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Rádio: Caminho Aberto na Comunicação Entre Acarpa e Agricultores

DESENVOLVIMENTO DO CAPITAL NAS ONDAS DO RÁDIO ∗

2. Rádio: Caminho Aberto na Comunicação Entre Acarpa e Agricultores

Logo visualizam-se os laços que amarravam os programas de rádio e a atuação da ACARPA. A apostila arquivada versa sobre o 1º Treinamento de Comunicação e Metodologia vinculado à Coordenadoria de Metodologia e Comunicação – CORMEC e ao Departamento de Apoio Teórico – DATEC, ambos de autoria do professor assistente Niels Röling do Departamento de Extensão Educacional da Universidade de Wageningen – Holanda. A apostila foi traduzida do original em inglês por Thomas Joseph Burke. Niels Röling apresentou esse trabalho em 1970 no 18º Seminário Internacional de Extensão Rural em Wageningen. O conteúdo estratégico do Seminário trouxe surpresas expressivas, pautadas em idéias elaboradas na indução dos agricultores a aderirem às inovações no campo. O material é recheado de exemplos cristalizados no estudo profundo do comportamento humano e mecanismos adeqüados para interferir no cotidiano do grupo-alvo. Tais aspectos parecem ser o suporte das relações entre a comunicação da ACARPA e a transmissão de programas de rádio. O que surpreendeu foi a intensidade dessa relação, apresentada a partir dos detalhes contidos no documento.

Para se ter uma idéia, já na introdução da apostila, a fala contempla as inovações agrícolas e as considera sem relevância, no caso de não atingir de uma só vez milhares de agricultores. Na prática, trata-se de um programa estruturado a “fazer clientes adotarem ou agirem de acordo com novas idéias introduzidas via agentes de mudanças” (RÖLING, 200?, p. 1). Pode-se, então, enfatizar a forte relação entre o agente comunicador que serve de ponte na ação dos projetos. Assim, a fala executa uma ciranda, interligando os deveres e habilidades que cabem ao agente junto aos “clientes”, como são chamados os agricultores. Devido à preocupação com o sucesso do plano, são realizados estudos detidos na difusão das informações; para tanto, o palestrante revela, em detalhes, os pontos observados junto aos agricultores e reforça que o aparato da comunicação e o

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mostram que a atividade do agente de mudanças está entre os mais importantes fatores que influenciam no comportamento produtivo do cliente” (RÖLING, 200?, p. 1). Assim, a teia discursiva envolve o “agente de mudanças” e faz todas as recomendações para atingir o impacto desejado: a aproximação junto ao agricultor, realizada através de gestos como almoçar em sua propriedade para ganhar confiabilidade e, a partir desse contato, organizar sua atuação. O palestrante reforça a necessidade dos retornos constantes dos agentes às propriedades. Observaram-se críticas feitas àqueles pesquisadores que investem muito de seu tempo em pesquisas e deixam, em segundo plano, a difusão das mesmas, negligenciando assim o poder de modificar o comportamento dos agricultores a partir do “agente de mudanças”.

Para Niels Röling é expressivo ter em mente que todo processo depende da atuação eficiente do agente de campo que, caso necessário, deve retomar e recompor suas estratégias. Mas, muitos agentes não são bem sucedidos e atribuem o fracasso de sua atuação ao agricultor tradicional. No entanto, o professor destaca que o problema não diz respeito ao agricultor e sim à falta de estratégias corretas para a consumação das mudanças, pois a transformação nas técnicas de produção só ocorre após a transformação das pessoas. Assim, “mudar pessoas é uma condição necessária para a aplicação de nossas descobertas técnicas” (RÖLING, 200?, p. 4).

Tais metas indicam que os agentes de campo são treinados, capacitados e sabem tudo sobre novas sementes, fertilizantes e outras informações. Porém, em muitos casos, não recebem o treinamento e os métodos adequados para “mudar pessoas” e para influenciar decisivamente em suas decisões. Dessa forma, pode-se compreender a presença marcante dos agentes de campo no município e a ação marcada pela repetição das informações nos programas, nos quais as mesmas idéias eram repetidas e “o agente de mudança é freqüentemente visto como um rádio que executa seu trabalho se repete a mensagem técnica” (RÖLING, 200? p. 4). Presume-se na fala do professor que a contínua e marcante “transferência de informações” levará o agricultor a adotar as idéias se o mesmo as ouvir várias vezes, e que o agente deve executar sua fala como se fosse um rádio e como a fala é direcionada aos agentes de mudança, o palestrante frisa que seu trabalho não deve ser substituído pelo rádio.

