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3. OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA

3.2 RÁDIO: A viabilidade técnica

As primeiras iniciativas de transmissão – recepção dentro dos padrões radiofônicos foram resultado das pesquisas então desenvolvidas pelas grandes empresas do setor, que culminaram na criação dos aparelhos receptores, ou seja, como afirma Maria Elvira Federico: “[...] a indústria eletroeletrônica, recém

– instituída, envidou esforços que permitiram ainda mais a aceleração e o caminho que a área tomou após a guerra9”. (FEDERICO: 1982, 13)

Estes aparelhos receptores possibilitaram, portanto, o início do mecanismo de transmissão de mensagem via rádio, agora para um indivíduo que se instala próximo ao alcance do som do aparelho. Este processo de transmissão é resultado de uma complexa configuração e estruturação de peças, cálculos e ondas invisíveis dispostas na natureza10. Na realidade a “matéria prima” do rádio – as ondas eletromagnéticas – sempre esteve à disposição no mundo natural, bastava haver a conjunção entre um desenvolvimento técnico determinado e uma necessidade específica anunciada. Para enquadrar esta lógica estruturante dentro de uma perspectiva que aqui nos interessa, apresentaremos abaixo uma rápida síntese do processo de transmissão inaugurado pelo rádio:

Esquema 1

Esquema 2

O primeiro esquema tenta mostrar que o rádio se caracteriza enquanto produtor de informações. Na estação são criadas as informações que serão captadas pelos aparelhos receptores dos ouvintes que, por sua vez, aguardam

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Refere-se à Primeira Guerra Mundial. 10

Voltaremos ao tema no segundo capítulo.

Base de Transmissão Estação Receptor Aparelh Fato Base de Transmissão Estação Receptor Aparelh

no final da “linha” para se informarem. Ora, este processo remete à estação a responsabilidade de formar o ouvinte sobre o “produto” ali criado, uma vez que este, alheio à condição de participação na base de transmissão, depende totalmente da recepção para se formar. Em outras palavras, o indivíduo possui uma maneira única de se deparar com a informação transmitida, sendo ouvinte. Logo, a estação possui o que podemos denominar como meios de produção de mensagens, enquanto ao ouvinte resta o papel de “consumidor” em função da sua condição passiva no processo.

No segundo esquema procuramos demonstrar a capacidade técnica do rádio frente ao papel que ele adotou na seqüência de sua criação, a saber, o de controle social. A complexidade urbana instituída com o aumento das cidades atribuiu ao rádio a função de transmissor de informação e entretenimento. Tanto no Brasil – como veremos – como em todas as sociedades que o adotaram, o rádio passou a integrar os instrumentos de comunicação e, portanto, de orientação dos indivíduos. Assim sendo os acontecimentos que antes se restringiam a formas rudimentares e elitistas para serem divulgados – como os veículos escritos – foram assumidos pelo rádio, e este, em função de seu papel estratégico, pelos governos:

A maioria dos países têm sob a jurisdição direta dos seus governos, ou através de órgãos públicos indicados, não só a outorga de licenças, como o controle sobre os veículos eletrônicos. Alguns deles até mesmo os exploram diretamente instalando e operando serviços. (FEDERICO: 1982, 16)

Transmitir informações pressupõe, como condição inerente, um processo de reprodução; reprodução de uma informação criada na Base ou adquirida fora dela. Neste caso, e é o que nos apresenta este esquema, a estação fica com a incumbência de se deparar com o fato e transmitir para o receptor, através dos mecanismos técnicos, aquilo que se averiguou acerca do fato. O fato, tal qual a produção de uma obra de arte, é constituído levando-se em consideração uma junção de fatores – o hic et nunc de Benjamin – que o tornam único e original. Tal qual a obra de arte ele também possui uma aura. Ao tentar reproduzir este fato, seja através de imagem ou de som, a técnica de reprodutibilidade terá êxito em parte deste processo, ou seja, por mais fiel que a técnica se proponha a ser sempre haverá a limitação da reprodução da aura.

No caso específico do rádio este processo se acentua ainda mais. Este veículo se caracteriza pela transmissão sonora das informações. Esta especificidade força ao veículo o trabalho de um emissor humano capaz de transformar em linguagem compreensível aquilo que se verificou no contato com o fato. Ao exercer a transmissão o emissor, por não conseguir reproduzir a aura, envia uma versão do fato, transformando-o e deturpando-o.

A realidade despojada do que a aparelhagem lhe acrescentou tornou-se aqui a mais artificial de todas; assim no mundo da técnica, a captação imediata da realidade enquanto tal é agora uma simples quimera. (BENJAMIN: 1990, 229)

Em outras palavras, ao transmitir o fato, o emissor modifica a realidade enquanto tal. Do ponto de vista do receptor esta realidade se agrava – e este é, a nosso ver, o ponto de partida de toda a crítica frankfurtiana aos novos veículos de comunicação. Desprovido da condição de se deparar com o fato – e consequentemente com a aura – o indivíduo-receptor fica à mercê das versões transmitidas pelo emissor. O que ele recebe é uma realidade deturpada, transformada, trabalhada segundo suas necessidades verificadas pelo emissor.

Levando-se em consideração que toda produção possui sua aura, também a versão deturpada pelo emissor terá seu “selo de autenticidade”, sua aura. Assim, podemos aqui aferir que estar alheio ao verdadeiro fato o força a transformar em verdade aquilo que na realidade é uma versão, ou seja, a verdade do fato se confunde com a “verdade” da versão. Este processo, intrínseco à reprodutibilidade técnica, categoriza o receptor numa condição de passividade pela própria essência do veículo.

Democrático, o rádio transforma-os a todos igualmente em ouvintes, para integrá-los autoritariamente aos programas, iguais uns aos outros, das diferentes estações. Não se desenvolveu nenhum dispositivo de réplica e as emissões privadas são submetidas ao controle. (ADORNO e HORKHEIMER: 1985, 114)

Neste sentido evidencia-se, segundo nossa concepção, a clara possibilidade de atuação política proporcionada pelos meios de comunicação

de massa. Na realidade, toda a indústria cultural, inserida numa lógica de mercado, propicia a inserção de valores ao público receptor.

Ora, é justamente esta possibilidade que abrirá o caminho para que a radiodifusão possa se inserir no cenário político. E é esta condição a responsável pelo desenvolvimento dos veículos, desta feita sob a tutela das diversas orientações ideológicas e governamentais.