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Do inevitável necessário: sobre Sociologia e Arte

5 reação emocional e intelectual

      2.  execução         4.  apoio  técnico      

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Ao se ater ao artista, Becker cria uma estratégia teórica de confluência entre as ações cooperativas dos agentes e o mundo artístico de forma a privilegiar o vinculo estabelecido. Vínculo este que pode estruturar elementos para a própria poética, caso venha a ser o caso... Artistas podem realizar comentários sobre esta divisão de trabalho que caracteriza as redes cooperativas do mundo artístico. Estes comentários podem configurar poéticas que explicitam a sutileza destas funções altamente especializadas de modo a gerar interpretações sobre o contexto produtivo, mesmo que esta nem seja a intenção poética.

Existem certas propostas que permitem uma interpretação tendenciosa. Por exemplo, tendo a perceber a performance A artista está presente|2010 ’ r: ,Q&ªYde Marina Abramovic ’Q“è; V,,,Y

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quase como um escárnio sobre a visibilidade e o apego que temos com a figura pública do artista enquanto lugar de uma excepcionalidade digna de culto. Esta performance de longa duração (736 horas e 30 minutos) ocorreu entre 14 de março e 31 de maio/2010 na retrospectiva realizada no Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova Iorque, situação em que a artista permaneceu sentada em silêncio e imóvel diante de uma cadeira vazia na qual o público era convidado a sentar e fitá-la. De fato, além de um comentário sobre o tempo, a persistência, a co-presença, a alteridade, esta performance dimensiona uma discussão sobre o artista não apenas como origem, mas também como biografia que agrega valor à obra (que é ela mesma) em função de uma habilidade/sensibilidade única.

Já os desenhos de Sol LeWitt (Fig.133) destinados a acontecerem em paredes marcam exatamente um contrário, no sentido que são concebidos pelo artista, mas executados por outros, que não são o artista, mas artífices. Ao longo de sua carreira, Sol LeWitt produziu mais de 1200 desenhos para serem efetuados por outros a partir de instruções, sendo que estes desenhos estavam sujeitos a variações que correspondiam à interpretação e habilidade de quem iria realizar a composição. Assim, pensar o artista enquanto o fazedor do artístico nos termos apontados anteriormente talvez tenha também por consequência corroborar com o

mito romântico da vocação65. Prosseguindo a discussão proposta por Howard Becker quanto

à cooperação nos mundos artísticos, o autor apresenta que esta cooperação nem sempre ocorre sem conflito nas relações, oportunidades ou acomodações. Para além das intenções do artista, por vezes, as instituições não possibilitam certas poéticas por exigências da convenção. O que muitas vezes leva o artista a agenciar seus devires em espaços alternativos de circulação, distribuição e exibição. Ou até mesmo, fazer chacota destes como me faz refletir The Haul|2006 (Fig.134)  de Chris Engman (1978-­‐...) e Escoras de Parede|2005 (Fig.135)  

de Afonso Tostes (1965-­‐...)

.

                                                                                                               

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Categoria oriunda da ética protestante que sustenta o espírito do empreendimento capitalista, a vocação segundo Weber (1967), relaciona sua significação com as dimensões religiosas da experiência humana. O fenômeno artístico, entretanto, dimensiona este conceito para além da religião e orienta uma compreensão dos mecanismos discursivos que balizam a experiência. A vocação artística opera na experiência, tanto do acaso, quanto da necessidade: após descobrir-se artista, é preciso sê-lo. Esta necessidade revelada é muitas vezes a única certeza que o artista tem. Em contrapartida a um possível uso teórico desta categoria, temos a provocação de Bourdieu (2001) que indica que ao se legitimar o trabalho artístico como proveniente de um dom ou de uma vocação, promove-se a incompatibilidade teórica entre a Sociologia e a Arte.

Em todo caso, as exigências da convenção atuam como parâmetro e evocam uma recepção emocional por parte das pessoas. Como reagir a I’m too sad to tell you|1971 (Fig.136); o que fazer quando alguém chora copiosamente? Nestes termos, as convenções artísticas regular efeitos emocionais como também estabelecem as condições de possibilidade para a experiência, com uma ressalva: estas convenções raramente são rígidas ou permanentes. Por vezes, até mesmo acontecem como um jogo de azar como indica o objeto (Fig.137)  de Mounir

Fatmi (1970-­‐...). Outras vezes compete ao artista instruir uma crítica sobre as convenções, sobre as separações entre instâncias e sua nomeação (bacharelado e licenciatura em artes, por exemplo) como por exemplo quando um material didático compõe uma estrutura poética, como é o caso das videoaulaobras (Fig.138)  de Georgia Kyriakakis. Mesmo assim, às vezes, as

convenções se impõem de forma que compete ao artista escolher entre segui-las [como provoca ironicamente John Baldessari (Fig.139)

] ou promover alternativas possíveis. Deste

esforço de criação de oportunidades para a criatividade resultaria o potencial de novos mundos artísticos a partir de inovações nas redes cooperativas. Diante de tudo isto, Howard Becker caracteriza a especificidade da aproximação sociológica à Arte como uma compreensão de sua artisticidade (i.e.,   artness,   cf.   BECKER,   1982) e de sua mundandade (i.e.,   worldness,  cf.  BECKER,  1982), isentando que sejam feitos julgamentos estéticos, de valor ou de competência. Este último posicionamento, causa em mim certo alvoroço e pode gerar controvérsias, mas segundo o próprio autor o julgamento seria um fenômeno característico da

Arte enquanto atividade coletiva, esfera que não compete à Sociologia66

(pasme!).

