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A RECEPÇÃO DA CRÍTICA NO MEIO ACADÊMICO

6 A RECEPÇÃO DA OBRA DE PAULO COELHO PELA CRÍTICA

6.2 A RECEPÇÃO DA CRÍTICA NO MEIO ACADÊMICO

A crítica brasileira, também no meio acadêmico, que recebe a obra de Paulo Coelho com certa reserva, geralmente se baseia na construção da linguagem, essencialmente, incorrendo em comparações aos cânones da literatura. Argumentam-se a deficiência da linguagem, o uso corrente do lugar-comum e a repetição quanto à abordagem temática, entre outros "problemas". De certa maneira, isso acontece, principalmente no que se refere à sintaxe, apesar de ser apontado, muitas vezes, com um determinado exagero. Certamente, o próprio autor tem consciência disso. Mas insiste em escrever assim, pois conhece muito bem o seu leitor. É claro que, no seu itinerário como escritor, notam-se realmente algumas mudanças. Percebe-se um significativo deslocamento do texto de Paulo Coelho, desde O Alquimista: visão mais racional e aperfeiçoamento da técnica narrativa.

19 O livro é composto por pequenas crônicas que contam histórias vividas por Paulo Coelho, no Brasil,

Em 1999, o historiador Mário Maestri realiza uma análise da obra de Paulo Coelho publicada até aquele momento, buscando justificar o sucesso do escritor, configurando-se como um dos primeiros a analisar a obra a partir da perspectiva do meio acadêmico. Numa análise sociocultural detalhada, busca evidenciar as razões do sucesso de Paulo Coelho, destacando o momento histórico e cultural em que vive o leitor da obra coelhana – um sujeito com uma frágil identidade cultural, em meio ao consumo exagerado, motivado pelo neoliberalismo e pelo rompimento das fronteiras, num mundo agora globalizado. Maestri também destaca a história do escritor, localizando-o no contexto das décadas de 60/70, em que parte da juventude se movia em dois grupos bem distintos: o dos revolucionários, preocupados com as questões políticas e sociais do Brasil; e o dos místicos, hippies, esotéricos, motivados em fundar uma “sociedade alternativa”, pertencendo Paulo Coelho a este segundo grupo.

Buscando delinear um perfil do leitor de Paulo Coelho, há uma divergência entre Romancini (2002) e Maestri (1999):

[...] se deve, no nosso entender, recusar explicações demasiadamente simplificadoras, como as que colocam em foco somente consumidores ingênuos em busca de consolação, ou que projetam no campo cultural diretamente as transformações ocorridas no âmbito sociopolítico, para explicar o sucesso mercadológico de Paulo Coelho. Como ocorre em grande medida, na análise sobre o autor em questão, realizada por Maestri (1999). (ROMANCINI, 2002, p. 7)

O autor da dissertação de mestrado refuta a ideia de que os leitores de Paulo Coelho são indivíduos massificados e totalmente manipulados pela indústria cultural. A partir de uma pesquisa sobre “leitores empíricos” sob uma perspectiva sociocultural, Romancini, fundamentando-se, principalmente, em Roger Chartier, procurou analisar as formas de apropriação dos textos de Paulo Coelho por leitores de uma biblioteca pública, cuja leitura do grupo foi caracterizada como popular.

A pesquisa de Romancini contextualiza Paulo Coelho dentro do mercado editorial e das práticas de leitura no Brasil, relacionando a atuação do escritor ao processo de profissionalização do ofício de escrever e a ampliação do acesso à leitura e o surgimento de novos leitores, os quais buscam uma leitura prazerosa e acesso ao conhecimento.

Ramadan (2003), analisando, em sua tese de doutorado, o poder educativo do mito na obra de Paulo Coelho, também observa o efeito que a produção coelhana causa no cotidiano dos seus leitores:

Talvez fique difícil entender como é possível romper a couraça do cotidiano, inserir-se em outro espaço, nele renovar-se para dar sentido às pequenezas desse cotidiano. Ninguém melhor que o leitor para confirmar isso: Hoje acabei de ler o seu livro “As Valkírias”. Foi num momento que o mundo estava desabando sob minha cabeça, e no seu livro encontrei forças para me reerguer.