Sabemos que métodos massais [ligados aos meios de comunicação de massa] como o rádio servem muito bem para tornar conhecido o fato de que novas idéias existem [...]. Os métodos massais, por si mesmos, normalmente, não são capazes de influenciar pessoas para agirem de acordo com as novas idéias (RÖLING, 200?, p. 5).

Dessa forma, as fontes jornalísticas serão abordadas num contexto em que os “agentes de mudança” têm papel destacado, pois estão intimamente vinculados a projetos externos e internos de divulgação de mensagens que sinalizam para a transformação do cotidiano rural. Neste cenário, o rádio foi o caminho utilizado para informar e repetir determinados valores aos agricultores, incitando o desejo de mudanças que permitiu a promoção das novas idéias e a incorporação das novas técnicas no campo.

O papel do agente não é o de apenas transferir as inovações, mas deve também mostrar como aquela informação técnica pode ajudar os agricultores a satisfazer suas necessidades. Em outros termos, após um estudo detalhado dos valores e de todo o processo estratégico de

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indução, os agentes transferem as idéias para satisfazer os desejos “criados artificialmente”. Já se observou que a comunicação faz parte do alicerce do programa, pois a platéia do agente é “livre” para ouvir ou não a comunicação técnica. Por este motivo, o arsenal da comunicação é enaltecido e dirigido pela sensibilidade e não por generalização.

A esse respeito Röling afirma: “É meu propósito aqui criar uma maior consciência do comportamento de comunicação do agente de mudanças” (RÖLING, 200?, p. 6). O professor expande sua fala e aprofunda a discussão referente à comunicação, ressaltando a necessidade de adequação ao meio, pois, dependendo da mentalidade do grupo, temos manifestações diferentes.

Desse modo, apresenta-se a necessidade de aprofundamento dos estudos com relação à comunicação e à realidade do grupo no qual seria efetuada a ação. Entre as várias considerações, resistem os propósitos de formar realidades ou até transferir modelos que são chamados de realidades. A comunicação, para seu sucesso, deve ter presente a validade tática dos discursos, tendo em vista a necessidade de atingir outras realidades. Nesse caso, entende-se a estratégia de usar o rádio para a expansão das idéias, já que este era um meio de informação recebido em todo o município e que poderia auxiliar no contato indireto com os agricultores, preparando o contato direto, feito através dos agentes.

Como resultado da atuação, devem surgir caminhos treinados pelas mensagens que buscam sua estruturação nos canais de comunicação. Estes são compreendidos como nuvens carregadas prontas a romper e liberar as mensagens que correm como a água da chuva, levando as técnicas tradicionais e trazendo novos padrões de conduta. Os canais devem permitir que ondas sonoras, pedaços de papel com tinta ou outras unidades físicas com conteúdos simbólicos passem através deles. Portanto, a preocupação com as mensagens retoma os canais de comunicação, através dos quais surgem preocupações com seu poder de alcance, com o grupo que ouve a programação.

Ainda com relação ao agente de mudanças, outro aspecto que servia de canal para a comunicação está relacionado à escolha das pessoas encarregadas da difusão das informações. Em Marechal Cândido Rondon, o critério usado foi a escolha de pessoas da localidade para servirem de canal entre os agentes e os demais agricultores. Na entrevista com o extencionista, este informou, que os agentes locais eram os professores das escolas municipais residentes na localidade. Em muitos casos, eram também agricultores ou o presidente do clube da igreja.

A busca de líderes formais recebe a atenção da ACARPA, que efetuou vários treinamentos de líderes junto à comunidade. A realização destes treinamentos foi divulgada pela rádio local.

Neste texto, pretende-se tratar a modernização agrícola, vinculada às medidas técnicas, adotadas na produção através da incorporação de novas ferramentas no cotidiano do rurícula, quando este passa a desenvolver uma agricultura mecanizada e direcionada ao manejo de

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agricultura1 ligada à modernização, tendo como suporte de análise a produção discursiva de sua implantação, bem como a identificação dos mecanismos que levaram os agricultores à incorporação da mecanização, entre os quais são priorizados o discurso jornalístico e sua inserção no cotidiano rural.

Dessa forma, merece destaque a atuação dos meios de comunicação, pois:

a sofisticada tecnologia de comunicações, desenvolvida nos programas espaciais, militarmente orientados, usa técnicas de persuasão, manipulação e penetração cultural para vender excedentes da indústria, em geral produtos de consumo supérfluos; mas essa tecnologia vende, também, de forma global, idéias, gostos, preferências e crenças. Mensagens, objetos, estilos de vida e técnicas de informação, [...] (GUARESCHI, 1985, p. 73).

Na verdade, esperou-se, a partir dos discursos, identificar as transformações mais estimuladas junto às propriedades agrícolas. Os estudos relacionados ao cotidiano propõem um desafio, ao romper com o consagrado, abrindo espaço para novas reflexões silenciadas em muitos casos. Como diz Michel de Certeau (1996, p. 31), “o cotidiano é aquilo que nos é dado cada dia, nos pressiona dia após dia, nos oprime, pois existe uma opressão do presente”. Portanto, o cotidiano é entendido como instrumento que abre o caminho e sinaliza a direção, sintonizando as relações mais íntimas de um grupo. Neste contexto, buscou-se um entendimento do processo de exclusão de determinados instrumentos técnicos por parte dos agricultores e a incorporação de outros, o que interfere profundamente na transformação de seus hábitos.

Desse modo, no que concerne aos chamados meios de comunicação de massa, estes podem ser definidos como veículos que se encarregam de disseminar as informações, de tal forma que “seu papel de atores e agentes na sociedade tecnológica, são considerados como fatores que imprimem sua dinâmica na sociedade, pois são tidos como possuidores de uma liberdade de ação real” (GUARESCHI, 1985, p. 19). No programa intitulado “Nossa Programação”2, verificou-se, na íntegra, as constantes reprogramações:

A partir da próxima segunda feira, será feita uma completa transformação em nossa programação. Iremos beneficiar ainda mais nossos amigos do interior, apresentando uma série de bons programas. Às 5 horas da manhã, iremos iniciar nossos trabalhos, apresentando o programa ‘Na Fazenda do Nhô Zeca’. Às 6 horas, será apresentado o ‘Matutino Difusora’; 6 e 15, ‘Calendário Difusora’; e às 6 e 25, o ‘Paraná Municipalista’. Às 6 e 30 horas, irá ao ar o programa ‘Bom Dia Trabalhador’. Às 7 e 15, ‘Astros e Planetas’. Às 7 e 30 horas ‘Retreta Matinal’. A partir das 8 horas, a programação voltará ao normal, como anteriormente. Haverá a apresentação de um novo programa no horário das 14 e 45 horas até as 15: ‘Música Alemã’. A partir das 15 horas, serão apresentadas as homenagens musicais. O programa ‘Lar, Doce lar’, vai ser apresentado em novo horário: às 10 e 45 horas (Rádio Difusora).

A programação da Rádio Difusora apresenta mudanças constantes em suas atividades, buscando envolver e despertar seus ouvintes do interior para seus programas cotidianos.

1 Ainda de acordo com Kageyama (1987, p. 1), “a industrialização da agricultura envolve a idéia de que a agricultura acaba se transformando num ramo de produção semelhante a uma indústria, como uma ‘fábrica’ que compra determinados insumos e produz matérias-primas para outros ramos da produção”.

2 Cabe informar que as fontes jornalísticas presentes no decorrer do trabalho serão citadas na íntegra.

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Para tanto, são criados e recriados espaços com o objetivo de atrair o público. Assim, tem-se programas como: “Na Fazenda do Nhô Zeca” que inicia às 5 horas da manhã, horário em que os agricultores acordam e se preparam para mais um dia de trabalho. A rotina matinal do agricultor inicia-se com o fogão a lenha para aquecer a água, usada para o chimarrão, e enquanto tomam seu café, ouvem a programação da rádio.

O programa “Bom Dia trabalhador”, que ia ao ar às 6:30 horas, é especificamente produzido com a intenção maior de informar o trabalhador do campo. Exemplo disto é que nesse período, o rádio ocupa lugar de destaque na casa dos agricultores. Observando o interior das residências, buscou-se localizar o lugar destinado ao aparelho (rádio) nas comunidades do município: este permanece em destaque, já que os agricultores o deixam sobre uma prateleira de madeira construída, especificamente, para o aparelho ou possuem mesas e estantes, nas quais, este meio de comunicação tem seu espaço garantido. Olhando com mais atenção, percebeu-se que o objeto é destaque na casa do agricultor, competindo com os quadros de família e imagens sagradas. É comum, ainda hoje, a família ficar estática diante da “vinheta” que antecede o fato noticioso.

No horário das 8 horas a programação retoma sua rotina. Nesse horário, os agricultores estão ocupados com seus afazeres diários no campo. Para o horário do descanso, após o almoço, não poderia faltar uma programação mais alegre e, para isto, a emissora cria o programa “Música Alemã”. Por que música alemã?

Como na região predomina a colonização alemã, o programa buscou atender a esse público; mas com o tempo ocorreram questionamentos por parte dos demais grupos, como os italianos e poloneses e a emissora de rádio, então, cedeu espaço para outras programações. Já o programa “Lar, Doce Lar” era voltado para as esposas e filhas dos agricultores.

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