Estendendo a discussão da última nota de rodapé, por mais que o mundo artístico desfrute de uma relativa autonomia com relação às outras esferas da sociedade, existem condições exteriores que balizam, norteiam e perpassam a experiência do artístico. Estas condições exteriores podem ser convenções, preconceitos e superficialidades; estruturas que validam ou marginalizam discursos e linguagens simbólicas; subvenções ou proibições a ações, existências e realizações. Não seria justamente isto que interessa um desdobramento teórico sobre a sociedade; não é disto que trata a Sociologia?

                                                                                                               

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Isto sinceramente causa em mim um estranhamento. Logo explicito: Becker elenca dentre as atividades que possibilitariam a existência da obra de arte “a criação e manutenção de parâmetros de racionalidade sobre a arte”. Assim, de algum modo a Sociologia (da Arte) poderia ser justamente assim inserida no mundo artístico, sendo um de seus componentes, dissipando uma primazia da Sociologia sobre a Arte e promovendo uma outra estrutura hierárquica na ordem do discurso sobre o conhecimento artístico e julgamento estético. Quanto à questão da competência da teoria sociológica em fazer juízo estético, este tipo de julgamento condiz com a esfera de valores sociais, conceito fundamental na tradição da disciplina. Então... será que deveria ser questionada não a competência da Sociologia enquanto área de conhecimento, e sim a competência do sociólogo enquanto agente suficientemente qualificado (ou não) para desenvolver esta discussão?

Em contrapartida, algumas poéticas identificam práticas do artístico e convertem estas em contradiscursoslinguísticos em que as propostas parecem questionar se quaisquer parâmetros (até mesmo os sociológicos anteriores e exteriores) seriam realmente válidos para a compreensão de seus valores. São poéticas para as quais a lógica racionalista, utilitária, funcionalista ou mecanicista de argumentos causais implicaria apenas em obviedades ululantes, parciais e inviáveis. Como recodificar, por exemplo, a performance O paradoxo da práxis 1 (algumas vezes fazer algo leva a nada)|1997 em que Francis Alÿs (1959-­‐...) empurra durante nove horas um bloco de gelo pelas ruas da Cidade do México até que este derreta? Como ver as sete telas em que foram despejadas água dos sete mares como algo além de superfícies em branco (ref.

Esta indescritível sensação marinha|1997 de PPPP)

?

Alguém realmente se sentiria ofendido com o Campeonato Fluxus Multicultural de Mijo|1963 proposto por Nam June Paik (1932-­‐2006), no qual os competidores enfileirados lado a lado urinam simultaneamente pelos buracos de uma cerca cantando o próprio hino nacional? Afinal isto é artístico? Para quem? Quando? Em meio a isto, se “todo conhecimento é reconhecimento e não há percepção sem afecção” (BERGSON,  1999,  p.60), então talvez seja necessário considerar que nem todo conhecimento (inclusive o sociológico) admite que desconhece certas coisas menos tangíveis que poderiam ser fundamentais para a compreensão de outras mais imediatas. Nem todo conhecimento sequer sabe da existência daquilo que desconhece ou reconhece a legitimidade de sua existência. Agora, qual a relevância destas colocações? A relevância está na importância de uma postura crítica perante o processo de conhecimento, que coloque em dúvida a real possibilidade da decodificação e compreensão de um mundo (artístico ou não). É necessário promover um entendimento que o próprio conhecimento com seus discursos e linguagens simbólicas informam os modos como saberes são aplicados, valorizados, atribuídos e distribuídos (ref.  FOUCAULT,  1996). Com isto, é essencial estabelecer uma relação entre as atitudes/ações empreendidas e as possibilidades existentes. Assim, se a Sociologia da Arte busca pesquisar poéticas contemporâneas, talvez deva permitir certo contágio epistêmico pois,

em  oposição  à  pureza,  a  produção  contemporânea  aceita  as  contaminações   provocadas  pelas  coexistências  de  elementos  diferentes  e  opostos  entre  si,   como,   por   exemplo,   a   coexistência   de   imagens   e   palavras,   cujo   sentido   permanece   no   entremeio   dos   dois   universos,   ressignificando-­‐se   e   recontaminando-­‐se   mutuamente.   A   unicidade   dá   lugar   às   migrações   de   matérias,   técnicas,   suportes,   imagens   de   uma   obra   à   outra,   gerando   poéticas   marcadas   pela   transitoriedade   e   pela   diferença;   o   único   dá   lugar   assim,  à  coexistência  de  múltiplos  sentidos  (CATTANI,  2007,  p.22).  

Então, nada mais coerente que constatar que diferentes motivos exijam diferentes modos de expressão. Diferentes tipos de provocações cognitiva exijam outras possibilidades seja na forma, seja no conteúdo. Diferentes conteúdos mereçam outros procedimentos de reflexão sinestésica de modo a promover uma (re)significação. Assim, talvez seja possível não apenas escapar dos prejuízos da vida corrente, mas também promover novas experiências que permitam insurgências teóricometodológicas. Deste modo, é necessário retomar uma digressão mais precisa sobre os acúmulos teóricos legados em pesquisas e propostas em Sociologia da Arte para, mediante estes, proceder com o questionamento dos modelos que promovem a redução do artístico a formas textuais, culturais e sociais com tamanha destreza que estas passam a ser consideradas tão somente questões de discurso e linguagem simbólica. É preciso retomar a consideração do artístico como prática e pregnância, de modo que o diálogo com significados, intenções, motivações configure as poéticas em seus múltiplos espaços de possibilidade. Um destes espaços de possibilidade é justamente alargar o entendimento que se tem de discurso e linguagem para que para além do simbólico que significa algo para a interpretação, haja a possibilidade da não-significação, da anti- interpretação, do desinteligível.                      

2.1