[...] a leitura parece ter conduzido o leitor a uma viagem a sua psique, pra lutar e derrotar seus medos infantis. Um processo em que o mundo real e o mundo da ficção parecem ser a mesma coisa. O que a leitura na verdade proporcionou ao leitor foi uma recriação imaginária da própria vida, configurando-se o seu efeito catártico. (RAMADAN, 2003, p. 49)

A autora pontua que, na sociedade pós-moderna, o leitor se entretém e se identifica com obras que consistem em uma metáfora da própria existência. E isso é bastante visível na obra coelhana, exercendo um efeito catártico parecido com aquele que os esportes, principalmente o futebol causa nos espectadores. “A vida precisa ser vivida como espetáculo, enformada com os mesmos ingredientes da obra de arte, para ser fruída com deleite”.

Desenvolvendo uma pesquisa teórico-analítica, de cunho antropo-literário, Ramadan pretende compreender a amplitude de leitura da obra de Paulo Coelho, cuja receptividade se explica por se situar na vertente da literatura sedimentada por um imaginário simbólico transcultural, expressando uma cumplicidade entre mestre/autor e leitor/aprendiz.

O que se depreende da análise da autora é que tal leitura deve ser considerada, e não ridicularizada como grande parte da crítica o faz, uma vez que é preciso entender o leitor desse ato e que este está em formação. Não se inicia o processo de formação do leitor com leituras de Machado de Assis. Toda leitura deve ser considerada e analisada a partir de sua recepção.

Oliveira (2007), em sua dissertação de mestrado, analisa os modos de recepção do livro O Alquimista, de Paulo Coelho, por detentos da Penitenciária Estadual de Maringá, discutindo os conceitos de “literatura de massa” e “literatura erudita” e

evidenciando que esses polos devem ser compreendidos relativamente, e não exclusivamente. Após análise dos questionários aplicados, compreendeu-se que a leitura literária do “leitor comum” (desprovido do referencial teórico-crítico que tem balizado o julgamento de valor das obras literárias publicadas) também tem sua validade e que esse leitor não deve ser censurado por isso.

Já Ribeiro (2009), em sua dissertação de mestrado, no capítulo em que discute sobre a recepção do leitor, compartilha parcialmente com as teses e dissertações mencionadas:

Não queremos dar todo o poder ao leitor, mas também não podemos negar sua importância na construção dos sentidos da obra literária. Quando pensamos no leitor, temos que levar em conta a diversidade de repertório de cada indivíduo, não imaginar que todos os leitores apresentam o mesmo tipo de conhecimento e quantidade de leituras, visto que não concordamos com a ideia de que a leitura se empobrece por não ser um leitor um especialista em literatura. A leitura é um processo subjetivo, um processo de identificação e desidentificação. (RIBEIRO, 2009, p. 95)

Considerando que a subjetividade do leitor perpassa a leitura, o autor defende que não se pode considerar unicamente a opinião do leitor, havendo a necessidade de se ter um meio termo, uma baliza: de um lado, o leitor; do outro, a crítica.

Ribeiro (2009), em seu estudo, tem por objetivo compreender como o discurso de autoajuda presente na obra O Alquimista caracteriza-se como valor estético de construção do discurso literário, atravessado pelos discursos religioso e econômico- capitalista. O autor postula que ao criar histórias que retratam heróis que enfrentam as mesmas dificuldades que os seres humanos, Paulo Coelho afasta-se do que os formalistas russos entendem por “boa literatura”, fazendo com que o escritor não seja bem visto pela crítica literária. Porém, o escritor capta a atenção do leitor, o qual se identifica com o herói, ao ver que os problemas enfrentados por ambos são os mesmos: insegurança, falta de confiança em si mesmo, marasmo, vontade de realização pessoal, tudo isso gerado por diversos acontecimentos históricos, sociais e econômicos que caracterizam o mundo contemporâneo. Portanto, Ribeiro conclui que Paulo Coelho vale-se do discurso de autoajuda, que é o discurso que auxilia o homem contemporâneo na busca de sua identidade, para balizar as ações de seu herói.

Analisando as considerações que Ribeiro (2009) faz sobre leitor, percebe-se uma dissonância com o estudo de Oliveira (2007), uma vez que este aponta a necessidade de se considerar o leitor que não detém o conhecimento teórico-crítico, geralmente adquirido no meio acadêmico, mas que apresenta outros conhecimentos e que, portanto, faz outras leituras do texto literário. Entende-se a partir da análise de Oliveira (2007) que o suporte da crítica literária não é indispensável nem determinante. Ramadan (2003), Oliveira (2007) e Romancini (2002) compartilham com a ideia de que a leitura por fruição, por deleite precisa ser considerada com o mesmo grau de importância em relação àquelas que causam outros efeitos, como o despertar do senso crítico para a realidade em que se vive, por exemplo.

