar com esses dados. Devido a isso e, pensando-se no tempo e viabilidade do trabalho de doutorado, decidimos que iríamos explorar os dados relacionados aos alunos visando responder as três primeiras questões de pesquisa listadas anteriormente. Julgamos que outro trabalho de doutorado poderia se ocupar da análise com foco no professor (quarta questão de pesquisa).

No exame de Qualificação, que ocorreu em junho de 2010, foram apresentadas as três primeiras questões de pesquisa e sugestões de como analisar as entrevistas e o processo de ensino visando respondê-las. Entretanto, antes mesmo da realização desse exame, a partir da análise preliminar dos dados do grupo 2 nas atividades de interações intermoleculares, já tínhamos indícios de que o foco nas habilidades argumentativas ao analisar o processo de ensino não era coerente, pois o mais importante era a justificativa do modelo, sua defesa e, quando necessário, sua refutação. Portanto, dar ênfase, assim como

Kuhn, ao descrédito de ponto de vista não nos auxiliaria a compreender a argumentação inerente à modelagem. Essa mesma conclusão foi atingida durante a discussão com a banca

do exame de Qualificação. Além disso, os membros daquela banca fizeram duas sugestões

excludentes quanto à escolha dos dados a serem analisados: foco no argumento enquanto produto, ou seja, a aprendizagem pensada individualmente ou foco no argumento enquanto processo, ou seja, a aprendizagem pensada socialmente. No primeiro caso, a tese teria como foco a análise das entrevistas. No segundo caso, a tese teria como foco a análise do processo de ensino e, para tal, deveria ser proposto um instrumento que fosse mais sensível aos dados que tínhamos e às nossas questões de pesquisa. Em outras palavras, talvez tivéssemos que criar um instrumento próprio e não simplesmente nos basear nas propostas existentes na literatura. Nesse sentido, justifica-se também a exclusão da análise das habilidades argumentativas pesquisadas por Kuhn (como explicitado anteriormente), pois a autora fez uma análise mais clínica, mais individual, fora do contexto de sala de aula. Portanto, a análise da entrevista não faria sentido junto com os dados de sala de aula pelo fato de a metodologia da primeira ter sido voltada para o indivíduo.

Consideramos que analisar o processo, isto é, a construção social do conhecimento por meio da modelagem seria mais relevante para entender como esse tipo de ensino pode favorecer a argumentação científica, pois como apresentado nos capítulos 1 e 2, estudamos a aprendizagem potencializada pela modelagem pensando não apenas no indivíduo, mas levando em consideração o plano social, isto é, as interações entre os alunos e entre alunos e professor, assim como e a relação das mesmas com a construção, avaliação e reformulação de modelos. Nesse sentido, nos focamos na análise dos dados de sala de aula. Entretanto, paralelamente, optamos por continuar o trabalho com as entrevistas, mas isto não será apresentado na tese. Julgamos que trabalhar com elas é importante porque, a partir das análises preliminares, constatamos contribuições para a literatura no que se relaciona à discussão da transferência de habilidades de um contexto ao outro. Isto foi também percebido pela banca do exame de Qualificação a partir das análise preliminares dos dados de dois alunos apresentadas no documento de Qualificação.

Portanto, nesta tese serão apresentados apenas os dados relativos à sala de aula e à criação de um instrumento para análise desses dados com o objetivo de avaliar a qualidade

dos argumentos de alunos do ensino médio a partir do Ensino de Química por modelagem fundamentado no diagrama Modelo de Modelagem e como a modelagem favoreceu a

argumentação. Pretendemos alcançar tal objetivo discutindo as seguintes questões de

pesquisa:

1. Qual a qualidade dos argumentos produzidos por estudantes de ensino médio ao

participar de atividades de modelagem?

2. Existem diferenças na qualidade desses argumentos quando os estudantes

participam de duas estratégias de ensino fundamentadas em modelagem? Em caso afirmativo, quais são elas?

3. Quais são as relações entre atividades de modelagem baseadas no diagrama Modelo

de Modelagem e os argumentos produzidos pelos estudantes?

4. Como atividades de ensino fundamentadas em modelagem podem favorecer o

desenvolvimento da argumentação dos estudantes?

Julgamos que essa investigação é relevante para o Ensino de Ciências, pois, como comentado anteriormente, não há trabalhos voltados especificamente para a análise da relação entre argumentação e modelagem na perspectiva adotada pelo nosso grupo de pesquisa.

CAPÍTULO 4: ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA