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3. OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO DE MASSA

3.3 A viabilidade política

Sob uma conjuntura de utilização incondicional destas técnicas ao nível político, Adorno e Horkheimer ressaltam a força do discurso ideológico do mercado, onde as massas sucumbem mais facilmente aos preceitos.

Assim como os dominados sempre levaram mais a sério do que os dominadores a moral que deles recebiam, hoje em dia as massas logradas sucumbem mais facilmente ao mito do sucesso do que os bem-sucedidos. Elas têm os desejos deles. (ADORNO e HORKHEIMER: 1985, 125)

Inserida no contexto do mercado, a proposta ideológica resultante da ação da indústria cultural refletirá os princípios defendidos pela classe dominante capitalista. E esta proposta aponta efetivamente para a “não crítica”, ou seja, para uma condição de passividade do consumidor alienado. Essa passividade é estimulada porque, segundo Adorno e Horkheimer, a indústria cultural não atua apenas para satisfazer as necessidades a partir da reprodução, mas também para criar a própria necessidade do produto. Em outras palavras, ao contexto cultural serão inseridos valores e bens que, por estarem desconexos na origem, devem ser estimulados como necessidade, garantindo, a seguir, seu consumo sem resistência. Na realidade são criados de forma “racional” e apresentados à sociedade de forma “natural”.

Esta ideologia ao consumo dos bens industriais, ao vincular-se aos preceitos liberais da economia de mercado, procura “anular” como padrão de consumo de massa aquilo que não condiz com os objetivos de lucro provenientes da reprodução em larga escala. Assim, o que for “diferente” é marginalizado em nome do “comum” a todos, do conhecimento geral. A massa,

na condição de consumidora, deve reconhecer-se no produto; seus valores devem ser os mesmos transmitidos constantemente.

O espectador não deve ter necessidade de nenhum pensamento próprio, o produto prescreve toda reação [...]. Toda ligação lógica que pressupunha em esforço intelectual é escrupulosamente evitada. (ADORNO e HORKHEIMER: 1985, 128)

O propósito de vida, em termos genéricos, é retratado pela indústria, estabelecendo o padrão de comportamento a ser adotado. Mais adiante, a mesma lógica imposta na relação “homem – mercado” estrutura a relação de dominação no âmbito político. Isto porque o princípio de liberdade, que na democracia representativa se manifesta no direito à escolha do representante, influenciará a relação “homem – Estado”, tornando-a dependente das formas de reprodução de mensagens inerentes aos veículos de comunicação. O “candidato” que se apresenta é o candidato que retrata o “estilo de vida” do mercado, onde, atrelado ao trabalho contínuo de desconstrução, fez com que a ideologia se reduzisse a um discurso vago e descompromissado bastante eficaz, já que, como afirmam, manifestam-se como publicidade ou como o que chamam de conversa fiada.

A ideologia fica cindida entre a fotografia de uma vida estupidamente monótona e a mentira nua e crua sobre o seu sentido, que não chega a ser proferida, é verdade, mas apenas sugerida, é inculcada nas pessoas. (ADORNO e HORKHEIMER: 1985, 138)

O êxito da dominação está na legitimação dos valores intrínsecos ao sistema, em contrapartida, os riscos possíveis estão associados a uma condição de negação tendo em vista o surgimento de alternativas que alteram o padrão de consumo. Sendo assim, a constante representação das formas de vida e a estereotipização daquilo que se quer negar são métodos usuais da Indústria Cultural. E este movimento ocorre, muitas vezes, de forma vinculada, onde o “produto ideal” é o apresentado concomitantemente ao “não ideal”, sugerindo de forma subjetiva o seu consumo.

Das analogias

O que é salutar, na concepção de Adorno e Horkheimer, é exatamente aquilo que se repete constantemente, que além de demonstrar e ratificar a existência do “fato”, reafirma ao espectador que ele não está ‘só’, que os valores são por outros compartilhados. Desta forma, e aqui mora a principal pilastra das críticas levantadas à Indústria Cultural, restringe-se o espaço para a unicidade, tanto do ponto de vista da criação da obra quanto da perspectiva de quem a consome. E isso porque o valor de uso nela inserido não condiz com os propósitos da economia de mercado, logo, não será propagada. A realidade, que é a realidade do mercado, configura-se como natural.

Em linhas gerais, segundo podemos aqui afirmar, o cinema insere-se na lógica que norteia a crítica à indústria cultural, ou seja, segue a mesma regra da reprodução da obra de arte, uma vez que o produto que fornece – o filme – nada mais é que uma mercadoria e seu público, por ser de massa, está alheio ao processo de produção original.

Enquanto o cinema projeta imagens em uma sala para um grupo genérico, o rádio tem a sua recepção em aparelhos específicos, normalmente instalados na residência do receptor. Nesse sentido, enquanto na sala de projeção as reações individuais são “controladas” pela reação coletiva da massa, assim com apontou Adorno e Horkheimer, o rádio, em nossa concepção, possui uma característica mais “libertadora”, uma vez que seu receptor não se encontra envolto por um grande público. Assim, pode expressar de forma mais intensa sua individualidade.

Mesmo possuindo, como afirmamos, um viés informativo, o objetivo básico do cinema é o entretenimento, enquanto o rádio, por atuar apenas pela técnica oral de transmissão, teve seu papel social destinado com maior ênfase para a questão da informação através de mensagens específicas. E é por este motivo que sua utilização em termos políticos é mais acentuada, principalmente a partir da proliferação das estações receptoras.

Em contrapartida a TV apresenta aspectos de intermediação entre o rádio e o cinema. Nasce reproduzindo imagens como o cinema e apresentando

programações que se originaram no rádio11. Há que se ressaltar, entretanto, sua peculiaridade ante a produção, que se estabelece em torno de um tempo útil menor que o do cinema e da reprodução constante de personagens.

Além disso, a tecnologia da produção da televisão torna quase inevitável a estereotipagem. O pouco tempo disponível para a preparação dos textos e o vasto material que deve ser produzido continuamente exigem certas fórmulas. (ADORNO: 1973, 557)

Em nossa perspectiva, os veículos de comunicação de massa, apesar de singularidades quanto à questão técnica, se enquadram num propósito imediato de propagar a cultura de massa com o objetivo de estabelecer o controle social através da transmissão de regras de conduta e valores, seja para a questão do consumo ou, como tentamos mostrar, para a questão política.

Nosso propósito a seguir será demonstrar de que forma a radiodifusão se insere na cultura nacional atuando nas duas frentes que até aqui procuramos explorar: a do consumo, que sustenta a economia de mercado, e a política, que legitima ideologias e regras de controle. E é esta última que nos fornece subsídios para entender a importância do veículo para o governo ditatorial militar.

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PARTE II