O trabalho de Ribeiro (2009) também se destoa de Romancini (2002) quando considera que o leitor de Paulo Coelho se apropria de um texto de autoajuda, pois Romancini (2002) não percebe esse leitor como um consumidor ingênuo, que busca consolação nos textos do escritor, defendendo que: “É possível também construir outros sistemas de oposições, bem como problematizar outras analogias – mas isso, naturalmente, questiona a ideia de um sentido social dado de modo tão uniforme e exterior aos sujeitos”. (ROMANCINI, 2002, p. 24-25)

Tampouco se percebe concordância do estudo de Ribeiro (2009) com a análise de Maestri (1999), no que se refere a conceber o texto de Paulo Coelho como discurso de autoajuda. Embora o historiador perceba o texto do escritor como:

[...] um lenitivo cultural de massas para as angústias do homem moderno de consequências extremamente importantes, já que contribui para fortalecer o sentimento individual de impotência social, produzido pelo incessante desenvolvimento da divisão do trabalho na sociedade capitalista, sobretudo em sua fase senil [...] (MAESTRI, 1999, p. 22-23),

Maestri, após apresentar as justificativas e os objetivos de seu trabalho, estabelece uma distinção da ficção de tema esotérico de Paulo Coelho da literatura de autoajuda, demonstrando que ambas têm origem histórica e fenomênica comum, configurando-se como produtos da indústria cultural, funcionando tanto como mercadoria a ser comercializada quanto uma espécie de analgésico para as pessoas que consomem essa leitura. Todavia, a literatura esotérica consiste em um texto ficcional em prosa, enquanto que a outra se constrói como prescritiva e

normativa, vendendo receitas de felicidade pessoal e realização profissional. Na ficção esotérica, há a construção de uma narrativa, enquanto que na outra, não, diferenciando-se por pertencerem a tipologias e gêneros textuais diferentes.

Oliveira (2010), em sua tese de doutorado, estabelece uma análise sobre a recepção da obra de Paulo Coelho por leitores que comparecem aos blogs do escritor na Internet. Considerando as contribuições da crítica literária e cultural contemporâneas e os estudos de sociologia da cultura, de comunicação e de estética da recepção, a autora examina os pactos de leitura que evidenciam o cânone literário e cultural de Paulo Coelho, construído na contramão dos valores do campo literário instituído. Observou-se que nesses blogs, os leitores registram as suas experiências e relatos de recepção, consagrando nesses espaços um ambiente inédito de interlocução e mediação para se conceber a literatura numa visada alternativa.

Esse trabalho evidencia a liberdade que o leitor tem para expressar suas impressões de leitura, além de interagir como o escritor, proporcionando um acesso rápido, fácil e extremamente amplo ao texto literário. Essas leituras são consideradas e respeitadas. A pesquisa também apresenta a iniciativa do escritor Paulo Coelho como pioneira no mercado editorial, o qual necessita, segundo o escritor, adaptar-se a esse novo circuito de difusão da literatura. Segundo Oliveira (2010, p. 258-259):

Por meio de falas deslanchadas, muitas vezes intempestivas, mas também previsíveis, os remetentes tecem suas identificações e projeções, alheias às exigências estéticas da alta cultura e aos critérios legitimados de literariedade. Trata-se, aqui, de um movimento que se coaduna com a postura assumida pelo escritor em seu percurso, à medida que dessublima o estatuto do literário, abrindo sua produção a pactos de leitura que se desviam dos cânones estabelecidos.

Assim como a maioria dos pesquisadores mencionados, Oliveira (2010) também mostra a necessidade de se valorizar o leitor não-detentor do aparato teórico-crítico adquirido no meio acadêmico, cujas falas muito contribuem para se entender a produção coelhana.

Buscando explicar o grande sucesso da obra O Alquimista, Souza (2001) em sua dissertação de mestrado, busca provar que o best-selleré um conto de fadas. Para

isso, utiliza-se do estruturalista russo Vladimir Propp, estabelecendo uma comparação entre Chapeuzinho Vermelho, de Charlhes Perrault e O Alquimista, contextualizando e dando enfoque à figura do herói. A autora percebe que a estrutura do best-seller, reproduz fielmente, com tecnologia pós-moderna, a mesma estrutura narrativa dos contos de fadas do Iluminismo ao Romantismo, explicando assim seu consumo de sucesso. Com essa análise, a autora evidencia que, considerando a popularidade dos contos de fadas, justifica-se o sucesso da obra O Alquimista, pois mesmo havendo vários conflitos na narrativa, ao final tem-se a redenção do herói, não como os da Grécia antiga, mas como alguém que se parece com o leitor.

Dentre as pesquisas estudadas, a que mais se aproxima da análise de Maestri (1999) é o artigo de Sérgio Bars: Paulo Coelho: Mito e Mercado. Bruxo x Bruxo e a Alquimia do sucesso, o qual busca fazer referência à tese do mesmo autor, cujo título é Paulo Coelho: Mito e Mercado, mas buscando preencher, segundo Bars (2014, p. 1), uma lacuna deixada pelo estudo:

O que Machado de Assis, o bruxo do Cosme Velho, argumentaria, diante da eleição do bruxo da pós-modernidade neoliberal Paulo Coelho, como novo irmão de fardão na Academia Brasileira de Letras? Na impossibilidade de invocar o depoimento do primeiro presidente da ABL pela prática letrada da psicografia, resta os caminhos da pesquisa bibliográfica.

Na comparação de Paulo Coelho com Machado de Assis, escritores tão distantes em termos de contexto histórico, linguagem e estilo, o autor reforça o critério que a maioria da crítica utiliza para analisar a obra coelhana: o valor estético legitimado e a linguagem. Faz uma crítica ferrenha à Academia Brasileira de Letras, por aceitar o escritor com membro da centenária instituição, dizendo que a ABL aderiu “ao triunfo da comunicação de massas e toma chá, submissa ao mercado, ao gosto popular e ao poder da mídia”. Acusa Paulo Coelho de compactuar com a ideologia da globalização, do neoliberalismo, do mercado e do marketing, sobretudo mantendo a indústria cultural e a cultura de massa. Na visão do autor, Paulo Coelho impôs um estilo de vida para os leitores em conformidade com a cultura de consumo.

Maestri (1999) reconhece, todavia, que não houve um esforço real e sistemático para se construir uma análise que desse conta do sucesso da literatura de Paulo

Coelho. Nesse sentido, o autor se dispõe a entender com mais precisão as nuances do texto coelhano. O historiador refuta algumas concepções referentes à produção de Paulo Coelho e concorda com outras:

Apenas livreiros, editores interessados e analistas ingênuos defendem eventualmente que o ato de ler ficção é sempre positivo, determinando inevitavelmente o elevamento cultural e moral do homem. [...]

Apesar das visões formalistas, cépticas, idealistas e evasivas das concepções da arte pela arte, que defendem uma essência radicalmente autônoma da obra artística, mostrarem claramente seus conteúdos amorais, elitistas e tautológicos, elas favorecem a superação das concepções didáticas, pedagógicas e moralizadoras da produção artística, contribuindo para uma compreensão mais equilibrada de sua funções sociais. (MAESTRI, 1999, p. 21-22)

O ideal de beleza e verdade propagado pela Antiguidade Ocidental e o processo mimético são reforçados pelo autor, concebendo a obra literária como um reflexo da realidade, podendo combater, portanto, ideias e ideologias, contribuindo para a libertação ou alienação humana. A concepção de Candido diverge-se, de certa forma, dessa ideia sobre a literatura:

De fato (dizia eu), há “conflito entre a ideia convencional de uma literatura que eleva e edifica (segundo os padrões oficiais) e a sua poderosa força indiscriminada de iniciação na vida, com uma variada complexidade nem sempre desejada pelos educadores. Ela não corrompe nem edifica, portanto; mas, trazendo livremente em si o que chamamos o bem e o que chamamos o mal, humaniza em sentido profundo, porque faz viver”. (CANDIDO, 2004, p. 176)

Candido defende que todo ser humano tem direito à literatura, não estabelecendo diferenças quanto aos textos, pois o leitor, à medida que lê, constrói sua formação e se emancipa quanto à leitura.

Após apresentar os objetivos do seu trabalho, Maestri (1999) passa a analisar sete romances20 do escritor Paulo Coelho publicados até 1999, buscando desvelar as razões sócio-histórico-culturais da eclosão do texto coelhano. Destacam-se, pois, alguns aspectos dessa análise considerados relevantes para esta tese em construção.

20O Diário de um mago (1987); O Alquimista (1988); Brida (1990); As Valkírias (1992); Na margem do

Os livros coelhistas examinados constroem-se através de longas narrativas, sintéticas e animadas, em prosa, das ações, materiais e espirituais, de personagens. Eles contam uma história que se desenrola no espaço e no tempo, com o objetivo primeiro de deleitar o leitor, como é próprio à literatura ficcional. São também claros e explícitos os seus objetivos artísticos, catárticos, ético-pedagógicos, evasivos, etc. (MAESTRI, 1999, p. 27)

O autor aponta que as narrativas coelhanas analisadas não conseguem transformar a realidade em matéria ficcional. A percepção de Maestri pode ser compreendida a partir do trabalho de Ribeiro (2009), quando este aponta que Paulo Coelho cria heróis bem próximos do cotidiano dos seus leitores, estabelecendo uma grande proximidade e identificação destes com o texto. A estreita relação da narrativa coelhana com a realidade é que, também, dentre outros aspectos do texto de Paulo Coelho, caracteriza o seu leitor.

Os desvios gramaticais também não escapam da análise de Maestri, todavia sua crítica não se ancora nisso:

Desqualificar a literatura coelhiana devido apenas a esses pecados e pecadilhos é esquecer que Lima Barreto incorria em alguns lapsos semelhantes e nem por isso deixou de produzir uma das mais significativas obras literárias nacionais. [...] Comumente, os reparos preciosistas e formalistas da literatura coelhista expressam os mesmos preconceitos elitistas que levaram ao desconhecimento da necessidade de um debate sobre essa obra, sobre as razões de seu sucesso multitudinário e suas consequências. (MAESTRI, 1999, p. 30-31)

Conforme o historiador, os desvios gramaticais do texto coelhano não comprometem: a construção dos personagens; a veiculação do conteúdo proposto; a facilidade da leitura e uma elegância textual relativa. Maestri também aponta como característica do texto a ironia, não como uma constante, mas eventualmente bem elaborada.

A adequada observação de Maestri quanto à linguagem do escritor permite perceber os exageros de boa parte dos críticos literários que limitam suas análises a aspectos gramaticais do texto. Isso se estende também a um número significativo de professores de Língua Portuguesa e Literatura, os quais reproduzem o preconceito da crítica, chegando ao absurdo de, na internet, por exemplo, comparar O Alquimista

com Dom Casmurro, a partir de trechos dessas obras, evidenciando os desvios gramaticais do primeiro e a maestria na linguagem do segundo. Ora, a linguagem do texto de Machado de Assis é do século XIX, enquanto que O Alquimista é do final do século XX. A linguagem da obra de Paulo Coelho necessita de ser analisada, considerando o seu leitor e sua época; só assim é possível entendê-la, de fato.

Maestri aponta outro preconceito muito recorrente nas críticas ao escritor:

Paulo Coelho é um escritor travestido de mago, não um feiticeiro disfarçado de ficcionista. Definitivamente, ele não penetrou no mundo das letras por um passe de mágica, após ter bebido uma poção misteriosa. Tem sido esquecido que Coelho é um profissional da arte de escrever, com uma real experiência anterior ao lançamento de seus romances. Talvez a sua formação autodidata – ele jamais concluiu um curso superior – tenha contribuído para o preconceituoso desconhecimento de seu passado de escritor profissional.

Antes de explodir como ficcionista, Paulo Coelho foi crítico teatral, teatrólogo, jornalista, letrista, roteirista e ensaísta. Em alguns desses papéis, teve amplo êxito. Letras de músicas que escreveu, sozinho ou em parceria, sobretudo com Raul Seixas, alcançaram grande acolhida. [...] a crítica especializada assinala a qualidade intrínseca e a importância da dupla na música popular brasileira. (1999, p. 32)

Além do constante exercício da escrita, Paulo Coelho é um leitor diversificado. Desde criança, e mais ainda na adolescência, o escritor se revelou um grande leitor:

Ler não era novidade. Até nos estatutos das Organizações Arco, ele